terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Maledicência

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Dom Fernando Arêas Rifan

Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney 


Nesse tempo de internet, em que se pode anonimamente falar mal à vontade de todo o mundo, em que se compartilham notícias sem preocupação com a verdade delas, em que se pode postar boatos que denigrem o bom nome das pessoas, em que se pode dizer meias verdades que impressionam e destroem a fama alheia, vale a pena recordar o que dizem os santos a respeito desse vício, que leva o nome de maledicência. O exagero, a caricatura, a meia-verdade, a reticência, a suspeita lançada ao ar, são tipos de maledicência que se assemelham à mentira, e até piores do que ela, por serem mais sedutoras.

O Catecismo da Igreja Católica ensina : Toda pessoa goza de um direito natural à honra do próprio nome, à sua reputação e ao seu respeito. Dessa forma, a maledicência e a calúnia ferem as virtudes da justiça e da caridade’ (C.I.C. 2479).

Não procures fazer figura pondo-te a criticar os outros e aprende a tornar mais perfeita a tua vida antes que denegrir a dos outros. São verdadeiramente poucos os que sabem afastar-se deste defeito, e é bem raro encontrar alguém que queira mostrar-se tão irrepreensível, na sua vida, que não critique com satisfação a vida alheia. Não há outra coisa, de fato, que ponha a alma em tanto barulho e que torne o espírito tão volúvel e leviano quanto o prestar fé com facilidade a tudo, e dar ouvido temerariamente às palavras dos críticos. E daí que surgem discórdias sobre discórdias e sentimentos de ódio que não têm motivo de ser. É justamente este defeito que frequentemente torna inimigas pessoas que, antes, eram amigas do peito. Se este mal está universalmente difuso, se este vício está vivo e forte em muitos, é justamente porque encontra, quase em todos, ouvidos complacentes’ (São Jerônimo, Carta IV, 148, 16).

‘Quem tira injustamente a boa fama ao seu próximo, além do pecado que comete, está obrigado à restituição inteira e proporcionada à natureza, qualidade e circunstância da maledicência, porque ninguém pode entrar no céu com os bens alheios, e entre os bens exteriores a fama e a honra são os mais preciosos e os mais caros... A maledicência, afinal, proferida a modo de gracejo, é a mais cruel de todas... Nunca digas : fulano é um bêbado ou ladrão, mesmo que o vejas uma vez embriagar-se ou roubar; seria uma inverdade, porque uma só ação não dá nome às coisas... Noé e Ló embriagaram-se uma vez e nem por isso foi bêbado nenhum dos dois. Nem tão pouco foi São Pedro um blasfemador e sanguinário, porque blasfemou um dia e feriu um homem uma vez. O nome de vicioso ou virtuoso supõe um hábito contraído por muitos atos repetidos do vício ou duma virtude... Todas as coisas aparecem amarelas aos olhos dos achacados de icterícia... A malícia do juízo temerário, dum modo semelhante a esta doença, faz aparecer tudo mau aos olhos dos que a apanharam... Eis aí como devemos julgar do próximo : o melhor possível; e, se uma ação tivesse cem aspectos diferentes, deveríamos encara-la unicamente pelo lado mais belo’ (São Francisco de Sales, Filoteia).

‘Se alguém não peca pela língua, esse é perfeito’ (Tg 3, 2)’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2024-01/dom-fernando-rifan-maledicencia.html

domingo, 28 de janeiro de 2024

Projeto sobre o "tesouro da fé" dos mártires “cristãos secretos" é lançado no Japão

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de  Walter Sanchez Silva


O projeto Thesaurum Fidei. Missionários, mártires e cristãos escondidos no Japão. 300 anos de heroica fidelidade a Cristo, em que se destaca a figura do beato Angelo Orsucci, martirizado em 1622, foi lançado em Roma na quarta-feira (24).

O projeto chega à Cidade Eterna quase um ano depois de ter sido apresentado na arquidiocese italiana de Lucca e contém uma exposição que pode ser vista na Pontifícia Universidade Gregoriana a partir do dia 19 de fevereiro.

No lançamento do projeto, segundo Vatican News, serviço de informações da Santa Sé, também foi apresentado um volume que reúne pesquisas de estudiosos italianos, japoneses e americanos, sob a curadoria do arcebispo de Lucca, dom Paolo Giulietti, e do professor Olimpia Niglio, da Universidade de Pavia.

A ocasião inicial do projeto foi o 400º aniversário do martírio do beato Orsucci (1622-2022) e o 450º aniversário de seu nascimento (1573-2023).

Dom Paolo Giulietti destacou que o projeto é importante porque ao fazer ‘surgir o corajoso testemunho dos mártires missionários, destes cristãos que foram conservando o tesouro da fé por gerações, inclusive em um contexto tão difícil, é verdadeiramente um grande estímulo, porque a Igreja será missionária se conservar o tesouro da fé em grande honra para a própria vida, para a vida do mundo’.

O bispo também enfatizou que o testemunho dos chamados ‘cristãos secretos’ e mártires ‘serve para certificar um protagonismo leigo na transmissão da fé na família, na sociedade e, depois para dizer que não existe nenhuma condição em que seja impossível ser cristão’, mesmo com ‘exemplos particulares de heroísmo e fidelidade’.

