Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
‘Regina
Lynch retornou recentemente de Damasco, onde esteve representando a Ajuda à
Igreja que Sofre (ACN) em uma conferência da Igreja Católica, juntamente com
outras organizações de ajuda que atendem à população síria. A diretora de
projetos da fundação pontifícia fala nesta entrevista sobre a situação atual
dos cristãos na Síria, após onze anos de uma terrível guerra civil.
Este
mês marca onze anos de guerra na Síria, mas o aniversário não teve muita
repercussão na mídia...
Isso
mesmo, atualmente é a guerra na Ucrânia que domina as manchetes, nossos
parceiros de projeto na Síria também expressaram sua preocupação pelas vítimas
e rezam pela paz. No entanto, também é verdade que o conflito na Síria, agora
entrando em seu décimo segundo ano, corre o risco de ser esquecido pela mídia.
Felizmente, o Santo Padre continua a manifestar a sua proximidade à comunidade
cristã daquele país. Assim, para a abertura da recente conferência em Damasco ‘A
Igreja como casa de caridade - sinodalidade e coordenação’, o Papa enviou
uma mensagem aos cristãos : ‘Vocês não estão sozinhos : a Igreja está
particularmente interessada em seu bem-esta, porque vocês são protagonistas da
missão de Cristo nesta terra’.
Os
líderes cristãos locais têm a esperança de que a situação um dia possa
melhorar?
Como
cristãos, devemos ter esperança, e é nossa fé que no-la dá. É a fé que
impulsiona a ajuda caritativa tão necessária em uma situação que só está
piorando. Especialmente nos meses mais frios do ano, porque em muitas partes do
país as temperaturas caem abaixo de zero à noite e pelo menos 90% da população
vive abaixo da linha da pobreza, o que significa que não tem dinheiro para
comprar combustível para o aquecimento ou para pagar pela eletricidade para
adicionar horas extras às poucas que são fornecidas pela rede. Acredito que a
presença de uma delegação do Vaticano e de muitas organizações de caridade não
sírias nesta conferência, apesar de todas as dificuldades, incluindo estradas
bloqueadas pela neve e a Covid, infunde esperança nos líderes da Igreja e nos
cristãos em geral.
No
entanto, o desespero é generalizado entre os cristãos sírios. É
por isso que estamos felizes em poder apoiar iniciativas especificamente
voltadas para encorajar as pessoas em situações desesperadoras. Por exemplo,
através do Christian Hope Center em Damasco e Homs,
financiamos projetos para ajudar as pessoas a reconstruir suas vidas após a
guerra. Em todo o país, financiamos acampamentos de verão para crianças pobres
para que se tornem mais arraigados na fé e encontrem alegria nas circunstâncias
difíceis. Muitos cristãos têm pouca esperança, mas o que têm vem das
iniciativas da Igreja.
Como
a guerra afetou a fé dos cristãos na Síria?
Muitos
cristãos sírios sofreram traumas terríveis nos últimos onze anos. Eles perderam
entes queridos, testemunharam violência extrema e até receberam ameaças de
morte por serem cristãos. Acredito que a fé é a razão pela qual muitos têm
resistido. No ano passado, visitamos uma mulher cujo marido foi sequestrado - e
provavelmente morto - por extremistas islâmicos em Malula, e que encontra
consolo somente na Igreja e na fé, e em particular nas religiosas que sustentam
sua família. Para muitos cristãos, a guerra teve um efeito positivo em sua fé e
deu à Igreja a oportunidade - apesar das probabilidades - de colocar em prática
seus ensinamentos sobre caridade e perdão.
É
verdade que existem mais jovens que estão envolvidos nas atividades da Igreja
do que nunca — nos escoteiros, acampamentos e eventos. Dada a pobreza e os
desafios da vida comum, o encontro com outros jovens na igreja tornou-se mais
comum do que nunca. Ao mesmo tempo, eles se fazem perguntas difíceis sobre sua
fé e seu futuro. Depois de tantos anos de violência, onde está Deus? A Igreja
está fazendo tudo o que pode para proteger o futuro dos jovens no país? Por que
essa guerra causou a morte de alguns de seus amigos, enquanto a maioria dos
outros aparentemente está contente no Ocidente? Eles deveriam ficar ou deveriam
ir? Essas podem ser perguntas assustadoras, e queremos garantir que a Igreja
esteja lá para apoiar os cristãos que lidam com elas e com o trauma da última
década.
Fala-se
muito hoje em dia de sanções, muitas vezes apresentadas como uma alternativa à
guerra, mas que afetam seriamente a população. Em vista do efeito de longo
prazo das sanções na Síria, o que você acha?
Antes
do início da guerra, os cristãos na Síria não dependiam de ajuda externa; na
verdade, eles tinham suas próprias instituições de caridade para ajudar a população
mais pobre. Agora é muito triste ver como uma porcentagem tão grande da
população precisa urgentemente de ajuda e, sem dúvida, na Síria as sanções
afetam as pessoas comuns. A inflação é galopante, motivo pelo qual eles não
podem mais financiar remédios ou operações, nem comprar carne ou leite para
seus filhos, nem mesmo a passagem de ônibus para ir à escola ou universidade.
Mesmo quem tem parentes no exterior não pode receber dinheiro devido a embargos
bancários. A realidade é que a maioria das sanções na Síria está prejudicando
as pessoas comuns mais do que qualquer coisa. Por esta razão, a Igreja local se
manifestou fortemente contra elas e nós estamos de acordo
Quais
são as necessidades mais urgentes para as pessoas atendidas por instituições de
caridade católicas na Síria?
Ainda
há uma necessidade urgente de fornecer ajuda de emergência ou de socorro para
atender às necessidades mencionadas acima, mas também é importante focar nos
jovens. Sua fé cristã deve ser fortalecida para que entendam que têm um papel a
desempenhar na Síria, e também devemos ajudar financeira e espiritualmente
jovens famílias cristãs.
Essas
organizações atendem apenas católicos ou também pessoas de outras religiões?
Cada
organização tem seu próprio carisma, que depende em certa medida da origem de
seus recursos, ou seja, se são governamentais ou não governamentais. ACN é uma
fundação católica com doadores principalmente católicos, e nossos parceiros de
projeto na Síria são líderes das Igrejas Católicas ou Ortodoxas que, por sua
vez, ajudam principalmente suas próprias comunidades a desenvolver as
atividades pastorais da Igreja, mas também há projetos que beneficiam
muçulmanos que precisam de ajuda.
Por
exemplo, na Síria, muitas religiosas se concentram em visitar famílias e apoiar
sua fé, então elas ajudam principalmente os cristãos que conhecem por meio de
seu trabalho pastoral. Porém a Igreja também tem, por exemplo, escolas
católicas apoiadas pela ACN onde muitos ou a maioria dos alunos não são
cristãos, mas muçulmanos.’
Fonte : *Artigo na íntegra
https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2022-04/siria-11-anos-conflito-ajuda-igreja-sofre.html
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