*Artigo de Pe. Raniero Cantalamessa, OFM,
pregador oficial da Casa Pontifícia (Vaticano)
‘Hoje vamos continuar e concluir as nossas reflexões
sobre a constituição Dei Verbum, ou seja, sobre a Palavra de Deus.
Na última vez falei da ‘lectio divina’,
ou seja, da leitura pessoal e edificante da Escritura. Seguindo o esquema
delineado por São Tiago distinguimos três operações sucessivas : acolher a Palavra, meditar a Palavra, colocar em prática a Palavra.
Falta uma quarta operação a ser
feita, sobre a qual queremos refletir hoje : anunciar a Palavra.
A Dei Verbum fala brevemente do lugar privilegiado que a
Palavra de Deus deve ter na pregação da Igreja (DV, nr.24), mas não trata
diretamente do anúncio, também porque sobre este argumento o Concílio dedica um
documento a parte, a Ad gentes divinitus, sobre a atividade
missionária da Igreja.
Depois deste texto conciliar, o
discurso foi retomado e atualizado pelo Beato Paulo VI com a Evangelii
nuntiandi, por São João Paulo II com a Redemptoris missio, e
pelo Papa Francisco com a Evangelii gaudium. Do ponto de vista
doutrinário e operacional, portanto, tudo foi dito, e ao mais alto nível do
magistério. Seria insensato da minha parte achar que eu poderia acrescentar
algo. O que é possível fazer, de acordo com a linha destas meditações, é
destacar algum aspecto mais diretamente espiritual do problema. Para fazê-lo,
começo com a frase, muitas vezes repetida, do Beato Paulo VI : ‘o Espírito Santo é o principal agente da
evangelização [1]’.
- O meio e a mensagem
Se eu quero espalhar uma notícia,
o primeiro problema que se coloca é : com qual meio transmiti-la : através do
jornal? através do rádio? através da televisão? O meio é tão importante que a
ciência moderna das comunicações sociais cunhou o slogan : ‘O meio é a mensagem’ ( ‘The medium is the message [2]’).
Ora, qual é o meio primordial e natural com o qual se transmite uma palavra? É
o sopro, a respiração, a voz que toma, por assim dizer, a palavra que se formou
no segredo da minha mente e a leva ao ouvido do interlocutor. Todos os outros
meios apenas potenciam e amplificam este meio primordial do sopro ou da voz.
Também a escritura vem depois e supõe a viva-voz, uma vez que as letras do
alfabeto só são sinais que indicam sons.
Também a Palavra de Deus segue
esta lei. Ela é transmitida por meio de um sopro. E qual é, ou quem é, o sopro,
ou ruah, de Deus, segundo a Bíblia? Nós sabemos : é o Espírito
Santo! O meu sopro pode animar a palavra de um outro, ou o sopro de outro
animar a minha palavra? Não. A minha palavra só pode ser pronunciada com o meu
sopro e a palavra de outro com o seu sopro. Assim, de forma análoga, claro, a
Palavra de Deus só pode ser animada pelo sopro de Deus que é o Espírito Santo.
Esta é uma verdade muito simples
e quase óbvia, mas de imenso alcance. É a lei fundamental de todo anúncio e de
toda evangelização. As notícias humanas se transmitem ou com viva-voz ou via
rádio, jornal, internet, e assim por diante; a notícia divina, em quanto
divina, é transmitida através do Espírito Santo. O Espírito Santo é o
verdadeiro, essencial, meio de comunicação, sem o qual nada se percebe da mensagem,
a não ser o revestimento humano. As palavras de Deus são ‘Espírito e vida’ (cf. Jo 6, 63), e, portanto, só podem ser
transmitidas ou acolhidas ‘no Espírito’.
Esta lei fundamental é a que
vemos em ato, concretamente, na história da salvação. Jesus começou a pregar ‘com o poder do Espírito Santo’ (Lucas
4,14 ss) Ele próprio declarou : ‘O
Espírito do Senhor está sobre mim… ele me consagrou com a unção, para levar aos
pobres uma feliz mensagem’. (Lc 4, 18) Aparecendo aos apóstolos no Cenáculo
na tarde de Páscoa, ele disse : ‘Como o
Pai me enviou, também Eu vos envio. Dito isto, soprou sobre eles e disse :
Recebei o Espírito Santo’ (Jo 20, 21-22). Ao dar aos apóstolos o mandato de
ir a todo o mundo, Jesus lhes deu também o meio para realiza-lo – o Espírito
Santo – e deu-o, de forma significativa, no sinal do sopro, da respiração.
