Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, MG
Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil
‘O ser humano é epifania da grandeza do inesgotável
amor de Deus. Uns mais que outros revelam a plenitude deste amor e todos têm a
oportunidade de construir a própria história de vida como revelação do seu
Criador e Redentor. Tudo isso se faz pela ação do Espírito Santo de Deus, aquele
que, como ensina São Basílio Magno, no terceiro século, está presente em cada
um dos que são capazes de recebê-lo, concedendo a todos as graças necessárias.
São Basílio lembra que pelo Espírito Santo os corações são elevados ao alto, os
fracos são conduzidos pela mão, os que progridem na missão chegam à perfeição.
A cada indivíduo não basta a própria força, pois o ser humano precisa sempre do
amor de Deus. Ora, nem mesmo a grandeza da razão supera a grandeza do amor,
capaz de fecundar a existência, iluminar o viver humano em todos os seus
processos. Por isso mesmo, as heranças legadas pelo Papa Bento XVI à
humanidade, importantes na semeadura do amor, despertam especial reverência.
No
amplo horizonte das heranças de Bento XVI, vale homenageá-lo revisitando o seu
discurso inaugural da 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e
Caribenho, celebrada em maio de 2007, no Santuário Nacional Nossa Senhora
Aparecida, Padroeira do Brasil. Uma contribuição magistral. As palavras de
Bento XVI, sempre atuais, nortearam a intuição de todos que se dedicaram à
Conferência de Aparecida, primeiramente em razão do tema escolhido : ‘Discípulos
e missionários de Jesus Cristo, para que nossos povos Nele tenham vida – ‘Eu
sou o caminho, a verdade e a vida’’. Naquele importante momento que inaugurou
um acontecimento marcante na vida da Igreja, Bento XVI apontou um caminho. Essa
direção indicada, a partir da magistral sensibilidade do Papa Francisco, tem
levado a Igreja, na atualidade, a investir para ser sempre e cada vez mais
sinodal - Igreja de comunhão, de participação e de missão, que ajuda o mundo
contemporâneo a encontrar respostas para os problemas atuais, a partir da
vivência e do testemunho autêntico da fé cristã.
No
discurso inaugural da Conferência de Aparecida, o Papa Bento XVI derramou a
grandeza de sua alma, a nobreza de seu jeito de ser, com indicações e juízos
que confirmam a sua sensibilidade pastoral de profunda relevância. Fez frente,
deve ser lembrado, aos agouros direcionados à Conferência, daqueles que a
enxergavam como ameaça de retrocesso para o caminho missionário da Igreja. Ao
invés disso, aquele acontecimento delineou um horizonte largo e inspirador,
ainda por ser explorado e vivido, desafiando a Igreja a contribuir, ainda mais,
à luz da fé, para que todos se reconheçam protagonistas. Ali, o Papa Bento XVI
parte de uma constatação preciosa, em referência à fé em Deus que animou a vida
e a cultura dos povos latino-americanos e caribenhos, já por mais de cinco
séculos. A vida dos povos latino-americanos e caribenhos, assim, ganhou feições
nascidas a partir do encontro da fé cristã com as riquezas culturais das etnias
originárias, fazendo surgir um valioso patrimônio da arte, da música, da
literatura e das tradições religiosas. O reconhecimento dessa realidade
permite considerar a importância da fé cristã para superar os desafios
contemporâneos e garantir a todos os povos uma vivência alegre e coerente com o
Evangelho.
Todos
são igualmente chamados a se reconhecerem discípulos de Cristo, compreendendo
que a fé cristã não é alheia ou um contraponto às diferentes culturas. Ao
contrário, trata-se de resposta ansiada no coração de diferentes culturas, que
possibilita a união da humanidade a partir do amor, que leva ao respeito das
muitas diversidades. A fé cristã, vivida com autenticidade, assim, promove o
crescimento de todos na verdadeira humanização, no autêntico
desenvolvimento integral. Ainda sobre a pluralidade cultural da América Latina
e Caribe, a Conferência de Aparecida focalizou o grande mosaico da
religiosidade popular, precioso tesouro da Igreja Católica, merecendo o seu
cuidado, proteção e adequado tratamento. Em síntese, saber balizar o próprio
horizonte a partir do que significa ser discípulo de Jesus é redescobrir a ‘mina
de ouro’ da tradição cristã.
Profeticamente,
o Papa Bento XVI afirmou que só reconhece a Deus quem conhece a realidade,
respondendo-a de modo adequado, humano. Deve-se reconhecer o fracasso de todos
os sistemas que colocam ‘Deus entre parêntesis’, conforme adverte o Documento
de Aparecida, inspirado nos ensinamentos de Bento XVI. A observação da
realidade confirma o que diz o Documento, bastando considerar que sem um
consenso moral sobre os valores fundamentais a serem defendidos, até mesmo com
a renúncia de interesses pessoais, agravam-se problemas sociais e políticos. E
Bento XVI, na Conferência de Aparecida, advertiu : onde Deus está ausente,
estes valores não se mostram com toda a sua força nem se produz um consenso
sobre eles. Com essa clareza, a Igreja busca se sacramentar sempre como
advogada da justiça e dos pobres, precisamente ao não se identificar com os
políticos, nem com os interesses de partidos.
Papa
Bento XVI, no seu discurso inaugural da Conferência de Aparecida, dedicou-se a
muitos outros temas relevantes, com lucidez intelectual e sensibilidade
singular, sendo força decisiva para a riqueza do muito atual Documento de
Aparecida. Sua presença e sua palavra pavimentaram a estrada que o Documento
configura, com indicações para o novo tempo que precisa ser construído - um
compromisso de fé e de qualificada cidadania. As lições da Igreja que aproximam
o ser humano de Deus nutrem as esperanças da humanidade. No conjunto dessas
lições estão as heranças de Bento XVI.’
Fonte : *Artigo na íntegra
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