Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
Mosteiro de Martigné-Briand, França
‘Não se entra no mosteiro para fazer estudos de
teologia, mas para se servir de um caminho de libertação interior que nos
conduzirá a nada ter de mais caro que Cristo. Entretanto, pode acontecer que as
circunstâncias permitam estes estudos, e que eles sejam benéficos para a vida
monástica. Este pequeno testemunho pretende ser eco disso.
Os estudos de teologia podem começar desde o
noviciado, graças à aulas recebidas, às leituras pessoais que é bom poder
realizar de modo aprofundado no princípio da formação monástica. Após a
profissão temporária, é costume entre nós que seja reservado um ano à inserção
em comunidade pelo trabalho e a vida fraterna. Entretanto, durante este ano,
pude realizar um trabalho muito enriquecedor sobre Santo Ireneu, uma boa porta
de entrada na teologia, em ligação com um professor da universidade católica de
Angers. Em seguida pude participar do STIM, ciclo comum durante três anos, que
além de um ensino de qualidade, permitiu-me viver trocas e encontros com outros
jovens monges e monjas, e alguns laços tecidos nesta ocasião perduram até hoje.
Depois, realizei o ciclo do Bac em parceria com o Centro Sèvres e o seu método
pedagógico bem concluído. Depois pude completar o segundo ciclo de teologia na
universidade católica de Angers em quatro anos através da assistência de uma única
tarde de presença por semana na faculdade, até à obtenção da licenciatura
canônica. Enfim, os meus estudos acabaram com a realização da tese na
universidade católica de Angers, debruçada sobre o estatuto da percepção
sensível nas Questões a Talassios de Máximo o Confessor. A meu ver, todos os
estudos de teologia até à licenciatura canônica visam obter uma certa cultura
em teologia, o que representa um grande trabalho tendo em conta a nossa
tradição de pensamento cristão. Mas com o trabalho de tese, trata-se
verdadeiramente de um compromisso pessoal e criador onde é possível acrescentar
a sua pequena pedra ao edifício do estudo teológico, podendo assim contribuir
com uma base de trabalho para outros que continuarão a tarefa. Realizei estes
longos estudos em paralelo com as tarefas que me eram confiadas em comunidade,
primeiro a cozinha, depois o ateliê de doces, o ateliê de cerâmica, a horta e o
pomar.
Gostaria de resumir brevemente quais os contributos
dos estudos de teologia para a vida monástica.
O primeiro ponto concerne à nossa tradição
monástica. A Regra de São Bento aconselha partilhar o tempo que não é dedicado
ao opus Dei entre a lectio divina e o trabalho manual. A lectio
divina é o estudo da Bíblia e dos Padres, um estudo orante e nutriente, sendo
totalmente possível encontrar este alimento da alma nos estudos de teologia
desde que estes sejam abordados na sede do mistério, e não com a secreta
intenção de daí retirar uma glória pessoal. Esta implicação é por outro lado
também presente no trabalho manual, e São Bento não deixa de sublinhá-lo.
Deve-se acrescentar que é nos mosteiros que a cultura da antiguidade tem podido
ser conservada no Ocidente e sobreviver aos devires da história e aos
acontecimentos políticos. Nos nossos dias, os abalos que agitam a nossa
sociedade fazem dos mosteiros lugares que permitam a transmissão de uma cultura
e, note-se, a das línguas antigas, cujo ensino tem sido brutalmente diminuído
nestes últimos tempos.
A segunda vantagem dos estudos de teologia é o de
um equilíbrio humano. A nossa natureza é feita para se desenvolver em todas as
suas faculdades, e tal como o trabalho físico permite desenvolver
harmoniosamente as forças do corpo, também o estudo permite exercer as forças
do espírito de modo proporcional. Os estudos permitem pois encontrar um
equilíbrio, se nisso tivermos gosto. Concentrar-se sobre um objetivo e
aprofundá-lo é uma disciplina que permite descentrar-se dos seus problemas
pessoais, abrir-se ao pensamento de outro e alargar o seu mundo interior.
Enfim, o terceiro ponto que gostaria de sublinhar é
o mais importante. Os estudos de teologia podem ser um apoio necessário à
própria vida monástica. Na época em que vivemos atualmente, a vida monástica
submete-se ao desafio de brutais mudanças culturais. É absolutamente necessário
dimensionar o porquê de termos escolhido esta vida, no que ela tem de
essencial, e do que se pode transformar sem a desvirtuar. Para efetuar este
discernimento, os estudos de teologia são preciosos sob diversos pontos de
vista. Pela confrontação com o pensamento de cristãos apaixonadamente
comprometidos com a sua fé, eles podem suscitar uma experiência de fé pessoal e
intensa. Eles permitem igualmente a expressão desta experiência, porque dão a
possibilidade de pôr em palavras realidades interiores, dando-lhes assim mais
força, mais convicção e tornando-os comunicáveis a outros. Enfim, eles podem
tornar-se um alimento para a fé e um motor para o progresso na união com Deus.
Confrontar-se com um autor de modo regular e aprofundado com a perspectiva de
dever prestar contas do seu trabalho obriga a entrar num arranque de pensamento
bem mais consistente do que se ler livros conforme as suas inclinações
pessoais. Trata-se da edificação de um tipo de construção interior capaz de
resistir às tempestades e aos ventos contrários, e que permite a
construção de uma personalidade intelectual, uma riqueza que é também possível
transmitir à sua volta e aos que dela têm sede.’
Fonte : *Artigo na íntegra
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