terça-feira, 29 de novembro de 2016

'Tu vens, Senhor... eu já perscruto teus sinais'

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Aguardamos a vinda do Cristo, Sol nascente que nos vem visitar.
 *Artigo do Frei Sinivaldo S. Tavares, OFM,
doutor em Teologia Sistemática
pela Pontificia Università Antonianum, Roma.


‘Domingo passado, em comunhão com as comunidades eclesiais de todo o mundo, iniciamos o tempo litúrgico do Advento. Ad-vento, como exprime a própria palavra, significa espera, expectativa. Quem espera, espera sempre por alguém ou por alguma alvissareira notícia, ou por ambos, como é o nosso caso. Aguardamos a vinda do Cristo, Sol nascente que nos vem visitar. Esse é o sentido pleno do mistério que celebramos no Natal, cuja preparação se dá ao longo destas quatro semanas que constituem o tempo litúrgico do Advento.

Há quem insista em interpretar a esperança como sendo uma atitude passiva e, na melhor das hipóteses, resignada face à vida e seus inerentes processos. Assim entendida, ela se restringiria a uma espécie de expectativa cega, ilusória e ingênua. A esperança cristã não se propõe como uma espera monótona ou entediante nem tampouco como uma expectativa que provoque ansiedade ou angústia. A esperança cristã, para todos os efeitos, não consiste apenas em uma atitude ativa, mas criativa. Ela se encontra enredada em torno aos nós constitutivos da variegada e rica teia que é a experiência de fé bíblica.

 A inteira trama da história da salvação, narrada na Bíblia, é tecida mediante os nós recíprocos e complementares que constituem a tessitura da aliança de Javé com o povo de Israel : promessa/(não)cumprimento. O próprio nome que o Senhor revela a Moisés, depois de muita insistência, IAHVEH, consiste em uma forma verbal, no tempo futuro. Trata-se, afinal, de uma promessa. Dessa maneira, o próprio nome através do qual o Senhor se revela a Moisés significa uma promessa que Ele faz de permanecer sempre junto a seu povo eleito todos os dias. Estamos diante de uma promessa que instaura uma autêntica história de aliança entre Deus e seu povo. Aquele que se antecipa e propõe a aliança promete fidelidade para sempre, custe o que custar, e espera que o povo, caminhando por entre luzes e sombras, corresponda à mesma, ainda que em meio a fidelidades e infidelidades. E, a partir daí, inicia-se o longo e sinuoso percurso da história da salvação, narrada de formas diferentes e mediante distintos gêneros literários.

Anúncios alvissareiros, segundo o testemunho dos textos da Bíblia, remetem-nos à visita de Deus. Visita esperada e acalentada desde tempos imemoráveis que promete vir ao encontro dos mais profundos desejos do coração humano e satisfazer suas mais remotas necessidades. O Senhor vem, de fato, e vem para nos salvar. Nesse sentido, Deus irrompe em meio à nossa vida, atraindo-nos para o futuro. Sua presença subverte nossas ordens estabelecidas e nossa maneira usual de pensar e raciocinar. Ele jamais se deixa circunscrever ou aprisionar dentro de nossas estreitas categorias, espaços e formas de pensar e de agir. Por essa razão, necessitamos estar sempre vigilantes para não cristalizarmos imagens de Deus nem para engessá-lo dentro de nossos critérios. É preciso deixar Deus ser Deus, renunciando a toda e qualquer tentativa de querer reduzi-lo a um ídolo que, estando aí à nossa inteira disposição, obedeceria fielmente aos nossos interesses e propósitos.

E, se antes, ele havia nos visitado através de patriarcas e profetas, agora, na plenitude dos tempos, ele se aproxima e se acerca de nós, pessoalmente, em seu próprio Filho. Os sinais de sua visita são desconcertantes e até escandalosos : um recém-nascido, coberto com panos rudes, deitado em uma simples manjedoura, aquecido pela respiração e transpiração dos animais, na atmosfera lúgubre de um estábulo. Seria possível imaginar fragilidade maior do que essa?

Não raramente, associamos Deus a grandes manifestações, a fatos e a situações extraordinários. Comportamo-nos como os Magos dos evangelhos que, preferem se informar junto a Herodes e sua corte, do que continuar seguindo a estrela que os levaria à cena em que se faziam presentes todos aqueles sinais prometidos. Observar as estrelas era o que faziam os Magos quotidianamente. Como imaginar que Deus se serviria de uma atividade monótona e repetitiva, do dia-a-dia, para sinalizar algo ou para comunicar-lhes uma alvissareira notícia? Melhor se prevenir e buscar outras formas mais adequadas à dignidade e majestade divinas. Não é assim que também nós pensamos?

Em sua singular e inusitada maneira de se fazer presente entre nós, mediante sinais, o Deus de Jesus Cristo potencializa as mediações humanas, históricas e também cósmicas como possíveis vias de sua presença e interpelação. Entre tantas mediações escolhidas pelo Deus bíblico, uma merece ser destacada. Trata-se da mediação do pobre, concebido como sacramento primordial do Deus comunhão, revelado por Jesus Cristo. Ao se revelar preferencialmente no pobre, no excluído e no marginalizado, Deus revela um de seus segredos mais recônditos. E o segredo é este : que Deus ama tudo o que é desprezível, insignificante, simples. Deus ama a todos e se serve de toda e qualquer situação para se fazer presente e comunicar-nos os desígnios de sua vontade. No entanto, manifesta um carinho especial para com os pequenos, desprezados e últimos deste mundo, e ama particularmente aquelas situações mais desprezíveis e insignificantes. Numa palavra, Deus ama o abandonado e faz dele seu sacramento por excelência.

