quarta-feira, 25 de abril de 2012

A Cruz, Sinal dos Cristãos

  Por Maria Vanda (Ir. Maria Silvia, Obl. OSB)


            Este artigo foi gentilmente cedido por Dom João Evangelista Kovas, OSB,
monge beneditino do Mosteiro de São Bento de São Paulo.

                     Em muitos lugares deste nosso imenso Brasil, encontramos uma grande variedade de representações artísticas da cruz de Jesus. Assim que a vemos, logo reconhecemos nela um sinal cristão dos mais fortes. Quando vemos a cruz ostentada sobre o peito de uma pessoa, ela nos indica sua consagração pessoal a Cristo; quando ela alteia o cimo de uma torre, reconhecemos que aquela edificação é uma igreja cristã; quando ela está entronizada em um recinto, é invocado sobre nós o sentimento de proteção divina e de profundo respeito pelas pessoas que ali estão presentes. O que faz da cruz um sinal tão forte para os cristãos, e mesmo para quem não é cristão, um sinal especial de respeito?

                  No dia 14 de setembro, celebramos o dia da Exaltação da Santa Cruz. Uma festa do calendário litúrgico que nos lembra o significado maior da cruz de Cristo.
                        
                   Antes de tudo ela é um sinal, um sinal eficaz de salvação. Por isso, merece ser lembrado e celebrado na liturgia.

                  É conhecida a história do imperador romano Constantino no início do século IV. Certa noite, ele teve um sonho, no qual visualizava a cruz dos cristãos e ouvia uma voz que lhe dizia: “com esse sinal vencerás” (in hoc signo vinces). Ele sabia que se tratava da batalha que ele travaria contras as legiões romanas que se opunham à sua sucessão ao trono. No dia seguinte, ele ordena que os escudos de seus guerreiros fossem pintados com o sinal da cruz. Eles partiram para a batalha e venceram. Sua mãe Santa Helena alguns anos mais tarde vai à Terra Santa juntamente com uma comitiva de peritos, com o intuito de localizar os lugares santos, ou seja, as localidades onde Jesus nasceu, realizou seus mais celebres feitos, foi morto e sepultado. Até hoje é reconhecida a precisão com que Helena e seus peritos localizaram tais lugares. Dentre suas façanhas na Terra Santa, está a localização de uma cruz romana, a qual foi atribuída ser o objeto de suplício de Jesus Cristo. É difícil atribuir-lhe autenticidade histórica, porém o fato foi significativo, despertando ainda mais os fiéis cristãos ao reconhecimento da importância da cruz, como já salientavam amplamente as Sagradas Escrituras. A partir desse fato, a celebração da Exaltação da Cruz não tardou a entrar no calendário litúrgico.

                   A história acima narrada ilustra algo do significado da cruz de Jesus. Paulo diz à comunidade dos coríntios que ele não anunciou a sabedoria segundo a filosofia dos gregos, nem os grandes sinais de Deus segundo a piedade judaica, mas Cristo crucificado: “loucura para os gregos e escândalo para os judeus” (I Cor 1,23).

                  O Cristo crucificado é a expressão maior da sabedoria de Deus e o maior sinal de Deus para a humanidade. Em sua cruz, Jesus “crucifica” todos os procedimentos embusteiros do mundo: sua injustiça, seu apego às aparências falsas, sua segurança nas riquezas materiais.

                  A denúncia da cruz de Jesus é, ao mesmo tempo, denúncia do pecado do mundo e anúncio do amor de Deus em favor de todos aqueles que desejam viver conforme a justiça de Deus. Para nós cristãos, a cruz é um sinal eficaz a nos lembrar que não queremos fazer parte das obras desse mundo mundano e do príncipe desse mundo, o demônio.

                  Mas, livres do pecado, vivemos na alegria dos filhos de Deus, os quais sabem separar o bem do mal, ficar com o bem e renunciar ao mal. Assumimos a missão com Jesus de promover a justiça e a paz, desterrar toda injustiça e abrir o caminho para a verdadeira caridade. Continuar a anunciar o Cristo crucificado, escândalo para muitos, porém salvação para todos os que reconhecem em Jesus a maior dádiva de Deus Pai para todos os povos.

