domingo, 29 de setembro de 2019

Será que realmente cremos que o Espírito age onde quer?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Aprender e abrir-se ao discernimento da ação do Espírito no meio cristão e entre outras religiões é uma tarefa para o teólogo de hoje.
Aprender e abrir-se ao discernimento da ação do Espírito no meio cristão e entre outras religiões é uma tarefa para o teólogo de hoje.

*Artigo de Fabrício Veliq,
teólogo protestante


‘Dentre as pessoas da Trindade, talvez a mais difícil sobre quem se falar seja o Espírito Santo. Isso porque, de todas as três, talvez seja aquela com quem tenhamos menos familiaridade imagética. Pensar o Pai e o Filho é mais fácil pois já temos em mente o que é paternidade, maternidade e filiação. Esses papeis já são claros e fazem parte do nosso dia a dia. Todo mundo é filho ou filha de alguém e, consequentemente, tem um pai e uma mãe que lhes são progenitores.

Quando entra a questão do Espírito, comumente esse lastro é perdido e as imagens que se têm começam a ficar somente no campo do fantasioso. É comum pensá-lo como um vulto branco que fica perambulando pelo mundo ou, ainda, como um fantasma, a la filmes hollywoodianos, o que dificulta muito quando se deseja compreender quem seja essa pessoa para o cristianismo.

Ao longo da história, também foram diversas as formas de se falar a respeito do Espírito, numa tentativa de tornar claro para a comunidade cristã quem ele seria. Desde pensá-lo como o Amor – que une o Amante (Pai) e o Amado (Filho) na teoria agostiniana – até as formas que ressaltam mais seu caráter de pessoa trinitária – com suas atribuições na santificação, regeneração e justificação, tal como nas diversas teologias protestantes – é ponto pacífico a consciência de que tudo que se fala a seu respeito só pode ser dito a partir da experiência de fé que dele se faz. Portanto, é impossível qualquer definição que dê conta do Espírito ou que possa circunscrever seu poder de ação.

O Evangelho de João deixa isso mais claro ao dizer que o guiado pelo Espírito é como o vento, que não se sabe de onde vem nem para onde vai (Jo 3,8). Da mesma forma, dá uma característica que se torna de suma importância para se falar dele hoje, a saber, que o Espirito sopra onde quer. Assim, sua ação não deve ser pensada somente dentro de um escopo bem determinado e, muito menos, dentro de hermetismos doutrinais.

Durante muito tempo no movimento cristão, e em muitos movimentos ainda hoje, pensa-se o Espírito como algo restrito à doutrina ou a um lugar específico, como se ele somente agisse quando determinadas normas fossem obedecidas. De  maneira ainda mais exacerbada, chega-se a considerar que sua ação só é possível dentro do meio eclesiástico cristão. Qualquer agir que não conte com aval eclesiástico não poderia ser considerado seu. Nesse sentido, é comum que uma parcela significativa do cristianismo fundamentalista ainda tente controlar e colocar limites para a ação do Espírito e controlar onde e como Ele deveria proceder, ligando-o somente às questões hierárquicas da vida da Igreja.

Uma vez sendo esse o pensamento, embora triste, não é de espantar a existência de movimentos fundamentalistas – católicos ou protestantes – que ainda briguem entre si, afirmando que o Espírito não age em uma comunidade diferente da considerada ‘verdadeira igreja’. Com isso, ao invés de discernirem que a divisão não é obra do Espírito, acreditam que estão lutando em sua causa.

O mesmo acontece quando os cristãos, não só os fundamentalistas, pensam sobre esse agir em outras religiões.  Sua dificuldade está em considerar que o Espírito não é de sua exclusividade. Discernir a ação dele nas outras religiões ainda continua um grande tabu. Certamente, o cristianismo atual, no que se refere a esta questão, ainda está como Nicodemos, que pergunta sem entender a colocação de Jesus : ‘Como pode ser isso?’ (Jo 3,9).

Assim, uma tarefa importante se apresenta aos teólogos que pensam o diálogo ecumênico e interreligioso contemporâneo : aprender e abrir-se ao discernimento da ação do Espírito no meio cristão e entre outras religiões. A partir daí, caberá buscar entender melhor quem é essa pessoa da Trindade, no intuito de ensinar e compreender, juntamente com o povo, que ele age onde quer. Seus traços de amor e de vida precisam ser identificados onde quer que os cristãos se apresentem, sendo esses os critérios para se tatear onde o Espírito de Deus estaria ou não.


