Por Eliana
Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo
de Crux/ IHU
Tradução: Isaque Gomes Correa
‘Não importa o que
se diga, o Sínodo dos Bispos sobre os jovens e o discernimento convocado
pelo Papa Francisco e marcado para outubro é um projeto ambicioso.
O evento não
almeja apenas mostrar que a Igreja está aberta a escutar todos os jovens do
mundo, mas para fazer isso ela também está empregando novos instrumentos
tecnológicos.
Enquanto uns
saúdam esse empenho inovador, outros levantam dúvidas sobre como estas novas
tecnologias serão usadas, qual será o alcance global do Sínodo e quais reais
efeitos ele trará, se é que trará algum.
‘Ou o Sínodo é o lançamento de algo novo, ou
será a enésima oportunidade desperdiçada pela Igreja para fingir que está
escutando alguém’, disse o padre italiano Paolo Mulps, de 31 anos, que
participou do Festival Internacional de Criatividade na Gestão Pastoral,
realizado em Roma nos dias 9 e 10 de março e que irá apresentar ao Sínodo os
seus resultados.
Outros se
preocupam com que, por mais ambiciosas que possa ser, as possibilidades a serem
consideradas ainda não são suficientemente variadas.
‘A visão dos bispos sobre o que estão
tentando fazer com a tecnologia é muito pequena’, disse o especialista em
big data e em tecnologia Joshua Tijerina em entrevista por telefone ao Crux.
Os bispos que
estarão participando do Sínodo, a acontecer no Salão Sinodal do Vaticano, terão
a oportunidade de recorrer a uma enorme quantidade de documentação e insumos,
elencados durante os meses antecedentes ao evento.
Entre outros
lugares, as vozes dos jovens serão ouvidas durante um encontro pré-sinodal em
Roma entre os dias 19 e 24 de março envolvendo mais de 300 representantes
jovens enviados pelas conferências episcopais de todo o mundo. Mas esse é só o
começo, já que os jovens estarão contribuindo de muitas outras maneiras, por
exemplo : via conferências, festivais e, talvez, até mesmo via hackatons
vaticanos.
De acordo com
Tanya George, missionária consagrada indiana que trabalha como a diretora para
a região asiática do Parlamento Jovem Mundial, organização com sede em Roma, o
verdadeiro desafio deste Sínodo dos Bispos será representar a diversidade da
juventude ao redor do globo.
‘A realidade é muito complexa. Aqui na
Europa, os jovens pensam de um modo diferente e não participam da vida da
Igreja, enquanto na Ásia eles são bastante ativos e há muita energia! Como
conciliar isso?’, disse George ao Crux.
A jovem
missionária disse que está ‘um pouco
preocupada’ com o eurocentrismo que, às vezes, permeia os sínodos, porém
sente-se otimista, pois os jovens do mundo inteiro terão a oportunidade de
participar.
‘Acho que isso é
só um começo. Um novo começo’, disse.
A Igreja se dirige para a era digital
Historicamente no
Vaticano há um atraso não somente em termos de adotar novas tecnologias, mas
também em adaptar-se à mudança. Por exemplo, ficou famoso o caso do Papa
Gregório XVI que, em meados do século XIX, proibiu trens e a iluminação a gás
nos Estados papais, preocupado com que eles promoveriam a difusão de ideias
liberais e outras noções modernas.
‘É um movimento clássico da Igreja não chegar
por primeiro’, disse em entrevista ao Crux o cardeal italiano Lorenzo
Baldisseri, de 77 anos, nomeado pelo papa em 2013 para coordenar os encontros
sinodais ao redor do mundo.
No entanto, sob a
liderança do Papa Francisco, um sucesso junto à imprensa, o Sínodo está
entrando ousadamente na era digital ao estrear novas estratégias tecnológicas.
Com o tema ‘Os Jovens, a Fé e o Discernimento Vocacional’,
o Sínodo usará o Facebook como uma plataforma para se engajar com os mais
novos. Foram criados seis grupos privados nesta rede social (em inglês,
espanhol, alemão, português, italiano e francês), abertos a pessoas com idades
entre 16 e 29 anos e que estão sendo mediados por voluntários de várias
dioceses.
Esses grupos
servem como locais de diálogo sobre diferentes tópicos, marcados por hashtags
correspondentes, e onde os jovens podem debater livremente. Os organizadores
esperam que mais de três mil jovens se juntem a cada um destes grupos já antes
do Sínodo começar.
