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terça-feira, 11 de junho de 2024

Musicalidade e mansidão

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Ricardo Abrahão 

 

‘Tem circulado entre a fala de pacientes do meu consultório de psicanálise e pessoas da minha convivência diária a constatação de que, em geral, a maioria não tem escutado bem. Não são questões auditivas. São questões de escuta atenta. Então, reflito bastante sobre tudo o que me dizem e prefiro não encontrar ‘culpados’, ou seja, colocar a culpa em redes sociais e aparelhos digitais, o que muitos terapeutas tem feito. Minha preferência é pensar que não estamos nos concentrando o suficiente na musicalidade da escuta. Afinal, música e escuta necessitam concentração.

Proponho uma reflexão baseada na escuta musical : Jesus concentrou com precisão o coração como o lugar onde a escuta é eficaz. Ele diz que o caminho é fazer como Ele mesmo, ou seja, sendo manso e humilde de coração. Mansidão e humildade são palavras que fundamentam a história da escuta humana. Os sábios nos guiaram por caminhos seguros e foram homens de excelente escuta. Atualmente há uma grande procura sobre a música como ferramenta de cura, meditação, equilíbrio e paz.

O cristianismo é mansidão e humildade e, para ser chamada música cristã, os sons musicais na Igreja necessitam veicular e promover acesso à mansidão e à humildade no coração humano. Do contrário, torna-se muito grande o risco de colocar o coração nas deturpações da vida. O Coração de Jesus é a música do Amor por excelência.

É tempo de parar e aprender a escutar a Voz que canta no Sagrado Coração de Jesus, evitando a dispersão e promovendo a concentração. A musicalidade do Coração Divino rege acordes que conduzem, os que verdadeiramente escutam, ao caminho seguro da verdadeira paz. Nossa única tarefa é aprender a escutar sempre. Que o Amor seja nossa música!’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/musicalidade-e-mansidao.html

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Sinceridade e direção espiritual

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo do Padre José Eduardo


Costumamos chamar de ‘direção espiritual’ esse meio de formação da consciência que alinha o indivíduo com o seu fim sobrenatural, primeiramente em nível moral, mas sobretudo em nível ascético. Ora, a matéria desse direcionamento outra coisa não é senão a vida mesma do dirigido, que se expõe com total simplicidade ao médico que lhe pode ajudar a não fazer a sua própria vontade, mas a vontade de Deus.

A direção espiritual, portanto, deveria ser o momento em que nós livremente nos abrimos, expondo todos os aspectos da nossa personalidade perante o infinito, contando com a graça de estado daquele que nos orienta para sermos tratados em todos os pontos da nossa indolência, da nossa claudicação, da nossa fragilidade.

Se o ponto mais alto da maturidade humana é viver, por assim dizer, ‘in conspectu Dei’, na presença de Deus, é justamente nesses momentos em que nós o comprovamos para nós mesmos. Para quem quer ser santo, a sinceridade deixa de ser uma obrigação e passa a ser o tema mesmo de sua existência, com todos os seus ônus, visto que ela não é senão um aspecto daquela humildade fundamental, sem a qual jamais podemos ser verdadeiramente conscientes diante de Deus.

O homem vaidoso, insincero, que quer parecer bom aos olhos do seu diretor e, por isso, oculta-lhe, talvez com o pretexto de não o decepcionar, as suas próprias misérias, nada mais é que um extraviado que fez a opção de perder-se de modo cada vez mais irreversível. Não há nada mais patético do que um dirigido que se apresenta como quem lesse a ‘positio’ do seu próprio processo de beatificação : tudo são qualidades, tudo são méritos, recheados de lirismo pseudo-místico, de poesia e de orgulho espiritual.

Quem quer parecer santo diante do seu diretor deve simplesmente interromper esta encenação e reconhecer humildemente o quanto é hipócrita, cínico e palhaço, pois o crescimento em santidade é tão maior quanto maior é o reconhecimento da nossa precariedade, do nosso nada. E não se trata de um reconhecimento retórico, mas da coragem de demolir a própria autoimagem e demonstrar-se como verdadeiramente se é, com todas as sutilezas da sua própria canalhice, ignorância, fraqueza e malícia.

Ir à direção espiritual é dispor-se para falar mal de si mesmo, para revelar-se em toda a amplidão da sua própria virulência, a fim de receber o remédio adequado.

