sexta-feira, 29 de maio de 2015

Olhando para o Céu, se enxerga mais e melhor a terra


 *Artigo de Dom Alberto Taveira Corrêa,
Arcebispo Metropolitano de Belém, PA

‘‘Amai-vos uns aos outros como eu vos amei’ (Jo 13, 34; Jo 15, 12). Ao saberem do mandamento que agrada mais a Jesus, seus discípulos de todos os tempos se surpreendem e descobrem horizontes abertos e antes inimagináveis para sua vivência do seguimento de Jesus. A novidade e o segredo se encontram numa palavra, ‘como’! Nosso Senhor não lhes oferece normas de bom comportamento ou civilidade, ou regras para o trânsito da vida, numa convivência respeitosa. Em nosso tempo, há sociedades extremamente organizadas, com os limites bem definidos em direitos e deveres, e que ao mesmo tempo se tornam frias e secas no relacionamento humano. É que as fontes das decisões ficaram restritas à terra, sem que as pessoas se abram ao transcendente, à vida que vem do Céu! A pretendida laicidade do Estado tem produzido muitos frutos negativos. Já o Concílio Vaticano II (Gaudium et Spes, 36), alertava : ‘Se com as palavras 'autonomia das realidades temporais' se entende que as criaturas não dependem de Deus e que o homem pode usar delas sem as ordenar ao Criador, ninguém que acredite em Deus deixa de ver a falsidade de tais assertos. Pois, sem o Criador, a criatura não subsiste. De resto, todos os crentes, de qualquer religião, sempre souberam ouvir a sua voz e manifestação na linguagem das criaturas. Antes, se se esquece Deus, a própria criatura se obscurece’.
  
Se praticamente todos os seres humanos, em algum momento, reconhecem a existência de Deus, há um valor que só pode ser experimentado por revelação, o fato de sermos filhos de Deus. Só aquele que é o Filho eterno do Pai, desde toda eternidade compartilhando a alegria do amor que é o Espírito Santo, pode anunciar e abrir as portas para que a humanidade compartilhe este valor único, ‘somos filhos de Deus’. E é do alto, por dom de Deus, que desce gratuitamente o presente do amor da Santíssima Trindade, para que nos amemos na terra como fomos amados. Jesus traz consigo uma ‘cultura’ diferente das lutas pelos interesses individualistas presentes na humanidade, cujos resultados são sobejamente conhecidos, e têm nomes como guerras, opressão, violência e muitos outros.

Podemos pedir licença e entrar na casa da Santíssima Trindade, verificando como vivem as pessoas divinas, com a ajuda dos ensinamentos da Igreja (Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 45-48) : ‘O mistério central da fé e da vida cristã é o mistério da Santíssima Trindade. Os cristãos são batizados no nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Deus deixou alguns traços do seu ser trinitário na criação e no Antigo Testamento, mas a intimidade do seu Ser como Trindade Santa constitui um mistério inacessível à razão humana sozinha, e mesmo à fé de Israel, antes da Encarnação do Filho de Deus e do envio do Espírito Santo. Tal mistério foi revelado por Jesus Cristo e é a fonte de todos os outros mistérios. Jesus Cristo nos revela que Deus é Pai, não só enquanto é Criador do universo e do homem, mas sobretudo porque, no seu seio, gera eternamente o Filho, que é o seu Verbo, 'resplendor da sua glória, e imagem da sua substância' (Hb 1, 3). O Espírito Santo, que Jesus Cristo nos revelou, é a terceira Pessoa da Santíssima Trindade. Ele é Deus, uno e igual ao Pai e ao Filho. Ele procede do Pai (Jo 15, 26), o qual, princípio sem princípio, é a origem de toda a vida trinitária. E procede também do Filho, pelo dom eterno que o Pai faz de Si ao Filho. Enviado pelo Pai e pelo Filho encarnado, o Espírito Santo conduz a Igreja 'ao conhecimento da Verdade total' (Jo 16, 13). A Igreja exprime a sua fé trinitária confessando um só Deus em três Pessoas : Pai e Filho e Espírito Santo. As três Pessoas divinas são um só Deus, porque cada uma delas é idêntica à plenitude da única e indivisível natureza divina. Elas são realmente distintas entre si, pelas relações que as referenciam umas às outras : o Pai gera o Filho, o Filho é gerado pelo Pai, o Espírito Santo procede do Pai e do Filho’.

O Pai vive ‘fora de si’, gerando e amando o Filho, desde toda a eternidade. O Filho vive totalmente para o Pai e o Espírito Santo é amor do Pai e do Filho. A lei é esta! Não se vive para si, mas na doação contínua, desde a eternidade. ‘Por causa desta unidade, o Pai está todo inteiro no Filho, todo inteiro no Espírito Santo, o Filho está todo inteiro no Pai, todo inteiro no Espírito Santo; o Espírito Santo, todo inteiro no Pai, todo inteiro no Filho’ (Catecismo da Igreja Católica, 255).