                   Por isso, não nos enganemos! A cruz é sinal de suplício de Jesus, sua morte injusta. Isso é o resultado das ações dos homens, quando a vaidade e a falta de amor mandam em nós. Contudo, aqueles que reconhecem e meditam no sinal da cruz, descobrem o sinal da ação silenciosa de Deus a nos redimir de todo esse mal.

                   Aqueles que impõem a cruz sobre si são merecedores de participar da ressurreição de Jesus: poder salvador de Deus em favor de todos os seres humanos.
                                                               

quinta-feira, 19 de abril de 2012

O que é mais nobre para a alma: sofrer uma injustiça ou praticá-la?

Por Denis Cabrerizo Silva



No século V a.c. dizia Sócrates que é mais nobre para a alma sofrer uma injustiça do que proferir uma iniqüidade, injúria ou praticar um ato injusto; no Evangelho de São Marcos, asseverava Jesus que o que provém do âmbito externo não é o que faz o Homem impuro, mas o que lhe sai de dentro é o que lhe conspurca a alma.

Passados mais de 2000 anos da época em que viveram tais personalidades, o significado elíptico, o intuito de cada uma das mensagens – que são congruentes e professam a mesma filosofia – parece ter-se diluído nas relações sociais que compõem nosso cotidiano. Olvidou-se do verdadeiro sentido das mensagens aludidas e, pior, inverteram-se-lhes a lógica, de forma que hoje se afigura ser mais “vantajoso” incorrer em um ato injusto a fazer-se vítima dele. Porém, para efeito de análise deste pensamento e um verbero concludente aos hábitos atuais, faz-se preciso, antes, explanar com clareza o que tais mensagens professam.

Para os gregos antigos, à época do esplendor ateniense e das ciências a que se devotavam, o mundo, o universo (cosmos), era dotado e regido por uma razão natural que conferia uma lógica aos fenômenos naturais e uma dinâmica ao funcionamento desse todo; de forma que, através desta razão normativa, a cada parte desse mesmo cosmos imputava-se um lugar e uma função específicas, cujo equilíbrio e consonância com a lei natural asseguravam o bom funcionamento de todo nosso universo.

Fortemente associado a isto, cria-se também a necessidade de se estabelecer uma comunhão da alma do homem com o cosmos. Advogando a tese de que a alma era composta por diversas partes, fazia-se necessário demonstrar ou fornecer uma forma de equilíbrio interno da alma entre suas diversas partes. Isto para que se pudesse estabelecer uma comunhão mais ampla da alma com a ordem do todo.

Daí o porquê de que naquela sociedade tanto se cultivassem as ciências matemáticas, uma vez que seu objeto consistia na transcrição, bem como a explicação para o entendimento humano, dos fenômenos e das dinâmicas naturais, a fim de melhor se compreender a ordem do cosmos e, assim, “ligar-se” a ele, integrar-se nele, desvelando as funções e deveres específicos do indivíduo para com este universo.

A partir daí, despontava a noção clássica do “bom, belo e justo”, em que se designava com tais adjetivos aquele indivíduo cuja alma encontrava-se equilibrada e em conformidade com o todo; ou seja, em consonância com um universo racional naturalmente ordenado, (bom, belo e justo) e que, por conseguinte, se fizesse como um ser virtuoso, apartado de qualquer vício, honesto e saudável.

Assim, nesta linha de raciocínio, a quem perpetrasse uma injustiça ou levasse a efeito uma iniqüidade a alma achar-se-ia desequilibrada e, portanto, em dissonância com a ordem do cosmos; encontrando-se este ser num estado de enfermidade, necessitada de reparos, pois apartada das virtudes, da beleza, da benignidade.

Por conseguinte, a assertiva de que é melhor e mais nobre para a alma sofrer uma injustiça ou adversidade se coaduna com o pensamento grego.