De acordo com Marcos e Mateus, a
última palavra que Jesus disse aos apóstolos antes de subir ao céu foi ‘Ide!’ : ‘Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura’ (Mc
16,15; Mt 28, 19) . De acordo com Lucas, o comando final de Jesus parece ser o
oposto : Fiquem! Permaneçam! : ‘Permaneçam
na cidade até serdes revestidos com o poder do alto’ (Lc 24, 49). Claro,
não há contradição; o sentido é : ide por todo o mundo, mas não antes de ter
recebido o Espírito Santo.
Toda a história de Pentecostes
serve para destacar essa verdade. Vem o Espírito Santo e eis que Pedro e os
outros apóstolos, em voz alta, começam a falar de Cristo crucificado e
ressuscitado e a sua palavra tem uma tal unção e potência que três mil pessoas
sentem o coração transpassado. O Espírito Santo, descido sobre os apóstolos, se
transformar neles em um irresistível impulso a evangelizar.
São Paulo vem afirmar que sem o
Espírito Santo é impossível proclamar que ‘Jesus
é o Senhor!’ (1 Cor 12, 3), que é o começo e a síntese de todo anúncio
cristão. São Pedro, por sua vez, define os apóstolos ‘aqueles que anunciaram o Evangelho no Espírito Santo’ (1 Pd 1, 12).
Indica com a palavra ‘Evangelho’ o
conteúdo e com a expressão ‘no Espírito
Santo’ o meio, ou o método, do anúncio.
- Palavras e obras
A primeira coisa a evitar quando
se trata de evangelização é a de pensar que seja sinônimo de pregação e,
portanto, reservada a uma categoria particular de cristãos. Falando da natureza
da revelação a Dei Verbum diz :
‘Esta «economia» da revelação realiza-se por meio de ações e palavras
intimamente relacionadas entre si, de tal maneira que as obras, realizadas por
Deus na história da salvação, manifestam e confirmam a doutrina e as realidades
significadas pelas palavras; e as palavras, por sua vez, declaram as obras e
esclarecem o mistério nelas contido [3]’
Trata-se de uma afirmação que
remonta a São Gregório Magno. ‘O Nosso
Senhor e Salvador – escrevia o santo doutor – às vezes nos adverte com o que
diz, às vezes, pelo contrário, com o que faz’ : ‘aliquando nos sermonibus, aliquando vero operibus admonet’ [4].
Esta lei que vale para a Revelação na sua origem, vale também para a sua
difusão. Em outras palavras, não se evangeliza só com as palavras, mas, em
primeiro lugar, com as obras e a vida; não com o que se diz, mas com o que se
faz e que se é.
Assim foi no começo. O estudo de
maior autoridade sobre ‘missão e
propagação do cristianismo nos primeiros três séculos’, conclui que ‘a mera existência e o trabalho constante das
comunidades individuais foi o principal fator na propagação do cristianismo [5]’.
Neste ano da misericórdia vale a pena lembrar em que consistiu este ‘trabalho’ da comunidade cristã. Além da
ajuda fraterna entre si, consistia nas obras de misericórdia com todos : no
cuidado com os órfãos, com os enfermos, os prisioneiros. A força destas
iniciativas era tão evidente que, querendo contrariar o crescimento da fé
cristã, o imperador Juliano, que voltou para a religião pagã, tentou introduzir
análogas instituições de caridade no âmbito civil.
Há um ditado em Inglês que
adquire um significado todo particular aplicado à evangelização : ‘Os fatos
falam mais do que as palavras’ : ‘Deeds speak louder than words’. Uma frase
muitas vezes repetida por Paulo VI na Evangelii nuntiandi diz
assim : ‘‘O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do
que os mestres, ou, se escuta os mestres é porque são testemunhas [6]’.
Um dos mais famosos filósofos
moralistas do século passado (não há necessidade de mencionar o seu nome) certa
noite foi surpreendido em um local com uma companhia pouco edificante. Um
colega lhe perguntou como podia conciliar a sua conduta com o que escrevia nos
seus livros; ele respondeu tranquilamente : ‘Alguma vez você viu uma placa de
sinalização caminhar para a direção que indica?’. Uma resposta brilhante, mas
que se condena a si mesma. Os homens não sabem o que fazer com ‘placas de
sinalização’ que mostram a direção, mas que não se movem um centímetro.