Jesus propõe nada menos do que esta vida para seus discípulos, quando propõe como ‘seu’ mandamento o amor recíproco. É que trazia dentro de si a experiência da eternidade vivida na comunhão da Santíssima Trindade! E ele diz que este mandamento é 'novo'. 'Eu vos dou um novo mandamento'. Novo significa : feito para os 'tempos novos'. Então, de que se trata? Veja : Jesus morreu por nós. Portanto, nos amou até a medida extrema. Mas que tipo de amor era o seu? Certamente não era como o nosso. O seu amor era, e é, um amor ‘divino’. Ele disse : 'Como meu Pai me ama, assim também eu vos amo' (Jo 15,9). Ele nos amou, portanto, com o mesmo amor com qual Ele e o Pai se amam. E com esse mesmo amor nós devemos nos amar mutuamente para realizar o mandamento 'novo'. Na realidade, porém, você como homem, como mulher, não possui um amor dessa natureza. Mas se alegre porque, como cristão, você o recebe. E quem é que o doa? É o Espírito Santo que o infunde no seu coração, nos corações de todos os que têm fé. Existe, então, uma afinidade entre o Pai, o Filho e nós cristãos, graças ao único amor divino que possuímos. É esse amor que nos insere na Trindade. É esse amor que nos torna filhos de Deus. É por esse amor que o Céu e a terra estão unidos como que por uma grande corrente. Por esse amor a comunidade cristã se insere na esfera de Deus e a realidade divina vive na terra lá onde existe o amor entre os que creem’ (Chiara Lubich, 25 de abril de 1980).

Temos uma nova lei a implantar, primeiro em nossos corações, para depois contagiar outras pessoas e a sociedade, ‘em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo’. Não se trata de fazer uma cruzada para forçar pessoas à conversão, mas testemunho corajoso de valores diferentes. Quem assume como própria esta lei começa a ouvir mais, vai ao encontro dos outros para servir, toma sempre a iniciativa do amor, espalha o perdão, tem calma suficiente para não atropelar os passos no relacionamento com os outros, valoriza o que é diferente e tem ideias novas. Olhando para o Céu, enxerga mais e melhor a terra, para transformá-la segundo plano de Deus.’


Fonte :

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Por que o Líbano, bastião do cristianismo árabe, está sem seu presidente cristão?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 *Artigo de Guga Chacra, 
comentarista de política internacional do 'Estadão' 
e do programa Globo News 'Em Pauta em Nova York'

  
‘Há um ano, o Líbano não tem presidente, cargo destinado aos cristãos maronitas. Quanto mais o tempo passa, mais cresce o temor de os cristãos do único país com identidade cristã no Oriente Médio perderem o direito de terem a Presidência, prevista em acordo entre as religiões.


Como é a divisão religiosa no Líbano?

Apenas para ficar claro, o Líbano é uma nação sem maioria religiosa. Talvez seja o único no mundo, se não levarmos em conta os ateus. Há pluralidades de diferentes religiões. Entre os cristãos, podem ser maronitas (majoritários), grego-ortodoxos, melquitas (grego-católicos), assírios, armênios (ortodoxos e católicos), protestantes, católicos romanos e outros. Podem também ser muçulmanos sunitas e xiitas, além de uma minoria alauíta. E podem ser drusos. No passado, até a Guerra Civil, havia uma proeminente e bem integrada comunidade judaica. Não há censo há décadas e não dá para saber as divisões.


Como é a divisão do Parlamento?

O poder se divide de uma forma que crie um equilíbrio. Metade do Parlamento é cristão, com subdivisões entre as diferentes denominações. Metade é muçulmana e drusa, com divisões entre as suas diferentes denominações. O mesmo se aplica ao gabinete ministerial.


O presidente tem de ser cristão maronita; o premiê, sunita; e o presidente do Parlamento, xiita?

O presidente, por convenção, tem de ser cristão maronita, conforme escrevi acima. O premiê precisa ser muçulmano sunita. E o presidente do Parlamento, muçulmano xiita. Todos eles são escolhidos pelo Parlamento, eleito democraticamente – diante da Guerra da Síria, as eleições vêm sendo adiadas. Eu, por exemplo, por ter origem cristã-ortodoxa e cristã melquita (grego-católica), não poderia ser presidente, nem premiê e nem presidente do Parlamento.


Como é feita a escolha do presidente, do premiê e do presidente do Parlamento?

Normalmente, os membros da religião buscam um consenso e escolhem seu representante, sendo aceito pelos demais. Evitam figuras que criam polarização. Por exemplo, o presidente do Parlamento, que tem de ser xiita, é Nabi Berri, da mais secular Amal, não do Hezbollah, embora sejam aliados. O premiê a Tammam Salam, de uma tradicional e moderada família sunita libanesa, não Saad Hariri, que seria o líder sunita mais popular.


Quem são os principais candidatos a presidente do Líbano?

No caso dos presidentes, os dois últimos, Emile Lahoud e Michel Suleiman, eram comandantes das Forças Armadas, outro cargo destinado aos libaneses. Desta vez, porém, os cristãos estão extremamente polarizados ao redor de duas figuras carismáticas e com histórias políticas desde os tempos da Guerra Civil (1975-90) – Michel Aoun e Samir Geagea. No fim do conflito, os dois travaram uma guerra entre diferentes grupos cristãos.


 Quem é Michel Aoun?

Aoun, ou o ‘general’, como é conhecido, comandou as Forças Armadas do Líbano no fim da Guerra Civil. Lutou contra a Síria e também contra as milícias de Samir Geagea, conhecidas como Forças Libanesas. Depois, passou 15 anos no exílio por sua oposição à ocupação síria. Quando voltou, foi recebido como herói pelos cristãos. Mas os sunitas de Saad Hariri, junto com o druso Walid Jumblatt, temendo a força de Aoun, o deixaram de fora da coalizão anti-Síria. Sem alternativa, Aoun precisou se aliar ao Hezbollah e ao regime de Damasco, seus antigos algozes.


Quem é Samir Geagea?

Geagea, por sua vez, é conhecido por seus massacres na Guerra Civil do Líbano. Suas forças mataram um rival político, Tony Frangieh, também cristão, sua mulher, sua filha e seu cachorro – o filho, em Beirute, ficou vivo e é um importante aliado de Aoun. Ficou mais de uma década em um calabouço por seus atos na Guerra Civil. Mas os sunitas de Saad Hariri e o druso Jumblatt o soltaram em 2005 para ficar como rival de Aoun, embora sua popularidade entre os cristãos seja bem menor e sua imagem seja associada a massacres e a Israel – os dois não são mais aliados e hoje Geagea é próximo da Arábia Saudita.