Os ‘cristãos secretos’ do Japão

A perseguição no Japão foi uma das mais terríveis da história. Em 1597, 50 anos depois da chegada dos jesuítas e antes da chegada dos franciscanos e dominicanos, o imperador acreditava que o apostolado dos religiosos era, na realidade, um projeto de conquista militar.

Desde então, os cristãos foram perseguidos e tiveram que se esconder nas catacumbas. Como não havia padres porque eles tinham sido expulsos, eram os próprios pais que batizavam seus filhos e transmitiam a fé a eles.

Muitas pessoas foram mortas por ódio à fé, entre elas 26 mártires em Nagasaki e 188 pessoas que perderam a vida na segunda onda de perseguições entre 1603 e 1639.

Apesar da severa perseguição, a comunidade cristã ressurgiu em 1865, quando o Japão reabriu suas portas aos missionários franceses, que celebraram a Sexta-Feira Santa com dez mil fiéis.

O arcebispo Giuletti comentou que é possível que ‘nesta época não tenha menos mártires do que o Japão no século XVII’, referindo-se não apenas àqueles que morrem por ódio à fé, mas também àqueles que são discriminados ‘em sociedades secularizadas por suas profissões de fé’.

Beato Angelo Orsucci

Angelo Orsucci foi um dominicano de Lucca, nascido em uma família nobre, e foi missionário na Espanha, nas Filipinas e depois no Japão.

Ele se destaca por seus inúmeros testemunhos escritos, preservados no convento de San Romano, em Lucca, e por suas cartas aos seus familiares, na qual falava dos cristãos que viviam escondidos e que ele os visitava à noite disfarçado de comerciante. Ele foi descoberto e preso em 1618.

Apesar de viver em condições péssimas, em um espaço apertado e com pouquíssima comida, o beato escreveu : ‘ Sou muito feliz nesta prisão’.

Em 10 de setembro de 1622, junto com seus companheiros, foi condenado a morte na fogueira. Ele é um dos 205 mártires liderados pelo beato Afonso Navarrete, que foram beatificados em 1867.

Hoje, no Japão, a porcentagem de cristãos é de apenas 0,01%, em uma população de aproximadamente 126 milhões de pessoas.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.acidigital.com/noticia/57228/projeto-sobre-o-tesouro-da-fe-dos-martires-cristaos-secretos-e-lancado-no-japao

quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

A conversão de São Paulo

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Bartolomé Esteban Murillo (1617–1682), domínio público

*Artigo do livro ‘O Evangelho de Paulo’, 

de José Maria González Ruiz, 

publicado pela Editora Vozes.


‘Eu sou judeu, de Tarso da Cilícia, cidadão de uma cidade de renome (At 21,39), circuncidado ao oitavo dia, da raça de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu, filho de hebreus. Segundo a Lei, fariseu… Pela justiça da Lei, considerado irrepreensível (Fl 3,5-6).

Esta é a ficha que faz Saulo Paulo de si mesmo.

Como quase todos os judeus que viviam no mundo grego, acrescentara ao próprio nome judeu – Saulo ou Saul – outro nome grego que, quanto possível, se lhe assemelhasse foneticamente : Paulos, ou seja, Paulo.

Tarso era uma cidade culta, mas é de se supor que seus pais, fariseus recém-emigrados da Palestina, continuaram a estrita observância judia, abstendo-se de enviar seu filho às escolas gregas. O certo é que, tão logo completados os quatorze anos, Paulo foi enviado a Jerusalém, para fazer estudos rabínicos na escola mais ilustre da época : Aos pés de Gamaliel (At 22,3).

Alguns autores, deixando-se levar por uma fantasia completamente infundada, supuseram que Paulo, em sua juventude, tenha levado vida licenciosa e, para isto, aduzem a trágica descrição que, na primeira pessoa, ele mesmo faz, no capítulo 7 da ‘Carta aos Romanos’.

Todavia, parece que o que Paulo quer destacar ali não é sua vivência pessoal e individual, mas a trágica situação do próprio ‘eu’ humano, envolto na desgraça coletiva de uma pecaminosidade estrutural.

Por outro lado, temos em suas próprias cartas afirmações sinceras e humildes sobre a conduta irreprovável que o jovem israelita observou sempre, em sua boa fé. Fariseu desde jovem (At 26, 3-5), observador das tradições judaicas (Gl 1,14), irrepreensível em sua conduta (Fl 3,6).

O fariseu de direita – Hoje, graças às recentes descobertas de Qumrân, estamos em melhores condições de enfocar histórica e ideologicamente os acontecimentos que deram origem ao surgimento do cristianismo.

Através da numerosa literatura religiosa, encontrada às margens do Mar Morto, conhecemos o estado religioso daquela interessante época.

A ‘direita’ constituíam-na os fariseus, conservadores das velhas tradições de Israel, inclusive das mais significativas minúcias rituais. Eram integristas e se consideravam os expoentes autênticos e indiscutíveis das mais puras essências religiosas e nacionais. Para isto, a ordem religiosa se identificava com a situação sociológica. Seu sistema se podia qualificar de ‘nacional-judaísmo’.

Não obstante, apesar de seu alardeado nacionalismo, haviam chegado a um status quo em suas relações com o poder romano, regendo-se por um equilibrado modus vivendi que lhes permitia certa estabilidade e flexibilidade de movimentos.

Todavia, os fariseus eram somente minoria, ainda que numerosa, do povo israelita. E é isto que o sensacional achado de Qumrân veio iluminar.

