Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo d0 Padre Guy Consolmagno, SJ
Uma
instigante reflexão do astrônomo e padre jesuíta Guy Consolmagno, mundialmente
reconhecido diretor do Observatório do Vaticano
‘A Epifania é uma
festa especial para nós, astrônomos. De todas as pessoas que acorreram para ver
o recém-nascido Salvador, só os pastores e os astrônomos são recordados de modo
específico. Esta fama, é claro, tem um custo. A Epifania também é um tempo em
que somos bombardeados de pedidos para ‘explicar’ a estrela de Belém.
Johannes Kepler
tentou explicá-la como uma ‘nova’, produzida pela conjunção de planetas. Em 9
de outubro de 1604, ele calculou uma conjunção de Marte, Júpiter e Saturno; na
noite seguinte, de repente, apareceu na parte do céu entre Júpiter e Saturno
uma estrela brilhante. Kepler chegou à conclusão aparentemente óbvia, mas
incorreta, de que foi a conjunção dos planetas o que, de alguma forma, causou o
surgimento da nova estrela.
Hoje identificamos
aquela estrela como uma ‘supernova’, a última avistada em nossa galáxia. Entre
outras coisas, esta supernova inspirou em Galileu uma série de aulas sobre
astronomia e o levou à primeira utilização de um telescópio para estudar as
estrelas. Era 1609, o mesmo ano em que Kepler publicou a primeira das suas
famosas leis sobre o movimento planetário. Kepler teve a ideia de usar aquela
supernova para explicar a estrela de Belém depois de descobrir um livro do
polonês Laurentius Suslyga, que situava a data do nascimento de Jesus em torno
ao ano 4 antes da era cristã. Pressupondo que as grandes conjunções, como a
recém-observada, levassem ao surgimento de ‘novas estrelas’, ele decidiu
procurar tal conjunção no tempo do nascimento de Jesus.
Não é de admirar que
a tenha encontrado. E ele não foi o último a fazê-lo. Desde então, milhares de
estudiosos amadores têm examinado as conjunções para encontrar explicações
prováveis. O fato é que existe um número infinito de possíveis disposições
planetárias ou de cometas e estrelas que explodem e que podem coincidir com os
cálculos (numerosos) para se determinar a verdadeira data do nascimento de
Jesus. Uma pesquisa no site da Amazon.com, por exemplo, usando os termos ‘estrela
de Belém’, resulta em mais de quatro mil livros e vídeos à venda sobre o
assunto. E praticamente todos estão convencidos de que a sua argumentação está
correta. A maioria dessas explicações – talvez todas – são meras coincidências,
assim como a fortuita disposição dos planetas e da supernova que enganou Kepler
em 1604.
Um livro que
explicitamente não tenta dar uma explicação astronômica foi escrito por um
companheiro jesuíta no Observatório do Vaticano, Paul Muller, juntamente
comigo. Em vez de discutir sobre qual conjunção ‘funcionaria’ melhor, nós
colocamos uma pergunta diferente : que importância tem isso?
Não queremos ser
impertinentes. É interessante questionar o que é que há nessa história,
exatamente, de tão fascinante para tantas gerações de astrônomos e entusiastas.
Talvez, em parte, seja a esperança de que a ciência possa ‘provar’ que a Bíblia
diz a verdade; mas essa é uma falsa esperança, porque, falando como cientista,
eu sei o quanto essas provas podem ser frágeis (e eu, em particular, não
confiaria numa religião só porque a ciência a ‘demonstrou’). Por outro lado,
também em parte, entra em cena o elo entre a glória das estrelas à noite e a
glória do Salvador entre nós. É este, na minha convicção, o vínculo que Mateus
tentava estabelecer. A minha experiência como cientista me faz abordar a
história dos reis magos com um conjunto diferente de perguntas sem resposta. O
que os levou a partir em viagem e a se afastarem tanto do conforto de casa? O
que eles realmente procuravam?
Olhando para as
motivações que animam muitos dos meus colegas cientistas, não me custa
acreditar que os magos podem ter sido movidos por razões diferentes, tanto
profundas quanto profanas. Talvez quisessem verificar a precisão das suas
previsões astrológicas. Talvez quisessem se afastar de um chefe irritante ou de
uma vida familiar infeliz. Talvez procurassem um rei digno da sua veneração.
Outro mistério para mim é como reconheceram Jesus quando o encontraram. Na
época, tal como agora, as pessoas imersas em estudos, de acordo com o
estereótipo, tendiam e tendem a estar em menos sintonia com as realidades da
vida cotidiana. Pelo menos para mim, um bebê parece igual a outro. Eles, porém,
conseguiram entregar os seus presentes àquele Menino pobre, deitado na
manjedoura. E a parte talvez mais importante da história dos reis magos não tem
nada a ver com a estrela. Depois de partirem de casa, qualquer que tenha sido o
motivo, e depois de encontrarem aquele a quem reconheceram como rei, eles
fizeram algo que é de todo inesperado : voltaram para casa. Para perto do chefe
irritante ou da vida familiar infeliz. Para aqueles tediosos cálculos
astronômicos. Voltaram da sua busca de um rei, mesmo após tê-lo encontrado.
Mas, como nos conta Mateus, voltaram por outro caminho. Aquele encontro os
mudou. Não mudou, no entanto, a sua vida, o seu trabalho, o seu modo de
descobrir a verdade. Os ‘magos’ eram estudiosos, tais como os que hoje
trabalham no Observatório do Vaticano. Mas o estudo não é a única estrada rumo
à verdade. Os pastores também descobriram o Bebê na manjedoura. Foram
inspirados pelo canto dos anjos. E é estranho que, hoje, ninguém peça aos
pastores da atualidade para ‘explicarem’ aquele canto! O pe. James Kurzynski,
sacerdote da diocese de La Crosse, no Estado norte-americano de Wisconsin,
escreveu sobre este contraste no blog do Observatório do Vaticano. O pe.
Kurzynski é astrônomo amador, ou seja, um ‘mago’; mas é também um padre, um ‘pastor’
de almas. No final da sua reflexão, ele pergunta aos leitores : ‘Como é que
vocês chegam até a verdade? Vocês são ‘magos’ que seguem o rumo da razão
natural? Vocês são ‘pastores’ que seguem a revelação divina? Ou será que são um
pouco de cada?’.
O relato dos reis
magos nos inspira a olhar para o nosso próprio caminho. O que estamos
procurando? Por que estamos nessa busca? Como é que vamos reconhecer o que
buscávamos quando o tivermos encontrado? E somos corajosos o bastante para
levá-lo para casa depois de tê-lo achado?’
Fonte : *Artigo na íntegra
https://pt.aleteia.org/2016/01/06/o-dia-da-epifania-e-nos-somos-magos-ou-pastores/
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