Este artigo, gentilmente cedido por Dom
Lourenço Palata Viola, OSB,
monge beneditino do Mosteiro de São Bento de São
Paulo,
Seremos acompanhados pelo
protomártir Estevão, aquele que primeiro teve a honra de testemunhar sua fé
através da efusão de seu sangue a semelhança de Jesus Cristo.
Sabemos pelo relato de
São Lucas que o número dos que aderiam à fé aumentava a cada dia e assim os
apóstolos já não estavam mais conseguindo atender a todos aqueles que desejavam
escutar a Boa Nova da Salvação. Estevão é um dos sete homens cheios de fé e do
Espírito Santo que foram escolhidos pela comunidade de Jerusalém tendo em vista
auxiliar o grupo apostólico no anúncio da Palavra e na prática da caridade.
Particularmente tudo isso
efetuou-se devido ao caso das viúvas de língua grega que diziam “não mais
estarem sendo assistidas no serviço diário” (At 6,1), ou seja, sabemos que os
apóstolos tinham um maior domínio sobre o aramaico e nessa língua proferiam
suas pregações, assim sendo, o serviço diário das viúvas, as quais se reuniam
num grupo a parte conforme as divisões e costumes não apenas para comerem, mas
também para serem instruídas sofria as consequências dessa disparidade
linguística e as mesmas não conseguiam entender as instruções ministradas pelos
apóstolos achando-se assim privadas da Boa Nova.
Estevão, assim como os
outros seis “homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria”
(At 6,3) são portadores de nomes de origem grega, e ainda mais, um deles,
Nicolau era proveniente de Antioquia, e portanto, era um judeu convertido da
Diáspora. Esses homens seriam testemunhas da fé, teriam como missão proclamar a
Palavra aos não crentes, aqueles que estão às mesas e não no Templo,
ofereceriam a Palavra de Deus e professariam a Fé até mesmo com o derramamento
de seu sangue, se necessário fosse, como no caso de Estevão.
Coroado, eis o
significado do nome daquele que foi a primeira testemunha a destacar-se no
Livro dos Atos (citado sete vezes) sem ser do grupo dos apóstolos, e de quem
recebemos um claríssimo exemplo de eficaz testemunho da fé (martyria).
Um dos propósitos do Ano
da Fé era reascender no coração dos cristãos a necessidade do surgimento e ou
uma renovação do testemunho da Fé em nossas vidas. Assim sendo o exemplo deste
mártir, o qual deu um valoroso testemunho da divindade de Jesus Cristo diante
da Sinagoga dos judeus e ao proclamar a verdade irritou seus ouvidos tornando
os inimigos do Evangelho seus próprios inimigos a ponto de o condenarem a uma
chuva de pedras mortíferas, nos encoraja a vivenciarmos, como nos diz o Papa
Francisco em sua Encíclica Lumen Fidei “a convicção de uma fé que faz grande e
plena a vida, centrada em Cristo e na força de sua graça. Era essa convicção
que animava a missão dos primeiros cristãos (...) para os quais a fé, enquanto
encontro com Deus vivo que se manifestou em Cristo, era uma “mãe”, porque os
fazia vir a luz, gerava neles a vida divina, uma nova experiência, uma visão
luminosa da existência, pela qual estavam prontos a dar testemunho até o fim”
(Francisco, Lumen Fidei, 5).
Todos nós somos
impulsionados pela caridade de Cristo. (cf 2Cor 5,14)
Ao passarmos pela porta da fé no momento de
nosso batismo passamos a fazer parte do rebanho do bom pastor, mas é sempre
também através desta porta que somos enviados a testemunhar a fé.
Pela porta da fé passamos
tanto ao entrar quanto ao sair; ao entrar porque decidimos estar com o Senhor
para vivermos com Ele; ao sairmos porque a fé exige de nós um testemunho e um
compromisso públicos.
Não podemos nunca perder
a consciência de que o acreditar não é um fato privado. O Ressuscitado nos
constitui testemunhas de sua ressureição dentro de uma comunidade, a Igreja.
Por isso acreditamos na Igreja e com a Igreja, tornando-nos assim sal e luz no
mundo, imagens de Cristo não temerosas e apagadas, mas sim bem visíveis para
todos!
A vida de Estevão
configurou-se plenamente com a de Cristo, todo seu ministério e principalmente
o processo injusto e mentiroso feito pelo sinédrio para tramarem sua morte o
conduziram a doutrina perfeita da caridade, imitando em tudo o Mestre inclusive
sua última oração: “Senhor, não lhes imputeis este pecado” (At 7,60).
O martírio é um ato
supremo de coragem e de verdadeira prudência, o qual aos olhos do mundo pode
parecer uma loucura. Os mártires revelam-nos as possibilidades da natureza que
se abre a força de Deus e assinalam um modelo, real e simbólico ao mesmo tempo,
para o comportamento de cada um de nós, discípulos e discípulas de Jesus
Cristo.
Nenhum exemplo é mais
útil para instruir ao Povo de Deus que o dos mártires. A eloquência é fácil de
impetrar, a razão é eficaz para persuadir. Não obstante, valem mais os exemplos
que as palavras, e ensina-se melhor com as obras que com as palavras” (S. Leão
Magno, Homilia na festa de S. Lourenço).
Encerrando esta
meditação, faço presentes as palavras da Lumen gentium que tão belamente nos
apresenta o dom do martírio, testemunho de fé para o qual todos devemos estar
dispostos: “Como Jesus, Filho de Deus, manifestou o seu amor dando a vida por
nós, assim ninguém dá maior prova de amor do que aquele que oferece a própria
vida por Ele e por seus irmãos (cfr. 1 Jo. 3,16; Jo. 15,13). Desde os primeiros
tempos, e sempre assim continuará a suceder, alguns cristãos foram chamados a
dar este máximo testemunho de amor diante de todos, e especialmente perante os
perseguidores. Por esta razão, o martírio, pelo qual o discípulo se torna
semelhante ao mestre, que livremente aceitou a morte para salvação do mundo, e
a Ele se conforma no derramamento do sangue, é considerado pela Igreja como um
dom insigne e prova suprema de amor. E embora seja concedido a poucos, todos,
porém, devem estar dispostos a confessar a Cristo diante dos homens e a
segui-lo no caminho da cruz em meio das perseguições que nunca faltarão à
Igreja” (LG 42).
- At 6; 7
* Testemunho
verdadeiramente minha Fé? Sou imagem de Jesus Cristo no meio do mundo?
* Minhas atitudes condizem
com aquilo que meu coração recebeu e minha boca professa?
* Estou disposto a ser
mártir ou sou prefiro ser juiz?
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