Completamente à margem da fração farisaica, pululava uma multidão de seitas, uma das quais denominada, por Flávio Josefo e por Plínio, ‘essênia’.

O núcleo central deste tipo de seita era constituído por um grupo de homens célibes, que se retiravam para o deserto, para se dedicarem à vida de oração e de estudo da Lei. Eram autênticos monges, cujas regras e modos de vida influíram, sem dúvida, na própria organização do monacato cristão, que nasceu exatamente naqueles mesmos desertos palestinos e egípcios.

Em redor dos mosteiros, e espiritualmente ligados a eles, havia numerosos assistidos, que bem podiam ser comparados às ‘ordens terceiras’ de nossas grandes ordens mendicantes ou aos ‘sócios benfeitores’ de congregações e institutos religiosos. Nem sempre viviam ali; iam e vinham fazendo uma espécie de exercícios espirituais, que vivenciavam no resto do ano.

Pelas descobertas de Qumrãn, sabemos que ali existiu um grande mosteiro, talvez o mais importante de todos, e do qual encontramos uma espécie de sucursal em Damasco, constituída por alguns monges fugidos de Qumrân em época de perseguição.

A espiritualidade ‘qumrânica’ era diferente da farisaica. Sem serem abertamente cismáticos, afastavam-se do legalismo ritual e estreito do culto do templo de Jerusalém, sobre o qual se encontram finas e veladas críticas em suas regras e livros ascéticos.

Diante do orgulho farisaico, professavam uma humildade desconfiada de si mesmos e fortemente baseada num sentimento de absoluta dependência do Criador. Finalmente, eram de tendência universalista e aberta aos demais povos não israelitas.

Saulo militava abertamente na ala extrema do farisaísmo mais estreito e ortodoxo e, no círculo intelectual hierosolimitano, assistira mais de uma vez às ásperas críticas que se faziam freqüentemente àqueles inovadores populares, perigosos para a ortodoxia.

Quando, mais tarde, Saulo volta a Jerusalém e se defronta com o problema da nascente comunidade judeu-cristã, sua indignação chega ao paroxismo. Exatamente os judeu-cristãos, procedentes do movimento ‘qumrânico’, que, de algum modo, coincidiam com os que Lucas denominava ‘helenistas’ (At 6,1), foram os que diretamente se converteram em alvo de suas iras.

Seu chefe era o jovem levita Estêvão. O discurso do protomártir, que Lucas nos refere (At 7, 2-53), é farto das idéias centrais do ‘qumranismo’, sublimadas e superadas numa esplêndida e originalíssima versão cristã.

Decididamente, Estêvão era um elemento demasiado perigoso e, nas reuniões conciliares da ‘direita’ farisaica, chegou a tomar a decisão de que a própria sobrevivência de Israel estava gravemente ameaçada e que, por conseguinte, era preciso eliminar, pela violência, quem assim minava sua própria existência.

Definitivamente, Estêvão foi apedrejado : única pena que as autoridades nacionalistas podiam infligir, quando se tratava de um caso declarado de ‘blasfêmia’.

Durante a macabra execução, os apedrejadores, para ficarem mais livres, puseram suas vestes aos pés de um jovem chamado Saulo (At 7, 58). O próprio Paulo orava, mais tarde,

Senhor enquanto era derramado o sangue de tua testemunha,
Estêvão, eu estava presente, de acordo com eles, e guardava as vestes daqueles que o matavam (At 22,20).

Saulo se converteu na peça-chave da primeira perseguição à Igreja nascente, persegui de morte esta doutrina, acorrentando e encarcerando homens e mulheres (At 22,4). Isto, naturalmente, produziu uma fuga dos cristãos, sobretudo dos da ‘ala esquerda’, que se refugiaram em Damasco, onde haveria, certamente, cristãos de tipo ‘qumraniano’. Saulo lutava inteligentemente e dirigiu seus ataques a Damasco : era preciso impedir decididamente que rebrotasse aquela semente envenenada. O resto dos judeu-cristãos não foi molestado e pôde permanecer em Jerusalém.

Caminho de Damasco – O que aconteceu no caminho de Jerusalém a Damasco, conta-o o próprio Paulo, simplesmente assim :

Recebi cartas do Sumo Sacerdote e de todo o colégio dos anciãos para os irmãos de Damasco, aonde fui com o fim de prender os que lá se achassem e trazê-los acorrentados para Jerusalém, onde seriam castigados. Ora, estando eu a caminho e aproximando-me de Damasco, pelo meio-dia, de repente me cercou uma intensa luz do céu. Caí por terra e ouvi uma voz, que me dizia : ‘Saulo, Saulo, por que me persegues’? Respondi : ‘Quem és, Senhor?’E ele me disse : ‘Sou Jesus Nazareno, a quem persegues’. Os meus companheiros viram a luz, mas não ouviram a voz daquele que me falava. Eu disse : ‘O que hei de fazer Senhor?’ O Senhor me disse : ‘Levanta-te e entra em Damasco, que ali te será dito o que deverás fazer ‘(At 22,5-10).

