Após conhecer a vila de Wanteete em um trabalho como instrutor de fotografia, Bruno Feder passou a transformar cliques em melhorias para o povoado. |
*Artigo de Thiago Guimarães,
da BBC Brasil em São Paulo
Um jovem ocidental de 30 e
poucos anos, criado em grandes centros urbanos, pode fazer a diferença em
comunidades remotas na África rural?
‘Pode
parecer impossível, mas é o que vem fazendo Bruno Feder, 31 anos, natural de
São Paulo.
Feder
transformou o hobby em profissão e há um ano e meio reverte o dinheiro de suas
fotografias, registradas na África, para melhorar a vida de comunidades em
Uganda e no Sudão do Sul.
Tudo
começou em 2013, quando Feder decidiu fazer um curso no ICP (International
Center of Photography), em Nova York. Por lá, conheceu a fotógrafa Louise
Contino, que estava de malas prontas para Uganda.
O
destino era Wanteete, localidade rural a cerca de 150 km da capital do país,
Kampala. Uma vila de 3 mil moradores sem saneamento básico, médicos nem água
limpa.
Louise
ensinaria 15 moradores da comunidade a contar histórias por meio da fotografia,
e Feder acabou como assistente do projeto.
De
volta ao Brasil, teve a ideia de vender as imagens captadas na comunidade para
melhorar a condição de vida dos próprios moradores.
Com
o dinheiro de 27 fotos, ele voltou a Wanteete em agosto de 2014. Passou dias
comprando madeira para mesas e cadeiras, medindo crianças e adquirindo tecidos
para uniformes.
Reforma na escola de Wanteete; fotógrafo acompanha a contratação e execução dos trabalhos |
Resultado
: 600 lápis, 600 livros, 200 apontadores, 180 uniformes e um caminhão de tábuas
para originar mesas e cadeiras para a pequena escola local, até então sem
mobília.
O
sucesso da primeira empreitada rendeu uma exposição de fotos no Brasil em
novembro do ano passado, a Uganda Edition,
onde Feder vendeu mais cem registros do projeto, que batizou como Cross Geographic.
O
brasileiro diz que procura intervir o mínimo possível nas cenas que registra, e
que, sempre que pode, opta por fugir dos clichês de miséria associados à
realidade africana. ‘É importante mostrar
coisas positivas de uma região que já é tão estigmatizada. Costuma-se pensar
apenas em Aids, pobreza e guerra em relação à África, e não há só isso’,
afirma.
Coloridos
e em preto e branco, os registros de Feder custam R$ 350 cada um, em formato
30x40 cm, e privilegiam cenas da vida cotidiana e da natureza locais.
Cliques que são revertidos em recursos costumam retratar cenas cotidianas de comunidades africanas. |
Consolidação e ampliação
O
fotógrafo, que tem formação em Relações Internacionais, diz ter revertido cerca
de US$ 25 mil em realizações em Wanteete.
A
partir da terceira visita, em dezembro de 2014, o projeto também financiou
ações em saúde. Distribuiu mais de 4.000 preservativos e 500 escovas de dente,
vermifugou 200 crianças, montou uma tenda para atendimentos dentários e
viabilizou a cirurgia, na capital, de uma moradora idosa com câncer no pescoço.
E
com o reforço em infraestrutura, a escola cresceu e passou a receber mais 120
alunos.
O
trabalho no Cross Geographic deu vazão à vocação de Feder, que sempre se
interessou por culturas e povos distantes. Após passar um ano na Nova Zelândia
na adolescência, enquanto colegas sonhavam com viagens aos EUA e à Europa, ele
mapeava destinos como Laos, Nepal e Filipinas.
‘Sempre me interessei por temas globais’,
conta o fotógrafo, que antes trabalhou em setores de relações internacionais na
prefeitura e no governo de São Paulo.
Sudão do Sul
Em
abril deste ano, ao fazer mais uma visita a Uganda, Feder teve a oportunidade
de viajar ao Sudão do Sul, país mais novo do mundo e cenário de uma dura guerra
civil há quase dois anos.
Baseado
em Juba, capital do Sudão do Sul, o brasileiro esteve em campos de refugiados
(a estimativa da ONU é de 2,2 milhões de deslocados em razão do conflito) e
ajudou a registrar o trabalho de entidades como a ONG sul-sudanesa CCC (Confident Children Out of Conflict,
crianças confiantes fora de conflito, em tradução livre), que trabalha com
crianças órfãs e vítimas de violência.
No registro de Feder, a brincadeira de uma criança em meio a um campo de refugiados no Sudão do Sul. |
Bancando
os próprios custos, ele irá retornar ao Sudão do Sul em agosto (após uma parada
em Uganda para obtenção do visto) para mais uma missão de ‘coisas pontuais e possíveis de se realizar’, como as pequenas
melhorias que ajudou a viabilizar em Uganda.
‘É algo que discuto na hora e vejo a demanda
com diretores de escolas, por exemplo.’
O
trabalho em uma nação em guerra, naturalmente, é muito mais difícil. Feder
conta que a população sul-sudanesa em geral é mais arredia aos registros. ‘São gerações sofridas e perdidas, e tudo o
que sabem envolve conflito’, afirma.
Há
também dificuldades com tropas policiais e militares, que impedem o registro de
estruturas que possam identificar determinada região, como pontes e viadutos, e
não raro trabalham alcoolizados e praticando extorsão.
‘O Sudão
do Sul é um bebê do mundo, completamente abandonado’, diz o fotógrafo brasileiro, ao
explicar o que o motiva para começar uma nova história pelos confins da África.’
Fonte :
* Artigo na íntegra de
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