sexta-feira, 3 de julho de 2015

História a construir


*Artigo de Padre José Rebelo,
Missionário Comboniano

Os religiosos e missionários são chamados a estar nas fronteiras da Igreja e do mundo e ser um sinal de amor e esperança, sobretudo para quem mais precisa.


‘Em Abril, houve um congresso em Roma para formadores de todo o mundo no âmbito do Ano da Vida Consagrada. O evento contou com a presença de 1200 participantes. Ao dirigir-se-lhes, o Papa Francisco disse : ‘Vendo-vos assim numerosos, não se diria que há crise vocacional, mas na realidade há, sem dúvida, uma diminuição quantitativa. Com a escassez de vocações que existe, são mais os formadores que os formandos. Isso é um problema.

O papa falou de crise da Vida Consagrada. Há quem prefira falar apenas de ‘encruzilhada’. Mas o número elevado das desistências parece apontar para uma crise na linha do sentir do papa. Senão vejamos : a Igreja Católica conta com cerca de um milhão de religiosos (irmãos, irmãs e padres). Mas cerca de três a quatro mil, segundo a Santa Sé, desistem por ano deste estilo de vida.

O fenômeno indica uma crise de identidade que terá múltiplas explicações : perda de aspectos essenciais para a vida consagrada (oração, momentos de qualidade na comunidade, retiros), perda dos valores evangélicos (fraternidade, simplicidade e autodoação) e a assunção dos ideais da modernidade (individualismo, comodismo, prazer e materialismo). A experiência de Deus, a vida comunitária e o compromisso apostólico diluem-se, vive-se de rotinas e formalismos, perde-se a paixão e o profetismo e, por fim, experimenta-se cansaço e desilusão.

O Ano da Vida Consagrada questiona-nos sobre a fidelidade à missão que nos foi confiada’, escreveu o papa na carta apostólica para este ano. Tal requer que os institutos e os seus membros se deixem interpelar pelo Evangelho e procurem ser fiéis ao seu carisma – e não se contentem com superficialismos, ou se deixem enganar por meias-verdades. Para um instituto missionário, uma delas pode ser aquela de dizer que ‘a Europa também é missão’ e aceitar os mais variados empenhos pastorais sem muito discernimento.

Quando trabalhava nas Filipinas, na revista World Mission, quisemos fazer um especial sobre a missão. Procuramos peritos em Roma. Um dos textos, de um professor de Missiologia numa das universidades pontifícias e originário do Oriente, discutia o mandato universal de Jesus, em particular o conceito ‘confins da terra’ no verso ‘Sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até aos confins da Terra’ (Act 1, 8). Defendia ele que os ‘confins da Terra’ se tinham invertido : vinham agora aos ‘centros tradicionais da Cristandade’ na pessoa dos turistas, estudantes e imigrantes pelo que o mais importante seria cuidar deles aqui entre nós. Portanto, já não seria preciso viajar para fazer missão : o ‘turismo missionário’, como ele o chamou, já estaria ultrapassado.

Os imigrantes e os estudantes que chegam à Europa precisam, seguramente, de ajuda. Mas a missão nas ‘periferias existenciais’ não se reduz ao que pode ser feito por eles, nem a ‘missão geográfica’ está definitivamente ultrapassada : periferias humanas e geográficas, frequentemente, coincidem. Os religiosos e missionários são chamados a estar nas fronteiras da Igreja e do mundo e ser um sinal de amor e esperança, sobretudo para quem mais precisa. Por isso é que o papa os desafia a olhar com gratidão para o passado, viver com paixão o presente e abraçar com esperança o futuro : ‘Vós não tendes apenas uma história gloriosa para recordar e narrar, mas uma grande história a construir!’ Sem medo, com generosidade e alegria, deixando-se guiar pelo Espírito em toda a sua imprevisibilidade.’


Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.alem-mar.org/cgi-bin/quickregister/scripts/redirect.cgi?redirect=EuFVAkFZuAaceTzcYb
  

Nenhum comentário:

Postar um comentário