Saulo obedeceu. Era muito difícil o que se lhe exigia. Convertendo-se ao cristianismo, teria preferido ser recebido pela ‘ala direita’ da ‘seita’, ou seja, por aqueles que ficaram em Jerusalém e foram tolerados pelo tribunal fariseu de depuração, de que ele era parte principal. Mas, agora, ordenava-se-lhe receber o ingresso da ‘seita’ naquele ambiente de Damasco, plenamente solidário com os ‘helenistas’ (At 6,1), que comandara o odiado Estêvão. A esta dura renúncia se refere, sem dúvida, quando, depois de fazer sua própria ficha, acrescenta, cheio de nostalgia pegajosa : Mas tudo isto, que para mim era vantagem, considero desvantagem por amor de Cristo (FI 3,7).

Esta transformação dolorosa de sua postura mental constitui indubitavelmente a infra-estrutura psíquica daquela atitude combativa, às vezes violenta, que teve que adotar, no seio da comunidade cristã, contra seus antigos correligionários fariseus, que pretendiam manter, dentro do cristianismo, uma posição integrista, sufocando a novidade expansiva do Evangelho.

O noviciado do apóstolo – A princípio, Paulo começou a experimentar sua vocação apostólica pregando a Jesus nas próprias sinagogas de Damasco. Mas, pouco depois, se retirou para o deserto, para ali se preparar, na oração, e quem sabe se uniu a algum grupo monástico judeu-cristão, procedente da ‘Seita da Aliança’, intimamente aparentada como movimento ‘qumrânico’.

Daqueles primeiros anos, narra-nos Lucas alguns fatos cruciais do novel apóstolo. Ao fim de três anos de conversão, subiu a Jerusalém para ‘visitar’ o chefe da Igreja, Pedro (GI 1,18).

Dali, voltou a sua cidade natal de Tarso, de onde teve que sair, finalmente, para se defender de uma conjura, tramada pelos judeus contra ele.

De Tarso, dirigiu-se Paulo a Antioquia, cuja comunidade florescia, devido, em parte, à própria perseguição do ex-fariseu. Na verdade, em conseqüência da rajada de vento anticristã, provocada por Saulo em Jerusalém, muitos cristãos ‘helenistas’ se dispersaram pela Fenícia, Chipre e Antioquia. Estes começaram a pregar a fé. Posteriormente, os apóstolos de Jerusalém enviaram Barnabé, como delegado oficial, e este, seguindo uma inspiração do Espírito, associou-se a Paulo, em sua tarefa apostólica. Por um ano inteiro, Paulo colheu uma messe tão abundante que o fato transcendeu o grande público e este começou a chamar os fiéis pelo nome de ‘cristãos’, como eram chamados ‘pompeanos’ ou ‘cesarianos’ os partidários de algum dos dois rivais do Império.

A carreira apostólica de Paulo chegara a seu ponto culminante e nele se realizariam os projetos de Deus, manifestados desde o primeiro momento de sua conversão : Vai, porque este homem é para mim um instrumento escolhido, a fim de levar meu nome perante as nações, os reis e os israelitas (At 9,15).

Um dia, na assembléia litúrgica de Antioquia, o Espírito falou por meio da mesma comunidade de oração : Separai-me Barnabé e Saulo, para a obra a que os chamei (At 13,2).’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://franciscanos.org.br/vidacrista/especiais/a-conversao-de-sao-paulo-2/#gsc.tab=0

terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Joel, o profeta do Pentecostes

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo do Padre Nilton César Boni, CMF


Joel significa ‘Javé é Deus’. Ele era filho de Fatuel (cf. Jl 1,1) e fez parte do grupo dos doze profetas menores que viveram no pós-exílio de Judá (reino do sul). Infelizmente, pouco sabemos sobre sua vida. Não há precisão sobre o período em que viveu, provavelmente entre os séculos VIII e V a.C. Seu livro possui poucos capítulos, divididos em duas partes, que tratam da praga de gafanhotos e do Dia do Senhor. Talvez fosse um profeta ou sacerdote ligado ao culto. Para o cristianismo, ele é conhecido como o profeta do Pentecostes quando faz menção ao Espírito Santo derramado sobre todos (cf. Jl 3,1) e da penitência, pois exortou ativamente o povo à prática do jejum, da oração e do arrependimento, a restaurarem sua fé em Deus, sobretudo nos tempos difíceis pelos quais passou.

Ao descrever, na primeira parte de seu livro, a desgraça que se abateu sobre o povo proveniente da praga de gafanhotos, entendeu-a como castigo divino e um pedido a que restaurassem a aliança com o Senhor. Deus se compadecerá e não mais os destruirá se derem a Ele sua vida, serão abençoados e fecundos. Já na segunda parte, fala da paz e da harmonia por meio do Espírito Santo derramado nos corações. Essa graça trará abundância ao povo, pois o ‘Dia do Senhor’ é a vitória sobre o mal e o sofrimento. Por meio da vinda do Espírito, Deus manifestará seu perdão e seu amor aos eleitos e os farão participar da salvação.

Joel, em sua pregação, faz um convite ao ser humano a reconquistar sua amizade com Deus e servi-lo com alegria, com um coração que se abre à paz e destrói o mal. Somente pela conversão é que Deus pode reinar e habitar o santuário das almas. Podemos trazer para nosso tempo esse desejo e interpretar os sinais da natureza, sobretudo as catástrofes, que se somam aos fracassos humanos, como expressão de que precisamos mudar as atitudes para que a vida respire e nossa sociedade tenha sentido.

Os profetas, assim como Joel, estão conscientes de que não vale a pena afastar-se da criação; devemos cuidar e amar, pois é a morada do Espírito, o lugar sagrado onde Deus se manifesta e se relaciona. Sem coerência de vida e zelo pelo bem comum nos tornamos bárbaros de nós mesmos e nos rendemos à devastação.