E é com este sentido, que Jesus vale-se para professar sua máxima, de que aquele que se encontrar em desequilíbrio e desassociado da ordem do universo acha-se não somente enfermo, mas também com a alma a caminho de uma perdição eterna que o ausenta da comunhão com Deus.
Sócrates se funda num ser elevado, criador do universo, para afirmar, que haverá perdição da alma caso seu portador não se conduzisse em vida, em consonância com as leis do universo. E para isso deveria empreender o equilíbrio de sua alma, afastando-se de todo e qualquer vício.

Observa-se que, da mesma forma que nos tempos de Sócrates e de Jesus Cristo, o pensamento não foi bem compreendido ou seguido, haja vista que, modernamente, experimentamos atrozes sofrimentos advindos de atos violentos, extremamente desumanos e injustos, que atentam contra as mais comezinhas normas naturais universais.

Destarte, após rematar a leitura deste pequeno texto, espero que a indagação com a qual tal se inicia, o leitor consiga respondê-la, optando pela melhor alternativa e dessa forma condicionar a própria compostura, sem se esquecer de que não se deve almejar ser bom, belo e justo unicamente por capricho ou emulação; mas porque nada deve haver de pior do que condenar a própria alma à perdição eterna, em razão de se haver em desarmonia com a ordem racional de um ser onipotente e da distância leviana dos bons valores e das virtudes.

Em suma, sejais puros e não praticais qualquer injustiça. E como prêmio receberá o que mais almeja: receber aquilo que, primeiro, deu ao outro.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Comentário à Carta 70 (Capítulo 3 de 5)

 Por Maria Vanda (Ir. Maria Silvia, Obl. OSB)



                      No capítulo anterior do comentário que estamos tecendo, (Carta 70 aos Bispos da Igreja Católica Apostólica Romana), deixamos para este capítulo falar sobre as orações que JESUS nos deixou e orações que Ele mesmo praticava.

                     A Carta 70 ressalta que o cristão, (e, portanto, o meditante cristão também), para se inserir na prática de uma pura oração deve, antes, acolher Cristo como fonte incessante de revelação do Pai e de permanente comunhão com Ele.

                     Pela fé, reconhece-se em Jesus Cristo a definitiva auto-revelação do Pai, “a Palavra encarnada que manifesta as profundidades mais íntimas do seu amor”. E para que isso ocorra, o Espírito Santo é enviado ao coração do fiel orante e nele sondará todas as coisas até as profundidades de Deus. Pelo Espírito Santo, a Palavra é recebida e revelada. É recebida de Deus Pai pelo Filho enviado e ressuscitado e revelada pelo Espírito trinitário. (1cor 2,10).

                     Verificamos, portanto, a necessidade de imitarmos Jesus, quando oramos. Devemos estar imbuídos e compenetrados no Seu Espírito.

                      Jesus promete aos discípulos que o Espírito Santo lhes explicaria tudo o que a Ele ainda não fora possível revelar; isto é, naqueles dias ainda não era o momento do homem receber as revelações que viriam . Mas diz Jesus a eles que “o Espírito não falará por si mesmo... O Espírito Santo me glorificará porque receberá do que é meu e vo-lo anunciará. (Jo 16,13ss”“. ( Ibidem, Jo 16,15)”.

                     Portanto, na oração, somos iluminados, aguçados, para contemplar a Deus e, lógico, ao Filho, Jesus Cristo, pelo Espírito Santo. Podemos então afirmar que quando oramos estamos diante da S. Trindade e de todos os Mistérios de Deus. E para dar supedâneo a tal afirmação, S.Paulo, o Apóstolo, confessa que o Mistério de Deus é Cristo, “no qual se acham escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento (Cl 2,3)”.