Fonte :

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Atenção espiritual é chave para administração de conflitos


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 O afresco do pintor italiano Giusto de 'Menabuoi (1320-1390) de 1375 mostra como Judas trai o Filho de Deus através de um beijo.
O afresco do pintor italiano Giusto de 'Menabuoi (1320-1390) de 1375 mostra como Judas trai o Filho de Deus através de um beijo.
(Hervé Champollion / akg-images)

*Artigo de Pádraig Ó Tuama,
teólogo, professor e poeta 


‘Os conflitos revelam o que é importante para nós. Às vezes me encontro em conflito porque descobri algo que não sabia que me importava muito. Alguém muda os móveis no escritório e percebo por que gostava mais da disposição anterior; alguém posta uma mensagem de mídia social que me enfurece por algum motivo até então não considerado; alguém fala alguma coisa do meu país, minha religião, minha política, minha língua, minhas prioridades e muitas outras coisas que supõem centenas de anos de ressentimento que carrego em mim.

O conflito é uma informação poderosa; e essas informações poderosas podem ser difíceis de reconhecer, difíceis de processar, difíceis de aceitar, de aprender ou de agir. O conflito pode dizer muito sobre nós mesmos, e pode nos dizer muito sobre Jesus. Ele nos mostra por que não devemos temer.

Ouvir atentamente um grupo de discussão significa obter um vislumbre peculiar dos desejos e ansiedades desse grupo. Você também aprende suas táticas, alianças, ameaças, o que estão dispostos a fazer para vencer e o que lhes acontece quando sentem que perderam. Você também percebe o medo e a habilidade. Uma pessoa pode demonstrar a capacidade de contornar ou reformular um argumento, ou suas alianças, ou sua falta de vontade de se envolver, inclusive seus sentimentos em relação a compromissos.

O que significa prestar atenção espiritual e moral aos conflitos de nossas vidas? Muita energia religiosa parece ser gasta imaginando vidas religiosas livres de conflito : Adão e Eva no paraíso; Jesus manso em uma manjedoura; os santos mais focados em sua pureza do que em suas políticas. Você entende a foto.

Mas isso trai a literatura bíblica e a condição humana. O objetivo de nossas vidas não é contornar conflitos e sair ileso, mas nos envolvermos com eles de uma maneira que teste, aprimore e evolua nossos impulsos morais em direção a uma ética de compromisso sério e criativo.

Medo do Medo

Durante anos, tive medo de conflitos. Não só estava com medo de conflitos, mas também com medo do medo — camadas e camadas me impediam de encarar o convite e as informações que o conflito apresentava. Então duas coisas aconteceram. Minha saúde diminuiu e, acidentalmente, aprendi a orar.

O declínio da minha saúde era previsível. Estava trabalhando no ministério religioso, gay, fechado, assustado e ansioso. Não tinha os recursos para expressar as informações da minha vida. Então meu corpo sofreu. Peguei um vírus grave, que afetou meu sistema imunológico, tornando-o hiperativo, e o vírus não foi embora. Algo estava chamando minha atenção.

Aprendi a orar. Acidentalmente. A história real é que eu decidi desistir de minha fé. E, num movimento irônico que estava totalmente perdido para mim, decidi ir a um mosteiro — comunidade de Taizé — para desistir de Deus. Para formalizar minha desistência, decidi voltar à cena da crucificação. E decidi imaginar que eu era uma das pessoas ao longo do caminho da cruz e que tive a oportunidade de dizer adeus ao Deus que não amava mais. Mas naquela oração, Jesus disse algo para mim, e eu lhe disse algo. E estava no meio de um tipo de oração que nunca havia imaginado.

— Decidi que ou você me odeia, ou é hora de parar de me importar – disse.— Você se importa com o quê? – Perguntou Jesus.— Eu não sei – respondi.— Nem eu – Jesus disse.— Eu não sei o que fazer – falei.— Eu sei – ele disse, olhando para mim.

Senti que faltava uma coisa nos anos em que me aproximei de Jesus : respeito. Respeito dele para mim e de mim para ele.

Então, bem na tentativa de me divorciar de Deus, encontrei-me conversando com Jesus com inesperado respeito recíproco. O que ele pensava ditava tudo o que devia pensar. Mas estava curioso. Queria saber o que aborreceu Jesus, o que chateou ele, o que comoveu. Comecei a ler os evangelhos e a escrever cartas para o Jesus que não conhecia.