Francisco de Assis, o Poverello, e Teresa de Calcutá, entre outros, intuíram este segredo de Deus. Foi assim que, descobrindo o valor recôndito das situações insignificantes, realizaram a experiência singular do encontro com o Deus de Jesus Cristo e, em comunhão com os pobres, aprenderam a cultivar e a apreçar a beleza desta intimidade. Assim vivendo, portanto, ensinam que o caminho que conduz o ser humano a Deus passa inevitavelmente pelo irmão ou pela irmã e, de modo especial, por aquele que se encontra caído à margem, vale dizer, excluído de toda e qualquer convivência social.

Quais seriam, então, hoje esses novos sinais de Deus que somos interpelados a perscrutar? O empenho em perceber em toda e qualquer situação a presença do Deus de Jesus Cristo e em acolher generosamente suas interpelações torna-se imprescindível. Não existem, para o cristão, situações que constituam um total empecilho à presença e à interpelação do Deus de Jesus Cristo. Não raras vezes, Ele se faz presente justamente naquelas situações nas quais resulta difícil perceber, de antemão, sua presença e conseqüente interpelação.

Que no decurso destas quatro semanas do Advento, de modo especial, exercitemo-nos em uma maior sensibilidade para com nosso dia-a-dia a fim de percebermos os sinais da presença interpeladora de Deus. E, uma vez percebida, que nos disponhamos a corresponder aos apelos de Deus com generosidade.’


Fonte :

domingo, 27 de novembro de 2016

Tempo de Deus, Tempo da Igreja

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Dom Alberto Taveira Corrêa,
Arcebispo Metropolitano de Belém, PA


‘Conferimos o calendário, as agendas de todos os tipos e organizamos o uso do tempo. De acordo com as estações do ano, nos hemisférios norte e sul, convivemos com a diversidade de climas e temperaturas, determinamos nossos períodos de trabalho e de descanso, fazemos as nossas escolhas. O ano civil vai de janeiro a dezembro e as normas dos diversos países determinam os prazos para prestações de contas, impostos, vigência das leis, e daí por diante. Com todos os limites existentes, mas o nosso mundo tende a normatizar a convivência, estabelecendo regras e propondo o necessário respeito às pessoas e grupos. Seria muito bom que tudo funcionasse assim, as leis fossem respeitadas, a ‘máquina’ funcionasse bem. Sabemos que nem sempre a letra corresponde à realidade vivida, mas estamos buscando um mundo possível e adequado, para as diversas porções da humanidade.

Para fecundar o tempo humano, a experiência da fé tem o seu centro, não na natureza, com seus ritmos, e nem mesmo na capacidade organizativa da sociedade. Para a Igreja, o tempo é marcado por alguém e não por coisas ou normas acordadas na sociedade. O eixo do tempo cristão tem um nome, Jesus Cristo. Também a sociedade, mesmo as pessoas que não têm fé, acabam referindo-se ao seu nascimento no tempo, para datar os acontecimentos. E mesmo antes do ano civil terminar, já é ano novo para a Igreja e para os cristãos, para percorrer, uma vez mais e de forma sempre renovada, os mistérios de Cristo. Eles nos encontrem crescidos e dispostos a testemunhar a fé cristã com maior ardor.

A organização do chamado Ano Litúrgico, que começa neste domingo, aconteceu paulatinamente, segundo a consciência adquirida do mistério de Cristo e da adesão a Ele. No primeiro período da Igreja, a Páscoa foi o único ponto central da pregação, da celebração e da vida cristã. O culto da igreja nasce da Páscoa e para celebrar a Páscoa. Tudo é visto no centro e a partir do centro, e este centro é o acontecimento do Cristo morto e ressuscitado. No começo, portanto, tudo está centrado neste único mistério, atualizado no presente da celebração.

A Igreja primitiva não celebrava ‘os mistérios’ de Cristo, mas ‘o mistério’, ou seja, a Páscoa, como acontecimento que resume e faz valer para a nossa salvação todo o conjunto da vida e da ação salvífica de Cristo. Nos primeiros três séculos da vida da Igreja prevaleceu o critério místico da ‘concentração’ sobre o critério cronológico da ‘distribuição’, que entrou nos séculos seguintes. Assim por exemplo, na segunda parte do século II, Melitão de Sardes, repetindo um conceito, já manifestado antes por São Justino, afirma : ‘Cristo é a Páscoa da nossa salvação’.

A celebração do mistério pascal está no centro da ‘memória’ que a Igreja celebra do seu Senhor. Esta celebração se realiza, desde o princípio, toda semana. As assembleias cristãs sempre se reuniram, como fazem até hoje, no primeiro dia da semana para a ‘Fração do Pão’, que foi o primeiro nome da Celebração Eucarística. Este dia recebeu logo um nome novo ‘o dia do Senhor’, ‘Domingo’, que lembra aos cristãos a ressurreição de Cristo, une-os a ele na sua Eucaristia, encaminha-os para a espera da sua vinda, no fim dos tempos.



O domingo é a espinha dorsal do ano litúrgico inteiro, do qual é fundamento e núcleo. No domingo existe a festa cristã na sua integralidade, e no decurso do ano litúrgico são explicitados os aspectos da totalidade desta festa primordial. A Páscoa anual até hoje continua celebrada com a ‘vigília’ solene, na passagem de Cristo, da morte para a ressurreição. Ao redor desse núcleo primitivo vai-se constituindo o ‘tríduo sagrado’, que se inicia na quinta-feira santa, depois celebra a morte de Cristo (sexta-feira santa), a sua sepultura (sábado santo) e a sua ressurreição (domingo com a grande vigília), a Páscoa celebrada em três dias. A solenidade pascal vai-se prolongando numa festa de cinquenta dias, até o ‘Pentecostes’. Depois se acrescentaram outros elementos que fazem parte da rica experiência do Tempo da Igreja, até que se compôs o que chamamos de Ano Litúrgico, Ano de Deus, Ano da Igreja, Ano dos cristãos.