Um diretor experiente sabe quando está lidando com uma pessoa ou com um personagem. Pessoas têm fraquezas, lutas, tentações; personagens têm proezas, para o bem ou para o mal: suas virtudes são façanhas de Hércules, seus pecados são as desventuras de Hazazel e os seus problemas são o tormento de Sísifo; tudo para esconder, por detrás de desproporções, a mediocridade real de sua miséria.

Não existe santidade sem humildade. Qualquer sacerdote sabe disso. E, para além da parlóquia inútil, os santos têm virtudes reais, radicais, heroicas.

Portanto, se alguém pretende autobeatificar-se, não está buscando um diretor espiritual, mas um fã. E isso é uma grande falta contra a justiça e a caridade. Se o dirigido não tem pena de sua própria alma, vitimada por sua própria mentira e fingimento, ao menos deveria ter pena de perder o próprio tempo com conversa tão inútil, bem como deveria ter misericórdia de fazer perder o tempo àquele pobre sacerdote, que tem muitas ovelhas para cuidar e que não pode se dar ao luxo de trabalhar inutilmente, deixando de rezar e de estudar para simplesmente debalde pastorar bodes.

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://pt.aleteia.org/2023/11/23/sinceridade-e-direcao-espiritual/

sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Por que às vezes parece que Deus não nos escuta?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
De Michael Angelo Immenraet - Dominio público

*Artigo de Mónica Muñoz 


‘Quando as coisas vão bem, muitas pessoas raramente se lembram de Deus. Mas, assim que chega a provação, elas imediatamente voltam os olhos para os céus e clamam pela ajuda divina. Não que isto seja errado : mas bem podemos falar com Deus o tempo todo, tanto nos bons quanto nos maus momentos.

Acontece com as nossas orações o mesmo que ocorreu com a mulher cananeia mencionada no Evangelho de São Mateus : Jesus e os seus discípulos tinham ido para Tiro e Sidônia, num território que nada tinha a ver com o povo eleito. E ali estão eles quando uma mulher começa a gritar : ‘Senhor, Filho de Davi, tem piedade de mim! A minha filha está terrivelmente atormentada por um demônio’ (cf. Mt 15,22). Mas o Senhor não lhe respondeu.

Insista sem desânimo

O relato prossegue falando da intercessão dos discípulos, que pedem a Jesus que a atenda porque ela está gritando atrás deles – o que os irritava. Mas o Senhor lhes responde : ‘Fui enviado apenas às ovelhas perdidas do povo de Israel’. Apesar disso, a mulher não se retira nem se deixa derrotar : volta ao ataque, vai para a frente do grupo e se prostra aos pés de Jesus, implorando novamente, já diante dele : ‘Senhor, ajuda-me!’ (cf. Mt 15, 25).

Vem então a resposta dura e até ofensiva do Senhor para provar até onde aquela mãe é capaz de ir, suplicando um milagre não para si, mas para a filha : ‘Não é certo tirar o pão dos filhos para jogá-lo aos cachorrinhos’ (cf. Mt 15, 26), diz Jesus. Ela então apela certeiramente à misericórdia de Deus, alcançando assim o seu objetivo : ‘E, mesmo assim, Senhor, os cachorrinhos comem as migalhas que caem da mesa de seus donos!’ (cf. Mt 15, 27).

A humildade sempre conquistará o Senhor

Jesus finalmente cede, atendendo ao pedido que lhe foi solicitado com clamores insistentes, com uma frase em que se lê uma pitada de admiração por aquela incansável cananeia : ‘Mulher, quão grande é a tua fé! Que o teu desejo se torne realidade’. E, naquele momento, a sua filha foi curada (cf. Mt 15, 28).

Deus sempre nos escuta, mas quer que não nos cansemos de pedir : e não é por capricho, mas sim para que nos acostumemos a confiar-nos totalmente a Ele.

Oremos, portanto, incansavelmente – e insistamos para que o Senhor ouça as nossas orações humildes e sinceras. Tenhamos a certeza de que, mais cedo ou mais tarde, Ele nos concederá o que for conveniente para a nossa salvação.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://pt.aleteia.org/2023/09/04/por-que-as-vezes-parece-que-deus-nao-nos-escuta/

sábado, 26 de dezembro de 2020

Natal: tempo propício para meditar sobre a humildade

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)        

*Artigo de Philip Kosloski,

escritor e designer gráfico

 

‘Enquanto a Quaresma e a Semana Santa se concentram no imenso sofrimento de Jesus por nós, o Advento e o Natal representam a oportunidade perfeita para se concentrar na humildade e na pobreza.