Cresci com muitos conflitos à minha volta : o conflito do legado da colonização da Irlanda, o conflito de ser gay, o conflito de me odiar, o conflito de violências que conhecia. Por isso, prestei muita atenção aos conflitos nos evangelhos : a mulher empurrando a multidão, confrontando essas pessoas com suas leis limitantes; os argumentos públicos sobre adeptos religiosos; as diferentes visões sobre como entender o papel dos estrangeiros no território ocupado; perguntas sobre a forma do casamento; argumentos sobre o pecado e os pecadores. Em quem devo tocar? Quem devo permitir que me toque?

Em cada uma dessas interações, os personagens estavam comunicando informações íntimas sobre suas vidas : as coisas que amam sobre si mesmas; as coisas que se recusam a considerar; os preconceitos sobre suas vidas; as regras que dominam, mas pelas quais nunca gostariam de ser conduzidas; inclusive as leis que quebram.

Em uma história, Jesus chega a uma casa. Não nos dizem de quem é a casa, mas é possível que seja dele em Cafarnaum. Jesus tem seus discípulos consigo; e quando chegam lá, pergunta sobre o que estavam discutindo ao longo do caminho.

A questão em si é intrigante. A palavra grega para perguntar é dialogizomai, da qual obtemos a palavra diálogo. Se Jesus dissesse : ‘Que dialogais um com o outro pelo caminho?’, A cena inteira teria um sabor diferente. No entanto, os tradutores são unânimes em afirmar que a melhor tradução para o português é discussão, não dialogar.

De qualquer forma, você pode ler o resto da história. Os discípulos estão calados porque têm vergonha; eles têm discutido sobre quem é o melhor.

É fácil pensar que conhecemos a substância desse conflito, mas vale a pena fazer uma pausa por um momento. O que significaria ser o maior? Aquele que passou mais tempo com Jesus? Quem foi mais elogiado? Aquele que era o mais forte? Aquele com o maior insight político? Aquele que mais se parecia com ele? Aquele que era o melhor em discutir? Estes são  devemos assumir  homens discutindo. Eles estão discutindo sobre tamanho, a força, o corpo? Em qualquer grupo, sempre há tensões sobre o maior, e cada grupo tem seu próprio critério para definir quem o seja. A comparação é como uma faísca para a mecha do conflito. Uma vez iniciado o jogo de comparação, é improvável encerrar até que acabe de alguma forma  levando-nos à agressão, à exclusão, ao julgamento e à redução; nesse jogo de determinar de uma vez por todas quem é o perdedor.

Porque é isso que está acontecendo em uma discussão sobre o maior. Por trás de tudo, também há uma discussão sobre quem é o menor.

Os evangelhos às vezes prestam muita atenção à linguagem corporal. Nesta cena, vemos Jesus sentado. O que é isso? Um convite para um exame atento de seus vícios competitivos? Possivelmente. Provavelmente, é uma indicação da postura de idosos reverenciados em muitas culturas. Os discípulos teriam sentado abaixo dele com toda a probabilidade. Então, a linguagem corporal deles mudou; são chamados de uma multidão de homens zombadores para uma postura de humildade e hierarquia (às vezes a hierarquia  quando é possível confiar  tem suas funções). Então, a coisa mais surpreendente acontece : Jesus apresenta uma criança.

A propósito, essa é uma das partes mais ricas da história. De onde veio a criança? Alguém dirá  é claro que sim  que essa criança é de Jesus. Ou talvez fosse um filho de um vizinho, ou um sobrinho ou sobrinha, ou um filho da casa. Se esta é a casa de Jesus, isso indica que a casa de Jesus era uma casa pela qual as crianças passavam, prontas para serem incluídas em uma parábola explicativa.

De qualquer forma, uma criança é apresentada. E a criança é abraçada. A criança é a personificação física do exato oposto da grandeza. Qualquer que seja a medida mundana de grandeza, essa criança não é ótima. A criança é pequena. A criança é impotente. A criança pode não ser fofa. A criança é uma criança, longe dos jogos de poder dos homens. Ao ouvir uma discussão sobre a grandeza conduzida pelos homens, Jesus os faz sentar para aprender e depois os enfrenta com um outro independente, que encarna o oposto do que os consumia. Essa criança perturba a economia de eminência que tem sido sua obsessão. Quando ouço as pessoas dizerem que a teologia deve ser objetiva, não subjetiva, penso em como Jesus interrompeu a objetividade. Não podemos comentar casos únicos, dizem empresas e governos. Contudo, Jesus parece dizer que só comenta casos individuais, caso contrário, não haveria sentido. Ele fala sobre hospitalidade, vincula-a à virtude, liga esta à noção de valor e valor à grandeza.