No século IV, para suplantar a festa pagã do ‘Natalis solis invicti’ e para confirmar a fé no mistério da encarnação, surgiu a celebração do Natal. No início, Natal, no Ocidente, e Epifania, no Oriente constituíram uma celebração que tinha um único e mesmo objeto, a encarnação do Verbo, ainda que com tonalidades diferentes. O ‘Advento’, como preparação ao Natal, é próprio do Ocidente cristão, e é nele que estamos para adentrar e viver as quatro semanas intensas de oração e crescimento, olhando para a vinda do Senhor no fim dos tempos, sua presença no tempo cotidiano de nossa vida cristã e a memória de seu Natal no tempo, quando o Verbo de Deus se fez Carne.

No Advento que se inicia, tem lugar a virtude da Esperança, cujo conteúdo não se reduz em aguardar coisas boas para o dia de amanhã, mas a certeza de que nossa vida tem rumo, destino certo, tem sentido. Recordemos que esta, ao lado da fé e da caridade, é uma virtude teologal, presente de Deus concedido no Batismo. Se está dentro de nós por dom de Deus, é hora de atualizá-la, de forma a oferecer à nossa geração esmorecida justamente na esperança, um sentido renovado para os gestos, atitudes e passos a serem dados. A Liturgia da Igreja, em tempo de Advento, oferece-nos ainda elementos preciosos para uma boa revisão de vida, pautada não tanto no espelho, mas à luz de Jesus Cristo e sua Palavra, para que o nosso seja um Tempo de Deus.

A partir da virtude da Esperança, podemos acolher o convite a viver ‘em estado de Advento’, não fechados nos acontecimentos quotidianos, que tantas vezes nos afogam, mas abertos para as promessas de Deus, conscientes de sua presença salvadora, prontos para anunciar a alegria aos outros, superando o pessimismo circundante, recolhendo as flores do bem que é feito, acendendo luzes ao invés de abafar os fachos tímidos que se mostram na escuridão. Justamente a grávida mais notável de todos os tempos, Virgem Maria, em estado de expectativa, pode ser nossa companheira de jornada. O tempo ao Advento é o mais favorável para cultivar a devoção e o carinho com Nossa Senhora, aquela que se revestiu totalmente da Palavra de Deus!’


Fonte :

sábado, 26 de novembro de 2016

Com os olhos abertos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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‘A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus 24, 37-44 que corresponde ao Primeiro Domingo de Advento, ciclo A do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto :

As primeiras comunidades cristãs viveram anos muito difíceis. Perdidos no vasto Império de Roma, no meio de conflitos e perseguições, aqueles cristãos procuravam força e alento esperando a pronta vinda de Jesus e recordando as suas palavras : ‘Vigiai. Vivei despertos. Tende os olhos abertos. Estai alerta.’ Significarão, todavia, algo para nós estas chamadas de Jesus para viver despertos?

Que é hoje para os cristãos colocar nossa esperança em Deus vivendo com os olhos abertos?

Deixaremos que se esgote definitivamente no nosso mundo secular a esperança numa última justiça de Deus para essa imensa maioria de vítimas inocentes que sofrem sem culpa alguma?

Precisamente, a forma mais fácil de falsear a esperança cristã é esperar de Deus a nossa própria salvação eterna enquanto viramos as costas ao sofrimento que há agora mesmo no mundo. Um dia teremos que reconhecer nossa cegueira ante Cristo Juiz : quando te vimos faminto ou sedento, estrangeiro ou nu, doente ou na prisão, e não te assistimos? Este será o nosso diálogo final com Ele se vivemos com os olhos fechados.

Temos que despertar e abrir bem os olhos. Viver vigilantes para ver por cima dos nossos pequenos interesses e preocupações. A esperança do Cristão não é una atitude cega, pois não esquece os que sofrem. A espiritualidade cristã não consiste só num olhar para o interior, pois o seu coração está atento a quem vive abandonado à sua sorte.

Nas comunidades cristãs temos que cuidar cada vez mais que nosso modo de viver a esperança não nos leve à indiferença e ao esquecimento dos pobres. Não podemos isolar-nos na religião para não ouvir o clamor dos que morrem diariamente de fome. Não nos está permitido alimentar a nossa ilusão de inocência para defender nossa tranquilidade.

Uma esperança em Deus que se esquece dos que vivem nesta terra sem poder esperar nada, não poderá ser considerada como uma versão religiosa do otimismo a todo o custo, vivido sem lucidez nem responsabilidade? Uma busca da própria salvação eterna de costas aos que sofrem, não poderá ser acusada de ser um sutil «egoísmo estendido para o além»?

Provavelmente, a pouca sensibilidade ao sofrimento imenso que há no mundo seja um dos sintomas mais graves do envelhecimento do cristianismo atual. Quando o Papa Francisco reclama «uma Igreja mais pobre e dos pobres», está gritando-nos sua mensagem mais importante e interpeladora aos cristãos dos países do bem-estar.’’
  

Fonte :

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Pregação do Advento : O espírito fonte de esperança

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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'‘Bebamos, sóbrios, a embriaguez do Espírito’. É o tema das quatro meditações que o pregador da Casa Pontifícia, o capuchinho Frei Raniero Cantalamessa, irá realizar - na presença do Papa Francisco – na sexta-feira da primeira semana de Advento, 2 de dezembro, na segunda, 9 de dezembro, na terceira, 16 de dezembro, e na quarta, 23 de dezembro, na capela Redemptoris Mater do Palácio Apostólico.

Na reflexão teológica – sublinha o religioso explicando a escolha do tema – se afirma cada vez mais o que é chamada ‘a teologia do terceiro artigo’, isto é, o artigo do Credo sobre o Espírito Santo’.