Isso ganha vida principalmente quando sentamos e meditamos na cena humilde do nascimento de Jesus. Muitas vezes, os presépios modernos não comunicam essa verdade central com força suficiente, pois o estábulo moderno pode parecer quase aconchegante e quente, em vez do que provavelmente era a realidade fria, bagunçada e brutal por trás de tudo.

Uma meditação encontrada em um livro de oração do século XIX destaca esse profundo mistério :

‘É meia-noite. O vento do inverno é frio. Veja um estábulo sem conforto, em parte galpão e em parte caverna, escavado ao lado de uma rocha. Um lugar pobre mesmo. A brisa afiada encontra seu caminho livremente. Nesse estábulo está um bebê. Seu único berço é uma manjedoura na qual o gado se alimenta. Ele está deitado sob a palha áspera – um bebê recém-nascido. Seus pequenos membros estão enrolados em faixas, como as crianças dos mais pobres.’

Sente-se e imagine essa cena por alguns minutos. Pense na pobreza de tudo ao redor e quão desconfortável deve ter sido! Estar em um quarto de hospital moderno não é nada bom, mas pense em como era dar à luz em tais circunstâncias.

A cena deve nos levar a pedir a Deus o dom da humildade e a examinar nossas próprias vidas, perguntando a nós mesmos se nossos confortos modernos têm alguma influência sobre nossas vidas espirituais.

Aqui está uma breve oração que vem após a meditação acima. Peça a Deus que nos preencha com um espírito de humildade :

Jesus, agradeço-te por ter vindo assim. Grande Deus, como te humilhaste! Parece demais, maravilhoso demais, mas sei que é verdade.Nada é maravilhoso demais para o Teu grande e eterno amor.Por amor a Ti, serei humilde. Tira o meu orgulho e a minha vontade própria.Maria, eu te agradeço e te abençôo por amar a Deus tão nobremente, tão puramente e tão humildemente, que Ele nos deu Seu querido Filho através de ti. Roga a esse Filho, para que eu tenha a graça de aprender com Ele e contigo a ser manso e humilde de coração. José, pai adotivo de Jesus, o coração daquela criança santa bate por mim. Maria é minha mãe; ora por mim para que eu seja verdadeiramente humilde e pertença a esta Sagrada Família, agora e na hora da minha morte. Amém.

 

Fonte : *Artigo na íntegra https://pt.aleteia.org/2019/12/11/natal-tempo-propicio-para-meditar-sobre-a-humildade/

segunda-feira, 27 de julho de 2020

Delírios e lições

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)        

  Achar-se a única referência ou a exclusiva fonte para se alcançar soluções é não se perceber como aprendiz

*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,

Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG

Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

 

‘A pandemia da Covid-19 expõe, ao mesmo tempo, delírios e lições. Os delírios tornam-se evidentes nos descompassos sociais, a exemplo do descaso com os pobres, ou a partir das inabilidades dos representantes do povo. Situações que pedem mudanças, a partir do aprendizado de muitas lições. Esse aprendizado requer renovação de mentalidades, de práticas e de estilos de vida. Um reconhecimento dos equívocos em determinadas escolhas que incidem não apenas no mundo da política, mas também no campo da cultura e, lamentavelmente, até mesmo na esfera religiosa. Diante da necessidade de se aprender muitas lições, oportuno é lembrar-se de que a eficácia na aprendizagem depende de um importante aspecto : as pessoas, indistintamente, assumirem a condição de discípulos, uma nuance compartilhada por Jesus, em sua maestria.

Ensina muito e bem quem se coloca na condição de aprendiz. Essa condição permite o compartilhamento de convicções e experiências. E a atitude de compartilhar é vetor de mudanças, caminho para alcançar metas capazes de responder ao clamor do povo sofrido. Por isso, precisam estar matriculados na condição de aprendizes, prioritariamente, os que sufragam seus nomes em eleições, pois é lastimável constatar o despreparo de representantes do povo no exercício de suas funções. Falta substrato humanístico e há indiferença em relação à meta de se edificar uma sociedade solidária. Quando se analisa o conjunto de situações da atualidade, avaliando o desempenho de líderes de diferentes lugares do mundo, chega-se facilmente a uma conclusão : mudanças são necessárias. Percebe-se que a humanidade está aprisionada em entendimentos equivocados. E a qualidade de entendimentos é importante termômetro para avaliar a condição de uma civilização.