Joel é um homem atento, sensível, responsável e comprometido com seu Deus. Entrega sua vida para abrir os olhos da cegueira social e reconquistar a paz. Exorta a confiar no Senhor e reconhecê-lo como único : ‘Sabereis então que estou no meio de Israel, que sou o Senhor, vosso Deus, e que não há outro. E jamais meu povo será confundido’ (Jl 2,27).

O Dia do Senhor é o tempo da esperança, em que o povo redimido encontrará consolo e traçará um projeto sustentável ao lado do Criador. A vocação de Joel é mostrar ao povo que diante das calamidades Deus não o abandona, mas pede que retorne ao primeiro amor e seja feliz em sua missão filial.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/wp-content/uploads/2023/11/dezembro-2023.pdf

domingo, 21 de janeiro de 2024

Perdão: da dor à liberdade

 Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de João Melo


Perdoar é um caminho desafiador, uma tarefa que, muitas vezes, revela-se árdua diante das feridas profundas infligidas por aqueles mais próximos a nós, como familiares e amigos. Em alguns casos, o distanciamento se instala, deixando relações abaladas, enquanto em situações mais graves somos marcados pela violência que permeia essas conexões.

Contudo, a decisão ética de perdoar vai além do mero relacionamento interpessoal; ela implica interromper o ciclo tóxico do desgosto, do ódio e da vingança, que perpetua o ciclo de violência e sofrimento.

Nessa jornada de perdão, olhamos para o exemplo de Jesus, que, mesmo sendo injustiçado e crucificado, proferiu as palavras ‘Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem’ (Lc 23,34). Ele nos ensinou que o perdão é uma escolha poderosa que transcende as injustiças, promovendo a reconciliação e a cura.

A extensão desse princípio cristão perpassa a reconciliação e a justiça para as pessoas mais descartadas da sociedade, da vida e missão da Igreja e do convívio familiar. A reconciliação é a cura das relações sociais feridas a partir do respeito à diversidade. Jesus acolheu todas as pessoas, independentemente de sua origem, religião, gênero, status social ou passado. Nele encontramos uma absoluta atitude de amor e inclusão. Ao perdoar e respeitar a diversidade, seguimos o exemplo daquele que ensinou que o amor supera todas as barreiras porque a reconciliação passa por toda forma de amor.

O perdão, em sua essência, é um ato libertador.

Ele não apenas redime o ofensor, mas também resgata o ofendido do peso do rancor, livrando-o do constante regurgitar da dor infligida. Apegar-se de forma doentia a uma relação ferida só serve para ocupar a mente e o coração, impedindo a abertura para outras relações e possibilidades de vida. Ao perdoar, encontramos a liberdade para explorar novos horizontes emocionais e construir conexões saudáveis. Ao mesmo tempo é crucial não infligir a si mesmo e aos demais a culpa pela suposta ‘inabilidade’ em perdoar. Cada pessoa tem seus próprios tempos e limites emocionais e, quando profundamente machucadas, podem carregar cicatrizes ao longo da vida.

O perdão não é um processo linear. Na verdade, é um caminho sinuoso que exige tempo, compreensão e compaixão. Reconhecer a própria vulnerabilidade e aceitar que o perdão é um processo gradual permite uma abordagem mais compassiva consigo mesmo e com os demais.

De fato, perdoar não é simplesmente absolver o erro alheio. Trata-se de uma jornada interna de cura que nos liberta das correntes emocionais que nos prendem ao passado. É uma escolha ética que transcende o desejo de retribuição, oferecendo a oportunidade de construir um presente e um futuro mais saudáveis.

Perdoar e respeitar a diversidade são pilares fundamentais para construir uma sociedade e relacionamentos saudáveis. Essas atitudes não apenas promovem a paz interior, também contribuem para a construção de comunidades mais compassivas e empáticas. Ao seguir os ensinamentos de Jesus somos desafiados a transcender as diferenças, nutrindo um espírito de perdão e aceitação que fortalece a harmonia e a diversidade em nosso convívio.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/wp-content/uploads/2023/11/dezembro-2023.pdf

sábado, 20 de janeiro de 2024

História de São Sebastião

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo da Cruz Terra Santa


São Sebastião era um soldado romano que foi martirizado por professar e não renegar a fé em Cristo Jesus. Sua história é conhecida somente pelas atas romanas de sua condenação e martírio. Nessas atas de martírio de cristãos, os escribas escreviam dando poucos detalhes sobre o martirizado e muitos detalhes sobre as torturas e sofrimentos causados a eles antes de morrerem. Essas atas eram expostas ao público nas cidades com o fim de desestimular a adesão ao cristianismo.

São Sebastião, soldado romano e cristão

São Sebastião nasceu na cidade de Narbona, na França, em 256 d.C. Seu nome de origem grega, Sebastós, significa divino, venerável. Ainda pequeno, sua família mudou-se para Milão, na Itália, onde ele cresceu e estudou. Sebastião optou por seguir a carreira militar de seu pai.