Trata-se de uma ‘corrente - acrescenta Frei Cantalamessa - que não pretende substituir-se à teologia tradicional, mas sim caminhar ao lado e vivificá-la’, propondo-se ‘de fazer do Espírito Santo não apenas o objeto do Tratado que lhe diz respeito, mas, por assim dizer, a atmosfera em que se desenvolve toda a vida da Igreja e, em particular, cada pesquisa teológica’.

Nesta linha – conclui o capuchinho - as meditações do Advento são destinadas a refletir sobre o Espírito Santo como a novidade teológica e espiritual mais importante do pós-concilio e a principal fonte de esperança da Igreja’.

Foram convidados a participar das quatro pregações, que terão início às 9 horas, os cardeais, os arcebispos e os bispos, os secretários de congregações, os prelados da Cúria Romana e do Vicariato de Roma, os superiores gerais e os promotores das ordens religiosas que fazem parte da Capela Pontifícia.


Fonte :
*Artigo na íntegra

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Cristãos iraquianos recuperam mosteiro saqueado pelo Estado Islâmico

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Paredes do pátio do mosteiro pichadas pelos jihadistas do Estado Islâmico


‘Diante do altar destruído, o padre Charbel ergue os braços, com a palma das mãos voltadas para o céu, e começa a rezar diante de uma congregação devota de combatentes iraquianos que recuperaram o mosteiro de Mar Behnam das mãos do grupo Estado Islâmico (EI).

Pai nosso que estáis no céu, santificado seja o teu nome, venha a nós o vosso reino’, proclamam. Na parede oposta, um grafite proclama em letras pretas : ‘Allahu Akbar (Deus é grande)’.

Há alguns dias, as tropas pró-governo recapturam o mosteiro siríaco católico, controlado pelo EI por dois anos.

Teto de gesso quebrado, estátua da Virgem Maria decapitada. Após sua chegada, radicais islâmicos perseguiram os monges e saquearam o edifício cristão, construído no século IV D.C. a 30 km de Mossul (norte), onde as tropas iraquianas lançaram em meados de outubro uma grande ofensiva contra o EI.

Estou feliz e triste’, suspira Charbel Issou, o ex-responsável do mosteiro ao reencontrar pela primeira vez o local que precisou abandonar. ‘Estou feliz de voltar a este lugar santo, onde passei um ano e meio. Ao mesmo tempo, estou triste por vê-lo neste estado, demolido. Dói meu coração’, diz ele.

Em frente ao mosteiro, um dos mais antigos lugares de culto e mais reverenciado do cristianismo no Iraque, uma pilha de escombros jaz no antigo local das sepulturas de Mar Behnam - um santo sírio que deu seu nome ao mosteiro - e sua irmã Sarah.


Brigada da Babilônia

Em 2015, os extremistas postaram um vídeo em que aparecem dinamitar as sepulturas, das quais não resta quase nada.

Um ato de vandalismo entre outros cometidos por homens do EI na região. Do sítio histórico assírio de Nimrod, passando pelos mais belos templos da cidade greco-romana de Palmyra, na vizinha Síria, os extremistas sunitas destruíram inúmeros objetos culturais em seu caminho.

Quando os extremistas invadiram a planície de Nínive, no norte do Iraque em 2014, deram três opções aos cristãos : se converter, pagar um imposto ou morrer. Cerca de 120.000 deles fugiram. E não vai ser fácil reconstruir sua comunidade, adverte o padre Issou.

Vocês deveriam ver as casas’, suspira, ‘metade delas foram reduzidas a cinzas’.

As perseguições do EI são uma das mais recentes de uma série contra a minoria cristã no Iraque, atacada regularmente desde 2003 e a queda de Saddam Hussein.

Antes da invasão americana, mais de um milhão de cristãos viviam no país. Eles são agora apenas 350.000, metade dos quais na província de Nínive, da qual Mossul é a capital.

Hoje o padre Issou é escoltado por milicianos fortemente armados, cruz carregada no pescoço ou tatuada no braço : são membros das ‘Brigadas da Babilônia’, formadas por cristãos iraquianos para enfrentar o EI.

Eles lutam sob a bandeira da Hachd al-Chaabi, as unidades de Mobilização Popular, uma coalizão dominada por grupos paramilitares xiitas ao quais o governo iraquiano apelou após a derrota de suas forças contra os extremistas.

Nós demonstramos que é possível reconquistar o lugar, apesar do nosso pequeno número : o que precisamos é a fé’, lançou o coronel Dhafer Luis, chamando seus companheiros cristãos a retornar às suas terras.’
  

Fonte :



Azerbaijão : Igreja missionária e misericordiosa

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Fernando Félix, 
Jornalista 


‘O Azerbaijão é pouco mais pequeno do que Portugal e a sua população também é ligeiramente menor : 9,5 milhões de habitantes. Situa-se na região do Cáucaso, no cruzamento entre o Leste Europeu e o Sudoeste Asiático, sendo, por isso, um país transcontinental. Este ano, celebra os 25 anos da proclamação da independência da ex-União Soviética.

A Constituição do Azerbaijão não declara qualquer religião oficial, mas 95 % da população é muçulmana xiita. As principais forças políticas no país são seculares, mas há movimentos e partidos da oposição ligados ao xiismo.

A comunidade católica azerbaijana é formada por cerca de 500 fiéis, tem apenas uma paróquia, confiada aos Salesianos, uma igreja e uma capela. Nela existem apenas sete sacerdotes, três religiosos, sete religiosas, dois missionários leigos e quatro catequistas. Os seminaristas são 14. Com os demais cristãos – da Igreja Ortodoxa Russa, Igreja Ortodoxa Georgiana e Igreja Apostólica Arménia – formam uma comunidade com perto de 150 mil discípulos de Cristo.