Eu tenho um bom exemplo da
eficácia do testemunho, na própria ordem religiosa à qual pertenço. A maior
contribuição, mesmo se escondida, que a ordem dos capuchinhos deu à
evangelização nos cinco séculos de sua história não foi, creio eu, a de
pregadores profissionais, mas o exército de ‘irmãos leigos’ : simples e ignorantes porteiros dos conventos ou
pedintes. Populações inteiras recuperaram ou manteram sua fé graças ao contato
com eles. Um deles, o Beato Nicolau de Gesturi, falava tão pouco que as pessoas
o chamavam de ‘Frei silêncio’. Até na
Sardenha, depois de 58 anos da sua morte, a ordem dos Capuchinhos se
indentifica com frei Nicola de Gesturi, ou também com frei Inácio de Laconi,
outro santo frei pedinte do passado. O mesmo acontece aqui em Roma, no começo
da Ordem, com São Felix de Cantalice. Realizou-se a palavra que Francisco de
Assis dirigiu um dia aos fradres pregadores : ‘Por que vocês se gloriam da conversão dos homens? Saibam que quem os
converteu foram os meus frades simples com as suas orações
[7]’.
Certa vez, durante um diálogo
ecumênico, um irmão Pentecostal me perguntou – não para criar polêmica, mas
para tentar entender mesmo – por que nós católicos chamamos Maria de ‘Estrela da Evangelização’. Foi a ocasião
também para mim de refletir sobre este título atribuído a Maria por Paulo VI,
na conclusão da Evangelii nuntiandi.
Cheguei à conclusão de que Maria é a estrela da evangelização, porque não
trouxe uma palavra particular para um povo particular, como fizeram os maiores
evangelizadores da história; mas levou a Palavra feito carne e levou-a (também
fisicamente) ao mundo inteiro! Nunca pregou, só pronunciou pouquíssimas
palavras, mas estava cheia de Jesus e por onde andava exalava o seu perfume,
tanto que João Batista deu-se conta desde o ventre de sua mãe. Quem pode negar
que a Virgem de Guadalupe tenha desempenhado um papel fundamental na
evangelização e fé do povo mexicano?
Falando para um ambiente curial,
parece-me justo destacar a contribuição que podem dar – e que dão, de fato – à
evangelização aqueles que passam a maior parte do seu tempo atrás de um
escritório e tratando negócios aparentemente não relacionados com a
evangelização. Concebe-se o próprio trabalho como serviço ao Papa e à Igreja;
renova vez ou outra esta intenção e não permite que a preocupação da carreira
tome conta do seu coração. O modesto funcionário de uma Congregação contribui
para a evangelização mais do que um pregador profissonal, se este procura
agradar mais os homens do que a Deus.
- Como se tornar evangelizadores
Se o compromisso de evangelização
pertence a todos, procuremos ver quais são os pré-requisitos e as condições
para tornar-se realmente evangelizadores. A primeira condição nos é sugerida
pela palavra que Deus dirigiu a Abraão : ‘Sai
da tua terra e vai’ (cf. Gn 12, 1). Não há missão e envio sem uma saída
prévia. Falamos muitas vezes de uma Igreja ‘em
saída’. Devemos dar-nos conta de que a primeira porta da qual sair não é
aquela da Igreja, da comunidade, das instituições, das sacristias; é aquela do
nosso ‘eu’. Explicou-o muito bem, em
certa ocasião, o próprio Papa Francisco : ‘Estar
em saída, dizia, significa antes de mais nada sair do centro para deixar a Deus
no Centro’. ‘Descentralizar-nos de
nós mesmos e recentralizar-nos em Cristo’, diria Teilhard de Chardin.
Mais intenso que o grito dirigido
a Abraão, é o de Jesus àquele que chama para colaborar com ele no anúncio do
Reino : ‘Parte, sai do teu eu, negue a si
mesmo! Então tudo se torna meu. A tu vida muda, o meu rosto se torna o teu. Não
eres mais tu que vives, mas eu que vivo em ti’. É o único modo para vencer
o enxame de invejas, ciúmes, medos de perder a face, rancores, ressentimentos,
situações de antipatia que enchem o coração do homem velho; para ser ‘habitados’ pelo Evangelho e espalhar o
odor de Evangelho.
A Bíblia nos dá uma imagem que
contém mais verdade do que tratados inteiros de pastoral do anúncio : aquela do
livro comido que lemos em Ezequiel :
‘Olhei e vi avançando para mim uma mão, que segurava um manuscrito
enrolado, que foi desdobrado diante de mim : estava coberto com escrita de um e
de outro lado : eram cânticos de luto, de queixumes e de gemidos. Filho do
homem, falou-me, come o rolo que aqui está, e, em seguida, vai falar à casa de
Israel. Abri a boca, e ele mo fez engolir.
