quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

A Festa da Epifania

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

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*Artigo do Padre Thomas Hopko,
teólogo e sacerdote cristão ortodoxo
(28.03.1939 – 18.03.2015)


‘No dia 6 de janeiro celebra-se a festa da Epifania ou da Teofania. Originalmente, era a única festa cristã da manifestação de Deus ao mundo na pessoa de Jesus de Nazaré. Incluía a celebração do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, a adoração dos Rei Magos e todos os acontecimentos da infância de Jesus como a Circuncisão, a Apresentação no Templo, assim como o seu Batismo por São João no Rio Jordão. É quase certo que esta festa, como a Páscoa da Ressurreição e Pentecostes se entendia como o cumprimento de uma festa judaica, neste caso, a Festa das Luzes.

A palavra Epifania significa manifestação. Freqüentemente se refere a esta festa como a Teofania, tal como se diz nos livros litúrgicos da Igreja Ortodoxa, palavra que significa Manifestação de Deus. A ênfase que se dá a esta festa hoje em dia está na vinda de Jesus como o Messias de Israel e o Filho de Deus, Um da Santíssima Trindade, junto com o Pai e o Espírito Santo.

Assim, em seu batismo por João no Jordão, Jesus se identifica diante dos pecadores como o «Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo» (Jo 1,29), o «Bem-Amado» do Pai, cuja tarefa messiânica é a de redimir os seres humanos de seus pecados. (Lc 3, 21; Mc 1, 35) É revelado como um da Santíssima Trindade de quem dá testemunho a voz do Pai e o Espírito Santo em forma de pomba. Os hinos da festa glorificam esta Epifania transcendental, isto é, manifestação.

Em teu batismo no Jordão, Senhor,
manifestou-se a adoração da Trindade;
pois a voz do Pai deu testemunha,
chamando-te Filho bem-amado;
e o Espírito, sob forma de pomba,
confirmou a verdade desta palavra.
Ó Cristo Deus que te manifestaste e iluminaste o mundo,
Senhor, glória a Ti! (Tropário de la Fiesta)

Hoje, Senhor, te manifestaste ao Universo
e a tua voz brilhou sobre nós,
que, conhecendo-te, cantamos:
Vieste, apareceste, ó Luz Inacessível! (Kondakion)

Os ofícios litúrgicos da Teofania reproduzem os da Natividade, ainda que, o mais provável é que tenha sido a Epifania a que servir de modelo para a Natividade, já a Natividade só mais tarde foi estabelecida como festa, Na manhã da véspera da festa celebram-se as Horas Reais junto com as Vésperas e a Divina Liturgia de São Basílio, o Grande. A vigília da festa consiste em Completas Maiores e Matinas.

As profecias que são lidas na Teofania repetem as palavras de Isaías ‘Deus-conosco’, e enfatizam a predita vinda de seu precursor, São João Batista :

«Esta é a voz Daquele que grita no deserto: preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas. Todo vale será aterrado, toda montanha e colina serão aplainadas; as estradas curvas ficarão retas, e os caminhos esburacados serão nivelados. E todo homem verá a salvação de Deus.» (Is 40, 3-5; Lc 3, 4-6)

O versículo batismal de Gálatas 3, 27 situa outra vez o Triságion. As leituras do Evangelho selecionadas para todos os ofícios da Teofania falam do Batismo de Jesus por João no Rio Jordão. A leitura da Epístola na Divina Liturgia fala das conseqüências da manifestação do Senhor :

«A graça de Deus se manifestou para a salvação de todos os homens. Essa graça nos ensina a abandonar a impiedade e as paixões mundanas, para vivermos neste mundo com autodomínio, justiça e piedade, aguardando a bendita esperança, isto é, a manifestação da glória de Jesus Cristo, nosso grande Deus e Salvador. Ele se entregou a si mesmo por nós, para nos resgatar de toda iniqüidade e para purificar um povo que lhe pertence, e que seja zeloso nas boas obras.» (Tt 2, 11-14)

A característica principal da festa da Epifania é a Grande Bênção das Águas. De acordo com as indicações da Igreja, esta bênção deve ser celebrada depois da Divina Liturgia, tanto na véspera da festa como na festa mesma. Na maioria das paróquias, não obstante, faz-se geralmente uma só vez e numa oportunidade em que um maior número de fiéis possam participar. Tem início com a entoação dos hinos especiais da Festa e, logo, o celebrante incensa a água posta antes num recipiente no meio do templo. Cercado por velas e, em alguns casos, também por flores, esta água representa o belo mundo da criação original de Deus e o mundo glorificado por Cristo no Reino de Deus. As vezes esta bênção é feita fora, quando a igreja está situada próxima de um rio.

A voz do Senhor faz-se ouvir sobre as águas, dizendo :
Vinde, todos, receber o espírito de sabedoria,
o espírito de inteligência, o espírito de temor de Deus,
do Cristo que se manifestou!

Hoje a natureza das águas se santifica
o Jordão se divide e suas águas deixam de correr;
porque nele se vê o Senhor sendo batizado.