Essa qualidade depende dos processos educativos responsáveis pela formação do ser humano. Por isso mesmo, é preocupante quando um país convive com o sucateamento do campo educacional, confiando-o a mãos inábeis, a agentes pouco lúcidos. A consequência desse mal é a desconsideração e o desperdício da capacidade humana para promover o desenvolvimento integral da sociedade. Urgente é, pois, investir educativamente no desenvolvimento de entendimentos adequados, de pessoas capazes de conduzir a sociedade a partir de valores que sustentam a vida, promovendo relações sociais, políticas e culturais justas. Esses processos educativos qualificados exigem uma condição fundamental : cada pessoa se coloque na condição de aprendiz.

Ninguém pode acreditar que tudo sabe, particularmente no mundo contemporâneo, caracterizado também pela velocidade das mudanças e por suas muitas complexidades. Perceber-se, permanentemente, como aprendiz é também caminho para vencer delírios, que se propagam especialmente neste tempo de pandemia, afetando mentes, vidas e corações. Há os que se acham onipotentes. Outros se tornam vítimas do medo. E muitos se apegam a convicções equivocadas, que podem levar a graves enfraquecimentos institucionais, a partir de extremismos, por exemplo.

Achar-se a única referência ou a exclusiva fonte para se alcançar soluções é não se perceber como aprendiz. Isso leva a equívocos nos diferentes campos da vida, inclusive em contextos institucionais.  Trata-se de uma postura que deve, urgentemente, ser substituída pela humildade. Somente assim é possível seguir um percurso que vai possibilitar diálogos e, consequentemente, permitir encontrar a solução mais eficaz para diferentes desafios. Reconhecer-se aprendiz, sempre e de modo humilde, é uma atitude indispensável para ajudar a recompor os tecidos socioculturais, político e religioso da civilização contemporânea, sanando delírios, enquanto são aprendidas novas lições.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/artigo/8942/2020/07/delirios-e-licoes/


sábado, 16 de maio de 2020

Uma Igreja humilde para uma humanidade sofredora

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

The Compass Magazine Living in the Shadow of the Cross: How Jesus ...
*Artigo d0 Padre Federico Lombardi, SJ 




‘Na conclusão do Grande Jubileu do ano 2000 que ele viveu e nos convidou a viver como um grande encontro entre a graça de Cristo e a história da humanidade, João Paulo II escreveu à Igreja uma bela Carta intitulada : ‘No início do Terceiro Milênio’, na qual ressoavam as palavras de Jesus a Pedro : ‘Duc in altum… Faze-te ao largo; lançai vossas redes para a pesca’ (Lc 5, 4). O Papa nos convidou a ‘lembrar o passado, viver o presente com paixão, e abrir-nos com confiança ao futuro’, porque ‘Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e nos séculos’. Como sabemos, Papa Francisco retomou e relançou o tema falando desde o início do seu pontificado da ‘Igreja em saída’, uma Igreja evangelizadora animada pelo Espírito que lhe foi doado por Cristo ressuscitado.

Na noite de 12 de outubro de 2012, o Papa Bento XVI fez um breve discurso da mesma janela da qual, 50 anos antes, João XXIII havia saudado, sob o olhar benevolente da Lua, a multidão que tinha afluído à Praça São Pedro no final do dia de abertura do Concílio. Enquanto Bento, com o olhar dirigido para o alto, fez uma reflexão que foi muito marcante, pois não suscitou o desejado entusiasmo fácil, mas sim – mesmo em confiança – inspirava grande humildade, característica do final de seu pontificado. Ele recordou como nos 50 anos anteriores a Igreja havia experimentado o pecado, o joio no meio do trigo, a tempestade e do vento contrário. Mas também o fogo do Espírito, o fogo de Cristo. Porém como um fogo que não é devorador, mas humilde e silencioso, uma pequena chama que suscita carismas de bondade e caridade que iluminam o mundo e testemunham a sua presença conosco.

À medida que Pentecostes se aproxima, penso nas palavras de nossos três papas do Terceiro Milênio. Na realidade, este novo Milênio, em que entramos há vinte anos, não tem sido, no conjunto, uma era de progresso luminoso para a humanidade. Abriu-se com o 11 de setembro de 2001 e com a guerra do Golfo, depois tivemos a grande crise econômica e a guerra mundial ‘aos pedaços’, a destruição da Síria e da Líbia, o agravamento da crise ambiental, muitos outros problemas, e agora a pandemia global com suas consequências, experiência inédita que marca este papado. Certamente não faltam novos sucessos científicos e progressos em saúde, educação e comunicação, por isso não seria correto apressar balanços negativos. Mas certamente não podemos falar de um caminho linear e seguro para a humanidade em direção ao melhor. A experiência da pandemia, mesmo que seja superada, é certamente uma experiência comum de incerteza, de insegurança, de dificuldades em governar o caminho cada vez mais complexo da sociedade contemporânea. Não sabemos se no futuro vamos ler isso como uma oportunidade de crescimento solidário ou de novas tensões internacionais e internas e desequilíbrios sociais. Provavelmente, ambas as dimensões serão misturadas: o trigo e o joio.