Filho
do homem, falou-me, nutre o teu corpo, enche o teu estômago com o rolo que te
dou. Então o comi, e era doce na boca, como o mel. (Ez 2, 9 – 3, 3; cf. também
Ap 10, 2)’.
Há uma enorme diferença entre a
palavra de Deus simplesmente estudada e proclamada e a palavra de Deus antes ‘comida’ e assimilada. No primeiro caso
fala-se de um pregador que ‘fala como um
livro impresso’; mas não se chega assim ao coração das pessoas, porque ao
coração chega só aquilo que parte do coração. ‘Cor ad cor loquitur’, era o lema do beato cardeal Newman.
Retomando a imagem de Ezequiel, o
autor do Apocalipse acrescenta uma pequena, mas significativa variação. Diz que
o livro engolido era tão doce quanto o mel nos lábios, mas amargo como o fel
nas entranhas (cf. Ap 10, 10). Sim porque antes de ferir os ouvintes a palavra
deve ferir o anunciador, mostrar-lhe o seu pecado e leva-lo à conversão.
Não é o trabalho de um dia. Porém, há uma
coisa que é possível fazer em um dia, hoje mesmo : concordar com esta
perspectiva, tomar a decisão irrevogável, na medida da nossa capacidade, de não
viver mais para nós mesmos, mas para o Senhor (cf. Rm 14, 7-9). Tudo isso não pode ser só fruto
do esforço ascético do homem; isso é também obra da graça, fruto do Espírito
Santo. ‘Porque não vivemos mais para nós
mesmos, mas para ele (Cristo) que morreu e ressuscitou por nós, mandou, o Pai,
o Espírito Santo, primeiro dom aos crentes’. Assim a liturgia nos faz rezar
na Oração eucarística IV.
É fácil saber como se consegue o
Espírito Santo em vista da evangelização. Basta ver como Jesus o conseguiu e
como a Igreja o conseguiu no mesmo dia de Pentecostes. Lucas descreve assim o
evento do batismo de Jesus : ‘Enquanto
Jesus, tendo sido batizado também ele, estava em oração, o céu se abriu e desceu sobre ele o Espírito
Santo’ (Lc 3,21-22). Foi a oração de Jesus que penetrou os céus e fez descer o
Espírito Santo e o mesmo aconteceu com os apóstolos. O Espírito Santo, em
Pentecostes, desceu sobre eles enquanto ‘perseveravam unanimemente na oração’
(At 1, 14).
O esforço por um renovado
compromisso missionário está exposto a dois perigos principais. Um deles é a
inércia, a preguiça, o não fazer nada e deixar que os outros façam tudo. O
outro é o cair em um ativismo humano febril e vazio, com o resultado de perder
aos poucos o contato com a fonte da palavra e da sua eficácia. Também isso
seria um cair no fracasso. Mais aumenta o volume da atividade, mas deve
aumentar o volume da oração. Argumenta-se : isso é absurdo; o tempo é o que é!
De acordo, mas quem multiplicou os pães, não poderá, talvez, multiplicar também
o tempo? Afinal de contas, é o que Deus faz o tempo todo e que todos os dias
fazemos a experiência. Depois de ter orado, fazem-se as mesmas coisas em menos
da metade do tempo.
Argumenta-se ainda : Mas como
estar tranquilos para orar, como não correr, quando a casa pega fogo? É verdade
também isso. Mas imaginem esta cena : uma equipe de bombeiros recebeu um alarme
e corre com as sirenes ligadas para o lugar do incêndio; mas, chegando ao
local, se dá conta de que no reservatório não tem uma só gota de água. Assim
somos nós, quando corremos para pregar sem orar. Não é que falte a palavra;
pelo contrário, menos se reza mais se fala, mas não palavras vazias, que não
tocam ninguém.
- Evangelização e compaixão
Juntamente com a oração outro
meio para obter o Espírito Santo é a retidão de intenção. A intenção ao pregar
Cristo pode ser poluída por várias causas. São Paulo elenca algumas na Carta
aos Filipenses : por conveniência, por inveja, por espírito de disputa e de
rivalidade (Fl 1, 15-17). A causa que engloba todas as outras, no entanto, é
uma só : a falta de amor. São Paulo diz : ‘Ainda
que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, sou como
bronze que soa ou como o címbalo que retine’ (l Cor 13,1).