                      Vale aqui transcrever um trecho da Carta 70 que assim se manifesta :
“6. Existe, portanto, uma relação estreita entre a revelação e a oração. A Constituição Dogmática "Dei Verbum " ensina-nos que, mediante sua revelação, o Deus invisível “movido de amor, fala aos homens como amigos (cf. ex.33,11; Jo 15,14-15), e fala com eles (cf Br 3,38), para convidá-los e admiti-los à comunhão com Ele”.
                      Podemos dizer, então, que toda a ação na oração, há de convergir para Cristo. Tanto na oração em assembléia de fiéis, na celebração litúrgica, quanto na reunião de cristãos para meditação, ou quando em nossos lares, em família ou individualmente, é Jesus (Deus Filho), quem nos ouve, é o Espírito Santo quem nos ensina e guia e é Deus Pai quem as recebe e atende. E claro, para nós cristãos, cremos que é a SS. TRINDADE QUEM NOS PROVÊ, (já que a perfeita unidade está na Trindade). Logo, nenhuma oração do coração se perde sem que os Céus a ouça e a considere, não por mérito de quem ora, mas antes por pura Graça Divina.



                         A Sagrada Escritura nos mostra como Jesus se entregava, perfeito, à oração. Isso nos soa um pouco estranho, se atentarmos para o fato de Jesus nos imitou em tudo, MENOS NO PECADO. Logo, não era lógico que fizesse os tipos de orações que a Doutrina Cristã costuma nos ensinar. Mas, tenhamos, logo, em mente de que Jesus orava e pedia e rogava e clamava e suplicava pelos nossos pecados que Ele haveria de apagar.

                        Mencionaremos, brevemente, esses tipos de orações, apenas para mostrarmos aquelas que o próprio Cristo rezava, situando o leitor.


                         Segundo a obra “DA ORAÇÃO” Ed. Vozes, Cap. IX, JOÃO CASSIANO menciona que o Apóstolo Paulo, em (1Tm 2.1) assim diz: “Recomendo-te, pois, antes de tudo, que se faça obsecrações, promessas, súplicas e ações de graças”.


                        João Cassiano nos ensina em que consistem essses tipos de orações dizendo:
“a Obsecração é uma imploração pelo perdão dos pecados quer presentes, quer passados. A Promessa, é ato pelo qual oferecemos ou prometemos alguma coisa a Deus. Aponta o autor o (Sl. 115,14) “cumprirei (os meus votos) as minhas promessas ao senhor”. A Súplica, pedidos que fazemos por nós, as vezes pelos outros ( Tm 2, 12): “ rezamos por todos os homens, pelos reis e por todos os constituídos em autoridade”. A Ação de Graça. Depois, em quarto lugar, estão as acções de graças que a alma rende ao Senhor com inexprimíveis arroubos ou quando traz à memória os passados benefícios de Deus...”.
      A mesma obra citada no Cap. XVII, expõe:
                         Das quatro espécies de oração iniciadas pelo Senhor   

               Diz ele:
“O próprio Senhor se dignou iniciar para nós estas quatro espécies de oração, de modo que também nisto se cumprisse aquilo que d,Ele se diz: o que Jesus começou a fazer e a ensinar (At 1,1). Com efeito, Ele assume a obsecração quando diz: Meu Pai, se é possível, afasta de Mim este cálice (Mt 26,39), ou aquilo que canta o Salmo como provindo de sua boca: Meu Deus, meu Deus, olha para Mim: porque me abandonaste? (Sl 21,2).
  
                       E continua a lição de João Cassiano :
Trata-se de Promessa, quando o Senhor diz: Glorifiquei-Te na terra, tendo consumado a obra que Me deste fazer (Jo 17,4) ou aquilo: Eu consagro-Me por ele, para eles serem também consagrados na verdade (Jo 17,19).
 É Suplica, quando diz: Pai quero que aqueles que Me deste, onde Eu estiver também eles estejam comigo, para que vejam minha glória, a glória que Tu Me deste (Jo 17,24). Ou então quando diz: Perdoa-lhes, ó Pai, porque não sabem o que fazem (Lc 23,34).