Ó Cristo Rei, como homem vieste ao rio para batizar-te.
Tomaste a iniciativa para receber o batismo da mão do Precursor
como escravo, por nossos pecados,
ó amante da humanidade (Hinos da Grande Bênção das Águas)

São lidas, na seqüência, as três leituras da Profecia de Isaías sobre a era messiânica :

«Alegrem-se o deserto e a terra seca, o campo floresça de alegria; como o narciso, cubra-se de flores transbordando de contentamento e alegria» (Is 35, 1-10)

Atenção! Todos os que estão com sede, venham buscar água. Venham também os que não têm dinheiro: comprem e comam sem dinheiro e bebam vinho e leite sem pagar... (Is 55, 1-13)

Com alegria vocês todos poderão beber água nas fontes da salvação».

E nesse dia, vocês dirão : «Agradeçam a Javé, invoquem o seu nome, contem aos povos as façanhas que ele fez, proclamem que seu nome é sublime; cantem hinos a Javé, pois ele fez proezas; que toda a terra as reconheça. Gritem de alegria e exultem, moradores de Sião, pois o Santo de Israel é grande no meio de vocês» ... (Is 12, 3-6)

Depois da Epístola (I Corintios 10, 1-4) e a leitura do Evangelho (Marcos 1,9-11), entoa-se uma litania maior especial na que se invoca a graça do Espírito Santo sobre a água e sobre todos aqueles que participaram dela. Encerra-se com a grande oração da glorificação cósmica a Deus na qual se suplica e se invoca Cristo que venha santificar a água, todos os seres humanos e a criação inteira pela manifestação de Sua Presença Divina, Salvífica e Santificadora, mediante a vinda do Santo, Bom e Vivificador Espírito.

Enquanto o tropário da festa é cantado, o celebrante submerge a cruz três vezes na água e logo procede sua aspersão para os quatro pontos cardeais. Ato contínuo, asperge todos os presentes com esta mesma água. Durante os dias que se segue à festa, prossegue abençoando as pessoas e os lugares com esta água abençoada que representa a salvação de toda humanidade e da criação inteira, que Cristo levou a cabo mediante sua Epifania na carne pela vida do mundo.

Algumas vezes se pensa que a bênção da água e a prática (costume) de tomá-la e aspergir sobre todas as pessoas e coisas é um costume pagão que, erroneamente, teria entrado na Igreja Cristã. Sabemos, não obstante, que este ritual foi praticado pelo povo de Deus no Antigo Testamento e que na Igreja Cristã tomou um significado novo e especial.

Pois, em nossa fé cristã, pela imersão de Cristo nas águas do Jordão, toda a matéria foi santificada e purificada nEle, limpa de seus germes mortíferos herdados do demônio e da corrupção dos seres humanos. Na Epifania do Senhor, toda a criação foi restaurada, voltando a ser boa de novo, por certo ‘muito boa’, tal como Deus mesmo a fez e proclamou que era no princípio quando ‘o Espírito de Deus se movia sobre as águas’ (Gn 1, 2) e quando o ‘Espírito de Vida’ estava no ser humano e em todo ser feito por Deus. (Gn 1, 30; 2,7)

O mundo e tudo quanto há nele certamente é ‘muito bom’ (Gn 1, 31) e quando se torna contaminado, corrompido e morto, Deus novamente o salva mediante a ‘nova criação’ em Cristo, seu Filho Divino e Nosso Senhor, pela graça do Espírito Santo. (Gl 6,15) Isto é o que se celebra na Epifania, e de modo muito especial, na Grande bênção das Águas. A consagração das águas nesta festa coloca o mundo inteiro, através de sua matéria elementar, à água, na perspectiva da re-criação, santificação e glorificação cósmicas do Reino de Deus em Cristo e no Espírito. Diz-nos que o fim último do ser humano e do mundo é ser ‘plenos de toda a plenitude de Deus’ (Ef 3, 19), ‘a plenitude Daquele que tudo preenche’. (Ef 1, 23) Diz-nos que Cristo, em Quem ‘habita corporalmente toda a plenitude da Divindade’, é e verdadeiramente será ‘tudo em todos’. (Cl 2, 9; 3,11) Diz-nos, ainda, que ‘o novo céu e a nova terra’ que Deus nos prometeu pelos seus profetas e apóstolos (Is 66, 22; II Pd 3, 13; Ap 21, 1) em verdade já estão ‘conosco’ no mistério de Cristo e Sua Igreja.

Assim, a santificação da água na Festa da Epifania e o aspergir da água da Epifania não é nenhum ritual pagão, estranho a Igreja Cristã dos primeiros tempos. É a expressão da autêntica visão cristã do ser humano, de sua vida e de seu mundo. É o testemunho litúrgico de que a vocação e o destina da criação é de ser plenificada ‘de toda a plenitude de Deus’. (Ef. 3,19)


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Fonte :

Tradução : Monges da Comunidade Monástica São João, o Teólogo


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