Reenquadrando a imagem

Exercitando-me em resolução de conflitos, ouvi a frase ‘reenquadrar’ repetidamente. Vale a pena pensar nessa palavra de maneira tangível. Quando se pega uma obra de arte e a reenquadramos, isso pode ajudar o espectador a ver o que tem ali. Talvez a moldura capte uma cor até então escondida, oculta no centro do trabalho. Talvez o quadro seja grande o suficiente para mostrar mais da foto. Uma foto recente de um partido político na Irlanda mostrou seus representantes sentados com uma pessoa de renome. Alguém no Twitter  sempre o Twitter  mostrou o original. Mostrou representantes de duas partes opostas sentadas com uma pessoa de renome. A foto foi reenquadrada e cortada. Liberte-me, o conflito chama; mostre as partes inconvenientes.

Conflito é informação, e muitas vezes não desejamos que o conflito revele a informação. Assim, contamos a história que torna nosso colega, nosso chefe, nosso bispo ou os leigos irrelevantes, até ridículos. Caricaturamos os indivíduos para que o ouvinte da história do conflito saiba imediatamente o que um bom ouvinte deve saber : quem é a pessoa boa e quem é a pessoa má.

Não me interpretem mal  é divertido. Está no centro de todas as boas histórias sobre ‘meu chefe é um idiota’. Mas as histórias nem sempre dizem a verdade; nós sabemos isso. Os Evangelhos sim. Lembra de Judas?

  • Simão, o cananeu, e Judas Iscariotes, aquele que o traiu’ (Mt 10, 4);
  • e ‘Judas Iscariotes, aquele que o entregou’ (Mc 3,19);
  • e ‘Judas, irmão de Tiago, e Judas Iscariotes, que foi o traidor’ (Lc 6,16);
  • E isto dizia ele de Judas Iscariotes, filho de Simão; porque este o havia de entregar, sendo um dos doze.’ (Jo 6,71).

Existem outros Judas nos Evangelhos  um deles é parente de Jesus (Mc 6,3)  e há um seguidor chamado ‘Judas (não o Iscariotes)’ no Evangelho de João (14,22). Estamos preparados para odiar essa pessoa. Iscariotes se tornou um palavrão em algumas línguas, e certamente não é usado como elogio em muitas.

Desde a introdução de Judas, somos levados a um ponto de vista sobre ele. O que Judas diria? O que faria? Conhecemos parte da história, mas pouco nos lembramos dela. Parece-me que Judas era um homem que procurava escalar conflitos. Procurou provocar um aumento do conflito com os ocupantes romanos. Ele não estava sozinho. Os discípulos no caminho de Emaús contaram a um estranho a história de seu lamento, decepção e choque que Jesus havia fracassado em seu projeto de conflito pela liberdade : ‘Mas esperávamos que ele fosse o único a redimir Israel’ (Lc 24,21).

Judas costuma ser considerado um personagem faminto por dinheiro, mas ele não era faminto por dinheiro. João nos diz que Judas roubou da bolsa (12,6), mas não tenho certeza se acredito nisso. Que evidência há no texto de que os autores são narradores confiáveis das motivações de Judas quando o apresentaram sem considerar seu ponto de vista na história? Mateus é quem desfaz tudo. Mateus está preocupado com a justiça, particularmente a justiça narrativa. Ele introduz a genealogia de Jesus, nomeando 42 homens e cinco mulheres, e ele  sozinho entre os evangelistas  termina a história de Judas assim : ‘Quando Judas, que o havia traído, viu que Jesus fora condenado, foi tomado de remorso e devolveu aos chefes dos sacerdotes e aos líderes religiosos as trinta moedas de prata’ (Mt 27,3).

A palavra arrepender só foi usada algumas vezes em outras partes do Evangelho de Mateus. Duas vezes Jesus pede que as pessoas se arrependam por causa da proximidade do reino (3,2 e 4,17) e duas vezes Jesus usa a palavra ao falar de cidades cujas políticas precisam mudar (11,21 e 12,41).

A visão de Mateus parece diferente. A palavra arrepender-se é rica : a palavra usada no grego é metanoia, o que significa mudar de ideia ou mudar de direção. Judas não se importava com o dinheiro  ele trouxe as 30 moedas de prata de volta. Judas não queria que Jesus fosse condenado  isso o levou a por fim a si mesmo. Às vezes, o conflito pode ser intensificado para nos distrair de uma história mais profunda, uma história mais verdadeira, uma história mais inconveniente.

