*Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de
Belo Horizonte, MG
‘O altruísmo, condição fundamental para a
civilização, está em falta. Estabelecida uma comparação com outros tempos, é
preocupante a situação. Hoje, inclusive, pouco se fala sobre altruísmo. Muitos
deveriam recorrer ao dicionário para se inteirar sobre o significado dessa
palavra, relacionada a uma qualidade que deveria ser exercida em todo
lugar. O déficit lastimável de altruísmo
cresce em razão da falta de práticas marcadas por esse atributo. Uma das
exceções dessa triste realidade é formada por segmentos que ainda se preocupam
com o cuidado social dos que estão em situação de vulnerabilidade. Porém, para
enfrentar os cenários de miséria e exclusão, precisa-se de maior soma de
esforços. Na contramão do altruísmo, está a indiferença para com os pobres pela
dificuldade de repartir.
Quando
se compreende o altruísmo como capacidade humana de tender sempre ao cuidado
com o outro, diante da realidade atual, constata-se a vitória da ação
antagônica, o egoísmo. Por isso, surgem cenas abomináveis e há extrema
dificuldade para sair das graves crises que estão afligindo a sociedade. É
triste, por exemplo, ver a confusão no cenário político brasileiro. Em
evidência estão os esquemas bárbaros de corrupção, que envolvem partidos
diversos, vários segmentos da sociedade e cidadãos, revelando o peso
determinante de egoísmos doentios. Constata-se também a incompetência no
exercício da liderança para encontrar novos rumos. A carência de altruísmo é um
mal generalizado. Dos ocupantes de altos cargos aos que são responsáveis pelos
afazeres mais simples, todos podem ser afetados por essa carência que
inviabiliza a solução de problemas sociais.
A falta de respostas capazes de superar as crises emana da incompetência
humanística e espiritual que confina grupos políticos, construtores da
sociedade e religiosos na mesquinhez de interesses e de comodidades.
Pode-se
observar diferentes situações sociopolíticas, culturais e religiosas, nos
diversos âmbitos da sociedade brasileira, que sempre se constata a prevalência
de uma apatia instalada. Basta acompanhar pela mídia o que é noticiado no
cenário político. Trata-se de uma saga novelesca que envolve manobras, ataques,
tramas, agressões, defesas, articulações. Tudo o que se encontra em uma novela
de pouca qualidade formativa. Os líderes pecam por falta de altruísmo, mal que
inviabiliza ações generosas, com relevante sentido social e humanitário, em
diversos segmentos - nos serviços da educação, da vivência da fé, da construção
em geral da sociedade.
Interrogados,
todos responderão que desejam a superação das crises. Mas a solução esperada é
sempre uma oferta feita pela outra parte. O ponto de partida, porém, deve ser o
altruísmo - reconstruir e encontrar saídas pelo gesto de oferecer primeiro. Só
um espírito altruísta é capaz de abrir mão de benefícios, status e até de
conquistas pessoais com o objetivo de se alcançar um novo estágio, o bem comum.
Isto não se faz sem competência humanística. Uma qualidade que não deixa o
indivíduo instalar-se na linha abominável da mediocridade, na estreiteza que
não permite pensar projetos maiores.
Lamentavelmente,
empenha-se muito para preservar a mesquinhez, o egoísmo de ajuntar para si e
permanecer na ilusão de que a vida vale pelo que se tem, não pelo que se é ou
pelo que se faz em benefício do outro. Explicitam-se assim as razões que
incapacitam os governantes para discernir e escolher bem, perpetuando
necessidades e demandas do povo. A falta
de altruísmo afeta até mesmo os âmbitos da cultura, de sua produção. Apequena
também a religiosidade, transformada em lugar de disputa, de autoafirmação e de
pouca contribuição. Eventuais soluções para as outras crises, como a econômica,
correm o risco de serem enfraquecidas justamente pela falta de altruísmo.
Essa
qualidade, fruto da educação familiar, escolar e religiosa, é um remédio indispensável
para a superação de irracionalidades. O momento é de povoar os cenários da
política, do mundo da educação, da cultura, do empreendedorismo e da família
com figuras que primam por gestos marcados pelo altruísmo.’
Fonte :
* Artigo na íntegra de http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=5221
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