A quais coalizões eles pertencem?

Hoje Aoun integra a coalizão 8 de Março, junto com o Hezbollah. Isto é, uma coalizão que tem a maioria dos cristãos e quase a totalidade dos xiitas. Geagea integra a coalizão 14 de Março, que também possui um bom número de cristãos e quase a totalidade dos sunitas.


Por que nenhum deles consegue se eleger?

Os dois querem ser presidentes e nenhum deles tem maioria no Parlamento porque Jumblatt, o druso, se mantém neutro. Por um lado, ele teme Aoun presidente porque isso significaria um popular líder cristão no comando do país, enfraquecendo os drusos e especialmente a sua facção política. De outro, sabe que Geagea, que tentou matá-lo na Guerra Civil, também pode ficar incontrolável se assumir o cargo e certamente entraria em atrito muito forte com o Hezbollah e com os cristãos pró-Aoun. Também há a questão regional. A Arábia Saudita apoia a 14 de Março. O Irã e a Síria, a 8 de Março. O futuro da Guerra da Síria e as negociações envolvendo o programa nuclear EUA-Irã influenciam nas decisões.


Quais as alternativas?

Uma alternativa seria Aoun tentar negociar com os sunitas de Hariri. Ambos possuem uma visão parecida para o futuro do Líbano. Juntos, nem precisariam dos votos do Hezbollah. Mas as conversas fracassaram. Outra saída seria um presidente neutro, como Jean Kahwagi, comandante das Forças Armadas, que talvez tivesse o apoio de sunitas, xiitas e drusos, mas provavelmente não dos cristãos pró-Aoun e pró-Geagea. Mas ele seria o terceiro general a fazer este caminho e poderia fortalecer muito os militares.


Por que o impasse é perigoso para os cristãos?

Com o impasse, o Líbano aos poucos se acostuma a viver sem presidente. O país não parou por causa disso. Se a briga persistir, talvez, aos poucos, comecem a questionar o cargo de presidente ser destinado aos cristãos. Isso apenas ainda não ocorreu porque os xiitas não aceitariam um presidente sunita e os sunitas não aceitariam um presidente xiita. Mais fácil ter um cristão ou não ter ninguém.


O Líbano é o único país com identidade cristã na região?

O Líbano não pode perder esta sua identidade cristã. É o único país do Oriente Médio onde o cristianismo impera. Israel é judaico, embora laico e com minorias religiosas cristãs, muçulmanas e drusas, e os demais são islâmicos, embora muitos sejam laicos, como a Síria, Egito, Argélia e Tunísia. O cristianismo nasceu na região e os cristãos por séculos foram maioria no Levante. A imigração e as guerras reduziram o seu número e hoje no Líbano devem ser menos de 40% – certamente, passa de 50% se contarmos a diáspora. Basta ver o Brasil, onde 9 em cada dez imigrantes ou descendentes de imigrantes libaneses são cristãos e somam 7 milhões (mais do que a população do Líbano). A ameaça do ISIS, também conhecido como Grupo Estado Islâmico ou Daesh, e a Al Qaeda.’


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://internacional.estadao.com.br/blogs/gustavo-chacra/por-que-o-libano-bastiao-do-cristianismo-arabe-esta-sem-seu-presidente-cristao/
  

Israel : Escolas cristãs protestam contra políticas discriminatórias

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)


‘As escolas cristãs de Israel organizaram uma manifestação sem precedentes na manhã desta quarta-feira (27), para denunciar as políticas discriminatórias do governo em relação a elas. Cerca de 700 pessoas, entre professores, pais acompanhados de seus filhos e religiosos, manifestaram-se na praça em frente ao Palácio Lev Ram, sede do Ministério da Educação, levando faixas e distribuindo panfletos explicando as razões do protesto.

Trata-se de uma manifestação pacífica e respeitosa, para dizer que queremos ser tratados como os outros, quer do ponto de vista econômico como da liberdade de educação’, declarou à Agência Fides o Diretor do Departamento das Escolas Cristãs,  Padre Abdel Masih Fahim.


Ensino aberto à convivência e contra sectarismo

As escolas cristãs em Israel são frequentadas por 30 mil estudantes, dos quais somente a metade são cristãos. A maior parte delas já funcionava antes da criação do Estado de Israel. Com resultados acadêmicos elevados, estas escolas formam seus alunos segundo os valores cristãos do amor ao próximo, do perdão e da tolerância, alimentado com o seu trabalho cotidiano uma sensibilidade aberta à convivência e contra toda forma de sectarismo. As escolas cristãs – lê-se em um comunicado divulgado por ocasião da manifestação – pertencem à categoria das escolas ‘reconhecidas mas não-pública’, recebendo um financiamento parcial do Ministério. O restante dos custos é coberto por pagamento de mensalidades.


O corte dos financiamentos das escolas cristãs incide sobre as famílias

Há anos, o Ministério da Educação tenta reduzir o financiamento das escolas cristãs (45% nos últimos anos), o que obrigou os educandários a elevar o valor pago pelas famílias. O corte dos financiamentos pesa sobretudo para famílias da população árabe-israelense, para quem o rendimento médio familiar é abaixo da média nacional.


O Governo quer que escolas cristãs se tornem públicas

Um comitê nomeado pelas Escolas Cristãs em Israel conduziu tratativas com o Ministério por oito meses. A proposta do Governo é de que elas se tornem escolas públicas. Os titulares das escolas (igrejas, mosteiros,…) interpretam este gesto como o fim da empresa educativa cristã baseada nos valores cristãos, e um golpe gravíssimo contra as minorias cristãs na Terra Santa. Com estes fatos, as escolas cristãs interromperam os colóquios.