O conflito é uma economia peculiar. Algumas pessoas usarão conflitos contra um grupo para escalar mais conflitos com outros. No evangelho de João, uma mulher está sendo levada para ser apedrejada porque foi pega ‘no próprio ato de cometer adultério’ (8,4). Que notavelmente conveniente. Essa coisa toda parece tão surpreendentemente conveniente que acho que é uma configuração. De qualquer forma, alguns homens estão prontos para encenar o conflito final  assassinato  contra essa mulher, a fim de escalar um conflito entre eles e Jesus.

Aqui é onde a linguagem corporal entra novamente : a mulher conhecia a linguagem corporal das pedras. Eles estavam quase contra ela. Jesus também conhece a linguagem corporal. Ele se agacha. Diante de uma multidão de homens sendo reduzida a um sentimento primordial de pertencimento, ele vê uma multidão se exaltando. Jesus fez um gesto. Ele se agachou. O que estava escrevendo?

Diante do conflito, Jesus se torna menor e faz algo que ninguém mais pode ver. O conflito é a busca da curiosidade. Quando a curiosidade entra em uma multidão de pessoas enfurecidas, algo pode mudar. Jesus poderia estar rabiscando, poderia estar escrevendo pecados, poderia estar escrevendo uma pergunta interessante  onde está esse suposto homem? - ou poderia estar apenas demonstrando que o drama do conflito desses homens não era o drama que eles pensavam. Ele fez uma pausa. Chamou a atenção, levantou-se, falou e se agachou novamente.

Os homens vão embora; Jesus fica e fala com a mulher. Mas ele a deixa em conflito  afinal, ela agora sabe do que esses homens são capazes de voltar. E certamente alguns desses homens são conhecidos dela ou parentes. E Jesus diz para ela não pecar mais. Qual foi o pecado dela? Apaixonar-se por um homem que mentiu sobre ser casado? Ser considerada não casada e cortejar um homem? Ser enganado em sexo? Ser um cenário para as obsessões teológicas dos homens projetadas em seu próprio corpo? Eu não sei. Mas eu sei que gostaria de questionar.

A linguagem está no coração do que me move. Para mim, poesia, conflito e religião circulam em torno da mesma coisa : as palavras que dizemos, de corpo e língua. Jesus também gostava de palavras. Ele elogiou a mulher pelas palavras dela. Jesus estava cansado, queria fugir, mas alguém não o deixou. Não dê comida para cachorros, ele diz. E então ele mesmo aprende. Ah, mas senhor, diz essa mulher estrangeira, até os cachorrinhos comem migalhas. Ela pega o insulto de cachorrinhos e vira o diálogo. Ensinando como dar do que transborda do seu coração. Ele para, ouve, muda de ideia. Ele a elogia por suas palavras. E ainda nos lembramos dela.

Alguns conflitos precisam se intensificar para que os detentores do poder percebam que são eles que causam o conflito do qual estão reclamando. Alguns conflitos precisam aumentar para que as pessoas possam colaborar. Alguns conflitos precisam diminuir. Alguns de nós precisamos ser tirados do conflito. Alguns de nós precisamos ser jogados no coração dos conflitos que estamos negando.

Estamos cercados por tantos conflitos. Vale a pena perturbar as águas do conflito com um andarilho aquático encarnado : aquele que acalma tempestades, aquele que revela conflitos onde pensávamos que não existiam, aquele que não era possuído pelo medo do medo. Nossos conflitos revelam algo curiosamente íntimo sobre nós. Essas tempestades nos dizem coisas que não queremos que digam. Passemos sobre estas tempestades como Jesus de Nazaré. Oremos.


Fonte :

terça-feira, 24 de setembro de 2019

Mês da Bíblia: as cartas de São Paulo, as Epístolas Católicas e o Apocalipse

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

  
*Artigo de Mário Scandiuzzi, 
jornalista


‘Vamos falar das Cartas de São Paulo, apresentando a ordem cronológica, situando-as no livro dos Atos dos Apóstolos.

Tessalonicenses I e II – na primeira carta, Paulo fala sobre a pregação do Evangelho, da alegria ao saber da fidelidade da comunidade de Tessalônica, faz um convite para que todos sejam perseverantes na fé e fala também da ressurreição dos mortos. Na segunda alerta os fiéis sobre as falsas ideias da segunda vinda de Cristo, exorta todos sobre a confiança em Deus e para que se fortaleçam na luta contra o mal.