No exército romano, chegou a ser Capitão da 1ª da guarda pretoriana. Esse cargo só era ocupado por pessoas ilustres, dignas e corretas. Sebastião era muito dedicado à carreira, tendo o reconhecimento dos amigos e até mesmo do imperador romano Maximiano. Na época, o império romano era governado por Diocleciano, no oriente, e por Maximiano, no ocidente. Maximiano não sabia que Sebastião era cristão. Não sabia também que Sebastião, sem deixar de cumprir seus deveres militares, não participava dos martírios nem das manifestações de idolatria dos romanos.

Por isso, São Sebastião é conhecido por ter servido a dois exércitos : o de Roma e o de Cristo. Sempre que conseguia uma oportunidade, visitava os cristãos presos, levava uma ajuda aos que estavam doentes e aos que precisavam.

Missionário no exército romano

De acordo com Atos apócrifos atribuídos a Santo Ambrósio de Milão, Sebastião teria se alistado no exército romano já com a única intenção de afirmar e dar força ao coração dos cristãos, enfraquecidos diante das torturas.

Martírio de São Sebastião

Ao tomar conhecimento de cristãos infiltrados no exército romano, Maximiano realizou uma caça a esses cristãos, expulsando-os do exército. Só os filhos de soldados ficaram obrigados a servirem o exército. E este era o caso do Capitão Sebastião. Para os outros jovens a escolha era livre. Denunciado por um soldado, o imperador se sentiu traído e mandou que Sebastião renunciasse à sua fé em Jesus Cristo. Sebastião se negou a fazer esta renúncia. Por isso, Maximiano mandou que ele fosse morto para servir de exemplo e desestímulo a outros. Maximiano, porém, ordenou que Sebastião tivesse uma morte cruenta diante de todos. Assim, os arqueiros receberam ordens para matarem-no a flechadas. Eles tiraram suas roupas, o amarraram num poste no estádio de Palatino e lançaram suas flechas sobre ele. Ferido, deixaram que ele sangrasse até morrer.

Recuperação

Irene, uma cristã devota, e um grupo de amigos, foram ao local e, surpresos, viram que Sebastião continuava vivo. Levaram-no dali e o esconderam na casa de Irene que cuidou de seus ferimentos.

Segundo martírio de São Sebastião

Depois de curado, Sebastião continuou evangelizando e se apresentou ao imperador Maximiano, que não atendeu ao seu pedido. Sebastião insistia para que ele parasse de perseguir e matar os cristãos. Desta vez o imperador mandou que o açoitassem até morrer e depois fosse jogado numa fossa, para que nenhum cristão o encontrasse. Porém, após sua morte, São Sebastião apareceu a Lucina, uma cristã, e disse que ela encontraria o corpo dele pendurado num poço. Ele pediu para ser enterrado nas catacumbas junto dos apóstolos.

Sepultamento

Alguns autores acreditam que Sebastião foi enterrado no jardim da casa de Lucina, na Via Ápia, onde se encontra sua Basílica. Construíram, então, nas catacumbas, um templo, a Basílica de São Sebastião. O templo existe até hoje e recebe devotos e peregrinos do mundo todo.

Devoção a São Sebastião

Tal como São Jorge, Sebastião foi um dos soldados romanos mártires e santos, cujo culto nasceu no século IV e que atingiu o seu auge nos séculos XIV e XV, tanto na Igreja Católica como na Igreja Ortodoxa. São Sebastião é celebrado no dia 20 de janeiro. Existe também uma capela em Palatino, com uma pintura que mostra Irene tratando das feridas de Sebastião. Irene também foi canonizada e sua festa é no dia 30 de março.

Oração a São Sebastião

São Sebastião glorioso mártir de Jesus Cristo e poderoso advogado contra a peste, defendei a mim, minha família e todo o país do terrível flagelo da peste e de todos os males para que servindo a Jesus Cristo alcancemos a graça de participar de vossa Glória no céu. Amém.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://cruzterrasanta.com.br/historia-de-sao-sebastiao/162/102/

quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Ser Igreja, escutar a Igreja

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre Rafael Beck Ferreira


No início de suas Confissões, Santo Agostinho faz uma oração : ‘Senhor, faz com que eu saiba e compreenda se devo invocar-te primeiro ou louvar-te, se primeiro devo conhecer-te ou invocar-te’. Pedro, em sua primeira epístola, exorta os cristãos a saberem dar as razões de sua fé a quem os solicitar (cf. 1Pd 3,15). Por fim, vale a pena ressaltar a famosa frase de Santo Anselmo : ‘Fides quaerens intellectum’ (‘A fé busca seu entendimento’).

Desde os primeiros séculos, os cristãos buscaram entender em que acreditavam (fides quae – qual o objeto da nossa crença), enquanto, concomitantemente, a Igreja sistematizava progressivamente seu entendimento, iluminada pelo Espírito Santo, positivando-o por meio dos concílios, do símbolo apostólico e de seus pronunciamentos oficiais. Costumamos falar da ‘riqueza’ de ser católico porque, de fato, cada fiel recebe um tesouro, que é o depositum fidei (depósito da fé) proclamado, organizado e clarificado ao longo da história da Igreja.

Por isso, não basta a fé subjetiva (fides qua), que é o ato pessoal de afirmar ‘Eu creio!’. É necessário saber em que cremos, escutar a santa mãe Igreja como filhos obedientes, por isso o cristão precisa ser discípulo : colocar-se aos pés do Mestre e haurir de sua sabedoria, conhecer as Sagradas Escrituras, o Catecismo da Igreja Católica, que é uma síntese do ensinamento da Igreja, os documentos do magistério, as fontes patrísticas, as vidas dos santos e seus escritos, as obras teológicas, estudar a liturgia… Ficar nos ‘achismos’ ou seguindo ‘gurus da moda’ é caminho que conduz ao afastamento da unidade da Igreja, a um criticismo ácido que rouba a alegria de ser católico. 

