*Artigo do Cardeal Dom Orani João Tempesta, O.
Cist.,
Arcebispo Metropolitano de
São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ
No
momento atual é importante colocarmos o adjetivo ‘cristã’ na festa que ora celebramos, pois nem sempre esse aspecto
fica claro para as pessoas. A imagem midiática que a maioria tem do Natal é que
a data é uma ótima oportunidade de compras e vendas, de dar e receber
presentes, de comidas, bebidas em abundância, de visitas de confraternizações.
Não
há dúvida de que alguns desses aspectos podem até mesmo entusiasmar as pessoas,
em especial as crianças, e fazem parte do nosso imaginário que trazemos desde a
infância.
Porém,
atualmente, estamos esquecendo um outro aspecto central no momento de Natal,
que, de uma certa forma, também trazemos impresso em nossa memória : as
celebrações litúrgicas que marcam a data, dando sentido ao conteúdo principal
da festa : o Mistério da Encarnação!
O
Natal foi sendo trabalhado por muitas gerações e circunstâncias e, de uma certa
forma, todas têm uma ligação com essa solenidade, mas que, infelizmente, aos
poucos tem perdido o seu centro. Quantas vezes escutamos que as pessoas não
puderam participar da celebração por causa das visitas dos parentes e amigos
que chegaram, porque estavam preocupadas em fazer ou comprar a comida ou até
mesmo enfeitando a sua residência?
A
imagem da família indo para a Igreja para participar da Missa da Noite de Natal
ou mesmo no Dia de Natal está ficando meio esquecida, devido à falta de
incentivo e motivação para que essa imagem continue como uma atitude concreta.
A
alegação do medo da violência para o deslocamento noturno é apenas uma parte da
desculpa, pois para outros eventos e circunstâncias a movimentação é possível e
acontece, embora, infelizmente, essa razão tenha um fundo verdadeiro, mas que
não exclui ainda a nossa liberdade de locomoção.
A
celebração do Natal é a do acontecimento único e exclusivo em nossa História :
Deus, o totalmente outro, um único Deus em três Pessoas, veio morar entre nós!
O Verbo eterno do Pai ‘se encarnou’,
tomou a nossa carne! Quando chegou o momento certo, Deus enviou o seu Filho
nascido da Virgem Maria para ser o nosso Salvador como havia prometido. Com o
nascimento de Jesus Cristo, começa a nossa Redenção. Esse acontecimento é o
centro da História humana, a tal ponto que os anos passam a ser contados em ‘antes’ e ‘depois’ de Cristo.
As
questões periféricas sobre o ‘dia do
nascimento de Cristo’ e o erro na contagem dos anos não tiram a
centralidade desse acontecimento único : a intervenção de Deus em nossa vida!
Veio para o que era Seu, e os seus não o receberam, lamenta a Escritura. Com
Cristo temos a nova criação, o Novo Adão, do qual somos todos descendentes, já
que salvos por Ele.
Porém,
aqu’Ele que veio para todos (universalidade da salvação) derramou o sangue para
muitos, recordando que nem todos acolhem a Sua Palavra e a Revelação do Caminho
para a vida eterna. E o apelo do Natal é para que, celebrando o seu nascimento
hoje, aprofundemos o encontro com Ele, pois com a Encarnação nós O encontramos
em cada irmão e irmã.
Ao
celebrarmos o Natal, a festa cristã, não estamos apenas recordando um fato
passado, mas sim atualizando para hoje essa realidade. Ao recordarmos que Jesus
Cristo nasceu historicamente e que Ele virá um dia escatologicamente, queremos
aprofundar o nosso encontro com Ele no tempo que se chama hoje. Ele, que é
verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, tornou-Se a nossa ‘ponte’ de encontro. Ele é o Pontífice
que nos leva a caminharmos para a união com a Trindade, e nos traz a vontade de
Deus para que vivamos segundo os planos do Pai.
Por
isso, o tempo do Advento que acabamos de celebrar foi a oportunidade de
purificarmos o nosso coração e a nossa mente para que o Natal seja realmente
uma festa cristã.
Não
imaginava que um dia fosse necessário em nossa realidade ter que ‘adjetivar’ essa festa, como acontece em
alguns países do Oriente em que alguém precisa se apresentar como ‘sacerdote de Jesus Cristo’ porque se
conhece outro tipo de sacerdócio das religiões não cristãs. Ao constatarmos
isso em nosso Ocidente ‘chamado cristão’,
é uma realidade que nos leva a enfrentar com muita coragem esse desafio de
celebrarmos a Vida de Jesus Cristo, que nasce como Messias e Salvador.
Retornando
ao centro da festa, até mesmo as outras atividades tradicionais deste tempo
adquirem um certo sentido, desde que haja a singeleza e a simplicidade que
requer o momento do ‘presépio’.
Natal
é vida que nasce, é alegria do encontro com Jesus Cristo como Senhor da Vida e
da História, é encontro com os irmãos e irmãs na construção da vida de
fraternidade, que é possível para aqueles que creem e O aceitam como Salvador.
Participemos
com alegria das celebrações natalinas em nossas comunidades! Talvez esse seja
um primeiro passo para não perdermos o sentido da festa cristã. Um povo que
segue verdadeiramente a Cristo é um povo que constrói um mundo de irmãos!
Feliz
e Santo Natal e uma bênção especial com muito carinho a todos os que são amados
por Deus!’
Fonte
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