Ensino padrão acabaria com especificidade da abordagem educativa cristã

Tenta-se impor também nas escolas elementares cristãs um sistema de ensino padrão já implementado nas escolas judaicas e nas árabe-governativas’ - explica à Agência Fides o Padre Abel Masih Fahim – ‘o que acabaria com a especificidade de sua abordagem educativa. E também os professores seriam penalizados em relação aos colegas de outras escolas, no que tange a seus direitos trabalhistas’.

Na manifestação de Jerusalém tomaram parte também bispos de diversas Igrejas cristãs, entre os quais Dom William Shomali e Dom Giacinto Boulos Marcuzzo, do Patriarcado Latino de Jerusalém.’


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.news.va/pt/news/israel-escolas-cristas-protestam-contra-politicas


terça-feira, 26 de maio de 2015

Migrantes enfrentam a opção de ser aniquilados ou arriscar a vida no mar


 *Artigo de Emma Graham-Harrison,
do 'Guardian'

‘Eles desceram cambaleando ou foram carregados para a terra, alguns paralisados pela desnutrição, outros pouco mais que esqueletos ambulantes, atordoados e queimados de sol depois de passarem semanas ao mar em embarcações descritas pela ONU como féretros flutuantes.

Manu Abdul Salam, 19 anos, viu seu irmão morrer quando brigas desesperadas irromperam depois de o capitão do barco de madeira em que eles viajavam fugir numa lancha, deixando mais de 800 passageiros à deriva com baixíssimos estoques de água e comida. ‘Se eu soubesse que a viagem de barco seria tão infernal, teria preferido morrer em Mianmar’, ela disse a jornalistas pouco depois de ser rebocada para a terra por pescadores indonésios. Ela foi uma das poucas centenas de migrantes que puderam desembarcar.

Rohingya vinda do norte de Mianmar, Salam não estava exagerando ao falar daquela escolha tenebrosa, a julgar por um relatório de pesquisadores da Queen Mary, University of London, avisando que os rohingyas enfrentam genocídio patrocinado pelo Estado.

Os rohingyas enfrentam duas opções : ficar em Mianmar e ser aniquilados ou fugir’, disse a professora Penny Green, parte de um grupo que recentemente concluiu vários meses de pesquisas em Rakhine, o Estado natal dos rohingyas. ‘Se entendemos o genocídio como um processo, é isto. Aqueles que permanecem em Mianmar enfrentam a miséria absoluta, a desnutrição e a inanição; doenças físicas e mentais graves; restrições impostas ao seu movimento, educação, casamento, nascimentos, subsistência e propriedade de terra, além da ameaça sempre presente de violência e corrupção.

Desde 1982 o governo birmanês se recusa a dar cidadania aos rohingyas, cuja existência nega. As autoridades se negam até mesmo a participar de eventos nacionais ou internacionais em que seja usada a palavra ‘rohingya’; na semana passada, ameaçaram boicotar uma cúpula convocada pela Tailândia para discutir a crise crescente de migração.

Se empregarem o termo 'rohingya', não participaremos, pois não reconhecemos esse termo’, disse à Reuters no domingo Zaw Htay, funcionário do gabinete da Presidência de Mianmar. ‘O governo de Mianmar vem protestando contra o uso do termo desde o começo.’ Mianmar insiste que um grupo que tem sua própria língua e uma história em Mianmar que vem de muitas gerações seja descrito como de bengaleses, classificando seus membros como imigrantes ilegais do vizinho Bangladesh. Essa rejeição levou a uma enorme rede de campos de ‘refugiados’ que, segundo Penny Green, são mais semelhantes a prisões. Neles vivem mais de 100 mil rohingyas que precisam de autorização para sair.

Na capital regional de Sittwe, no passado uma cidade movimentada com dezenas de mesquitas, alguns poucos rohingyas ainda vivem em um gueto com sete entradas fortemente guardadas. O número de mesquitas ainda em pé não chega a dez, e elas estão desertas, ocupadas apenas por forças do governo. O fornecimento mínimo de ajuda alimentar aos campos mantém as pessoas vivas, mas passando fome, à base de uma dieta parca de arroz e lentilhas, enquanto nos mercados da cidade sacos de alimentos doados por organizações assistenciais aparentemente são desviados por autoridades que pouco se preocupam com a situação dos moradores dos campos. ‘Eles apenas subsistem’, diz Penny. ‘As pessoas nos imploravam por comida. Você anda por aí e é recebido por olhares inexpressivos, apáticos.’

O governo também tolera a islamofobia e textos espúrios de ódio publicados na mídia, disse Green, fomentando um ambiente de hostilidade que facilmente explode em violência. Em 2012, mais de 200 rohingyas foram mortos em ataques pelos quais ninguém foi a julgamento ou sequer chegou a ser detido. ‘Perguntamos por que não há investigações e ninguém é levado à justiça, e o promotor disse que foi porque os ataques ocorreram à noite, de modo que ninguém viu o que aconteceu.’

Nesta morte em vida da qual os rohingyas vêm procurando fugir há anos, alguns deles atravessam a fronteira do Bangladesh, mas milhares partem pelo mar, apesar de saber que o tráfico de humanos é predatório e agressivo e que a viagem pode lhes custar suas vidas.

O ritmo das partidas vem se intensificando; até 25 mil rohingyas partiram da baía de Bengala entre janeiro e março, o dobro do número de 2013 e 2014, segundo um relatório das Nações Unidas sobre ‘movimentos marítimos irregulares’ na região. Mais de 300 migrantes morreram de fome, desidratação e espancados por tripulantes dos barcos, conforme relatado à ONU por sobreviventes. É possível que outros tenham morrido sem que isso tenha sido registrado quando partiram em embarcações tão lotadas e precárias quanto as que frequentemente afundam no mar Mediterrâneo.