A Igreja deste início de milênio, do ponto de vista humano, não é forte. Sua fé é testada pelas desertificações espirituais de nosso tempo. Sua credibilidade é testada pela humilhação e pela sombra do escândalo. A história continua e a Igreja continua a aprender que sua única força verdadeira é a fé em Jesus Cristo Ressuscitado e o dom de seu Espírito. Um frágil vaso de barro no qual está contido o tesouro de um poder de vida além da morte. Seremos nós uma Igreja humilde capaz de acompanhar fraternalmente uma humanidade provada, com caridade e bondade? Com uma caridade tão difundida que também anima as inteligências e as forças sociais a buscar e encontrar os caminhos do bem comum e da melhor vida? Uma Igreja do ‘lava-pés’ do nosso tempo, como diz o Papa Francisco? Em alto mar, num mar imóvel e sempre desconhecido para todos nós, mas nunca estranho pelo amor de Deus.

Na maravilhosa Sequência de Pentecostes invocamos o dom do Espírito como pai dos pobres e luz dos corações, como consolador e conforto, como força que cura as culpas, a aridez, as feridas, que aquece o que está gelado, que orienta o que está mal orientado. Oferecer ao Espírito do Senhor um espaço aberto de expectativa e desejo, um espaço concreto de mentes e corações, de almas e carne humana, para que possa operar e manifestar-se no tecido profundo da nossa humanidade - o das guerras e pandemias - como um poder de salvação da fragilidade e solidão, da aridez, da confusão, dos enganos das ilusões e do desespero, como um poder de esperança de vida eterna. Isto pode fazer uma Igreja humilde, irmã, companheira e serva de uma humanidade sofredora. E isso é o mais importante.



Fonte :
*Artigo na íntegra

terça-feira, 19 de novembro de 2019

Como a humildade leva à gratidão, segundo São Vicente de Paulo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Philip Kosloski,
escritor e designer gráfico


‘Muitas pessoas, religiosos ou leigos, apontam para a importância da gratidão na busca de uma vida feliz. A capacidade de agradecer a Deus e aos outros é uma habilidade essencial para todos nós aprendermos.

No entanto, é mais fácil falar do que fazer, pois temos uma tendência natural de tomar as coisas como garantidas, especialmente se nossas vidas são abençoadas com muitos bens materiais. De fato, é mais fácil para nós querer mais do que agradecer pelo que temos.

A chave para superar essa inclinação gananciosa e promover um espírito de ação de graças é a virtude da humildade.

São Vicente de Paulo explica esse princípio espiritual :

Uma apreciação viva da graça dada a você deve torná-lo humilde, pois a apreciação gera gratidão … Qualquer um que considerar calmamente o que fez sem Deus não pode deixar de perceber que o que faz com Deus não é mérito próprio.

Ao mesmo tempo, São Vicente de Paulo mostra como a gratidão pode levar à humildade :

Nada tende a nos humilhar diante da misericórdia de Deus como a multidão de Seus dons para conosco; assim como nada tende a nos humilhar diante de Sua justiça como a multidão de nossos erros. Vamos considerar o que Ele fez por nós.

A Virgem Maria é um dos principais exemplos de humildade. Ela sempre agradeceu a Deus por seus feitos maravilhosos :

Foi nesse espírito que a Santíssima Virgem confessou que Deus lhe havia feito ‘grandes coisas’; apenas para que ela possa se humilhar e exaltá-Lo. ‘Minha alma glorifica o Senhor’, disse ela, em razão dos presentes que Ele havia lhe dado.

Se tivermos dificuldade em agradecer por tudo o que nos foi dado, promovamos em nossa alma um espírito de humildade, reconhecendo a presença de Deus em nossas vidas. Ele é quem nos guia e nos fornece diariamente.

Quando reconhecemos o cuidado providencial de Deus por nós, podemos elevar nossos corações a Ele e agradecê-lo por tudo o que Ele nos deu. Esse mesmo espírito de humildade também direcionará nossas ações para os outros, reconhecendo o quão dependentes somos das pessoas e das coisas que elas fazem por nós.