Conhecer a nossa fé é percurso apaixonante e sem volta e cada vez mais os leigos estão se empenhando, estudando, desenvolvendo com mais consciência e amor seu apostolado. Assim, contra as ondas do relativismo, a barca da Igreja navega proclamando corajosamente a verdade. 

‘Quando a fé esmorece, há o risco de esmorecerem também os fundamentos do viver.’ (Francisco, Carta Encíclica Lumen Fidei, 55).

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/ser-igreja-escutar-a-igreja.html


terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Quem é Santo Antão, o abade do deserto?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo da redação da Aleteia


Antão é uma versão menos comum de um nome bastante conhecido : Antônio. Os dois nomes significam a mesma coisa : ‘florescente’, ‘aquele que floresce’ (do grego ‘ánthos’, flor). Aliás, na Igreja católica, que celebra Santo Antão no dia 17 de janeiro, o santo é também chamado de Santo Antônio Abade. Ele é considerado o pai dos monges cristãos e um elevado modelo de espiritualidade ascética.

Santo Antão nasceu no Egito em torno do ano 250, numa rica família rural. Quando perdeu os pais, o jovem de 20 anos dividiu os seus bens com os pobres e se retirou ao deserto para uma vida penitencial como eremita, chegando a viver junto a um cemitério para se aprofundar na meditação sobre a morte derrotada por Jesus. A inspiração para a renúncia ao mundo lhe tinha vindo durante uma Santa Missa, quando em seu coração se destacaram estas palavras de Jesus :

‘Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres’.

As Escrituras, a propósito, eram fonte perene de diretrizes práticas para Santo Antão. Seu trabalho manual, por exemplo, era incentivado por palavras claras de São Paulo (que, aliás, precisam ser recordadas em alto e bom som para as sociedades de todas as épocas) :

‘Quem não quiser trabalhar não tem direito de comer’ (2Ts 3,10).

Não é à toa que ele é também venerado como padroeiro pelos tecelões de cestas, fabricantes de pincéis, açougueiros e trabalhadores da manutenção de cemitérios.

Santo Atanásio, que escreveu sobre a vida de Santo Antão, observa que o eremita usava apenas o que de fato precisava, doando qualquer excedente aos necessitados.

A certa altura, ele começou a organizar comunidades de oração e trabalho, mas acabou retornando ao deserto, numa espécie de harmonização entre a vida solitária e, ao mesmo tempo, a direção de um grupo de eremitas que viviam nas proximidades. Tornou-se amigo de São Paulo Eremita (que, obviamente, não deve ser confundido com São Paulo Apóstolo – até por conta de grande diferença de época em que viveu cada um). Foi a partir dessa organização de grupos de eremitas que Santo Antão se tornou um dos pioneiros do monaquismo cristão – e é daí que lhe vem o outro nome pelo qual é conhecido : Santo Antônio Abade.

Seu papel na defesa da fé foi de grande relevância histórica. Junto com o bispo Santo Atanásio, ele combateu a heresia do arianismo, que negava a divindade de Cristo.

Santo Atanásio nos deixou várias e preciosas informações sobre o amigo :

‘Ele orava constantemente, pois aprendera que devemos orar em privado sem cessar. Era tão atento à leitura da Sagrada Escritura que nada lhe escapava : tudo retinha e, assim, sua memória lhe fazia as vezes de livros. Todos os aldeões e monges com quem convivia viram que tipo de homem ele era e o chamavam de ‘amigo de Deus’, amando-o como filho ou como irmão’.

Santo Antão partiu para a eternidade no monte Colzim, perto do Mar Vermelho, por volta do ano 356.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://pt.aleteia.org/2019/01/17/quem-e-santo-antao-o-abade-do-deserto/

domingo, 14 de janeiro de 2024

Amós, o justo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 

*Artigo do Padre Nilton Cesar Boni, CMF


Sobre as origens do profeta Amós, temos poucos dados. Ele representa o mais antigo profetismo escriturístico. Nasceu em Tegoa (cidade localizada a dezessete quilômetros ao sul de Jerusalém) e apresentou-se no reino do norte (Samaria) em 760 a.C. como profeta do juízo. Em seu livro ele aparece como sendo homem do campo, lavrador. Diz-se que era pastor, mas, isso não pode ser entendido como sua profissão e sim no sentido de salvação e libertação do seu povo, ao estilo de Moisés e Davi, pois sua participação profética se dá a partir do chamado a obedecer a Deus (cf. Am 7,14-15).

Nessa época, o reino de Israel encontrava-se economicamente em ascendência, contudo, a hipocrisia religiosa, o luxo e a perversão sexual tomaram conta da sociedade, destruindo moralmente as consciências. Embora o povo se sentisse religioso e fizesse peregrinações aos santuários, os excessos de promiscuidade eram evidentes. Amós anuncia a ruína desse estilo de vida desmascarando a segurança dos israelitas e a queda do reino do norte (cf. Am 7,7-8).

No entanto, nesse horizonte ameaçador aparece uma pequena luz consoladora. Acontecerá uma mudança drástica, mas o Senhor não os abandonará e manterá a aliança feita com os antepassados. A esperança está numa mudança sincera de vida por meio da penitência. A glória de Israel virá com o Messias prometido da descendência de Davi.

