Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo d0 Padre Geraldo de Mori, SJ
‘Nos dias 9 e 10 de outubro, o
papa Francisco abriu oficialmente o percurso que culminará no próximo Sínodo
dos Bispos, em 2023. Ampliando o processo inaugurado nos sínodos anteriores,
ele propôs um percurso que deverá implicar toda a Igreja nesta primeira etapa,
que é denominada de ‘escuta’. De fato, no dia 17 de outubro, todas as
dioceses do mundo deverão também abrir oficialmente seu processo sinodal.
Qual a novidade desse percurso,
para além da ampliação da escuta, uma vez que os sínodos da Família, da Juventude
e da Amazônia já tinham auscultado as Igrejas locais através de inúmeras
iniciativas? O que está em jogo nesta proposta, voltada aparentemente para uma
dinâmica interna à própria Igreja, já que o tema em discussão é o da
sinodalidade?
O papa Francisco assumiu o
pontificado em um momento de grande crise no seio da Igreja. Falava-se então da
necessidade de uma reforma, não só no exercício do pontificado e da Cúria
Romana, mas também no modo de funcionamento da própria Igreja. O recente
relatório sobre os abusos de menores na Igreja da França, mostra a urgência
dessa reforma, que não pode, porém, circunscrever-se às instâncias decisórias,
mas deve implicar todo o ‘povo fiel de Deus’, como insiste o papa.
O Concílio Vaticano 2º, como
dizem muitos de seus intérpretes, foi um evento fundamentalmente eclesiológico,
ou seja, propôs para a Igreja uma releitura de sua identidade e missão em um
mundo que se tornava ‘autônomo’. Mais que contrapor-se a esse mundo,
vendo-se a si mesma como ‘sociedade perfeita’, pensada a partir do
sacramento da ordem e dos ‘estados de perfeição’, o concílio revisitou a
imagem da Igreja como ‘sacramento ou sinal e instrumento da íntima união com
Deus e da unidade de todo o gênero humano’ (LG n. 1), que se coloca a si
mesma como servidora do Reino, pensada a partir do sacramento do batismo, que
confere a todos os fiéis a mesma dignidade sacerdotal, profética e real.
O texto do Documento
Preparatório, elaborado pela Secretaria Geral do Sínodo, inspirado no
magistério de Francisco, propõe uma reflexão sobre os termos a partir dos quais
é composto o tema do sínodo : comunhão, participação e missão. Esses termos são
a chave de leitura para a própria ideia de sinodalidade, que ajuda a entender a
reforma proposta pelo papa em seus textos e decisões. De fato, as metáforas da ‘Igreja
em saída’ e da ‘Igreja hospital de campanha’, da Evangelii
gaudium, indicam em que perspectiva deve ser pensada a missão.
Por sua vez, os princípios que
orientam a convivência social e o bem comum, na mesma exortação, a saber, o ‘tempo
é superior ao espaço’ (EG 222-225); a ‘unidade prevalece sobre o
conflito’ (EG 226-230); a ‘realidade é mais importante do que a ideia’
(EG 231-233); o ‘todo é superior à parte’ (234-237), e as ideias que orientam a
amizade e o diálogo social na Fratelli tutti, mostram como
entender a comunhão e a participação em perspectiva sinodal. Frente às inúmeras
‘sombras’ de um ‘mundo fechado’ (FT 9-55), a Igreja, pelo
testemunho da comunhão, deve criar ‘pontes’ que aproximem as pessoas,
promovendo a participação de todos os seus fiéis no serviço samaritano aos que
estão à beira do caminho (FT 56-86).
A reflexão do Documento
Preparatório propõe também uma leitura sobre o significado do termo sínodo,
retomando o discurso do papa por ocasião dos 50 anos da instituição do Sínodo
dos Bispos, no qual Francisco afirma que aquilo que o Senhor nos pede, de certo
modo já está tudo contido na palavra ‘sínodo’. Jesus se apresenta a si
mesmo como ‘o caminho, a verdade e a vida’ (Jo 14,6) e os cristãos eram
inicialmente conhecidos como ‘discípulos do caminho’ (At 9,2). A
sinodalidade não se reduzia então a encontros, mas era o modo de viver e de
operar da Igreja. Ela foi seu jeito habitual de proceder no primeiro milênio,
sendo redescoberta pela Igreja católica no Concílio Vaticano 2º, mostrando como
todos/as são chamados/as a aprender no caminhar juntos.
O Documento Preparatório propõe
ainda duas cenas do Novo Testamento para entender a sinodalidade : a que põe em
relação Jesus, a multidão e os apóstolos, que mostra como essa dinâmica deve
manter-se viva ainda hoje na Igreja, onde todos/as devem assumir sua vocação
batismal; e a que põe em relação Cornélio e Pedro (At 10), e indica como o
caminhar juntos supõe a conversão de todos/as que estão no caminho.
No discurso que fez no dia 9 de
outubro, no momento de reflexão sobre o início do processo sinodal, o papa
recorda três ameaças ao processo sinodal : o formalismo, que faz com que o
sínodo seja apenas um processo formal, sem impacto real na vida da Igreja; o intelectualismo,
que converte o sínodo num ‘grupo de estudo’, sem implicar os processos
eclesiais; o imobilismo, que impede a Igreja de assumir esse processo,
preferindo continuar na ‘pastoral de manutenção’.
Francisco também aponta as três
oportunidades abertas pelo processo sinodal : a de caminhar, não
ocasionalmente, mas estruturalmente na perspectiva sinodal; a de ser uma Igreja
da escuta, aprendida na adoração, escutando os/as irmãos/ãs em suas esperanças
e crises; a de ser uma Igreja da proximidade, que é o estilo de Deus, que se
aproxima com atitude de compaixão e ternura, uma Igreja que não se afasta da
vida, mas que ajuda a carregar as fragilidades e pobrezas de nosso tempo,
curando as feridas e sanando os corações aquebrantados.
O papa Francisco afirma
inúmeras vezes que o importante é ‘abrir processos’ e não ‘dominar’
as dinâmicas que eles vão tornando possíveis. Como ele disse na homilia de
abertura do sínodo, no dia 10 de outubro, ‘trata-se de se colocar à escuta
do Espírito’, para saber o que Ele diz à Igreja, discernindo qual Sua
vontade para os que se dizem ‘discípulos do Caminho’ hoje.
Oxalá esse percurso, para o
qual todas as Igrejas particulares são convidadas, possa ser o semeadouro de ‘novos
processos’, ajudando-as a um ‘caminhar juntos’, descobrindo qual o
carisma de cada irmão/ã, numa real perspectiva sinodal, que as ajudem a
eliminar o clericalismo, que tanto mal lhes tem feito, impedindo-as de serem a
Igreja que brotou do lado aberto do Crucificado, na qual todos/as possuem a
mesma dignidade e são chamados/as na edificação do Reino de Deus.’
Fonte : *Artigo
na íntegra https://domtotal.com/noticia/1544892/2021/10/para-uma-igreja-sinodal-comunhao-participacao-e-missao/
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