Cristãos em tempos de perseguição religiosa

O Catolicismo recente no Azerbaijão data de 1912. Oito anos depois, com a chegada dos bolcheviques, o território foi incorporado na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (ex-URSS) e a Igreja Católica foi suprimida. Na década de 1930, a perseguição teve o seu pico com a destruição da única igreja, na capital, Bacu, e o assassínio do seu pároco.

Em 1991, o Azerbaijão proclamou-se independente da ex-URSS. No ano seguinte, quando representantes da Igreja Católica romana chegaram ao país, restava apenas uma dúzia de fiéis idosos dos que, em tempos, tinham sido 10 000 católicos.

O país, em 1997, proibiu por decreto toda a atividade de missionários estrangeiros. Todavia, acolheu dois papas em viagem apostólica : São João Paulo II, em 2002, e Francisco, em outubro passado.

Depois da visita de São João Paulo II, foi enviado o primeiro padre católico para o país. Ao mesmo tempo, o Governo decidiu compensar os cristãos, oferecendo-lhes um terreno para a edificação de um novo templo. E é nesta nova igreja, dedicada à Imaculada Conceição, que, todos os domingos, são celebradas três missas e são cada vez mais as crianças que frequentam a catequese.

Em 29 de Maio passado, foi ordenado diácono, em São Petersburgo (Rússia), o futuro primeiro sacerdote do Azerbaijão. Esta é uma notícia muito boa para a comunidade católica azerbaijana. Este pode ser considerado um dos primeiros frutos da presença discreta, mas verdadeiramente missionária, dos católicos.


Presença caridosa num país laico

No Azerbaijão, são mais fortes os costumes sociais e culturais do que os credos. Entre a maioria muçulmana, os costumes religiosos não são levados muito a sério, e a identidade muçulmana tende a basear-se mais na etnia e na cultura do que na religião.

O país vive tempos de prosperidade que parece pôr em segundo plano a fé. O petróleo e o gás natural fazem do Azerbaijão um país muito rico. «Tão rico que, quando as Irmãs da Madre Teresa de Calcutá decidiram abrir uma casa na capital, Bacu, em 2005, lhes disseram que podiam ir embora, que o seu trabalho não seria necessário pois não havia pobres no Azerbaijão», anota a Fundação Ajuda à Igreja que Sofre. As Missionárias da Caridade não deram ouvidos àquelas palavras desmotivadoras e cumpriram um dos desejos de Santa Teresa de Calcutá : abrir pelo menos uma casa, uma comunidade, em cada uma das antigas repúblicas socialistas soviéticas. Hoje, cinco irmãs desta congregação cuidam dos sem-abrigo, dos que perderam a família, dos que não têm como se sustentar, dos que permanecem à margem, estendidos nas ruas, quase invisíveis aos olhos de quem passa.


Os gestos inter-religiosos do Papa Francisco

A breve visita do Papa Francisco ao Azerbaijão – concentrada num domingo – teve um forte caráter inter-religioso. O ponto alto foi o encontro na Mesquita H. Aliyev, de Bacu, reunindo o xeque dos muçulmanos do Cáucaso, Allahshukur Pashazadeh, e representantes de comunidades cristãs e judias no país.

Ao iniciar o seu discurso, Francisco salientou o grande sinal que era o encontro, realizado em fraterna amizade naquele local de oração : «Um sinal que manifesta aquela harmonia que as religiões, em conjunto, podem construir, a partir das relações pessoais e da boa vontade dos responsáveis», frisou, e da qual o Azerbaijão se beneficia, pois «é a colaboração e não a contraposição que ajudam a construir sociedades melhores».

Este encontro, como recordou o papa, saúda, encoraja e está em continuidade com os numerosos encontros que se realizam em Bacu para promover o diálogo e a multiculturalidade.

«A fraternidade e a partilha que desejamos incrementar não serão apreciadas por aqueles que querem salientar divisões, reacender tensões e enriquecer à custa de conflitos e contrastes; mas são imploradas e esperadas por quem deseja o bem comum, e sobretudo são agradáveis a Deus, Compassivo e Misericordioso, que quer os filhos e filhas da única família humana unidos e sempre em diálogo entre si», sublinhou o pontífice.

Disse ainda o Papa Francisco, demonstrando como a harmonia entre as religiões é o melhor para o mundo : «Abrir-se aos outros não empobrece, mas enriquece, porque nos ajuda a ser mais humanos, a reconhecer-se parte ativa de um todo maior e a interpretar a vida como um dom para os outros; a ter como alvo não os próprios interesses, mas o bem da humanidade; a agir sem idealismos nem intervencionismos, sem realizar interferências prejudiciais nem ações forçadas, mas sempre no respeito das dinâmicas históricas, das culturas e das tradições religiosas.»’
  

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segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Liberdade religiosa diminui e cristãos são os mais perseguidos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



‘Há uma diminuição da liberdade religiosa no mundo, revela um relatório da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS). O Relatório foi apresentado na manhã desta terça-feira em Roma, na sede da Imprensa Estrangeira na capital italiana.

O documento, ‘A Liberdade Religiosa no Mundo’, analisou 196 países entre junho de 2014 e junho deste ano. Verificou-se que ‘em 11 dos países onde há das piores infracções, houve mesmo um retrocesso’, admite a diretora do secretariado nacional da AIS.

Catarina Martins, da Fundação AIS Portugal, indica ainda que ‘a comunidade cristã continua a ser a mais perseguida’. ‘Nós temos países como o Iraque e como a Síria que poderá mesmo desaparecer o cristianismo nos próximos anos. E isto tendo em conta tudo o que está a acontecer, estes fenômenos de hiper-extremismo que estamos a ver, em que há um claro objetivo de eliminar todas as minorias, todas as religiões que não a predominante no Estado’, afirma.