A mensagem de Amós é bem clara: de esperança e perdão para que se restabeleçam os princípios morais de Javé. Os sinais que acompanham esse desejo de mudança estão na natureza e nos acontecimentos históricos, isto é, o Senhor dá sinais para retomarem o caminho correto.

Amós representa um novo jeito de ser profeta, centrado na justiça social baseada na solidariedade com os oprimidos e pisados pelo sistema dominante vigente. Dentro de um povo dominado pela violência, manipulado pela idolatria, tendo a vida assaltada pelo sofrimento, resta ao profeta levantar sua voz contra tudo aquilo que fere a dignidade humana. Foi ameaçado, perseguido, insultado e perseverou na luta por Deus.

Com ele aprendemos a ser perseverantes e nunca nos vender aos sistemas que exploram e nos afastam da graça de Deus. A verdade deve reinar em nossas condutas para que a beleza da Palavra de Deus resplandeça com fervor sobre aqueles que ainda vivem na cegueira da ganância e do egoísmo. Essa é a vocação do profeta : sacudir a consciência dos que se acomodaram e compactuam com a cultura da conformidade e da indiferença. Os profetas não vieram para agradar e falar coisas bonitas, mas, para nos ensinar a viver com fidelidade à missão que Deus nos reservou.

‘A verdadeira profecia nasce de Deus, da amizade com Ele, da escuta diligente da sua Palavra nas diversas circunstâncias da história. O profeta sente arder no coração a paixão pela santidade de Deus e, depois de ter acolhido a Palavra no diálogo da oração, proclama-a com a vida, com os lábios e com os gestos, fazendo-se porta-voz de Deus contra o mal e o pecado.’ (São João Paulo II)

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/amos-o-justo.html


sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

Dons e talentos a serviço dos demais

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Ronaldh Oliveira


Cada ser humano carrega consigo diversos dons e talentos. É certo que ao longo da vida uns vão se dando com mais evidência e outros, menos. Os inúmeros ciclos do desenvolvimento do indivíduo vão aperfeiçoando esses aspectos que podem nascer com cada um ou podem ser aprendidos durante a existência. 

As Sagradas Escrituras já apontam na famosa parábola dos talentos (cf. Mt 25,14-31) que eles devem ser encarados com responsabilidade, caridade e criatividade, investindo bem a vida e os dons que são concedidos. Uma vez que são dados por Deus, não devem parar nos sujeitos; pelo contrário, devem chegar aos demais, oportunizando que os outros sejam mais dignos. 

Um lugar propício para a boa vivência e partilha dos dons e talentos é a comunidade eclesial, que contribui com o crescimento em estatura, sabedoria e graça daqueles que se deixam acompanhar. As pastorais e movimentos são espaços fecundos de desenvolvimento da aptidão dos talentos recebidos e percebidos porque são traduzidos em serviço aos outros. Não se trata de poderio ou de graça especial ter esse ou aquele dom quando se compreende que todos fazem parte de um único corpo cuja cabeça é o próprio Cristo (cf. 1Cor 12,27). 

Quando cada cristão se coloca a serviço da comunidade eclesial, vivencia o seu Batismo na prática e na experiência concreta de ser sacerdote, profeta e rei. As aptidões, quando exercidas na construção diária e anônima da civilização do amor, ganham sua importância para a dimensão da fé e colocam cada ser humano no caminho do Espírito que sopra onde quer. 

Os dons e talentos não devem ser fim, mas meios para a construção da plenitude pessoal e coletiva que elevam cada um ao estado daquele que serve e que, portanto, torna-se o maior no Reino de Deus (cf Mt 18,1-5.10.12-24). Todos podem servir na comunidade: há aqueles que sabem tocar, proclamar, sorrir, organizar e tantos outros verbos que elencam ações que tornam o cristão, de fato, seguidor do Cristo, servidor de todos. 

O amor que é afetivo e efetivo faz com que cada um se comprometa com o outro a partir do que tem a oferecer. Colocar os dons a serviço na Igreja e na sociedade oportuniza a cada cristão permanecer no exercício de uma fidelidade ativa e criativa diante de Deus. 

Em tempos em que, ao que parece, o cristianismo de muitos chegou a um ponto em que o primordial é ‘conservar’ e não tanto procurar com coragem a partir dos dons e talentos que se tem novos itinerários para acolher, viver e anunciar o projeto de Jesus, que é o Reino Deus, olhar para a parábola dos talentos deve ser novamente evidenciado. 

Se o cristão não se sente chamado a seguir as exigências de Cristo além do que sempre é ensinado e ordenado, se não se arrisca em nada para fazer uma Igreja mais fiel a Jesus, se o cristão se mantém indiferente a qualquer conversão que pode colocar em xeque sua condição de vida, se não assumir a responsabilidade da civilização do amor, como fez Jesus, procurando ‘vinho novo em odres novos’ (cf. Mt 9,14-17), é que não entendeu com clareza a oração proposta por Santo Inácio de Loyola : ‘Todos os dons que me destes com gratidão vos devolvo. Disponde deles, Senhor, segundo a vossa vontade. Dai-me somente o vosso amor, vossa graça, isso me basta, nada mais quero pedir’.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/dons-e-talentos-a-servico-dos-demais.html