Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo
Metropolitano de Belo Horizonte, MG
‘Causam perplexidade a crescente violência e a
força destruidora das indiferenças. As perseguições e o gosto mórbido de se
destruir reputações ou tratar, com espetacularização, a condição humana são
graves ameaças. E diante deste turbulento cenário, ainda surgem figuras que se
apresentam como a ‘força da moralização’,
mas agem com truculência e se autopromovem a partir da disseminação de notícias
falsas, criando confusões e semeando desarranjos. Há, assim, uma retroalimentação
das hostilidades, disputas, revides e, de modo preocupante, do espírito doentio
daqueles que querem ver ‘o circo pegar
fogo’.
Constata-se que o
coração das pessoas, projetado para ser da paz, se transforma em lugar que
abriga sentimentos de vingança, de apreço ao banditismo. Distancia-se, assim,
do sentido humanístico indispensável para alimentar a fraternidade e a
solidariedade. O processo crescente de desumanização conduz a sociedade ao
colapso. Os cenários são de guerra, o que é comprovado pelas estatísticas sobre
homicídios provocados pela falta de compromisso com a sacralidade da vida do
outro, que é irmão.
Na contramão da
indispensável e urgente sensibilização humana, o que se verifica é um processo
de petrificação dos corações, uma patologia. Afinal, quem cultiva o hábito de
praticar maldades é doente. As práticas que, apesar de sedutoras, levam pessoas
e instituições ao fracasso, são também indicações do grave sintoma da
devastação das referências humanísticas. Há uma perda de limites : as consequências
dos atos inadequados e imorais sequer são consideradas. Isso decorre da falta
de compromisso com a honestidade. A probidade, que deveria ser norteadora de
condutas, não tem seu valor reconhecido.
Uma sociedade
vivida neste horizonte confuso não tem força para recuperar-se de crises.
Carece de sabedoria para reencontrar caminhos e respostas. E as pessoas não
conseguem perceber o sentido e o alcance da vida como dom. Pelo contrário, as
condutas ficam emolduradas pelos estreitamentos humanísticos que levam a
cidadania a ser palco de teatralizações. Consequentemente, a vida
cotidiana distancia-se da felicidade, possível quando todos se reconhecem como
pertencentes a uma grande família – todos se percebendo como irmãos uns dos
outros.
É preciso um remédio
que tenha força de ação no coração humano. É lá que reside o problema. Chegue,
pois, aos corações, o remédio da compaixão, capaz de fazê-lo sede da
experiência do amor. Os processos que tendem a brutalizar o coração
humano precisam ser debelados. Isso inclui investimentos em segurança pública,
legislações, infraestrutura e, principalmente, promover, no ambiente familiar,
religioso, entre tantos outros, o remédio da compaixão. A compaixão permite o
desenvolvimento de competências, de responsabilidades, a recuperação do sentido
de irmandade, a alegria do pertencimento a um povo, o gosto de zelar por seu
patrimônio e o comprometimento com aqueles que precisam de ajuda. A patologia
do embrutecimento, por sua vez, leva à perda do sentido mais profundo da vida,
causando sequelas e trazendo prejuízos preocupantes - mortes, suicídios,
violências de todo tipo, indiferenças destruidoras. Por isso mesmo, precisa ser
tratada com o remédio da compaixão.
A compaixão não é
fraqueza, menos ainda conivência com os erros que requerem penas e correções. A
aprendizagem e a prática da compaixão, legado próprio da espiritualidade
cristã, é o remédio que trata o coração humano, fonte inesgotável para se lavar
e se purificar. É preciso reconhecer-se como necessitado desse remédio.
Vivenciar a Semana Santa, seguindo os passos de Jesus Cristo - a compaixão - é
tomar esse remédio para curar-se de muitos males, caminho para se tornar agente
construtor de uma vida nova, de um tempo novo e um exercício que permite educar
o coração para reconhecer a importância do outro, principalmente de quem é
pobre e indefeso.
Limpar o coração
de mágoas que geram vinganças e ressentimentos. Cultivar o gosto pelo bem e
pela verdade. Compreender a vida como dom. Abrir um ciclo novo para a própria
vida, na vivência e celebração da Semana Maior, a Semana Santa. Eis o
convite : o remédio da compaixão!’
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