Alguns entrevistados contaram casos de embarcações inteiras que teriam afundado, mas não houve como verificar esses relatos ou descobrir se houve mortes e, se sim, quantas’, disse a ONU no relatório sobre o tráfico marítimo de pessoas.

Muitas das mulheres sofrem estupros ou outros atos de violência sexual nos barcos ou enquanto aguardam para embarcar, e muitas outras são forçadas a casar-se com os homens que pagam por suas viagens. As mães que viajam com filhos correm risco especial de morrer de fome, porque as crianças não recebem alimentos, então as mulheres muitas vezes ficam sem comer para dar de comer a seus filhos. Esse êxodo desesperado vem acontecendo há anos, passando em grande medida despercebido até que os governos regionais que vinham aceitando os migrantes começarem a impedir a entrada de homens, mulheres e crianças que passaram semanas ao mar.

É possível que haja até 8.000 pessoas à deriva hoje nesse limbo marítimo infernal, tendo negada a permissão de desembarcar pelos governos da Indonésia, Malásia e Tailândia, depois de receber estoques básicos de comida e água que dificilmente serão suficientes para sustentá-los em suas viagens de extensão desconhecida.

A situação é gravíssima’, disse à Reuters Joe Lowry, porta-voz em Bancoc da Organização Internacional para a Migração. ‘Eles não têm comida ou água. Estão bebendo sua própria urina. É um jogo de pingue-pongue marítimo jogado com vidas humanas. Esperamos que os governos da região encontrem uma solução rapidamente, senão, nos próximos dias, encontraremos barcos cheios de cadáveres dessecados boiando no mar de Andaman.’

No início da semana passada foi permitido o desembarque de cerca de 2.000 pessoas; não estava claro que critérios as autoridades estavam usando para decidir quem deve receber assistência e quem seria condenado a continuar no mar. O diretor de direitos humanos da ONU avisou que mandar as embarcações embora é ‘incompreensível e inumano’, enquanto outras organizações da ONU imploravam aos governos que recebessem os migrantes e prometiam ajudar com os custos de alimentos e transporte. ‘Em nome da humanidade, deixem esses migrantes desembarcar’, pediu William Lacy Swing, diretor geral da Organização Internacional para a Migração, que já ofereceu verbas de US$1 milhão.

Empurrar migrantes desesperados de volta para o alto-mar pode também ser ilegal, segundo a Câmara Internacional de Transportes Marítimos, já que viola obrigações previstas no direito marítimo global. ‘É uma tradição marítima honrada que navios resgatem qualquer pessoa à deriva no mar, mas os países costeiros também têm a obrigação de resgatá-las, e esperamos que eles honrem essa obrigação, que inclui levar os migrantes para a terra’, disse Simon Bennett, porta-voz da Câmara.

Os países que estão recusando migrantes aparentemente estão preocupados com sua capacidade de absorver um número rapidamente crescente de migrantes pobres e sem instrução. Mas críticos dizem que eles compartilham a responsabilidade pela crise atual pelo fato de terem evitado lidar com a causa original da migração – a política seguida em Mianmar, que, segundo grupos de defesa dos direitos humanos, equivale à limpeza étnica patrocinada pelo Estado.

Os países regionais estão colhendo o que semearam durante anos com sua política de negação dos fatos, e até mesmo com embarcações cheias de pessoas desesperadas à deriva em suas águas eles estão se recusando a agir’, disse David Mathieson, pesquisador sênior para Mianmar da organização Human Rights Watch.

Eles praticamente conspiraram para ajudar com a repressão aos rohingyas durante anos, devido à sua resposta fraca à exportação da política discriminatória de Mianmar em relação a uma minoria sem cidadania, política essa que evidenciou mais ódio que misericórdia em toda a Ásia.’

Em sua primeira reação oficial à crise, o governo birmanês negou que as pessoas à deriva no mar sejam cidadãs de seu país. ‘Não podemos dizer que migrantes sejam de Mianmar a não ser que possamos identificá-los’, disse à Associated Press um porta-voz do governo Ye Htut. ‘A maioria das vítimas de tráfico de pessoas diz ser de Mianmar; é muito fácil e conveniente para elas.’’


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2015/05/1633134-migrantes-enfrentam-a-opcao-de-ser-aniquilados-ou-arriscar-a-vida-no-mar.shtml

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Santa Teresa : monja de clausura pelos caminhos de Espanha

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Frei Patrício Sciadini, OCD,
Provincial dos carmelitas descalços no Egito

‘O V Centenário do nascimento de Santa Teresa d’Ávila, fundadora das carmelitas descalças e dos carmelitas descalços, coloca em discussão tanto nossa maneira de pensar como de viver. Hoje gostaria de evidenciar um aspecto do momento atual, onde a Igreja, mãe e mestra, se encontra com uma certa dificuldade e que Teresa pode oferecer uma luz e um caminho novo e corajoso : a clausura. O que nós entendemos quando falamos de monjas de clausura ou de Carmelitas Descalças, fundadas por Santa Teresa d’Ávila, naquela manhã quente e esplendida do 14 de agosto de 1562? A fundação de São José foi preparada no silêncio, às escondidas. O povo de Ávila acordou com as badaladas do sino do pequenino mosteiro e ficou assustado, preocupado por ter que manter economicamente um outro mosteiro e outras monjas. Tentou-se todo o possível para fechar o mosteiro, mas não teve jeito. O bispo Dom Álvaro estava de acordo e especialmente Teresa era uma ‘cabeça dura’, que não desanimava diante de coisas deste tipo. 

