Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
‘O Evangelho de Lucas apresenta-se como aquele que
mais concede espaço e protagonismo às mulheres na vida e na missão de Jesus.
Desde os primeiros capítulos, observa-se uma valorização singular da presença
feminina, não apenas como figuras secundárias, mas como discípulas e
testemunhas privilegiadas da Boa-Nova. Esse traço particular reflete a intenção
do evangelista de destacar a universalidade da salvação e a inclusão dos marginalizados,
entre os quais as mulheres ocupam lugar central.
Já no início da narrativa, duas mulheres
desempenham papel fundamental : Maria e Isabel. Maria é saudada como a cheia de
graça (cf. Lc 1,28), modelo de fé e disponibilidade ao plano divino. Seu cântico,
o Magnificat (cf. Lc 1,46-55), expressa a inversão das
estruturas sociais e anuncia a justiça do Reino, elevando os humildes e
derrubando os poderosos. Isabel, por sua vez, é retratada como mulher justa e
repleta do Espírito Santo (cf. Lc 1,41), reconhecendo em Maria a mãe do Senhor.
Ambas inauguram o protagonismo feminino no processo da encarnação e da promessa
messiânica.
Outro exemplo é Ana, a profetisa (cf. Lc 2,36-38),
viúva idosa que reconhece no Menino Jesus o cumprimento da esperança de Israel
e anuncia sua chegada a todos os que esperavam a redenção. A presença de Ana,
ao lado de Simeão, ilustra a complementaridade entre homens e mulheres no
testemunho da fé.
Lucas apresenta também figuras anônimas que
evidenciam a compaixão de Jesus. A viúva de Naim (cf. Lc 7,11-17) recebe dele a
misericórdia ao ver restituído à vida o seu único filho. Esse gesto revela a
profunda sensibilidade de Jesus diante da condição de fragilidade da mulher na
sociedade patriarcal, na qual a perda do marido ou dos filhos significava
abandono e miséria.
No caminho de Jesus, encontram-se ainda mulheres
discípulas que o acompanham de perto : ‘Maria Madalena, Joana, mulher de Cuza,
administrador de Herodes e Susana, e muitas outras que os ajudavam com seus
bens’ (Lc 8,1-3). Esse trecho é notável por situar as mulheres entre os
discípulos, em contraste com as estruturas sociais da época. Maria Madalena, em
particular, será apresentada no fim do Evangelho como a primeira testemunha da
ressurreição (cf. Lc 24,1-10), título de grande relevância, pois na cultura
judaica o testemunho feminino não era juridicamente reconhecido.
Na narrativa de Lucas, destacam-se igualmente as
irmãs Marta e Maria (cf. Lc 10,38-42). Marta representa a dedicação do serviço
hospitaleiro, enquanto Maria é apresentada aos pés de Jesus, em atitude de
escuta e discipulado. Ao tomar a defesa de Maria, o Mestre legitima a presença
da mulher no espaço do discipulado e da escuta da Palavra, rompendo as
barreiras culturais vigentes em sua época.
Assim, Lucas articula uma teologia inclusiva, em
que as mulheres não são apenas beneficiárias da ação de Jesus, mas
participantes ativas de sua missão. Como observa Brown (1999), a opção do
evangelista por enfatizar essas personagens revela uma ‘dimensão universal do
Evangelho, na qual os que eram considerados socialmente frágeis tornam-se
portadores da revelação’. Bovon (2002) acrescenta que a figura feminina em
Lucas funciona como ‘espelho da comunidade cristã nascente, chamada a viver a
fé na escuta, no serviço e no testemunho’.
O Evangelho de Lucas apresenta as mulheres como
presenças discretas, mas decisivas, na história da salvação. Elas acompanham
Jesus desde o anúncio do Messias até a ressurreição, indicando que a mensagem
do Reino de Deus irrompe barreiras culturais e sociais. Essa ênfase de Lucas
constitui um convite permanente para o reconhecimento e valorização da missão
das mulheres na vida comunitária e na evangelização.’
Fonte : *Artigo na íntegra
https://revistaavemaria.com.br/as-mulheres-no-evangelho-de-lucas.html
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