* Artigo de Dom Walmor Oliveira de Azevedo,
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte
‘Os diagnósticos da crise contemporânea
apontam processos corrosivos de desumanização, pesando existencialmente sobre
os ombros de todos. É incontestável a perda do sentido da própria vida, com
consequentes atentados contra a dignidade do outro. Violências de todo tipo
permeiam as relações sociais e humanas como o tráfico de pessoas - tema da
Campanha da Fraternidade (CF-2014) - a banalização da vida e a perda da noção
de moralidade, que resultam no desrespeito aos valores essenciais do ser
humano.
Essa desumanização que alimenta dia a
dia o aumento da violência e intensifica a inércia de ações governamentais e
cidadãs, exige reação urgente e massiva na reconfiguração dos cenários
socioculturais e políticos.
Tem-se a impressão de que a sociedade
contemporânea é um caminhão desgovernado ladeira a baixo, sem freios. De tudo
acontece. Tudo parece possível quando deixa de existir clareza sobre os valores
do bem e do mal na vida social e familiar. Diante desta realidade, é
compromisso inegociável do cristão o combate diuturno para fazer triunfar o bem
e a justiça.
Ardiloso, o mal não se dobra facilmente
a qualquer ameaça. Vencê-lo requer estratégias inteligentes, de racionalidade e
de vontade política próprias de quem tem estatura cidadã. Mas só a
espiritualidade é capaz de sustentar a competência daquele que assume esta
luta. Só ela tem poderes para alargar os corações e capacitar as pessoas para
uma compreensão que ultrapassa a simples lógica das relações formais e conduzir
à construção de uma sociedade justa e solidária, por meio do aprendizado do
amor a partir de sua gênese: a fonte inesgotável, o amor, Deus revelado de
maneira plena na pessoa de seu Filho, Jesus Cristo, Salvador e Redentor.
Significativo é ter presente o ápice do diálogo de Jesus com Nicodemos, narrado
pelo evangelista João, quando o Mestre diz: ‘Deus amou tanto o mundo, que deu o
seu filho único, para que todo aquele que nele crer não pereça mas tenha a vida
eterna’.
Não se pode ser coração da paz e,
assim, vencer o mal, sem beber da fonte do amor, que o limite humano não
garante, em si. E este amor de Deus, na
história da humanidade, se personifica em Jesus Cristo. Se há essa compreensão,
permanece cotidianamente o desafio de aproximação dessa fonte e o usufruto da
oferta dadivosa que ele faz de si, com ensinamentos e gestos que, imitados e
testemunhados, podem fazer de cada coração da paz instrumento de consecução de
uma dinâmica social e política que promova a dignidade humana.
Esses espantosos diagnósticos de
desumanização da sociedade contemporânea precisam ser afrontados, com o
propósito inadiável de nova configuração, em segurança pública, educação,
trabalho, saúde, moradia, política menos partidarista e mais cidadã. Pela
garantia de oportunidades para todos, por uma cultura que supere a exclusão
social. Sendo assim, a reconquista da humanização que se anseia neste momento,
com a reorganização das diversidades de todo tipo, autonomias e liberdades,
demandas e prioridades, só será possível por meio de uma espiritualidade
enraizada, fazendo de cada pessoa coração da paz.
A vivência da Semana Santa, a Semana
Maior, fixando o olhar na revelação plena do amor de Deus, aproximando-nos da
fonte inesgotável, é a grande oportunidade para se recuperar a espiritualidade
tão necessária. A superficialidade de fazer da Semana Santa um feriadão pode
ser um equívoco. O repouso justo, o silêncio fecundante, a oração alargadora do
coração, as abstinências, a sensibilização pela escuta e a celebração do
mistério da paixão, morte e ressurreição de Jesus são possibilidades fecundas
para um novo tempo de vida pessoal e comunitária em busca do indispensável
vigor espiritual.’
Fonte :
* Artigo na íntegra
de http://www.zenit.org/pt/articles/a-superficialidade-de-fazer-da-semana-santa-um-feriadao-pode-ser-um-equivoco
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