*Artigo
de Frei Patrício Sciadini, OCD,
Provincial dos carmelitas
descalços no Egito
‘Procurando no
arquivo da minha memória para refletir sobre a ressurreição, veio-me de repente
uma frase de minha mãe Domênica, pronunciada há muitos anos, exatamente depois
da Missa de Páscoa, enquanto estávamos tomando café com o ovo bento, como é
costume na Itália. Ninguém, no Dia de Páscoa, deixava de comer o ovo abençoado
pelo padre, na visita às famílias, e um pedaço de bolo feito com uva passa.
É a bênção da
ressurreição, e minha mãe, comentando comigo a homilia da Missa, dizia : ‘Ressurreição é acordar-se do sono, do
torpor, do desânimo, do desespero e recomeçar o caminho da vida, sabendo que o
Senhor caminha conosco’. Já tivera muitas experiências na sua vida de
mulher analfabeta, mas com longa caminhada no meio do povo.
A ressurreição –
dizia ela – ‘é o nascer da semente que
fica enterrada dias e dias debaixo da terra e que ao primeiro cair da água e
surgir do sol vai nascendo, dando vida nova a toda a planície. É ver como,
passado o inverno que parece morte, mas não é, tudo volta a florescer e a ser
bonito. Assim é a Páscoa. A gente sofre tanto na Sexta-feira Santa, sofre até
chorar, ao ver Jesus traído pelos melhores amigos, coroado de espinhos, sem ter
feito nenhum mal, mas ao contrário, só ter feito o bem a tanta gente. Sofre ao
ver Jesus carregando a cruz sobre a qual será crucificado’.
‘Dá dó ver que os apóstolos o abandonaram… A
gente sofre. Os olhos se enchem de lágrimas quando se vê o Cristo que nem pode
mais carregar a cruz, mas é obrigado e chicoteado. Cristo morre, mas Ele
acorda, sai do sepulcro e vive de novo, e manda as mulheres darem o anúncio da
vida nova’.
‘Sei que isto é verdade, não por ter lido,
não sei ler – prossegue mãe Domênica
– mas porque vocês padres dizem que está escrito no Evangelho. E mesmo que não
estivesse escrito, sei que é verdade, quando olho a vida das pessoas ao meu
lado. Você conheceu a Albina, ela tinha câncer, sofria terrivelmente, mas todas
as vezes que sabia que alguém ia visitá-la, costumava dizer à minha irmã que
cuidava dela : ‘Olhe, me deixe bonita como uma páscoa porque hoje vêm as minhas
amigas e quero que vejam que estou ressuscitada’.
Páscoa é o nascer
da semente que fica dias e dias debaixo da terra e que ao primeiro cair da água
e ao surgir do sol, vai nascendo, dando vida nova a toda a planície.
E ela era alegre,
feliz, embora a mordida da dor fosse forte e a fizesse sofrer atrozmente. Essa
me parece que é a ressurreição, a coragem de aguentar o sofrimento e crer que é
possível ser feliz quando se pensa na alegria dos outros. Quantas pessoas eu
tenho visto ressuscitar com a nossa ajuda, reviver, serem outras. Quantas
crianças, por um pedaço de pão recebido com carinho e amor, abrem o seu sorriso
e nos falam da vida que renasce…
Minha mãe
continuava dizendo com força e coragem : ‘Acham
que só vocês que estudam e são padres, porque sabem latim, conhecem a
ressurreição? Não, também nós sabemos disto’.
‘Outra coisa linda, que parece uma ressurreição,
é o nascimento de uma criança. As dores do parto são de morrer, mas a criança
que vem ao mundo é alegria, é ressurreição, é vida nova. A ressurreição é
despertar do sono e abrir os olhos à nova vida e ver como Deus não quer ver
ninguém sofrer nem desanimar. A Páscoa é a festa mais bela, por isso toda a
natureza coopera, até as flores do meu jardim no Dia de Páscoa são mais bonitas
e perfumadas…’
Esse acontecimento
que estava guardado na minha memória me fez sorrir silenciosamente e dei nota
10 com louvor à minha mãe em teologia bíblica. Sem que ela tenha lido um texto
de exegese, e nada saber de estudo, entendia que a ressurreição não é de ontem,
mas de hoje, e que Jesus está vivo entre nós no sorriso, na vida, na criança
que nasce, no doente que sabe superar a dor para receber os que ama, etc.
Cheguei à
conclusão de que o dogma da fé na ressurreição de Jesus Cristo é o mais fácil
de acreditar e o mais belo, que é para todos incentivo a não permitir que o
desânimo entre na vida, que o pessimismo faça desaparecer a beleza do amanhã. É
só olhar ao nosso redor e temos uma experiência maravilhosa de como vida e
morte se alternam no cenário do mundo, mas a vitória é sempre da vida.
Todo gesto de
amor, de gratidão, todo sorriso dado a alguém tem o efeito de ressurreição, de
alegria que vem de dentro. A Páscoa é momento de sair pelas ruas e distribuir
sorrisos, apertos de mão, e dizer para cada pessoa : ‘Coragem, não tenha medo, Cristo ressuscitou, Ele está vivo!’.
Cristo veio para
nos ensinar o caminho a ser percorrido, do nascimento até a morte, mas depois
da morte Ele quis dar para todos uma lição maravilhosa : a morte, que é o nada,
não pode vencer nem ser rainha; Deus faz com que a vida retorne na eternidade.
Não é necessário
estudar para acreditar na ressurreição de Jesus e na nossa. É suficiente parar
e olhar dentro de nós mesmos e ver quantas vezes morremos e quantas vezes
ressuscitamos, retomando o caminho da esperança e do amor. Sentir que Jesus
ressuscita em nós porque nos doa a coragem de viver. Dizer aos outros como Ele
disse : ‘Coragem, eu venci o mundo!’’
Fonte :
* Artigo na íntegra
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