quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Joio e Trigo : algo sobre tolerância e humildade

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

A humildade e a tolerância ajudam a não fazer julgamentos precipitados do que seria
*Artigo de Fabrício Veliq,
protestante, é mestre e doutorando em
teologia pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE),
doutorando em teologia na Katholieke Universiteit Leuven - Bélgica,
formado em matemática e graduando em filosofia pela UFMG


Deixai crescer ambos juntos até à ceifa; e, por ocasião da ceifa, direi aos ceifeiros : Colhei primeiro o joio, e atai-o em molhos para o queimar; mas, o trigo, ajuntai-o no meu celeiro. Mateus 13:30.

A meu ver, esse texto é um convite à humildade e à tolerância. No mundo atual em que estamos inseridos, em que diversos discursos de ódio tem crescido tanto em nosso país como em diversos lugares do mundo com a volta de nacionalismos e grupos de extrema direita, acredito que pensarmos a questão da tolerância e da humildade é tarefa importantíssima.

Não dificilmente ouvimos nos diversos meios cristãos em que estamos inseridos frases do tipo ‘essa coisa não é de Deus’, ou ‘Deus não pode agir desse modo, onde já se viu?’. Essas frases, muitas vezes, refletem a ideia de que aquele que a diz é extremo conhecedor daquilo que é de Deus e aquilo que não é. Nesse sentido, essa parábola do joio e do trigo tem muito a nos ensinar na atualidade.

Um dos pontos mais interessantes é que quem faz a colheita não são os servos do dono da plantação. Por mais que a intenção dos servos aparentasse ser muito boa e solícita, a resposta do senhor da plantação é muito clara. Um enfático ‘não’ é dada à proposta. Porém, não é um ‘não’ sem justificativa, mesmo que, como senhor da plantação poderia ter dado esse ‘não’ e pronto. Porém, diante dessa resposta, propõe também um motivo. Esse era simples : ‘para que, ao colher o joio, não arranqueis também o trigo com ele’ (v. 39).

Isso nos mostra que, por mais que a intenção dos servos fosse boa, o senhor da plantação tinha consciência de que os mesmos não eram capazes e não tinham conhecimento suficiente para fazer a separação entre o joio e o trigo, o que acarretaria em perda do trigo e a confusão de um com o outro. Ao contrário, o senhor diz para deixar crescer o joio e o trigo juntos e, na ceifa, os ceifeiros fariam a separação entre o joio e o tribo.

Assim, antes de falar se algo é ou não de Deus, devemos lembrar dessa parábola. Não somos nós quem fazemos a separação entre joio e trigo; o senhor da plantação não autorizou os servos que plantam a fazerem isso. Antes, dá-lhes uma palavra de tolerância : ‘deixai crescerem juntos’.

Isso poderia incomodar os servos, contudo era necessário a eles reconhecerem que não tinham capacidade para a separação e que, caso o tentassem fazer, o estrago seria maior que a ajuda.

Não é difícil termos a impressão de que sabemos separar as coisas que ‘são de Deus’ daquelas que não são. Quem costuma fazer isso, geralmente, não atenta que há situações que são bem complexas para sermos totalmente taxativos sobre elas. A humildade e a tolerância sempre fazem bem nesses casos.

A ordem do senhor da plantação nos instiga a desenvolvermos essas duas virtudes que ficam cada dia mais raras entre nós e que pode ser de grande valia para vivermos em dias atuais.

Isso não quer dizer tolerar os intolerantes, nem tão pouco sermos apáticos e inertes frente às situações que vão contra o exemplo de Cristo, mas, antes, mostra que, nas situações ‘cinzas’ da vida, a parcimônia é virtude a ser desenvolvida por nós, os plantadores, bem como nos instiga a tomarmos consciência de que somente Deus sabe aqueles que lhe pertencem e que, muitas vezes, nossos olhos e nossas visões de mundo podem nos enganar, fazendo com que, na ânsia de ajudar o senhor da plantação, estraguemos e queimemos diversas partes do trigo que está em nosso meio.’


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