Esta responsável diz que não são só os cristãos que podem deixar de existir em alguns países do Médio Oriente, como também outras minorias, como é o caso dos yazidis e os drusos.

Há ainda países como a Coreia do Norte, Eritreia, China, Paquistão, Irã, Arábia Saudita que impõem restrições religiosas com graves consequências para quem as violar. ‘O que nós temos assistido é inquéritos, é perseguições, é prisão, é torturas a toda a família e não apenas a uma pessoa’, denuncia Catarina Martins.

Vivemos no paraíso’, resume, comentando a situação em Portugal. Catarina Martins aproveita para destacar dois pontos positivos : ‘A criação em 2015 no Parlamento português de um grupo de defesa dos cristãos perseguidos no mundo, com o objetivo de fazer alguma pressão sobre os outros deputados do parlamento e também influenciar algumas decisões no Parlamento Europeu através dos nossos eurodeputados. E depois também, como sendo um dos poucos parlamentos no mundo que também assinou e declarou por unanimidade este genocídio que está a acontecer no Médio Oriente relativamente às minorias yazidis, cristãos e drusos’.

O relatório ‘A Liberdade Religiosa no Mundo’ foi divulgado em Portugal no dia 17 de outubro na Sociedade de Geografia em Lisboa, contando com a presença do arcebispo caldeu de Erbil, D. Bashar Warda e da irmã Guadalupe, missionária na Síria.’
  

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sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A morte do cristão, como horizonte trinitário e pascal

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

A morte é o acontecimento humano que mais nos gera questionamentos.
*Artigo de Felipe Magalhães Francisco,
Mestre em Teologia, pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia


‘Dos silêncios que a vida nos impõe, não há dúvidas de que a morte é o acontecimento humano que mais nos gera questionamentos. Ela é uma das grandes questões que perpassam toda nossa existência. Não raras vezes ouvimos expressões, tais como ‘a morte é a única certeza da vida’, entre outras. Diante disso, o que pensar dessa silenciosa e terrível situação que, cedo ou tarde, experimentaremos pessoalmente, mas que, até agora, só a percebemos, inevitavelmente, quando ela se mostra para aqueles que nos cercam?

Assim, pois, ao mesmo tempo em que temos a certeza da morte, pouco podemos dizer sobre ela e, de tal modo, qualquer especulação que façamos será insuficiente. O que não se pode negar é que, em todas as culturas das quais temos notícias, a morte é real e é motivo de atenção. Contudo, refletir sobre tal tema é mais que um desafio, pois vivemos em uma cultura que, cada vez mais, tenta se esquivar de tudo aquilo que nos remete à finitude humana.

Somos testemunhas do quanto as questões que se referem à morte são tratadas com desprezo, medo e, de todas as maneiras, tentamos adiar nosso indesejável encontro com esta situação indizível, mas inevitável. A crescente busca pela eternização da juventude é prova mais que clara do quanto a morte é, para nós, tabu : nunca se viu tantos empreendimentos e tecnologias, que se destinam a criar o prolongamento da vida, como vemos hoje.

Sem dúvidas, um dos fatores que contribuem para que a morte seja ‘experimentada’ e percebida a partir de um verdadeiro sentimento de pavor, é o fato de, em nosso imaginário, pensarmos nela como sendo uma realidade dotada de pessoalidade, isto é, pensar a morte como uma pessoa, um ser [1]. Contudo, é preciso esclarecer o fato de que a morte, como pessoa, não existe. A morte é, exclusivamente, um fato. O fato não é outro senão o de que morremos [2]. Isso nos coloca diante de um limite insuperável : a morte não é passível de ser conceituada. Porém, a não possibilidade de conceitualização, não nos impede de percebê-la como fenômeno [3].

Contudo, tanto o morrer quanto o viver têm sentido, quando vistos pelo horizonte pascal e trinitário. De fato, a vida cristã é uma vida na Trindade, de modo que, ao participar da morte-ressurreição de Cristo, o cristão é, pelo Espírito, levado à comunhão com o Pai : ‘Nele, vós também sois juntamente edificados para serdes morada de Deus, no Espírito’ (Ef 2,22).

A morte é, para o ser humano, situação ímpar de pergunta pelo sentido. Este, por sua vez, é a vida na Trindade, fazendo da morte, momento máximo de abandono e de comunhão. Interessante notar a ambiguidade do termo abandono. Pode significar tanto o sentimento de estar só, quanto o próprio desapegar-se de si mesmo, confiando-se ao totalmente Outro. A morte, pensada pelos dois sentidos do abandonar-se, é a expressão radical da fragilidade do existir.

Aqui, recordamos os inúmeros esforços da Tanatologia, que tem crescido consideravelmente, em vista de pensar os temas acerca da finitude da vida, mas, sobretudo, sobre a qualidade de vida dos enfermos terminais. É um bonito trabalho, no qual aqueles que já se encontram no limite da vida, são assistidos de modo que possam gozar com qualidade de seus últimos instantes.

Entretanto, todos estes e outros esforços, não são capazes de livrar o ser humano do sentimento de abandono, na hora da morte. Vale lembrar a máxima popular de que ‘nascemos sozinhos e, sozinhos, morremos’. Nenhuma abordagem, por mais mística que seja, é capaz de livrar o aspecto dramático do morrer : ‘Sinto uma tristeza mortal; ficai aqui e vigiai comigo’ (Mt 26,38). Nenhuma presença, porém, é capaz de aliviar-nos deste abandono : ‘Não fostes capazes de vigiar uma hora comigo’ (Mt 26,40).