É Acção de graças, quando diz: Bendigo-Te, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelastes aos pequeninos. Sim, porque assim foi do Teu agrado (Mt 11, 25-26). Ou então quando diz: Pai, graças Te dou por me teres ouvido. Eu bem sei que sempre me ouves (Jo 11, 41-41).”.
                    Encerramos, assim,  as citações de João Cassiano sobre as espécies de orações. Mas devemos lembrar ao leitor de que na obra de João Cassiano Intitulada Confr6encias de 08 a 15 vol 2, (Ed. Subiaco 2006), encontramos maiores subsídios sobre o tema oração, especialmente nas palavras de tão respeitado Mestre.

                    Mas como já é de se perceber não se encerram aí, as orações proferidas por Jesus. Jesus conhecia muito bem o Antigo Testamento e era de seu costume rezar os Salmos lá contidos. Além do mais, outras passagens há, no Evangelho, que nos autoriza a afirmar a vida sempre orante de Jesus, pelos mais diversos tipos de orações.

                   Realmente, há orações que Jesus fez, no mais puro silêncio do deserto, como vemos em (Lc 5, 16), após grande assédio do povo pelas curas que realizava : “Porém Ele retirava-se para o deserto e ali orava”.

                   No Monte das Oliveiras, quando lhe precediam as horas amargas, (Lc.22, 39; 41, 42, 44):  Jesus apartado dos apóstolos fez orações, de joelhos em terra, dizendo: “ Pai, se queres, passa de mim esse cálice; todavia não faça a minha vontade mas a tua. E apareceu-lhe um anjo do céu que o confortava”. (Lc 22 41,42,43). (Aqui prestemos especial atenção de como a oração é ouvida e o conforto de Deus nos é logo enviado).

                    “E, posto em agonia, orava mais intensamente. E o seu suor tornou-se em grandes gotas de sangue que caiam até o chão”. ( Bíblia de Estudo Aplicação Pessoal; Versão Almeida, Ed. 1995 Revista e corrigida-CPDA).

                    É de observar que nos vs. 40 e 46, do Cap.22, em Lc, Jesus exorta, e com veemência, os Apóstolos a também orarem: orai para que não entreis em tentação. Portanto, Ele se retira e entra em oração;  Jesus esperava que os apóstolos também estivesses no espírito orante. Mas eles dormiam apesar do momento ser tão crucial, isto é, se avizinhavam a prisão e o início da paixão de que já havia anunciado  que deveria sofrer. 

                   Jesus, já crucificado fez, a última e a mais admirável oração.   Essa magnífica oração, (num modo de obsecração ou súplica), feita por Cristo execrado, desnudo, chagado, lancetado por seus algozes, em vias de já entregar seu espírito é a oração do PERDÃO.  Já combalido Ele olha para os que ali estão e profere  a mais piedosa oração e diz:  Pai, perdoa-lhes: não sabem o que fazem” (Lc 23,33).

                  Com isso, meus caros, damos por terminado este  capítulo III, que está sendo escrito, espero, dentro do espírito da Carta 70, quando nos exorta à prática, constante da oração, especialmente, na Meditação Cristã. Em brevíssimo tempo estaremos aqui, novamente, para falarmos da oração do Pai Nosso,  aquela oração que Jesus nos ensinou.


                 Até breve.