Quando nós falamos hoje de clausura entendemos monjas contemplativas que decidem separarem-se do mundo, para viver uma maior intimidade com Deus, e que querem abraçar, com a oração, todas as necessidades da Igreja e serem uma presença viva, atuante, dentro da comunidade, não pelas formas de apostolado, nem pelas obras, mas sim pela oração e uma  intensa vida espiritual. Se fala de clausura papal. Não podem sair a não ser por determinados motivos e normas. E se obrigam a uma vida de sacrifício, de distância do mundo e etc dos etceteras. Tudo bem. Nada contra isto. Mas como Teresa soube ‘administrar tudo isto’, como ela e suas monjas souberam viver a clausura naquele tempo? E como deveria ser vivida hoje?

Não é caso de perder-nos em estéreis discussões sobre isto, tanto mais que eu não sou monja de clausura, mas sim ver como Teresa amou intensamente a clausura como ‘recanto de solidão’ para estar na escuta de Deus e viver, como dizia o seu filho e mestre espiritual João da Cruz, ‘a solidão sonora e música silenciosa’. Mas ao mesmo tempo o seu zelo pela missionaridade a levou muitíssima vezes a ‘sair da clausura’ para levar a presença de Cristo e do Carmelo no coração das cidades. Isto podemos comprová-lo olhando ‘o entusiasmo e uma certa ânsia de fundar mosteiros a toque de caixa’, em 20 anos, isto é de 1562 ao 1582. Teresa fundou quase 20 mosteiros de monjas e 13 de frades. Um ritmo impressionante, uma atividade que poderíamos chamar ‘frenética’, e projetou um Carmelo em Madri, mesmo que nunca conseguiu realizar.

Às vezes Teresa tinha que sair da clausura para consolar princesas depressivas ou jovens princesas como a de Alba de Tormes, que estava prestes a dar a luz, que queria a presença da madre Teresa. Ela chegará mais tarde para morrer em Alba de Tormes. Foi convidada a sair da clausura pelos Superiores sem motivos sérios, e hoje diríamos inúteis, mas Teresa é obediente e se coloca em caminho, com dificuldades e vai. Sabe como se relacionar com bispos e convencê-los a aceitar e apoiar as fundações, como a de Burgos e de Sevilha.

 A clausura de Teresa foi muitas vezes as ruas e as viagens, ou o seu ‘Carmelo itinerante’, em carruagem, onde nunca faltava o famoso sino, para chamar e marcar os horários das orações, do silêncio, da recreação. E convidava aos cocheiros a fazer silêncio e, se obedeciam, dava para eles uma boa porção de comida. Viveu a clausura com uma certa ‘elasticidade e liberdade interior’ e se sentiu bem. Mais tarde, depois de sua morte, vieram superiores, como o Padre Doria, que amará mais a lei que a pessoa humana. A clausura para Teresa não é mais importante que a missão, e nem a pessoa humana. Ela era uma mulher livre e a sua liberdade a viveu a com uma atenção às leis, à obediência à Igreja, mas também às necessidades do seu tempo.

O que diria Teresa de Ávila da clausura de hoje? Vamos deixar para um próximo artigo, que o meu espaço terminou. Mas creio que é necessário ter uma visão de clausura, de contemplação, que seja ao mesmo tempo um estilo de vida, com normas jurídicas, mas com uma visão do que diz Jesus : ‘não é o homem que é feito para os sábado, mas o sábado para o homem’. Nasce sem dúvida uma nova reflexão sobre este tema tão importante ao se colocar em discussão, a clausura. Mas será que se rompe a clausura só saindo do mosteiro? Creio que os meios de comunicação, se não bem usados, são um meio não para conservar o silêncio e solidão, para uma maior intimidade com Deus, mas para fazer entrar o mundo e a ‘mundanização’ nos conventos de clausura e nos corações dos contemplativos e dos consagrados.

Teresa de Ávila teria bem usado os meios de comunicação de hoje, seja a internet, WatsApp, twiter, como a seu tempo soube bem usar  a comunicação mediante livros, cartas e encontros, e como ‘andarilha de Deus’, pelos caminhos da Espanha e comunicou o evangelho e a oração com todos os meios e forças  e capacidade, que Deus lhe deu. Teresa é a cantora da liberdade sadia, forte, divina e humana. Soube voar e bem, de um lado ao outro, para anunciar o seu amor a Jesus e à Igreja, na escuta de Deus e da Igreja. Podemos estar em ‘clausura’ e ter o coração como um aeroporto ou rodoviária, de vai e vem. E podemos ir pelo mundo com o coração cheio de Deus e viver um ‘clausura de amor’, onde o mundo não pode perturbar-nos. ‘Onde está o teu tesouro aí está o teu coração’’.


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.zenit.org/pt/articles/santa-teresa-monja-de-clausura-pelos-caminhos-de-espanha
  

domingo, 24 de maio de 2015

Missionário nas Arábias : determinação e visão

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 *Artigo de Padre Olmes Milani,
Missionário Scalabriniano


‘...Recebam uma saudação de esperança das Arábias.

As realizações dependem sempre de dois elementos importantes : ter uma visão na linha do horizonte e a determinação de caminhar no seu rumo com o intuito de chegar o mais perto possível.

O sucesso de Dubai dependeu muito de seu xeque Rashid, da dinastia Maktum e seus sucessores que souberam combinar visão e determinação.

 Contudo, nada poderia ter sido conquistado se não fosse pelo espírito gregário dos vilarejos, reconhecidos como trabalhadores incansáveis. Sem recursos em terras desérticas, resolveram buscar soluções para sua sobrevivência. Por isso aumentou-se a frota de navios para comercializar e, muitas vezes, até contrabandear. Sendo o porto de pouco calado, pediram dinheiro emprestado para dragá-lo. Convidaram estrangeiros para se estabelecerem com seus negócios no Emirado, prometendo-lhes que não pagariam impostos e que não haveria convulsões sociais.

