*Artigo de José Rebelo,
Missionário Comboniano
Evangelizamos não tanto com o que pregamos, mas pela
maneira como vivemos e pomos em prática os valores em que acreditamos.
‘A fé é a razão de ser da missão. O
missionário parte para testemunhar a sua fé em Jesus Cristo. Não haverá razões
humanas suficientes que o levem a fazer o sacrifício de deixar para trás a
família, amigos, contexto social, e mesmo gastronomia... para viver em
situações pelo menos mais desconfortáveis, servir e, se necessário, dar a vida.
Com ele leva, contudo, a sua cultura, os seus valores, o seu conhecimento, os
seus dons, a sua maneira de ser e viver. É verdade que é chamado a assumir os
valores da cultura que o acolhe, mas por mais que queira será sempre sinal de
uma cultura diferente, visível desde logo na cor da sua pele, estatura e
restante aparência física.
A internacionalidade e
interculturalidade desempenham um papel importante na missão. A simples
presença de um missionário entre um povo diferente do seu suscita um diálogo
cultural – nem sempre explícito – em que há desafio e enriquecimento mútuos.
Ambas as partes são confrontadas com atitudes e valores que levam (ou deveriam
levar) a um questionamento das próprias assunções culturais e estilos de vida e
a um enriquecimento humano e cultural.
Nada do que somos é estranho ao
trabalho missionário que realizamos. Certamente que boa parte do
desenvolvimento humano realizado pelos missionários se deve a essa
interculturalidade, também representada pelos agentes humanitários e
emigrantes. Além disso, evangelizamos não tanto com o que pregamos mas pela
maneira como vivemos e pomos em prática os valores em que acreditamos – nas
relações que instauramos com as pessoas que encontramos e entre as quais
vivemos. É nesse diálogo-confronto que os valores são apreciados e apropriados
de parte a parte.
A missão faz com que o missionário se
defronte com culturas diferentes da sua que o interpelam e o desafiam a
entender, a aceitar e, eventualmente, o fazem mudar. A missão enriquece-o no
conhecimento e na maneira de ver a vida, mas também na maneira de ser e agir.
Por outro lado, o missionário é sinal de uma realidade diferente que não pode
não interpelar, começando pelas razões da sua presença num contexto de pobreza
e não poucas vezes de insegurança e de conflito.
Nos sete anos que passei nas Filipinas,
não pude não apreciar a religiosidade natural daquele povo; a humildade e a
bondade de pessoas espoliadas ao longo de séculos pelas elites coloniais e
locais, que para sobreviverem têm de recorrer a formas de dependência quase
feudais, aos subterfúgios, às meias verdades, às desculpas, e mesmo ao
desaparecimento.
Agora na África do Sul o contexto é
diferente, mas há tendências que se mantêm numa sociedade bastante desigual
onde o materialismo e a cobiça acompanham o crescimento econômico. O testemunho
de trabalho e dedicação sem fins lucrativos e sem aspiração a ter posições não
pode não ser significante. O diálogo e valorização das diversas etnias, mesmo
estrangeiras, num país que ainda não resolveu o problema racial e é tentado a
recorrer à violência e à xenofobia é outro desafio.
Daí que a presença dos missionários,
além de ser um sinal de fé contribui para criar um mundo mais fraterno e
pacífico. Mesmo que um país esteja evangelizado, a falta de missionários seria
sempre uma pobreza – para a Igreja e para a sociedade em geral. Eles são sinais
de amor, gratuidade, despojamento, convivência pacífica, da possibilidade de
diálogo e entendimento entre os povos. Houve missionários assassinados e
colonos que tiveram de fugir após as descolonizações, mas o facto de a África,
que tem vivido mais do que o seu quinhão de conflitos e atrocidades, nunca ter
tido nenhum sério conflito racial pode ser um sinal da importância da presença
dos missionários e dos valores cristãos e civilizacionais que eles incarnam.’
Fonte :
* Artigo na íntegra
de http://www.alem-mar.org/cgi-bin/quickregister/scripts/redirect.cgi?redirect=EFAAFZulplZJyrkHax
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