Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo
d0 Padre Alfredo Sampaio Costa, SJ
‘Passam os dias, os meses,
viramos o ano e seguimos enfrentando as variantes de uma epidemia que insiste
em permanecer entre nós. Vencidos muitas vezes pelo cansaço, dominados por
sentimentos de impotência, lutamos contra o desânimo, atormentados pela
tentação de encontrar respostas fáceis e rápidas. Contudo, o caminho a ser
trilhado e a complexidade da situação que enfrentamos pedem paciência e
resiliência. Um terceiro passo se nos impõe : prosseguir com a busca de
respostas, sem nos contentar com imediatismos apressados.
Não podemos rezar sobre a pandemia
sem ter presente diante de nossos olhos os rostos daqueles que sucumbiram, das
famílias destroçadas pela dor. Ainda que isso nos custe e incomode, a oração
cristã autêntica pressupõe uma relação viva com o Senhor, um ‘face a face’,
de coração a coração. O que caracteriza a oração cristã em relação a outras
formas de oração é essa dimensão de alteridade. Dom Luciano dizia que a oração
é ‘vivência consciente da reciprocidade afetiva’(1). A oração é o
clima natural do discernimento(2). Importa, pois, ‘povoar’ nossa
oração, não rezamos isolados do mundo.
Discernir com o olhar
fixo em Jesus : Antes de mais nada,
o Senhor deve ocupar o centro da nossa atenção na oração. O discernimento não
só não deixa de lado a contemplação, mas ainda se alimenta dela, e a
contemplação se faz com um caráter de discernimento (essa é uma das notas que
caracteriza a contemplação inaciana frente a outros tipos de oração
contemplativa). A mútua interação de contemplação e discernimento evita, além
do mais, que este se converta em um ensimesmado dar volta em torno de nós
mesmos. Qualquer decisão que tomemos, será movida pelo desejo de fazer algo por
Cristo, respondendo existencialmente à tríplice interpelação dos Exercícios : ‘Que
fiz, que faço, que farei por Cristo?’ (EE 53, no colóquio diante do
Crucificado, que é a primeira vez que Cristo é mencionado nos Exercícios).
Igualmente, no exercício
essencial, fundamental e fundacional para a espiritualidade inaciana que é o ‘Apelo
do Rei Temporal’ (EE 91-98), Inácio nos convida a fazer uma oferta cheia de
afeto e dizer : ‘Eu quero e desejo e é minha determinação deliberada
imitar-vos…’ (EE 98). Para crescer nessa comunhão com o Senhor, que é nosso
desejo mais profundo, contemplação e discernimento, discernimento e
contemplação, são indissociáveis… como são indissociáveis em uma pessoa
autêntica seus sentimentos e atitudes mais profundas e os fatos de sua vida
cotidiana. O discernimento nos Exercícios tem um caráter marcadamente
cristológico(3) : enamorados de Cristo, em equipe com Ele e em diálogo
com Ele(4) : é assim que temos que levar adiante nosso discernimento
durante o tempo da Eleição.
No discernimento espiritual confluem
três apelos do Evangelho : o apelo ao amor como dinâmica de fundo e motor da
vida; o apelo à atenção com respeito à passagem e à presença constante de Deus
na nossa vida humana; o apelo à vigilância com respeito às interferências que,
desde fora ou desde dentro, nos podem tentar e afastar do caminho que o
Espírito de Deus nos assinala. O discernimento evangélico é um movimento do
amor. Do amor que deseja responder ao Amor. Como amar mais? Como amar em
concreto, nas circunstâncias em que me encontro? Qual é para mim em cada âmbito
da minha vida a decisão mais coerente com o amor(5)? Eis a matéria da
nossa oração durante o tempo da eleição!
O duplo discernimento : O primeiro discernimento deve assegurar se a moção causada é por
ação do Espírito ou, ao contrário, o resultado de forças e potências naturais
que atuam na pessoa. O segundo discernimento, que é o discernimento espiritual
propriamente dito, trata de discernir as consolações que provêm do bom ou do
mal espírito. Contudo, o segundo discernimento só pode ser feito depois de
passar pelo primeiro. Portanto, é preciso fazer, em primeiro lugar, uma
reflexão sobre os pensamentos, desejos e sentimentos que provêm de mim e são
anteriores aos que vêm de fora(6).
Na nossa oração, observemos a
presença dos movimentos interiores (consolações e desolações). Eles são o eco
positivo ou negativo da atitude que o sujeito mantém com relação às mais
profundas exigências do seu ser. Manifestam os afetos ocultos que favorecem ou
atrapalham o dinamismo existencial básico do homem orientado para Deus. Quando
nos deixamos mover pelo Espírito de Deus esse dinamismo se encontraria favorecido
positivamente, produzindo a consolação espiritual. Quando o coração está tomado
pelos afetos desordenados contrários ao bom espírito, este pode produzir
efeitos de tristeza ou aparente desolação(7). Nesta etapa específica, o
discernimento é focado em descobrir onde estamos sendo enganados pelo mau
espírito quando buscamos a Vontade de Deus. O exercitante é chamado aqui a
discernir onde se dão as falsas consolações (Cf. EE 332)(8).
O discernimento evangélico é um
movimento do amor. Do amor que deseja responder ao Amor. Como amar mais? Como
amar em concreto, nas circunstâncias sociais e pessoais nas quais estou? Qual é
para mim em cada âmbito de minha vida a decisão mais coerente com o amor? É o
amor que busca a máxima fineza e a máxima entrega : ‘Que fiz por Cristo, que
faço por Cristo e que farei por Cristo?’ (EE 53). Sabendo que a minha
resposta que mais me identifique com o Amor de Deus será minha máxima
plenitude, porque Deus quer minha plenitude e felicidade ‘com maior
superabundância do que pedimos ou entendemos ’(9).
Paulo reza pelos cristãos de Filipos para que o amor deles ‘siga crescendo em conhecimento perfeito e em todo discernimento’ (Fl 1,9). O discernimento se vive em um movimento de tensão para o melhor, em um impulso que leva a crescer e aprofundar no amor (10).’
Notas :
(1)-
Apud Aracy Cardoso, Caminho de oração, São Paulo: Paulinas 1978,30.
(2)- Luís González-Quevedo, Discernimento espiritual – As Regras
Inacianas, São Paulo: Loyola 2013, 16.
(3)- Darío Mollá Llácer, El discernimiento, realidad humana y
espiritual, Manresa 82 (2010) 9-10.
(4)- Cf. Teresa de Jesús Plaza, El discernimiento espiritual como
actitud permanente, Manresa 82 (2010) 44-48.
(5)- Darío Molá Llácer, El discernimiento, realidad humana y
espiritual, Manresa 82 (2010)
(6)- Krzysztof Dyrek, El concepto de moción desde la psicología, Manresa
91 (2019) 132.
(7)- Josef Vives, Vida cristiana y discernimiento, EIDES 40 (2004)
28.
(8)- Antonio T. Guillén, Los engaños en el discernimiento, Manresa
82 (2010) 19.
(9)- Deliberação dos primeiros padres. Original latim em Monumenta
Historica Societatis Iesu vol. 63: Constitutiones I, Roma 1934, 1-7.
(10)- Josef Vives, Vida cristiana y discernimiento, EIDES 40 (2004) 17.
Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1533348/2021/08/em-uma-atitude-constante-de-discernimento/
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