Como era de se esperar, os estrangeiros caíram nas graças do xeque Rashid da vila de Dubai, que já se havia transformado em cidade.

Com a presença de pessoas de outros países e a visita de comerciantes, Rachid foi informado das maravilhas do mundo moderno. Soube que havia arranha-céus em Nova York e o trem subterrâneo de Londres. Ouvia as informações com atenção. A nova situação revelou um grande abismo entre Dubai e o resto do mundo. Rachid decidiu que isso mudaria.

A cidade de Dubai já não se constituía numa população isolada entre a areia e o mar. Alimentou o sonho de que o nome da cidade de Dubai deveria ser conhecido, em todo o planeta. Queria sentar para um jantar em Nova York e comentar os acontecimentos de Dubai. Sua ambição era ver dois ingleses, tomando cerveja e falando sobre Dubai. Enfim, propôs a si mesmo que faria com que a cidade estivesse na boca dos fazendeiros na China, dos banqueiros da Suíça, dos generais da Rússia.

Contudo, para que todos pudessem conhecer Dubai, ela não podia ser uma cidade pequena e pobre.  Alimentou o desejo de transformá-la na mais luxuosa cidade da terra como não haveria outra. Seria a Cidade do Ouro.

O xeque Rashid era um homem carismático, exagerado e ambicioso sem muito tempo para dialogar sobre projetos.  Pôs em seus planos de transformar Dubai no centro financeiro do mundo, do edifício mais alto do planeta, do hotel mais alto e caro da terra, do maior porto artificial do mundo, da imitação das construções emblemáticas de Nova York.  A arquitetura aqui deveria explorar a unicidade e a beleza. Para ser diferente deveria trazer para o deserto o que seria inimaginável : uma cancha de esqui, o maior jardim de flores do mundo, outro jardim com milhares de borboletas, uma selva amazônica, ilhas artificiais e vai por aí afora.

A megalomania de Rashid, porém, foi um eclipse para o bom senso. O sentido de comunidade, acolhida e simplicidade das pessoas do deserto foram perdidos para sempre.  À visão e determinação faltou-lhe sabedoria.

Amigos e amigas,

Todo mestre da lei, bem esclarecido quanto ao Reino dos céus, é semelhante a um pai de família que sabe tirar do seu tesouro coisas novas e coisas velhas’. MT 13:52’


Fonte :



sexta-feira, 22 de maio de 2015

Terrorismo e omissões : problemas do Brasil e do mundo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Ivanaldo Santos,
filósofo e doutor em estudos da linguagem pela UFRN

‘O Brasil e grande parte do mundo atualmente vivem apreensivos devidos a escalada do terrorismo. Grupos terroristas, como a Al-Quaeda, Boko Haram, Estado Islâmico (EI) e a Frente al-Nusra, espalham a dor e a morte pelo mundo, populações inteiras na África e no Oriente Médio estão sendo perseguidas, escravizadas e até mesmo assassinadas por esses grupos extremistas.

Apesar disso, vemos uma espécie de ‘onda’, de ‘moda’, de comportamento manada que quase não denuncia ou critica os grupos terroristas. Vamos apresentar seis exemplos desse comportamento manada.

Os organismos internacionais (ONU, OEA, Anistia Internacional, Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos humanos, etc) pouco falam, pouco denunciam os grupos terroristas. Falta força de vontade para os organismos internacionais combaterem o terrorismo.’

No Brasil temos um caso forte de omissão. Em 2014, durante o tradicional pronunciamento do governo brasileiro na reunião da assembleia geral da ONU, a atual presidente da república, a Sra. Dilma Rousseff, fez um discurso que, entre outras coisas, defendia o ‘diálogo’ com o grupo ultrarradical Estado Islâmico (EI). É interessante notar que a presidente Dilma Rousseff e a diplomacia brasileira não emitiram um comunicado oficial defendendo as vítimas dos grupos terroristas.

No Brasil organismos importantes ficam em silencio diante do terrorismo. Entre esses órgãos, citam-se : OAB, CNBB, ABI, Sindicato dos Artistas e outros.

A OAB e a ABI merecem um capítulo a parte nesse comportamento manada de silêncio em torno do terrorismo internacional. São organismos que historicamente lutam pela democracia, pelos direitos humanos, pela cidadania e coisas semelhantes. No entanto, diante do terrorismo parecem que ficaram paralisados, não há noticiais de um pronunciamento duro e enfático condenando o terrorismo. Que saudades da velha OAB que emitia, com frequência, comunicados condenando algum ato de corrupção do governo. Hoje a OAB vive de braços com o atual governo, o governo liderado pelo Partido dos Trabalhadores (PT), e fica omissa diante da onda de terrorismo que mata milhares de cristãos em vários países do mundo.

Omissão do Congresso nacional e das polícias (Polícia Federal, etc). O Brasil não tem, até hoje, uma lei antiterrorismo. Isso é muito grave. Na internet, nas redes sociais, grupos formados por estrangeiros e até mesmo por brasileiros ficam fazendo apologia ao terrorismo em língua portuguesa e em pleno território brasileiro, inclusive existem páginas nas redes sociais que defendem o Estado Islâmico, que pregam a morte dos cristãos e de outros grupos religiosos, etc. O Congresso nacional precisa ser rápido e aprovar uma lei que impeça o terrorismo de proliferar no país, as polícias e a justiça precisam investigar a presença no Brasil de membros e até mesmo de células de grupos terroristas.