sábado, 7 de abril de 2012

As fontes que jorram do corpo do Cordeiro

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

* Artigo de Adam de Perseigne

Do corpo do Cordeiro jorram cinco fontes das quais temos necessidade. Duas nos pés, duas nas mãos, e uma quinta que escorre da abertura do lado.
Pela fé, sabemos que do lado de Cristo jorrou sangue e água. Com efeito, o sangue de Cristo que, por seu valor, cura, redime e concede a coroa, é água no sentido de que  lava, restaura e resfria. Lava do pecado e restaura a esperança.
Contudo, só se pode haurir das águas nas fontes do Salvador quando, das feridas de Cristo, os lábios da fé sugam os regatos da graça. Assim, as chagas dos pés são fontes, mas fontes de óleo; as chagas das mãos, fontes de bálsamo; e a chaga do lado, uma fonte de vinho.
            Mas de todas essas chagas vê-se apenas escorrer o sangue! Ouve de que maneira : o óleo cura, o bálsamo perfuma, o vinho embriaga.
 O óleo é a misericórdia que acolhe o culpado aos pés de Jesus, quando esse lhe pede humildemente perdão; eis o óleo que vês escorrer dos pés. O bálsamo, que escorre das fontes das mãos, é a preciosa reputação das virtudes que o justo recebe da generosidade de Cristo. O culpado fica satisfeirto pelo perdão obtido; o justo fica satisfeito quando merece a glória das virtudes. A misericórdia concede o perdão àquele que humildemente se prosterna aos pés de Cristo; sua liberalidade dá a glória das virtudes àquele que, na força de sua alma, se mantém de pé para receber de Cristo o benefício de sua generosidade.
Enfim, da adega de vinho que é seu lado traspassado, jorra o vinho da caridade que dá a vida. Pois, com certeza, se Cristo é a verdadeira videira, se sua carne é a uva da videira, como não seria vinho o sangue que se derrama de sua carne? É este o vinho que alegra o coração do homem, quando o sangue de Cristo concede à alma a sóbria embriaguez do amor.

Gustav Mahler (1860-1911), Sinfonia nr. 2 'Ressurreição'.
O quarto movimento, 'Urlicht' ( A Luz Primordial ), é interpretado por Ewa Podles.
Texto : Clemens Brentano (1778-1842) e Bettina (Brentano) von Arnim (1785-1859)


Fonte :
*Adam de Perseigne, Epistola III, 37 : Sources Chrétiennes 66, 94-97, tradução de D. Matias Fonseca de Medeiros OSB - Revista Beneditina nrº 25, Janeiro/Fevereiro de 2008, editado pelas monjas beneditinas do Mosteiro da Santa Cruz – Juiz de Fora/Minas Gerais.
(e-mail: publicacoesmonasticas@yahoo.com.br).

*Adam foi um célebre autor espiritual cisterciense. Supõe-se que tenha nascido na Champagne francesa, na metade do século XII e falecido em 1221. Homem de vasta cultura literária e filosófica, era clérigo secular quando tornou-se monge beneditino, vivendo alguns anos como bibliotecário na abadia de Marmoutier. Passando depois para a Ordem Cisterciense, na abadia de Pontigny, tornou-se abade de Persênia (Perseigne) e governou-a por mais de trinta anos.


sexta-feira, 6 de abril de 2012

A Santa Ceia - Instituição da Sagrada Eucaristia

Por Maria Vanda (Ir. Maria Silvia, Obl. OSB)

 

          Deu-nos o Senhor, antes do seu máximo sacrifício, o presente mais precioso: a instituição da Sagrada Eucaristia. 
  
          Fez Ele, de modo singular, mas extremamente profundo, a reunião para COMER  com seus pares,  inclusive o seu algoz. E neste comer, deu-nos o alimento mais importante de todos, aquele que nos garante participar do seu espírito em amor, verdade e salvação .
                  
          Provou-se Jesus no mais temível sacrifício e mostrou seu imensurável amor,  dando-nos  o pão da vida  eterna, seu próprio corpo, para remissão de nossos pecados. Deu-nos de beber,  seu  sangue e  àgua jorrados do seu lado tanspassado à lança.  Assim, deixou-nos  ver seu interior, d'onde se descortinou a Luz que ilumina, a Sal que cura, a Santa Igreja  que  conduz para além da Palavra.  Sim, instituiu sua Igreja,  para nos guiar  no camainho da Fé, ensinando-nos o labor das  boas obras, exortando os homens de boa vontade para  seguir AQUELE QUE É,  caminho, verdade e vida.  
  
          Ceiemos com Cristo, nosso salvador, nesse memorial de sua Páscoa.


segunda-feira, 2 de abril de 2012

A Páscoa de Jesus - O Lava Pés

Por Maria Vanda (Ir. Maria Silvia, Obl. OSB)
                                        



Este artigo foi gentilmente cedido por Dom João Evangelista Kovas, OSB,
monge beneditino do Mosteiro de São Bento de São Paulo.