Gálatas – esta carta foi escrita porque alguns judeus cristãos queriam obrigar os pagãos recém convertidos ao cristianismo a seguirem a Antiga Lei.

Romanos – nesta carta o apóstolo fala sobre o estado de pecado no qual se encontra o homem e que a salvação não é mérito de nossos atos. A carta ainda traz os fundamentos de uma vida verdadeiramente cristã, com os deveres para com as outras pessoas.

Coríntios I e II – carta dirigida a uma comunidade marcada por disputas e abusos. Na primeira carta Paulo prega a união e a humildade. Ele ainda aconselha os fiéis sobre o casamento e a virgindade e dá conselhos escrevendo sobre a caridade (capítulos 12 a 14). Na segunda carta, Paulo se defende contra aqueles que se opunham às suas pregações, justificando-se contra todas as acusações que lhe foram feitas em Corinto.

Efésios, Filipenses e Colossenses – são chamadas de ‘epístolas do cativeiro’ por terem sido escritas no período em que Paulo ficou preso em Éfeso e em Roma, entre os anos de 60 e 62. Ele trata do mistério de Cristo na Igreja e apresenta diversos conselhos aos fiéis que vivem uma vida nova em Cristo. A carta aos Filipenses tem um caráter mais pessoal, marcado pelas expressões de alegria.

Filemon – é dirigida a um rico cristão de Colossos, cujo escravo havia fugido e procurado refúgio junto ao apóstolo. Paulo implora pelo perdão para o escravo.

Timóteo I e II e Tito – são chamadas de epístolas pastorais. Timóteo é discípulo de Paulo e companheiro de viagem. Foi colocado à frente da comunidade de Éfeso. A primeira carta é lembra dos conselhos já recebidos e propõem um programa de vida para homens, mulheres, bispos e diáconos. Paulo também fala sobre as viúvas, os anciãos e os escravos. Quando escreveu a segunda carta a Timóteo, Paulo já estava preso e pressentindo o martírio dá aos discípulos suas últimas recomendações. Tito era grego e também colaborador de Paulo. Nesta carta ele dá conselhos sobre a organização das comunidades na ilha de Creta.

Hebreus – esta carta reflete as ideias centrais da pregação de Paulo, ela não parece ter sido escrita por ele, já que possui um estilo diferente. A carta é dirigida a uma comunidade de judeus convertidos que viviam um dilema por ter que abandonar o culto do templo e da sinagoga ao se tornarem cristão. O texto se fundamenta na Lei de Moisés para mostrar que o Evangelho é a realização efetiva do culto israelita.

As epístolas católicas – este é o nome que se dá a um conjunto de sete cartas dirigidas a um conjunto de igrejas.

Tiago – era bispo de Jerusalém e presidiu uma importante reunião dos apóstolos no ano de 49. O texto tem como base o Sermão da Montanha, com conselhos voltados para o cristão fervoroso com virtudes para uma nova vida.

Pedro – a primeira carta de Pedro provavelmente foi escrita por Silvano, discípulo de Paulo que se tornou também colaborador de Pedro. O texto fala sobre a alegria do cristão batizado e a união em Jesus. Para aqueles que sofre pela fé, a carta lembra do sofrimento de Cristo, pregando uma vida de santidade e de boas práticas.

A segunda carta de Pedro e a carta de Judas parecem ter sido escritas pela mesma pessoa e alertam contra as falsas doutrinas que começavam a ser disseminadas e encorajam os fiéis a se manterem firmes na fé e no amor de Deus.

João – são três epístolas escritas pelo ‘discípulo que Jesus amava’. A primeira delas afirma que Deus é amor e luz e o cristão, como filho da luz, deve fugir da escuridão, seguir os mandamentos e arrepender-se caso cometa algum pecado. As duas cartas seguintes são dirigidas a comunidades da Ásia (Kyria – ‘a eleita’ e Gaio) e tratam de temas particulares.