O Rosto abandonado da cruz nos ilumina sobre o morrer, como abandono confiante nos braços daquele que, não sem razão, fez-nos existir. Do profundo grito de abandono, ‘Eloi, Eloi, lemá sabachtáni’ (Mc 15,34), ecoa-nos a pergunta sobre onde estaria o Pai, que parecia tão próximo e íntimo do Filho, o abandonado. No ápice do drama humano, é o Espírito quem revela o lugar onde Deus se encontra : ‘Pai, em tuas mãos eu entrego o meu espírito’ (Lc, 23,46). O Pai é o próprio lugar amoroso, no qual o Filho pode depositar sua confiança. Do abandono, Jesus é conduzido à mais profunda experiência de comunhão.

Morrer, abandonando-se ao existir amoroso do Pai, é, para nós, associação ao Filho, sujeito do abandono oblativo e obediente a Deus : ‘Pai, se esta taça não pode passar sem que eu a beba, que se cumpra tua vontade’ (Mt 26,42). É o próprio Espírito o elo da relação entre o abandonado e o regaço acolhedor do Pai. Oferecer-se na confiança ao Pai na hora da morte não é outra coisa, senão momento recapitulador de toda uma existência orientada para Deus, na liberdade configurada.

A dimensão pascal e, por isso, trinitária da morte nos permite pensar além da própria morte. ‘Pelo batismo nos sepultamos com ele na morte, para vivermos uma vida nova, assim como Cristo ressuscitou da morte pela ação gloriosa do Pai. Pois se fomos enxertados por uma morte como a sua, o mesmo acontecerá por sua ressurreição’ (Rm 6,4-5). O acontecimento pascal de Cristo nos coloca diante da possibilidade de um ‘estar com Cristo’ (Fl 1,23). E é à luz do ‘estar com Cristo’, que nossa esperança de que o morrer não é a realidade última de nossa existência, tem seu lugar e sua razão de ser : ‘Se é só para esta vida que pusemos a nossa esperança em Cristo, somos, dentre todos os homens, os mais dignos de compaixão’ (1Cor 15,19). Cristo, ‘como primícias dos que morreram’, é o lugar teológico de nossa esperança na ressurreição.’
  

 [1] Basta que nos lembremos da emblemática figura da Morte, que perpassa nosso imaginário popular : um esqueleto, vestido de roupa preta, portando uma foice. Ou, ainda, as corriqueiras experiências de pessoas que, ao sentirem um calafrio, pronunciam como a uma oração : ‘Passe a morte, que estou forte’, como se esta pudesse ser sentida como uma espécie de fantasma ou espírito.

[2] Cf. Thomas, Louis-Vicent. Antropologia dela morte : l’Africa e l’Occidente messi a confronto de um grande antropologo sul terreno più árduo : il rispetto – o il disprezzo – per l’esistenza umana in tutte le inifinite forme che assume di fronte ala morte, vero banco di prova dela vita. Italy : Garzanti, 1976, p. 260. Ver também : Dastur, Françoise. A morte : ensaio sobre a finitude. Rio de Janeiro : DIFEL, 2002 p. 57.

[3] Cf. Dastur, A morte, p.62.


Fonte :

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Missionários Franciscanos desafiam as bombas

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Bernardino Frutuoso,
Jornalista

‘Do Mosteiro Er-Ram pode-se ver quase toda a cidade de Alepo, ou o que resta dela depois de cinco anos de guerra. A cidadela antiga, que foi declarada Patrimônio da Humanidade em 1986, ainda permanece no topo da colina. Alepo antes era conhecida por ser um lugar de paz e coexistência, foi o lar de árabes, turcos, curdos, circassianos e trezentos mil cristãos de dez denominações.

Alepo é uma cidade histórica, com um significado religioso, político e estratégico crucial. Um provérbio sírio diz : «Quem domina Alepo, domina a Síria.» Foi a terceira cidade cristã do Médio Oriente e ao mesmo tempo a capital da cultura islâmica. Foi a antiga capital do reino hitita e é um lugar de grande valor arqueológico, o berço de culturas diferentes, uma encruzilhada na Rota da Seda entre o Oriente e o Ocidente e a antiga sede do Codex Aleppo (que é considerado o melhor manuscrito existente da Bíblia hebraica, embora esteja incompleto). Tudo foi destruído agora.

Alepo, que é a segunda maior cidade da Síria, está no epicentro de uma guerra civil que há mais de cinco anos (desde Março de 2011) opõe o governo do presidente Bashar al-Assad a várias forças rebeldes contrárias ao regime. Ao longo deste ano intensificaram-se os bombardeamentos russos e a ofensiva terrestre dos Guardas da Revolução iranianos e das tropas sírias leais a Bashar al-Assad. Alepo Este tem estado a ser alvo de intensos bombardeamentos desde o fim do cessar-fogo acordado pelos Estados Unidos e a Rússia no mês de Setembro. Em entrevista ao jornal russo Komsomolskaya Pravda, o presidente da Síria promete «continuar a limpar» a cidade, onde 275 mil cidadãos, 100 mil dos quais crianças, estão encurralados pelos bombardeamentos intensivos das forças leais ao regime em parceria com a Força Aérea russa. «Vai ser um trampolim para [nos] movermos para outras áreas, para libertarmos outras áreas dos terroristas, é esta a importância de Alepo», declarou Bashar al-Assad na entrevista.

O Observatório Sírio para os Direitos Humanos informou que num só dia – o passado 13 de Outubro – se registaram na zona oriental da cidade 20 ataques da aviação de combate da Rússia e do regime sírio, causando mais de 70 vítimas. O enviado especial das Nações Unidas à Síria, Staffan de Mistura, alertou que «a este ritmo, a cidade de Alepo Este estará totalmente destruída e milhares de civis sírios, não terroristas, serão mortos» até ao Natal. A guerra já causou, em cinco anos, cerca de 400 mil mortos – segundo as Nações Unidas –, mais de 6,5 milhões de deslocados dentro do país e 4,8 milhões de refugiados.

