Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo do Padre Francisco Thallys Rodrigues
‘A base fundamental da pregação
cristã é o anúncio da boa nova do Reinado de Deus, proclamado por Jesus, este
que se expressa como um tempo novo para os excluídos, pobres e sofredores. O
princípio fundamental da fé cristã é o amor a Deus e ao próximo vivido no
cotidiano da vida. Seguir Jesus é manifestar o amor de Deus pela humanidade por
meio da palavra e do testemunho. Neste contexto, denunciar as injustiças e
situações de exploração deve ser parte integrante da espiritualidade dos
cristãos de todos os tempos, expressos em palavras e atos. O problema é que
muitas vezes a denúncia da injustiça e o anúncio da boa nova do Reino tem
cedido espaço para discursos pretensamente ‘neutros’, sem posição diante
das ameaças à vida, ou em outros casos tem cedido espaço para o discurso de
ódio. Qual a importância da pregação cristã num contexto de dificuldade de
diálogo?
Na palavra e ação de Jesus
encontramos uma abertura fundamental ao próximo, independentemente de sua
situação ou condição. Acolhe a todos que o procuram nas mais variadas situações
não se atendo a questões culturais, religiosas ou étnicas. Isto ocorre mesmo
com aqueles que claramente se opunham a ele ou procuravam matá-lo. O Reinado de
Deus anunciado por Jesus não foi imposto, mas trata-se de um convite que supõe
uma adesão livre e por amor. A pregação de Jesus tem por base fundamental a
experiência filial com Deus, ela é acompanhada por um testemunho sincero e
fecundo. Os cristãos devem reconhecer-se nesta experiência filial com o Pai que
conduz a vivência da fraternidade com os irmãos e irmãs. Filiação e
fraternidade tornam-se essenciais numa vida segundo o Espírito.
No decorrer dos séculos, a
pregação, acompanhada do testemunho, tornou-se o eixo fundamental para o
crescimento do cristianismo seja nos espaços celebrativos ou mesmo na expansão
da atividade missionária. Tão grande era a importância da pregação cristã que,
no contexto medieval, surgiu uma ordem (dominicanos) especialmente dedicada à
pregação em vista da conversão daqueles que muitas vezes eram considerados ‘hereges’.
Mesmo em nossos tempos, uma quantidade significativa de pessoas dirige-se
semanalmente, ao menos, às igrejas e templos para participarem de celebrações
que dedicam uma parte, ou quase sua totalidade, à pregação a partir dos textos
bíblicos.
Quando se considera
o momento atual, marcado pela crescente polarização em todos os setores e o
crescimento do ódio, a pregação cristã tanto pode favorecer espaços de abertura
e diálogo, quanto pode levar ao acirramento de ânimos, aumentando a segregação
e o ódio. Quando se parte do
princípio de que o respeito e a capacidade de escuta são exigências
fundamentais do amor cristão, o diálogo torna-se possível. Trata-se de um
processo de maturidade para reconhecer que o outro tem igual dignidade mesmo
que não professe a mesma fé ou que não concorde com o que pensamos. Dentro das
próprias comunidades cristãs torna-se urgente insistir em sua diversidade como
expressão dos próprios dons do Espírito, tendo consciência de que o Evangelho
de Jesus é ponto fundamental que nos une. Tal experiência quando asseverada nas
pregações pode favorecer maior solicitude diante do próximo. Não faltam
exemplos de homens e mulheres que, em cada tempo e lugar, estabeleceram
diálogos, aparentemente impossíveis, tal é o caso de Francisco de Assis com o
Sultão; ou Charles de Foucauld com os mulçumanos no deserto africano.
Por outro lado, a pregação
cristã pode conduzir ao fechamento em si mesmo quando os pregadores estabelecem
uma linha divisória entre os espirituais e os profanos ou se quiser outra
linguagem, entre os batizados e os ‘do mundo’. Nesta concepção, estes
últimos encontram-se destituídos de valor porque não acolheram a boa nova de
Deus, não se ‘converteram’. Neste caso, o diálogo só é possível quando
os ‘perdidos’ decidem entrar num processo de conversão ou mostram alguma
disposição para fazê-lo. Do contrário, o diálogo torna-se impossível. O
extremismo de tal posição pode levar ao cerceamento do outro, tal como
aconteceu também na história, por mais de uma vez, aos judeus e, no caso
brasileiro, às religiões de matriz afro. O crescente ódio dos cristãos
motivados por pregações de cunho farisaico, fundamentalista e, porque não dizer
elitista (no sentido de termos os salvos e os condenados), é uma enorme contradição
com o Evangelho de Jesus e com a vida dos cristãos.
Neste cenário, os pregadores
cristãos deveriam insistir no diálogo como elemento fundamental para a vivência
do Evangelho. O diálogo supõe capacidade de abertura, reconhecimento de valor e
consideração do outro como irmão e não como inimigo. O caminho parece ser
insistir na necessidade de construir pontes e estabelecer diálogos, pequenos
consensos que possam conduzir a uma abertura. Além disso, não se deve esquecer
que o mais fundamental deverá ser o testemunho dado no cotidiano da vida que
como fermento na massa transforma o mundo.
Portanto, o papel da pregação
cristã neste cenário é convidar ao seguimento de Jesus que exige uma constante
conversão para o serviço a Deus e aos irmãos e irmãs. Estes não podem ser
compreendidos unicamente como aqueles que fazem parte da mesma confissão de fé,
mas deve incluir a todos sem distinção. A pregação cristã será mais evangélica
na medida em que expressar aquilo que foi o mais fundamental na vida de Jesus :
o amor feito doação a todos os irmãos e irmãs a partir da experiência filial
com o Pai animado pelo Espírito.’
Fonte : *Artigo
na íntegra https://domtotal.com/noticia/1534402/2021/08/a-responsabilidade-da-pregacao-crista-para-com-o-dialogo-em-tempos-de-intolerancia/
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