Gratidão e humildade andam de mãos dadas e ambos nos ajudam a desvendar a chave para uma vida cheia de alegria.’


Fonte :

domingo, 13 de outubro de 2019

Passamos a vida à espera. De quê?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Marta Arrais,
cronista


Passamos a vida (e o tempo) à espera. À espera que a sorte mude. À espera que o vento não seja tão frio. À espera que nos devolvam a chamada. À espera que se lembrem que existimos. À espera que nos atendam num balcão, numa fila, numa loja. À espera do amor-para-sempre. À espera da oportunidade que nos mude a vida. À espera do momento certo para começar a fazer tudo como deve ser. À espera que nos peçam desculpas. À espera que nos perdoem. À espera do Verão. Dos dias de sol e do calor a tostar a pele. À espera que a maré desça para não perdermos o pé. À espera que o país fique melhor. À espera que se acabem os dias tristes. À espera que se acabem as dívidas (as financeiras e as outras). À espera que nos apreciem, apenas, por aquilo que somos e não por aquilo que podemos oferecer. À espera no trânsito que não anda. À espera do verde que não cai. À espera da felicidade que os romances mais bonitos nos prometeram. À espera do jantar, no restaurante. À espera que o arroz fique no ponto. À espera que se acabe a fome nos lugares mais sujos e mais recônditos do mundo. À espera. De tudo. De todos. De tanto.

No entanto, enquanto esperamos, podemos aprender lições valiosas : a lição (duríssima) da paciência. A lição da humildade de quem sabe estar no seu lugar e esperar pela sua vez. A lição de deixar acontecer cada coisa na janela do seu tempo. A lição de valorizar o futuro que espreita de mansinho e que não se impõe.

Precisamos muito de aprender a esperar melhor. Com mais alegria. Com mais paciência. Com mais coragem. Ninguém gosta de esperar. É sempre tarde para quem está à espera. E é sempre difícil deixar que o tempo passe sem nos aborrecermos com ele. E com a sua velocidade-tartaruga.

Aprende a esperar, mas aprende, também, o momento certo para deixar de o fazer. Quem decide esperar para sempre deixa de estar à espera e passa a ser refém de uma promessa que pode não se cumprir.

Aprende a esperar. Aprende a esquecer. Aprende a colocar ponto final e a fazer parágrafo.

Estás à espera de quê?


Fonte :

sexta-feira, 31 de maio de 2019

Mística dos jardins monásticos se adapta aos novos tempos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Paz e tranquilidade no mosteiro beneditino Quarr Abbey na Ilha de Wight na Grã-Bretanha.
Paz e tranquilidade no mosteiro beneditino Quarr Abbey,
na Ilha de Wight na Grã-Bretanha

*Artigo de Paula Boyer,
colunista da La Croix International
Tradução : Ramón Lara


‘Desde a Idade Média, os monges criaram jardins em harmonia com seu ideal de vida. Agora, eles estão se abrindo para práticas ecológicas.

De onde vêm os jardins monásticos? ‘Tudo vem da Regra de São Bento [de Núrsia]’, diz Frei Thierry Barbeau da Abadia Beneditina de Solesmes (Sarthe).

De acordo com esta regra, um monastério deve, tanto quanto possível, ter água, um moinho, um jardim e oficinas, como diz a regra : ‘Seja, porém, o mosteiro, se possível, construído de tal modo que todas as coisas necessárias, isto é, água, moinho, horta e os diversos ofícios, se exerçam dentro dele, para que não haja necessidade de os monges vaguearem fora, porque, de nenhum modo convém às suas almas’ (Capítulo 66).

A ociosidade é inimiga da alma; por isso, em certas horas devem ocupar-se os irmãos com o trabalho manual, e em outras horas com a leitura espiritual’, observa o capítulo 48.

O jardim é propício para este trabalho manual.

Ao fazer isso, o monge tem que lidar com realidades naturais que não domina’, diz Barbeau. Cultivar plantas requer muita atenção e humildade. É preciso aceitar as leis da natureza, aprender a respeitar os ritmos naturais, inclusive nos irmãos. É um tipo de ecologia da alma’.

O jardim monástico é também um espaço de vida contemplativa, um local de relaxamento e recreação, de descanso para a alma e o corpo. Entre os beneditinos, o jardim é o espaço que permite o encontro dos irmãos durante a recreação.