A experiência me fez descobrir
uma coisa : que se pode anunciar Jesus Cristo por motivos que não têm nada a
ver com o amor. Pode-se anunciar por proselitismo, para encontrar, no aumento
do número dos seguidores, uma legitimidade da própria pequena igreja,
especialmente se própria ou de recente fundação. Pode-se anunciar,
interpretando literalmente uma frase do Evangelho, para levar o Evangelho aos
confins da terra (cf. Mc 13, 10), de modo a preencher o número dos eleitos, e
apressar a volta do Senhor.
Algumas dessas razões não são em
si ruins. Mas por si só não são suficientes. Falta aquele genuíno amor e
compaixão pelos homens que é a alma do Evangelho. O Evangelho do amor só pode
ser anunciado por amor. Se não nos esforçamos para amar as pessoas que temos em
frente, as palavras se transformam facilmente em pedras que ferem e das quais é
necessário defender-se como de uma tempestade de granizo.
Sempre tenho perante os olhos a
lição que a Bíblia, implicitamente, nos dá com a história de Jonas. Jonas é
forçado por Deus para ir a Nínive pregar. Mas os ninivitas eram inimigos de
Israel, e Jonas não gostava dos ninivitas. Ele está visivelmente contente e
satisfeito quando pode gritar : ‘Ainda
quarenta dias, e Nínive será destruída!’. A perspectiva não parece
desagradá-lo nenhum pouco. Só que os ninivitas se arrependem e Deus lhes poupa
do castigo. Neste momento Jonas entra em crise. ‘Tiveste compaixão – disse Deus quase desculpando-se – de um arbusto… E
então, não hei de ter compaixão da grande cidade de Nínive, onde há mais de
cento e vinte mil seres humanos, que não sabem discernir entre a sua mão
direita e a sua mão esquerda’ (Jn 3, 10 ss). Deus deve fazer mais esforço
para convertê-lo, o pregador, do que para converter todos os habitantes de
Nínive!
Amor, então, pelos homens. Mas
também e acima de tudo amor por Jesus. É o amor de Cristo que nos deve motivar.
‘Me amas? – disse Jesus a Pedro –
Apascenta as minhas ovelhas’ (cf. Jo 21, 15 ss). É preciso amar a Jesus,
porque só quem está apaixonado por Jesus pode proclamá-Lo ao mundo com profunda
convicção. Só se fala com paixão daquilo que se está apaixonado.
Proclamando o Evangelho, tanto
com a vida quanto com as palavras, nós não damos a Jesus só a glória, damos-lhe
também alegria. Se é verdade que ‘a alegria do Evangelho preenche o coração e a vida daqueles que se
encontram com Jesus [8]’, é verdade também que quem
difunde o Evangelho enche de alegria o coração de Jesus. A sensação de alegria
e bem-estar que uma pessoa experimenta ao sentir de repente voltar o fluxo da
vida em um dos seus membros, até então inerte ou paralizado, é um pequeno sinal
da alegria que Cristo experimenta quando sente o seu Espírito voltar a
vivificar algum membro morto do seu corpo.
Há, na Bíblia, uma palavra que eu
nunca tinha notado antes : ‘Como o frio
da neve no tempo da colheita é o mensageiro fiel para com os que o enviam; ele
refrigera a alma do seu Senhor’ (Pv 25, 13). A imagem do calor e do frio
faz pensar em Jesus na cruz gritando : ‘Tenho
sede!’. É ele o grande ‘ceifeiro’
sedento de almas, que somos chamados a refrescar com o nosso humilde e devoto
serviço ao Evangelho. Que o Espírito Santo, ‘principal agente da evangelização’, nos conceda dar a Jesus esta alegria,
com as palavras ou com as obras, segundo o carisma e a tarefa que cada um de
nós tenha na Igreja.’
Fonte :
*Artigo na íntegra
------------------------
[1] B. Paulo VI, Evangelii
nuntiandi, nr. 75.
[2] O slogan é de
Marshall McLuhan, Understanding Media. The Extensions of Man,
Mc Graw Hill, New York 1964.
[3] DV, 2.
[4] Gregorio Magno, Omelie sul
Vangelo, XVII.
[5] A.
von Harnack, Die Mission und Ausbreitung des Christentums in den ersten
drei Jahrhunderten, Hinrichs, Leipzig 1902; ed. it. Missione
e propagazione del cristianesimo nei primi tre secoli,
Cosenza 1986, rist. 2009, pp. 321s.
[6] EN,
41.
[7] Celano, Vita
Seconda, CXXIII, 164 (FF, 749)
[8] Papa
Francisco, Evangelii gaudium, 1.
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