No Rio de Janeiro o PSOL e outros partidos políticos propõem, na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), criar uma ‘secretaria especial para ofensas contra os muçulmanos’. É preciso combater o preconceito religioso e as demais formas de intolerâncias, nesse sentido a ALERJ está prestando um bom serviço ao ouvir as queixas dos muçulmanos que moram no Brasil. O que surpreende é que o PSOL, outros partidos políticos e a ALERJ não façam o mesmo com outros grupos religiosos. Por exemplo, por que não se cria uma secretaria especial para ofensas contra os cristãos e os judeus? O Brasil é um país majoritariamente cristão e, por incrível que pareça, a religião cristã é a que mais sofre piadas, artigos ofensivos nas ruas, nos jornais, nas salas de aula, etc. No entanto, não se vê iniciativas para defender os cristãos e outros grupos religiosos. Por que esse interesse de defender uma minoria e esquecer a maioria da população? O que existe por trás desse interesse? A justiça precisa investigar esse tipo de ação e de interesse.’


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.news.va/pt/news/no-sudao-do-sul-situacao-feroz-testemunho-missiona

quinta-feira, 21 de maio de 2015

No Sudão do Sul "situação feroz" : testemunho missionário

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)


‘São dramáticos os testemunhos recolhidos pela UNICEF no Sudão do Sul : em duas semanas, dezenas de crianças mortas, violadas ou raptadas e recrutadas. Isto acontece na série de ataques no Estado de Unity do Sudão do Sul, teatro de confrontos sangrentos entre as forças do governo e os rebeldes ligados ao ex-vice-presidente Riek Machar. Tanto assim é que a Cruz Vermelha, ONGs e missionários tiveram de abandonar o território. Eugenio Murrali entrevistou um missionário que trabalha há anos no país, ao qual, por razões de segurança, se garante o anonimato.

Desde a Páscoa a situação deteriorou-se. O governo tenta fazer de tudo para conquistar o Estado de Unity, porque lá existem poços de petróleo : por isso, é de vital importância.
  

Qual é a situação que se vive no momento?

A situação é terrível, porque, enquanto o governo avança, queima todas as casas e as pessoas são forçadas a abandonar os seus lugares. Agora estamos no início da estação das chuvas e também no início da época das sementeiras. O problema mais grave será, portanto, a fome e a falta de proteção. Os preços tornaram-se tão altos que para as pessoas é impossível comprar : somente poucos têm acesso aos bancos e têm moeda forte, todos os outros não podem fazê-lo, portanto vivem uma situação desastrosa. E depois, nos mercados, dificilmente se encontram as coisas que normalmente se encontram  em Juba, embora a preços elevados  e, portanto, vivem apenas daquilo que as organizações humanitárias podem trazer. Até agora, também o PAM (Programa Alimentar Mundial) e a Cruz Vermelha têm ajudado com a comida; agora, se as pessoas têm de fugir para os pântanos ou florestas, fica praticamente sem nada. Este é o primeiro ponto : muitos morrerão de fome, sobretudo as crianças, que já estão desnutridas. O segundo aspecto é o abuso das mulheres, a violência contra as mulheres : as primeiras que pagam são as mulheres e meninas. No passado, chegaram de estuprar até mesmo meninas de 12 anos ou mesmo mulheres de 60 e mais anos. É uma situação verdadeiramente feroz.


O que vos levou a decidir de ir embora?

Ouvimos dizer que a primeira linha já não conseguia mais resistir e que já tinham chegado até Koch. As notícias diziam que haviam já queimado várias aldeias, tinham morto jovens e levado consigo meninas. Assim, também de acordo com outras ONGs, nós pensamos que essa era a única coisa que se podia fazer.


Este é um confronto étnico entre os Dinka e os Nuer, ou um conflito ligado mais do que tudo a questões economicas? Qual é o verdadeiro ponto de discórdia?

É claro que a questão surgiu por discórdias políticas. Antes, houve palavras de rivalidade. Em seguida, o massacre de Juba em 15 de Dezembro de 2013, com mais de 18 mil civis mortos da etnia Nuer, certamente se tornou uma questão tribal. Não devemos esquecer os inícios : na verdade, a imprensa tende a esquecer. Por exemplo, mesmo quando o governo tomou Leer no ano passado, Leer foi queimada completamente. Entre janeiro e abril, foram mortas mais de 400 pessoas e ninguém fala sobre isso. Depois falam do massacre que houve em Bentiu, mas esquecem que antes houve outros massacres. E, naturalmente, a lei da vingança, que certamente não é nem cristã nem boa, tem as suas consequências. Um governo de unidade nacional é o único que pode criar as condições para elaborar uma Constituição, preparar as eleições e envolver todas as outras tribos na discussão dos problemas do Sudão do Sul. Sem isto, o problema volta a ser apenas entre os Nuer e os Dinka ou entre os Dinka e os Nuer. E, naturalmente, sabemos muito bem que a filosofia Dinka é que os Dinka nasceram para governar (‘Born to Run’). Ora, partindo deste pressuposto, creio que um tal governo não vai deixar aberturas para uma solução do problema.


O que poderia fazer entender melhor a situação de insegurança, de violência e dor que se vive no Sudão do Sul neste momento?

Certamente o que faz sofrer mais é ver que uma geração de jovens é destruída, quer de um lado quer do outro, numa guerra fratricida que não tem razão de existir. Isto é o que mais faz doer o coração, sobretudo a nós que estamos lá presentes, para dar esperança, para ajudar as pessoas a viver em paz e para criar uma comunidade de irmãos e irmãs onde o amor pode unir as várias tribos.’


Fonte :

* Artigo na íntegra de http://www.news.va/pt/news/no-sudao-do-sul-situacao-feroz-testemunho-missiona