É diferente para os cartuxos, aqueles eremitas religiosos que, de acordo com a regra de São Bruno, vivem essencialmente na solidão, cada um tendo um pequeno jardim ligado à sua cela.

Por que o jardim monástico medieval foi estruturado?

Na Idade Média, Deus estava no centro de tudo, e coisas como as plantas eram apreciadas pelo seu conteúdo simbólico. O jardim monástico é, portanto, acima de tudo, o do pátio do claustro (ou pequeno prado).

O claustro é um lugar de silêncio geralmente reservado para a leitura, a meditação e a oração solitária’, diz Barbeau. ‘Seu jardim, simples e modesto, com um design sóbrio e sem muita ornamentação, não deixa de recordar o alto significado simbólico que também está ligado a este lugar intimista – o Paraíso ou a Virgem (Hortus conclusus, jardim fechado, atribuição dada a Maria e que se refere a Ct 4,12) – onde a água de uma fonte ou um manancial flui’.

Naquela época, existiam outros jardins no recinto do mosteiro : uma horta, um pomar, um jardim de ervas, um jardim de flores destinadas a embelezar os altares e, de acordo com a região, um vinhedo para o vinho de missa. Cada uma dessas especialidades fica em espaços adjacentes ao edifício do serviço ao qual está ligado : a cozinha, a enfermaria, a igreja.

É pelo menos assim que esses jardins aparecem no referido Plano de São Galo, que apresenta um modelo ideal para um mosteiro construído na primeira metade do século 11, na época da reforma monástica defendida por São Bento de Aniane’ como Barbeau explica.

De maneira ainda mais precisa, esse plano também indica as plantas a cultivar.

Como os jardins monásticos evoluíram?

A organização sugerida no plano de São Galo dificilmente sofreu alguma modificação até o século XVII. Necessidades domésticas são movidas para o fundo e os espaços verdes, especialmente os dos grandes mosteiros que foram reconstruídos, são planejados de acordo com novos critérios.

Lotes cada vez maiores são transformados em jardins de ‘prazer’ que mapeiam as perspectivas e se abrem para a paisagem circundante, como as do Le Nôtre.

Uma certa sobriedade permanece, apesar de tudo, já que os jardins monásticos continuam a ser lugares de meditação e relaxamento para os monges. No entanto, esses espaços perdem um pouco de sua especificidade seguindo a evolução geral da arte dos jardins. Isso também está relacionado à mudança na vida monástica, mais aberta ao mundo exterior.

Quais são as características dos jardins modernos?

Com a crise das vocações, as mãos, as habilidades e o dinheiro são muitas vezes escassos. As comunidades, que cada dia ficavam menores, tendiam a sacrificar a horta e só mantinham um ou alguns jardins de lazer, onde ainda reina a ordem e a harmonia querida dos discípulos de São Bento, como na Abadia de Solesmes (Sarthe), e que são propícios para caminhar e para a meditação.

No entanto, há cerca de 10 anos, os mosteiros, particularmente aqueles que mantiveram um jardim ‘utilitário’, adotaram práticas mais ecológicas para fornecer alimentos naturais, conservar a natureza e cuidar da Criação, que é um presente de Deus.
Em 2015, a encíclica Laudato Si confirmou essas escolhas e acelerou o movimento. Atualmente, existe um verdadeiro entusiasmo pelos tratamentos naturais, pela agricultura biológica e até pela permacultura, esta ‘cultura de permanência’ mais baseada no ecossistema local, porque é muito mais econômica em energia e trabalho e respeita os seres humanos e as suas relações mútuas.

Quinze anos atrás, a preocupação pela natureza já fazia parte da nossa vida; o irmão encarregado da horta fizera estágios, nomeadamente em Lanza del Vasto’, diz o padre David, um abade em En Calcat (Tarn), que enfatiza ‘o gosto muito forte pelo cuidado do solo entre os jovens monges’. Ele se alegra com o fato desta escolha os obrigar a criar ‘ligações muito fortes’ com outros mosteiros e com leigos competentes.

Ainda temos muitas adaptações a serem feitas e muito espaço para cobrir’, acrescenta. ‘É toda a vida monástica que precisa ser repensada à luz da ecologia integral’.

Na Abadia de Ligugé, em Vienne, o padre Joseph-Marie, tesoureiro e chefe da horta, e Jacques Longchamps, um visitante regular, optaram há dois anos muito pragmaticamente por uma mudança gradual para a permacultura ‘porque nada mais estava crescendo na horta, que era orgânica, mas cujo solo estava completamente exausto’.