Apocalipse – no grego essa palavra significa revelação. Este livro foi escrito por São João no fim de sua vida como uma carta destinada às Igrejas da Ásia Menor. Considerado um texto de difícil interpretação, é preciso que se entenda o momento em que foi escrito. Os cristãos da Ásia começavam a sofrer perseguições. Aqueles que esperavam pela libertação com a segunda vinda de Cristo, viam com tristeza que este retorno demorava. João quis fazer de seu livro uma mensagem de esperança e, ao mesmo tempo, anunciar aos fiéis a inevitável luta entre o bem e o mal e predizer a vitória de Deus. Para isso usa de um recurso literário muito usado entre os judeus, presente também no livro do profeta Daniel. O gênero apocalíptico não quer dar uma descrição antecipada de fatos futuros, mas apresentar a realidade com símbolos diferentes, numa linguagem figurada para provocar a atenção do leitor. Para uma boa leitura deste livro é importante saber alguns dos simbolismos apresentados : O Cordeiro simboliza Cristo; a mulher, a Igreja Cristã; o dragão, as forças contrárias ao Reino de Deus; as duas feras (cap. 13), o império romano e o culto ao imperador; as vestes brancas, a vitória. O Apocalipse anuncia aos fiéis que não é possível escapar da luta do sofrimento no plano terrestre e também que a vitória final se dá em Cristo ressuscitado que venceu a morte.


Fonte :

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Mês da Bíblia: o Evangelho e os Atos dos Apóstolos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Mário Scandiuzzi, 
jornalista


‘A palavra Evangelho é de origem grega e significa a Boa Nova. O Evangelho narra a boa nova, a vinda de Deus entre os homens, daquele que se fez ‘filho do homem’ para que possamos nos tornar ‘filhos de Deus’.

Antes de ser escrito, o Evangelho foi anunciado. Assim como o próprio Jesus falou aos discípulos, estes continuaram a missão depois da morte e ressurreição do Senhor. E este ensinamento foi escrito a fim de que fosse conservado com fidelidade.

Mateus, que se chamava Levi era coletor de impostos antes de ser chamado por Jesus para segui-lo. Escreveu seu evangelho em aramaico, um dialeto do hebraico, por volta do ano 60. O texto não foi conservado, mas rapidamente traduzido para o grego. Mateus escreveu na Palestina para leitores judeus; seu texto tem várias referências ao Antigo Testamento.

Marcos é o sobrenome de João, primo de Barnabé, que é citado no livro dos Atos dos Apóstolos 12, 12. É discípulo de Pedro e acompanhou Paulo em sua primeira viagem missionária. O Evangelho reflete os ensinamentos de Pedro em Roma pouco antes do ano 64. Por vários detalhes acredita-se que se trata de um testemunho direto da vida e da atividade de Jesus. Marcos quer apresentar Jesus aos pagãos, mostrando o que de havia de extraordinário e de valor de sua missão nos milagres que realizou.

Lucas é de origem grega e também foi companheiro nas missões de Paulo. Lucas também é o autor do Livro dos Atos dos Apóstolos. Embora não tenha sido testemunha dos fatos, teve o cuidado de documentar seu relato, utilizando-se dos textos de Mateus e Marcos. Lucas também escreveu aos pagãos, destacando a bondade e a misericórdia de Jesus.

João é o apóstolo, irmão de Tiago e filho de Zebedeu. Foi um dos mais próximos do Mestre e a quem Jesus confiou o cuidado de sua mãe. O texto foi escrito nos últimos anos do primeiro século, mais de 30 anos depois dos três primeiros. Era dirigido aos cristãos e buscava mostrar a divindade manifestada aos homens na pessoa de Jesus. Apresenta-o como ‘a água da vida eterna’, ‘o pão vivo descido do céu’, ‘a luz do mundo’, ‘o bom pastor’, ‘o caminho, a verdade e a vida’. João não narrou somente os fatos e discursos de Jesus, mas também nos deixou sua experiência pessoal junto do Mestre.

Apesar de serem quatro autores, a Igreja tem vivo o sentimento que se trata de uma só Boa Nova de salvação, apresentada sob quatro formas : segundo Mateus, segundo Marcos, segundo Lucas e segundo João.

Os Atos dos Apóstolos são a sequência do evangelho segundo Lucas, também autor deste livro. Aqui encontramos o nascimento da Igreja primitiva, a ascensão de Jesus, o Pentecostes, a conversão de Paulo e suas viagens missionárias pela Ásia Menor e Grécia. A narrativa mostra ainda a prisão e a transferência de Paulo para Roma, mas não relata a libertação dele e as viagens antes do martírio. Na primeira parte os Atos dos Apóstolos falam sobre a influência do Espírito Santo na formação das primeiras comunidades cristãs. Na segunda parte, mostra como Paulo, a exemplo de Pedro, é o grande responsável pela entrada de vários pagãos na Igreja.

A leitura dos Atos dos Apóstolos é muito importante para uma boa compreensão das Epístola de São Paulo.