Entretanto,
ironicamente para a maioria das pessoas, hoje, o Facebook é uma ferramenta
ultrapassada. Embora muitos tenham uma conta no Facebook, a maioria prefere a
plataforma social baseada em fotografias chamada Instagram. Segundo o Pe. Ariel
Beramendi, jovem padre boliviano que trabalha para o departamento criado com a
finalidade de auxiliar a secretaria sinodal a administrar as comunicações e
redes sociais, ainda há vantagens em usar o Facebook.
‘É uma rede social segura e podemos
manualmente descobrir se [uma conta] é falsa ou não, e ela pode especialmente
ser moderada’, disse Beramendi em entrevista ao Crux.
Os moderadores dos
grupos terão de classificar manualmente as informações que surgirem nas
conversas no Facebook e compilá-las num documento unificado a ser apresentado
aos bispos durante o Sínodo.
Este texto estará
acompanhado por um outro conjunto de dados importante extraído de mais de 150
mil questionários relativos à moralidade, à fé e à vida respondidos pelos
jovens do mundo inteiro. Estas sondagens serão analisadas por meio de um
algoritmo do Instituto Toniolo da Universidade Católica de Milão.
Pela primeira vez
na história, o Sínodo não apenas está cruzando a ‘cortina de aço’ das mídias sociais, mas também está aplicando a
análise de big data para determinar temas comuns surgidos a partir dos
questionários.
Na linguagem
tecnológica, ‘big data’ refere-se a
um grande conjunto de dados que demandariam tempo demais para um humano
analisar por completo. Esses dados podem ser examinados por computadores e
relevar padrões, correlações e conexões. Algumas das máquinas melhores
equipadas para realizar esse trabalho são os sistemas de inteligência
artificial e os sistemas de aprendizagem profunda.
Embora não haja
dúvida de que o uso pelo Sínodo das mídias sociais representa ‘algo novo’, como
disse Baldisserri, ainda há questionamentos sobre um potencial inexplorado.
Tijerina,
especialista em big data, é o CEO da agência digital Him&Her e um dos
fundadores e CEO do Movimento Halcyon, organização sem fins lucrativos que
busca criar conteúdo baseado na moral e na ética para as mídias.
Enquanto o
Facebook oferece enormes possibilidades, segundo o especialista, ele é também ‘problemático’, pois o seu algoritmo
presenteia os usuários somente com um conteúdo que eles já gostam, tornando bem
difícil encontrar opiniões que não estejam em conformidade com a própria visão
de mundo.
Esse fenômeno é
chamado de ‘filtro bolha’, onde,
dependendo das preferências e reações do usuário, um conteúdo é eliminado ou
introduzido.
Uma outra questão
é que os dados nos grupos do Facebook são peneirados e reunidos por indivíduos,
que inevitavelmente irão aplicar os seus próprios preconceitos, ao invés de
usar máquinas de alta performance.
Com um tal modelo,
‘vai ser difícil ter uma ideia do que não
foi peneirado’, disse Tijerina. ‘Acho
que o importante é ser capaz de usar inteligência artificial e os big datapara
analisar uma tonelada desse material todo, e descobrir o que as pessoas estão
de fato falando’, acrescentou.
‘Nas mídias sociais, na internet, na rede ou
em qualquer outro componente digital, onde você se conecta com milhões e
milhões de pessoas, a questão não é ‘Como extraio informações dessas pessoas?’,
mas sim ‘Como transformo a visão de mundo dessas pessoas?’ ‘Como alcanço essas
pessoas com uma mensagem importante?’ ‘Como registro um retorno sobre
investimento para realmente mostrar conversão?’’, indagou Tijerina.
Big data pode se
um aliado útil, disse o entrevistado, mas, novamente, a Igreja está alguns
passos atrás aqui.
‘Big data não tem a ver com encontrar
respostas, mas com criar mudanças’, explicou o especialista em mídias.
O questionário que
os jovens compilaram em todo o mundo é um exemplo de ‘busca por respostas’, e é apenas uma pequena parte do quadro geral
comparado com o potencial de big data. Por exemplo, Tijerina tem trabalhado num
projeto centrado nas vocações, que, através de sondagens e testes de
personalidade sobre o clero, pode criar um perfil usado para encontrar jovens
nas mídias sociais que se interessariam no sacerdócio. A partir desse ponto,
disse ele, as dioceses e arquidioceses podem criar programas destinados a atrair
essas pessoas para a Igreja.
‘A realidade é que, no momento em que a
Igreja põe os pés dentro da inteligência artificial, eu fico temeroso com que
ela esteja perdendo uma grande oportunidade, caso apenas fique fazendo
perguntas’, disse Tijerina.
De acordo com
Beramendi, se a Igreja se aprofundar em big data, esta terá de ser ‘uma decisão no nível político’, mas ‘dar um passo no mundo de big data me
parece um passo possível’.’
Fonte :