Em declarações à Rádio Vaticano, o padre Firas Lufti, que trabalha no Colégio da Terra Santa dos Franciscanos em Alepo, explicou que «o exército sírio oficial com os seus aliados está a cercar a cidade de Alepo para enfrentar o avanço dos jiadistas». Segundo o religioso, «sentem-se os bombardeamentos dia e noite e, portanto, não se dorme. Não há paz na cidade. As pessoas têm medo».

O Papa Francisco condenou em muitas ocasiões a violência que tem atingido a população da Síria, particularmente em Alepo, e alertou para o «preço» humano que a guerra civil tem custado à população do país, pedindo soluções de paz. Em Agosto, o Sumo Pontífice afirmou que «é inaceitável que tantas pessoas vulneráveis – incluindo tantas crianças – devam pagar o preço do conflito, o preço do fechamento do coração e da falta de vontade das potências para a paz

«Todos os interesses no Médio Oriente estão a concentrar-se em Alepo», afirma o padre Firas. «Todos os dias ouvimos falar de conversações de tréguas, de acordos entre governos, mas, em seguida, os tiroteios e as mortes continuam. Estamos diante de uma grave catástrofe humana. Mas ninguém parece importar-se. Quem se preocupa com os milhares de crianças que não têm nada para comer? Quem se preocupa com os feridos que não podem ser curados, porque não existem medicamentos?»

Os Frades Franciscanos na Síria são os responsáveis por três centros : Paróquia de São Francisco de Assis, uma capela que pertence à Paróquia de Er-Ram, e a Escola Terra Santa. Nos últimos meses, a paróquia de São Francisco foi bombardeada numa ocasião e o Mosteiro de Er-Ram cinco vezes. Na Síria ainda permanecem 14 frades franciscanos, dos quais cinco estão em Alepo.

Os Frades Franciscanos foram convidados a deixar a cidade várias vezes. «As mesmas razões que nos podem levar a sair são aquelas que nos fazem ficar. Os cristãos que ainda estão aqui confiaram em nós, eles precisam de nós e nós precisamos deles. Queremos permanecer perto de todas aquelas pessoas que incessantemente batem à porta do nosso mosteiro, para receber alguma ajuda e conforto», frisa o padre Lufti. «Diria que o Senhor não nos deixa sozinhos se houver um pouco de consolação e de força para seguir em frente, porque o Senhor está presente e Ele é o Senhor da esperança, que nos ajuda a resistir e a esperar esta ressurreição depois do período da paixão e da morte», afirma o franciscano.


Convento da misericórdia

Em Agosto, devido aos combates, cerca de 100 pessoas refugiaram-se no mosteiro dos franciscanos. Na casa, explica o sacerdote, puderam encontrar «a força para viver e esperar por um futuro melhor». Os jovens encontraram um lugar onde se distraem com o desporto. «Há disparos, mas é muito comovedor ver um pouco da alegria destes jovens, a força de poder viver e de esperar um futuro verdadeiramente melhor», explicou o religioso. Entretanto, expressou a sua preocupação pelas crianças.

O padre Lufti indicou que só os mais pobres ficaram em Alepo, porque quando começou a guerra aqueles que tinham mais condições econômicas deixaram a cidade. «Atualmente em Alepo vivem os mais pobres. Procuramos sair ao seu encontro, não só oferecendo comida, água», mas também «abrindo este espaço de acolhimento, de assistência espiritual e psicológica. As pessoas em Alepo têm muita necessidade de serem escutadas», assinalou.

A casa dos Franciscanos também acolhe a comunidade cristã maronita que realiza as suas celebrações semanais na igreja do mosteiro, uma vez que as igrejas maronitas dos bairros circundantes foram completamente destruídas ou estão inabitáveis. «O nosso mosteiro é a sede de uma escola para surdos-mudos, um dos poucos centros deste tipo que ainda está operacional em Alepo. O acolhimento que nós tentamos oferecer incondicionalmente é uma expressão concreta das obras de misericórdia que a Igreja nos pede para fazer, especialmente neste Ano Santo da Misericórdia. Nós também partilhamos, com quem bate à nossa porta, o bem mais precioso que existe agora em Alepo, a água do poço que temos no nosso mosteiro.»

O sacerdote franciscano Ibrahim Alsabagh, da paróquia de São Francisco de Assis, em declarações realizadas à Fundação Ajuda à Igreja que Sofre, denunciava, em Julho passado, a intensidade dos ataques. O religioso afirmava que Alepo está a viver «os piores momentos da sua história», e que as pessoas «estão desesperadas e rezam de dia e de noite».

A «cidade dos mártires», como disse o Papa Francisco, tinha cerca de 150 000 católicos e era uma das maiores comunidades cristãs de toda a Síria. Calcula-se que, pelo menos, dois terços dos cristãos terão abandonado a cidade. Os que ficaram vivem principalmente na zona oeste da cidade, controlada pelo exército sírio, «onde, ao menos, têm direito a viver e a praticar a sua fé», como refere o padre Ibrahim. Os cristãos de Alepo estão a viver tempos de provação, incerteza e insegurança. «A lista de mártires é longa», assinala o religioso.

O Papa Francisco manifestou a sua «proximidade a todas as vítimas do desumano conflito na Síria» e apelou a um «cessar-fogo imediato» no país, durante a audiência pública com os peregrinos na Praça de São Pedro, no Vaticano, no passado dia 12 de Outubro. «É com urgência que renovo este apelo, implorando com todas as minhas forças aos responsáveis por este conflito, a fim de que haja um cessar-fogo imediato, implementado e respeitado pelo menos durante o tempo necessário para a evacuação das populações civis, sobretudo das crianças ainda apanhadas no meio destes bombardeamentos cruéis», disse Francisco.’
  

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