*Artigo
de Padre Fernando Domingues,
Missionário Comboniano
‘Era
uma tenda mesmo grande, baixa mas muito larga, como as que usam ainda hoje os
beduínos do deserto. Chamam-lhe a ‘tenda
de Abraão’. Vê-se que já tem muitos anos, mas não era certamente a que
usava Abraão para acolher a sua família nos desertos do Médio Oriente por onde
peregrinou. Esta estava plantada num terreno de areia, mesmo à entrada da casa
dos missionários combonianos, em N’Djamena, capital do Chade.
Para que serve? E
que ligação tem com o velho patriarca Abraão?
Notei-a logo ao
chegar da longa viagem desde Moundou, 500 quilometros mais ao sul, onde tinha
estado uma semana a guiar o retiro anual de um grupo de missionárias e
missionários.
Mas voltemos à
Tenda de Abraão.
A tenda, e a casa
ao lado, são usadas para toda uma série de atividades de diálogo com vários
grupos de fiéis muçulmanos de N’Djamena. A casa comboniana encontra-se no meio
de um bairro muçulmano, e é bonito ver como, logo às 4 da manhã, se ouve bem
clara a voz dos muezins que, do alto dos minaretes das mesquitas vizinhas,
convidam alto e bom som : «Deus é Grande!
Acordem e venham para a oração: é melhor rezar do que dormir!» Na estrada
que passa ali a poucos metros da tenda, cinco vezes por dia, vêem-se grupos de
fiéis que se reúnem logo que se ouve a voz do muezim, estendem os seus tapetes
da oração e fazem as suas orações enquanto se prostram e se ajoelham todos ao
mesmo tempo.
Naturalmente, alguns
deles não estão interessados em dialogar e fazer amizade conosco, mas muitos
outros gostam de conhecer a nossa religião pois somos todos ‘filhos de Abraão’. Eles consideram-se ‘filhos de Ismael’, o primeiro filho de
Abraão, e nós somos membros do povo de Deus que descende de Isaac, o filho de
Abraão e de Sara.
O gesto lindo do
Papa Francisco que, em Bangui, convidou o chefe religioso muçulmano a saudar a
multidão com ele, dando a volta juntos no papamóvel, dá bem a ideia de que os ‘filhos de Abraão’, mesmo se muito
diferentes na fé que professam, podem conviver e construir a paz no país que
habitam.
Voltando ao Chade,
é bom recordar que um dos feriados nacionais neste país é dedicado à
convivência pacífica de todos os Chadianos, e as celebrações desse dia são
sempre feitas em conjunto por pessoas de boa vontade, de todas as religiões
presentes no território.
Quando um dia
Abraão estava a perder a esperança sobre o futuro incerto da sua família, Deus
disse-lhe : «Alarga a tua tenda!» De
fato, a sua descendência ia ser numerosa como as estrelas do céu (Gen 15,5).
Também da parte
dos ‘descendentes de Isaac’ a tenda
de Abraão não pára de se alargar. No dia em que viajamos de Moundou para
N’Djamena, ao fim da tarde encontramo-nos na capelinha ali ao lado para
celebrarmos a eucaristia. Eu olhava para o rosto dos meus irmãos e irmãs
missionários e pensava : «Que maravilha,
há poucas dezenas de anos os missionários eram quase todos do Norte do mundo;
agora, o encarregado da tenda de Abraãa é um sudanês, missionário nestas terras
já lá vão doze anos; o mestre dos noviços vem do Congo; um colega da África do
Sul, sentado à minha beira, foi ordenado sacerdote há alguns meses, e amanhã
parte daqui num jipe com outro nosso missionário para a sua missão que fica na
fronteira com o Sudão.»
A ‘Família de Abraão’ não pára de crescer.
Oxalá possamos todos, cada um a partir da sua fé, construir um mundo que seja
uma grande tenda de irmãos que respeitam as diferenças uns dos outros e
colaboram juntos para o bem de todos.’
Fonte :
* Artigo na íntegra http://www.alem-mar.org/cgi-bin/quickregister/scripts/redirect.cgi?redirect=EuVkpApEFlCObSkado
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