Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo do Padre Eliseu Donisete de Paiva Gomes,
da Arquidiocese de Mariana, MG
‘Desde 2015 no Brasil, por
iniciativa do CVV (Centro de Valorização da Vida), da ABP (Associação
Brasileira de Psiquiatria) em conjunto com o CFM (Conselho Federal de
Medicina), iniciou-se uma campanha de prevenção ao suicídio, que recebeu o nome
de ‘Setembro Amarelo’, justamente porque o dia 10 do referido mês é o
Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio.
De acordo com dados da
Organização Mundial de Saúde (OMS), recolhidos no ano de 2012, aproximadamente
800 mil pessoas cometem suicídio anualmente. É sem dúvida uma estatística muita
assustadora, que atinge pessoas de todas as idades, gênero, classe social, cor,
crentes, ateus, padres, freiras, etc. Estima-se que no mundo a cada 40 segundos
alguém comete suicídio. No Brasil são 10 mil suicídios por ano, uma média de 27
brasileiros por dia, ou seja, a cada hora, uma pessoa tira sua vida no país.
Nesse cenário é preciso também
falar sobre o suicídio na vida sacerdotal, que nos últimos anos tem aumentado
de forma bastante expressiva. No Brasil entre os anos de 2017 e 2018
foram 20 padres que tiraram a própria vida, e desde que a pandemia
começou já se tem notícias que no país 7 padres cometeram
suicídio. Vários são os questionamentos que vão surgindo como forma de
encontrar respostas para esse triste e preocupante cenário.
Quais os principais fatores que
têm contribuído para o suicídio na vida sacerdotal?
Estresse profissional
Uma pesquisa realizada em 2008
pela ISMA-BR (International Stress Management Association), voltada ao
desenvolvimento da prevenção e do tratamento de stress no mundo, apontou
que a vida sacerdotal é uma das profissões mais estressantes da
atualidade. Nessa pesquisa, além de padres e religiosos, foram
entrevistados profissionais de diversas áreas, dando destaque para os agentes
de segurança pública, empresários e motoristas de ônibus, que comumente são
profissões tidas como muito estressantes. Mas entre todas as profissões, os
sacerdotes são os que mais experimentam o estresse profissional. Na pesquisa
dos 1,6 mil padres e freiras entrevistados, 28% deles, quase 500, se sentiam ‘emocionalmente
exaustos’.
O sacerdote é visto por muitos
como se fosse um ‘super-homem’, e que por isso, tem que estar 24
horas disponível para atender a todas as solicitações da comunidade da qual ele
foi constituído pároco e pastor. Mas no dia a dia da missão sacerdotal, ele
precisa ser mais do que pastor, porque as demandas são tão variadas, que passam
a exigir dele aptidões que estão para além da formação que recebeu no processo
formativo.
Na comunidade paroquial o
sacerdote vai ter que lidar com construções e reformas de capelas,
administração financeira e contábil, cuidar e zelar por todo o patrimônio
paroquial, muitas vezes terá que atuar como psicólogo na orientação dos fiéis,
em outros momentos terá que resolver conflitos entre membros das pastorais e
lidar com problemas sociais, além é claro, da administração dos Sacramentos,
reuniões e formações pastorais. Tudo isso, faz com que o sacerdote, com essa
sobrecarga de trabalho, não tenha tempo para cuidar de si, da sua vida
espiritual, da saúde mental, do seu lazer e descanso, e em pouco tempo, vai
entrar num processo de estresse, esgotamento e desmotivação.
Depressão
Outro fator que pode
desencadear o suicídio é a depressão. Em todo o mundo, aproximadamente 300
milhões de pessoas, de todas as idades, sofrem com esse transtorno. E o
sacerdote, que também é gente, é ser humano, está sujeito a desenvolver esse
transtorno mental. Depressão não é ausência ou falta de Deus. Se fosse
assim, os padres nunca teriam esse transtorno. Inclusive muitos homens e
mulheres de fé que o mundo já viu, tiveram lutas fortes contra a depressão,
como por exemplo, São Francisco de Sales e Santa Terezinha do Menino Jesus. No
caso específico do sacerdote, a depressão ocorre sobretudo por causa do
isolamento, da falta de convivência com os demais presbíteros, não se sentir
valorizado e nem realizado no ministério, dependência e conflitos afetivos,
desequilíbrio emocional, entre outros. Se o sacerdote não procura ajuda, não dá
o grito de socorro diante dessas situações, poderá entrar num
quadro de depressão, e consequentemente até chegar ao suicídio.
Cobrança excessiva
O tempo de formação até o
sacerdócio ministerial, em se tratando das dioceses, dura aproximadamente oito
anos, sendo um ano de Propedêutico, três anos de Filosofia e quatro anos de
Teologia. Esse longo tempo vai ajudá-lo a se preparar acadêmica, espiritual e
humanamente para estar à frente de uma comunidade paroquial. No entanto, isso
não dá ao sacerdote poderes especiais, como se ele tivesse uma varinha
de condão, para resolver todos os problemas da comunidade. Muitas
vezes a ideia que transparece no meio do povo é que o padre é incansável, e isso
é uma grande mentira. Assim como qualquer pessoa, o sacerdote se cansa, tem
as suas crises, experimenta dores, enfermidades, sofrimentos, chora, fica
triste, tem suas alegrias e realizações. Não se pode esquecer que antes de ser
padre, ele é um ser humano. Nesse sentido, os fiéis precisam entender que
quando as cobranças se tornam excessivas, elas de nada ajudam. Ao contrário,
vão contribuir para gerar um maior desgaste na vida dos sacerdotes.
O que pode ser feito
para ajudar os sacerdotes?
O primeiro passo é que cada
sacerdote não se esqueça de cuidar de si mesmo. Como diz o ditado popular : ‘Quem
gosta da gente somos nós mesmos’. E aqui entra uma importante
iniciativa em muitas dioceses, a chamada Pastoral Presbiteral, que visa
proporcionar encontros, momentos de formação, partilha e convivência entre os
presbíteros, auxiliando-os nesse cuidado permanente da saúde mental.
Um segundo passo é o
envolvimento da própria comunidade eclesial que deve sentir-se responsável no
processo de cuidado dos seus sacerdotes. Não é apenas rezar por eles, mas ser
presença afetiva, amiga e carinhosa, de forma que esse cuidado proporcione ao
sacerdote uma vida mais saudável que o fortaleça na sua vocação e missão. O
padre cuida, mas também precisa ser cuidado.
Um último passo é o cuidado dos
bispos com os seus sacerdotes. E deve ser um cuidado paternal, afinal o bispo é
pai, e como tal precisa estar atento e ser próximo dos seus filhos sacerdotes,
sobretudo quando estes estão passando por situações mais delicadas e de fragilidades
na saúde mental.
Assim como Jesus, que foi
enviado pelo Pai, e deseja que nenhum daqueles que lhe foram confiados se
percam (cf. Jo 6,39), o bispo, o presbitério e o povo, devem fazer o mesmo a
fim de que nenhum sacerdote perca a sua vida por falta de cuidado, atenção e
amor. Padre, a sua vida também importa!’
Fonte : *Artigo
na íntegra https://domtotal.com/noticia/1544623/2021/10/padre-sua-vida-tambem-importa/
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