Entretanto, sem dúvida alguma, foram as irmãs ortodoxas do Mosteiro de Solan (Gard) – que cultivam uma vinha, um pomar, uma horta e uma floresta -  quem primeiro adotou, em 1992, a abordagem mais radical. Deve ser dito que elas são aconselhados por Pierre Rabhi, agricultor, escritor e filósofo francês de origem argelina. Sua abordagem espiritual é incorporada na prática das freiras, na qual é a natureza quem comanda.’


Fonte :

domingo, 7 de abril de 2019

Autênticos e coerentes

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 As pessoas parecem se habituar, cada vez mais, com a mentira e, consequentemente, se distanciam da verdade
*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG



As derrocadas, cada vez mais frequentes, sofridas por toda a sociedade exigem novas atitudes, sob pena de se aumentar o enorme precipício que se interpõe nos caminhos da humanidade. Não se trata aqui de fazer terrorismo, mas alertar para os prejuízos em decorrência da falta de comprometimento com a autenticidade e a coerência. Não se pode permitir que esses princípios cedam lugar à inversão de valores, a exemplo da idolatria do dinheiro, que faz crescer a indiferença entre as pessoas e à Casa Comum. É urgente que todos reconheçam : buscar somente o próprio bem-estar, de modo egoísta, submetendo tudo à lógica do dinheiro, impede o êxito dos esforços para se alcançar a verdadeira paz. Uma atitude, comum e patológica, que torna a vida um pesadelo, contribuindo, paradoxalmente, para alimentar as mazelas que vão atingir, cedo ou tarde, os que se percebem seguros no seu bem-estar, ancorados somente no que possuem.
 
A necessária correção de rumos exige, assim, a superação do egoísmo e da indiferença. Nesse sentido, um caminho seguro e aberto a todos é acolher a convocação redentora deste tempo da Quaresma, que vem do coração do Mestre e Salvador Jesus : convertei-vos e crede no Evangelho. Quem acolhe esse convite com humildade consegue engajar-se verdadeiramente nas suas comunidades familiar, religiosa, governamental e em tantas outras, de modo autêntico e coerente, indo além do simples investimento no acúmulo de ganhos pessoais, das ações fundamentadas nas futilidades e vaidades.

Mas acolher o convite de Jesus é também um desafio, neste tempo de tantas polarizações, comprovadamente perigosas. Quem age de modo coerente com o Evangelho não pode enrijecer-se nos estreitamentos de mentalidades e de juízos tendenciosos, distantes da verdade, da justiça e, consequentemente, do amor. Por isso mesmo, o tempo da Quaresma pede a cada pessoa compromisso com a humildade na vivência do jejum, da oração e da caridade – dedicação, principalmente, aos que mais precisam de amparo. Caminho bem diferente do que é trilhado por quem se contenta com o fracasso dos outros ou se dedica a propagar mentiras para conquistar benesses e comodidades.

Lamentavelmente, a mentira é também um mal que se expande velozmente no mundo contemporâneo, contaminando os mais diversos tipos de relações. As pessoas parecem se habituar, cada vez mais, com a mentira e, consequentemente, se distanciam da verdade. Oportuno é lembrar o que diz Santo Agostinho, quando relata ter visto muitas pessoas que enganam outras, mas jamais ter encontrado alguém que gostasse de ser enganado. Se todos assumissem o propósito de nunca mentir por não apreciar o prejuízo de ser enganado, a realidade mudaria para melhor e a verdade seria reconhecida, de fato, como bem imprescindível. Há, pois, de se tomar consciência sobre a negatividade ética das mais diversas formas da mentira – a que é dita sobre os outros, a que se propaga para arquitetar a corrupção, a que busca assegurar cargos nas instituições e também a que alimenta ilusões sobre si mesmo.

Enfrentar a mentira e as muitas crises que ameaçam a humanidade é uma urgência. A sincera oração a Deus, inspirada pelas palavras de Santo Agostinho, contribui para a superação desse desafio, qualificando a própria interioridade : ‘Fazei que eu Vos conheça, ó Conhecedor de mim mesmo, sim, que Vos conheça como de Vós sou conhecido. Ó virtude da minha alma, entrai nela, adaptai-a a Vós, para a terdes sem mancha e sem ruga’. Todos tenham, assim, iluminados pela fé, oportunidade de investir mais na autenticidade e na coerência, alicerces  imprescindíveis para a edificação da própria interioridade.’


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