Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
Acessórios são derretidos em um cadinho (ou crisol) no mercado de ouro da capital sudanesa, Cartum. A palavra crise significa separar, depurar, como se faz com o ouro.
*Artigo
de Fabrício Veliq,
teólogo protestante
‘É
muito comum ouvirmos falar de crises, especialmente no momento atual, no qual
um mau governo se instaurou no país. Essa palavra é constantemente ouvida em
noticiários, análises econômicas e questões éticas. Entre bons analistas, é
categórico o veredito de que passamos por uma crise.
O dicionário de filosofia online traz como uma das definições da palavra crise (do grego krisis)
o termo ‘juízo’, entendido ‘(...)como decisão final sobre um processo
e ainda, generalizando, decisão de um acontecer num sentido ou noutro. (...) De
um modo geral, crise designa uma fase ou uma situação perigosa, da qual pode
resultar algo benéfico ou algo pernicioso para o indivíduo ou para a comunidade
que por ele passa um estado transitório de incerteza e dificuldades, mas também
cheio de possibilidades de renovação’.
Cabe
aqui reter essa característica da definição quando falamos a respeito da
teologia. Ao contrário do que muitas pessoas tendem a pensar, as crises não
necessariamente indicam algo ruim, mas, como nos mostra o dicionário, é também
momento de possibilidades, ainda que marcado pelas incertezas e dificuldades ao
longo do processo. Se isso é mantido em mente, então qualquer teologia séria deve
se mostrar disposta a entrar nos períodos de crise, naqueles em que ela faz um
juízo sobre si e se coloca em situações perigosas, a fim de repensar sua
relação consigo e com o próprio mundo.
Nesse
sentido, somente uma teologia em crise é capaz de prosseguir. Do contrário,
torna-se fechada em si, confortável no seu lugar seguro, e com respostas
prontas para todas as novas situações que a sociedade do seu tempo coloca.
Uma
teologia que não entra em crise em alguns momentos se torna engessada,
esquecendo-se de acompanhar os sinais dos tempos. Quando isso acontece, ao
invés de se mostrar como voz a ser ouvida, é vista e percebida como alguém que
não tem nada de útil a dizer, como alguém que fala das ‘eras de ouro’,
ou como tola que constantemente pergunta ‘Por que os dias do passado foram
melhores que os de hoje?’.
Teologias
em crise são fundamentais para a possibilidade de renovação da própria
teologia. Se nas relações interpessoais os momentos de crise se mostram como
oportunidades para se repensar a vida, as atitudes, os desejos e o sonhos, para
a teologia esses momentos se mostram como reveladores de novas maneiras de
falar sobre aquilo que foi narrado sobre Deus.
Ao
mesmo tempo, faz despontar novos teólogos e teólogas, que estão fora do status
quo criado pelos ambientes teológicos e, por isso mesmo, com maior
probabilidade de não terem a mentalidade fechada em dogmatismos que, como areia
movediça, puxam para dentro deles tudo o que entra em seus territórios (uma
armadilha na qual muitos teólogos e teólogas caem ao longo de sua trajetória).
Se
nas relações humanas vivenciar crises com coragem é salutar para se obter um
crescimento pessoal e relacional, na teologia, que trata como um de seus temas
a relação entre o ser humano e Deus, tais crises também se mostram
imprescindíveis para o fazer teológico. Passar por elas, então, não deve ser
motivo de medo ou temor, mas de confiança e esperança de que, após ela, será
possível se ter uma teologia mais depurada que, falando ao seu tempo, torne-se
digna de ser ouvida.’
Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1474015/2020/09/a-necessidade-de-crise-na-teologia/
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