*Artigo
de Lev Chaim,
jornalista e colunista
‘Ao assistir às discussões nos programas da TV holandesa, sobre
como criar uma sociedade mais justa, mais amorosa e mais compreensiva, um
pensamento estalou em minha mente : a conciliação com os outros só acontece
quando você concilia consigo próprio. Isto me veio à cabeça e não me recordo
ter lido em algum lugar. Provavelmente foi o que senti na hora quando assistia
aos programas.
Ao deglutir mais esta frase, uma coisa ficou óbvia : quando você
está bem consigo próprio, você é mais agradável e mais tolerante para com os
outros. Um dos presentes à mesa de discussões, escritor e colunista de um
jornal holandês, Bas Heijne, disse que ficar recordando o passado e querer que
tudo seja como antes é perda de tempo, é saudosismo que não leva a nada.
Segundo ele, temos que pensar hoje como queremos construir o nosso futuro.
Com tudo em minha mente, lembrei-me do livro que leio e releio
de vez em quando, ‘O jogo dos Olhos’,
do Nobel de Literatura, Elias Canetti. Trata-se da parte de sua autobiografia
que vai de 1931 a 1937, em Viena, Áustria, durante a ascensão de Hitler ao
poder na Alemanha. Ali, Canetti conta que os personagens de suas histórias
foram influenciados pelo escritor russo Nikolai Gogol :
‘Tudo a nossa volta é
assustador. Não existe mais uma língua comum. Um não entende o outro. Acho que
ninguém quer entender o outro.’ Ai, Canetti complementou com um comentário
dirigido ao autor Herman Broch : ‘Impressionou-me
bastante quando citou em seu livro que os homens estejam encerrados dentro de
sistemas de valores diversos, que não seja possível o entendimento entre eles.’
Nos tempos de Canetti, o caos reinante propiciou a chegada de
Hitler ao poder, o que sem dúvida era assustador para os que tinham consciência
deste absoluto perigo máximo para o mundo, como ficou provado depois. Mas, ai
eu me pergunto : qual o inimigo número ‘um’
de uma sociedade mais tolerante? Seria o islamismo radical? O consumismo
desenfreado? O aquecimento do planeta? A extrema-direita que pipoca ali e aqui?
As consequências das decisões impensadas de Donald Trump? O amor excessivo ao
poder e ao dinheiro? O excesso de tecnologia na vida das pessoas de hoje que
não têm mais tempo para admirar a natureza?
Sobre este último tema, o autor e antigo político holandês, Jan
Terlouw, disse que o homem é que tem que direcionar a tecnologia e não esta ter
o controle do homem. Terlouw disse ainda que hoje em dia são poucos aqueles que
andam e admiram a natureza, que olham as pequenas coisas deste mundo, as
pequenas flores de cada estação do ano. Além do que, complementou ele, o
contato virtual está, em muitos casos, substituindo o contato humano. ‘Os jovens precisam ser alertados para o fato’,
disse ele enfaticamente.
Se este autor tem a resposta para a melhor forma de se buscar a
efetivação de uma sociedade mais justa, mais humana, eu não sei com certeza,
mas eu me simpatizo extremamente com suas palavras. Não se pode querer tudo, a todo
tempo e a toda hora. Algumas coisas têm que ser desejadas e ficarem na
categoria de utopia.
Tal como disse Canetti, ao mencionar o livro de Insel Buchner, o
preferido de sua esposa Veza : ‘É
necessário que existam coisas que sejam inatingíveis; mas não devemos permitir
que o inatingível nos esmague’. Estas palavras e este livro foram
dados a Canetti por Veza, sua esposa, como um conselho para aquele que ela
amava muito e queria ver triunfar no mundo das letras, sem se sentir esmagado
por outras obras primas.
Nesta salada de pensamentos e assuntos, uma coisa ficou clara :
tanto Canetti e seus companheiros estavam na busca de uma explicação para o
caos reinante na sociedade de então e essas discussões continuam valendo para o
presente momento, com outros ingredientes entrelaçados. Após dizer tudo isto,
encerro com o seguinte : o mundo necessita de outras Vezas como a de Canetti e
outros autores como Jan Terlouw, o escritor holandês, para tentar resgatar a
esperança na alma do homem.
Ao apresentar este texto à minha irmã, ela perguntou assombrada :
‘E onde está Deus em tudo isto?’ O
primeiro pensamento que veio-me à mente eu soltei : ‘Em todos os lugares, mas ele fica mais visível quando encontramos almas
brilhantes que servem para iluminar e inspirar o caminho do homem’. E o
mundo de hoje está mesmo necessitado de boas almas, pensei baixinho.’
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