terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Um sorriso e um adeus

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo de Lev Chaim,  
jornalista e colunista


Precisamos derrubar os muros e melhorar a comunicação com nossos semelhantes.


‘Entrei na bela igreja Catharijne (Holanda), perto de casa, esbaforido. Estava atrasado dez minutos e minha amiga, Bárbara Hilwig, já devia estar lá dentro. A igreja estava cheia, mas não lotada. Ao entrar, vi todas aquelas cabeças sentadas, de costas para mim. Pela nave principal, caminhei devagarinho, procurando Bárbara. No meio do caminho, bati o olho no primeiro banco, à direita e lá estava ela. Ao seu lado havia um lugar livre. Apressei o passo e lá sentei-me. ‘Fui a sua casa e não encontrei ninguém’, sussurrou Bárbara. ‘Estava dando uma volta com o Pitú (meu cão) e esqueci-me do horário! Desculpe-me!’.

Ia sempre àquela igreja protestante porque o pastor dali, Frans Willem Verbaas, fala de uma maneira estupenda e sempre tem os braços abertos para receber quem quer que seja, independentemente de sua fé ou religião. Com o tema, ‘Semana de Orações’, houve ali uma liturgia pela unidade das igrejas cristãs. O pastor convidou o padre Albert Soeterboek, da cidade de Drune, pertíssima de Heusden, e representantes da Igreja luterana, como Frederik Hilwig, marido da Bárbara, entre outros. A cerimônia teve como título ‘Sua mão, meu sorriso’.

Durante a celebração, falaram o pastor, o padre e o representante da Igreja Luterana. E durante as falas, crianças foram colocando atrás deles caixas de papelão. Na frente de cada caixa, estava um tema que pudesse provocar a desunião das igrejas e das pessoas, afastando-as uma das outras : egoísmo, ignorância, falta de tempo, maus exemplos, etc. Até que em um determinado momento, ficou claro a todos que ali estava um muro, construído de caixas. Neste momento, o pastor Frans Willem Verbaas subiu ao púlpito e falou aos presentes. 

Ele disse que estava na moda construir muros para separar pessoas. Aqui e ali, em muitos lugares. E disse que as pessoas, sem perceber, também construíam muros ao redor de seus próprios corações, isolando-se do resto da humanidade. Ai, ele acrescentou : ‘Alguns muros são necessários para demarcar certas propriedades, mas sem o objetivo de isolar os outros. Mas o que eu peço a vocês agora, é para que derrubem os muros que os isolam do coração dos outros’.

Ele contou também que quando era mais jovem, por volta do ano de 1985, ele esteve visitando uma pequena comunidade de bravos luteranos numa cidade da Alemanha Oriental, Alemanha Comunista. O muro de Berlim e a cortina de ferro ainda não tinham sido derrubados. E nesta comunidade de ‘fortes’, ele encontrou um pastor luterano jovem e muito ativo na igreja. Verbaas, curioso, perguntou ao jovem como ele havia entrado para a Comunidade Luterana daquela cidade, num país comunista, onde a religião era tolerada mas não oficialmente aceita.

A resposta do jovem pastor alemão não demorou muito : ‘Estava no exército da Alemanha Oriental e fui colocado para guardar as fronteiras entre as duas Alemanhas. Eu, na minha torre, e o outro, a cem metros de distância, o inimigo, o soldado da Alemanha Ocidental, em sua própria torre. Um dia, olhando com um binóculo, vi que ele também estava munido de um e me olhava. Desci o binóculo e mirei seu corpo e subi logo em seguida. Ele fez o mesmo. Em um determinado momento, ele acenou e eu acenei de volta. Desde então, percebi a loucura deste muro. Todos nós éramos iguais. Por que tudo aquilo? Deixei o exército e fui me juntar a essas pessoas corajosas da Comunidade Luterana, onde estou até hoje!

Antes de terminar esta pequena história que me deixou todinho arrepiado, Frans Willem Verbaas, acrescentou : ‘O último líder da Alemanha Comunista, Erich Honecker, disse que o seu país esta preparado para tudo : um ataque da OTAN, misseis dos Estados Unidos etc. Mas não estava preparado para enfrentar um grupo de pessoas religiosas’.  Logo em seguido, ele disse que a cerimonia de hoje era para ajudar as pessoas a abrirem os olhos, começar a derrubar os muros ao seu redor e melhorar a comunicação com os seus semelhantes. Enquanto ele falava tudo isto, as crianças, que haviam construído um muro de caixas, o iam desfazendo aos poucos e formando uma cruz no chão. Segundo o pastor da igreja, a cruz representava o sacrifício que Jesus fez por todos nós ao morrer ali. Mesmo não adepto de muitos ditos teológicos, fiquei arrepiado com a simplicidade da mensagem oral e simbólica.

Ai, Verbaas desceu do púlpito e junto com o padre caminharam até a pessoas com as mãos estendida e disseram : A paz de Cristo. Pela primeira vez naquela igreja protestante, as pessoas se deram a mão, saudando umas as outras com a paz de Cristo. Enquanto isto ocorria, o organista tocava a magistral abertura de Johan Sebastiaan Bach, ‘A paixão segundo Matheus’. Neste momento, percebi a grandeza do pastor protestante, de realizar esta cerimônia, ‘minha mão, seu sorriso’, nesta grande e heráldica igreja protestante de Heusden, fé professada pela maioria da população da cidade. 

Ao sair, dei a mão de novo para o pastor e amigo Frans Willem Verbaas e lhe perguntei se poderia escrever sobre a cerimônia. Ele me deu carta branca. Depois, fui ao padre e o agradeci por este belíssimo serviço, no que ele, muito simpático, agradeceu a minha presença. E aos poucos, a igreja foi ficando vazia. Naquele instante, o muro em volta do meu coração havia caído.’


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