            Após o tempo de preparação, chega a festa. Como acontece segundo a ordem das coisas humanas, quanto mais nos preparamos para celebrar a festa esperada, ficamos mais contentes com a sua chegada. Celebrar a festa da Páscoa, contudo, traz uma espécie de alegria renovada, que faz esquecer as negligências do passado. Nada mais importa, o Senhor ressuscitou. Alegram-se os amigos de última hora, que ficaram aos pés da cruz de Jesus; alegram-se aqueles que o abandoaram no momento derradeiro, porque nada mais importa: “O Senhor ressuscitou verdadeiramente” (Lc 24,34).

            Em seus últimos dias, foi o próprio Jesus Cristo que disse aos seus discípulos: “Há tanto tempo espero para comer essa Páscoa convosco, antes de sofrer” (Lc 22,15). Alertou-os, dizendo que é bom para eles que ele parta, porque assim ele envia o seu Espírito Santo que recebe da parte do Pai e o dá abundantemente a seus amigos (cf. Jo 14-17). Era quinta-feira, às vésperas da Páscoa dos judeus. Ele sabia que seria entregue nas mãos de seus algozes e seria amargamente traído pelos seus. Sabia que sofreria a crueldade da injustiça do pecado, arraigado nos corações humanos. Era justamente para desalojar definitivamente essa injustiça do coração humano que ele veio ao mundo. Precisava sofrer tudo isso, a fim de que viesse a alegrar a tantos quantos sofriam interior e exteriormente as consequências do pecado. De momento, ele só podia ainda adiantar a seus discípulos que tivessem coragem, porque “Eu venci o mundo” (Jo 16,33).

            Este é o momento mais sublime da celebração litúrgica do calendário cristão. Os discípulos de Jesus não podiam deixar passar despercebidos os acontecimentos que culminam na morte de Jesus e, sobretudo, no seu momento mais glorioso, quando ressuscita e anuncia, com a força de sua própria vida resplandecente, que, doravante, a morte e o pecado forma derrotados e ele vive.

            A celebração da Páscoa de Jesus compreende três dias, como que em três atos. Esses três dias são chamados de TRÍDUO PASCAL. São contados segundo o costume judaico, segundo o qual o dia começa por volta das 18h do dia anterior. Eles transcorrem entre a celebração da Ceia do Senhor (Quinta-feira Santa, após as 18h), sua Paixão e Morte de Cruz (Sexta-feira da Paixão), sua descida à mansão dos mortos (Sábado Santo) e sua Ressurreição (Domingo da Ressurreição), celebrada desde a meia-noite do sábado. Os cristãos têm, assim, a oportunidade de celebrar os mistérios de sua salvação e reviver o drama próprio do sofrimento humano, que só o pecado e a injustiça podem causar. Quem jamais não sofreu alguma injustiça, uma traição, desamor? Quem não lutou contra si mesmo para evitar cometer o mal contra alguém ou se o fez não sentiu remorsos com isso? Contudo, após a ressurreição de Jesus mesmo os sofrimentos da injustiça não têm o mesmo efeito. A morte e o pecado já foram vencidos espiritualmente. Doravante, somos convidados a resistir às insídias do mal com o coração apegado em Deus. Revivemos em Cristo, pela graça do Espírito Santo, os mesmos sentimentos de Jesus, sua esperança e sua resignação no reto caminho, motivados pela obediência da fé, ou seja, pelo testemunho do Pai a confirmar seus filhos em sua promessa. Nada foi em vão na vida de Jesus. Por isso, ele é causa de soerguimento e grande alegria. Doravante, ele tem a capacidade de reunir a todos como membros de uma mesma família.

            Que este tempo pascal seja motivo de muitas graças para quantos a celebram com o coração cheio de fé, esperança e caridade. Esse é o tempo favorável, esse é o dia da salvação (cf. Is 49,8; II Cor 6,2).

                                                                                                  Dom João Evangelista Kovas