segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Para um diálogo entre muçulmanos e cristãos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 *Artigo de Zouhir Louassini, 
jornalista, trabalha na Rai Notíciasprofessor convidado 
em várias universidades e colaborador em jornais árabes, 
incluindo al-Hayat , Lakome e al-Alam , e Radio Medi1 (Marrocos). 

‘Há muitos anos num encontro organizado pela mesquita de Madrid sobre o diálogo entre muçulmanos e cristãos, vivi uma experiência que me fez compreender como é difícil iniciar um diálogo verdadeiro entre as religiões. No congresso estava presente um jovem religioso, imã de uma pequena mesquita numa localidade espanhola, que me contou como foi apoiado pelas irmãs católicas para construir o seu lugar de culto e também como a Igreja tinha ajudado a pequena comunidade muçulmana na zona. Uma terceira pessoa que estava ali conosco, um pouco provocatoriamente, disse com um sorriso: ‘mas então, não são infiéis!’. O religioso replicou irado : ‘São sempre infiéis e a sua única salvação consiste na conversão ao islão!’. E encaminhou-se para a sala a fim de participar no debate programado sobre o diálogo religioso.
  
Com o tempo aprendi que se dialoga não só com quem quer dialogar mas também com quem, efetivamente, o pode fazer. Com efeito, o diálogo entre as religiões não pode consistir apenas no encontrar-se em congressos para falar do tempo, de comida; e muito menos em limitar-se a exaltar o valor da própria fé. O diálogo precisa de sinceridade, de estima entre os interlocutores e, sobretudo, de um conhecimento verdadeiro do outro.

No distante ano de 1967 o historiador e sociólogo Abdallah Laroui publicou na França um dos livros mais úteis para compreender a realidade árabe e a sua evolução : L'idéologie arabe contemporaine : essai critique, com uma introdução de Maxime Rodinson. Naquela obra indica com perspicácia o denominador comum que desempenhou um papel fundamental na elaboração e na expressão de todas as ideologias no mundo árabe: a relação com o Ocidente. Com efeito, há um século que os árabes se definem só em relação ao mundo ocidental e aos seus valores.

Para Laroui esta busca de si próprios gerou três tipos de ideologias, ou melhor, três ‘tipos de árabes. O primeiro tipo é o ‘liberal’ : é homem político, convencido de que o atraso do mundo árabe é o resultado de muitos séculos de obscurantismo sob o predomínio otomano. A solução, a seu parecer, encontra-se na filosofia das Luzes e na defesa da democracia liberal.

O ‘tecnófilo’ é o segundo tipo : este acredita que nem a liberdade política nem o parlamento sejam o segredo do poder do ocidente. Ao contrário, este consistiria na tecnologia e nas ciências aplicadas que explicaria o seu domínio sobre o mundo.

Por fim, o ‘clérigo’, o homem religioso, que manteve bem firme a oposição entre ocidente e oriente no âmbito da relação entre cristianismo e islão : este terceiro tipo de árabe procura mostrar que o islão foi e será superior ao cristianismo.

Portanto, três tipos. Para os primeiros dois o ocidente pode oferecer modelos a seguir; para o terceiro, ao contrário, fora do próprio mundo há só uma ameaça contra a qual é preciso reagir. Por vários motivos, difíceis de resumir num breve artigo, hoje é o último tipo que predomina culturalmente no mundo árabe.

O terceiro tipo resume uma realidade muito complexa. Nela, privada de verdadeiras instituições religiosas que orientem as suas opções, os que têm um mínimo de influência são incapazes de sair de esquemas mentais, ideológicos, políticos pertencentes a outras épocas. Ao mesmo tempo, os que modernizaram a sua abordagem ao problema permanecem totalmente isolados.

É esta hoje a situação no mundo árabe. Realidades extremistas como o ISIS, um grupo que não supera vinte mil pessoas, mais não são que a ponta do icebergue. Se quisermos começar a derreter este enorme bloco de gelo, seria justo e oportuno partir do fato que os muçulmanos moderados, mesmo se emudecidos, são a maioria. Eles são os únicos interlocutores possíveis para um diálogo baseado no conhecimento, no respeito e na estima recíproca.


Fonte :
* Artigo na íntegra de
 http://www.news.va/pt/news/para-um-dialogo-entre-muculmanos-e-cristaos-os-uni


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