Fonte :

domingo, 22 de setembro de 2019

Mês da Bíblia: os Livros Proféticos


Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Mário Scandiuzzi, 
jornalista


‘No antigo Testamento encontramos 18 livros escritos por profetas : Isaías, Jeremias, Lamentações, Baruc, Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. Agora vamos conhecer um pouco mais sobre cada um deles.

Isaías é considerado como o maior dos profetas de Israel. Exerceu o ministério profético por cerca de 50 anos. Ele é o profeta da justiça, pregando contra os ricos e os poderosos, elevando sua voz contra os hipócritas e aqueles que levavam uma vida fútil. Chama o povo ao arrependimento e à fé. Isaías também se apresenta como o profeta da consolação e da esperança e apresenta Deus como o criador e soberano, vencedor do mundo e salvador do seu povo.

Jeremias era de uma família sacerdotal. Seu livro tem vários episódios que se relacionam à sua própria atuação e também refletem seus sentimentos, suas lutas interiores e sofrimentos. De temperamento tímido e hesitante, com um coração ardente e sensível, se viu obrigado a ser o ‘profeta das desgraças’, já que anunciava a queda de Jerusalém. Despertou a ira daqueles cujos abusos e pecados não parava de combater.

O Livro das Lamentações foi escrito durante os anos que se seguiram à destruição de Jerusalém, no ano de 586 a. C. Era lido todos os anos na comunidade judaica no dia do aniversário da destruição do templo e tinha como objetivo levar os ouvintes a reconhecer as próprias faltas e renovar a esperança na misericórdia de Deus.

Baruc – os historiadores acreditam que não se trata do mesmo personagem que serviu de secretário a Jeremias, embora tenha o mesmo nome. O livro pode ser dividido em duas partes. A primeira é uma exortação à penitência. A segunda fala da sabedoria como único meio de se chegar a Deus e também sobre coragem, resignação e esperança. Uma carta de Jeremias aos cativos foi acrescentada ao livro e parece ser uma paráfrase do capítulo 10 de Jeremias contra a idolatria.

Ezequiel – quando Jerusalém foi tomada pela primeira vez por Nabucodonosor em 599 a.C., rei, os grandes do reino, chefes das empresas e 7 mil guerreiros foram deportados para a Babilônia. Sob a influência dos pagãos, eles se deixaram corromper e passaram a praticar ritos de idolatria. Foi neste cenário que surgiu Ezequiel, anunciando a destruição de Jerusalém. Depois deste fato, houve uma nova deportação e o número de exilados aumentou. A partir de então, o profeta passou a exaltar o novo Pastor do povo de Deus, anunciando a ressurreição de Israel e a restauração do Templo.

Daniel é um israelita levado à Babilônia entre os deportados por Nabucodonosor. Jovem com uma fé inabalável e um grande sentimento de patriotismo, Daniel não é o autor do livro, mas figura como seu herói principal. Neste livro predomina a ideia da expectativa da vinda do reino de Deus, reino que será proclamado e realizado por Jesus.

O profeta Oséias narra as infidelidades de Israel para com Deus. Ele foi o primeiro profeta a comparar a união de Deus com o seu povo com um noivado.

Joel profetizou no reino de Judá e também em Jerusalém, de onde é originário. Ele destaca o conhecimento do culto, o amor do povo e a cultura religiosa que se espera num membro da classe sacerdotal.

Amós era pastor em uma localidade vizinha a Belém. Ele denuncia as injustiças sociais que devastam a Samaria, como opressão dos pobres e corrupção de juízes. A perspectiva do Messias é descrita como uma grande prosperidade agrícola.

Abdias profetizou na época do exílio e se dirigia principalmente a Edom, para que não se alegrasse com a ruína de Jerusalém; a vingança de Deus vai atingi-la da mesma foram que outras nações pagãs.

Jonas – livro colocado entre os profetas porque narra as aventuras de um profeta com este nome. Muitos estudiosos ler este livro como um ensinamento religioso velado, em forma de parábola. Jonas enviado a Nínive para pregar significa que Deus chama todos ao perdão, e não somente os judeus.

Miquéias era originário de uma aldeia vizinha a Hebron e foi contemporâneo de Isaías. Profetizou a ruína da Samaria e anunciou ao reino de Judá um castigo semelhante.

Naum – profeta de origem desconhecida, descreveu o julgamento divino que se exerce no mundo.

Sofonias é um profeta justiceiro que anuncia do dia do Senhor sob a figura de um sacrifício ritual em que todos serão castigados, salvo os que praticam a justiça, a humildade e a obediência à Lei de Deus.

Habacuc é um profeta filósofo e um dos primeiros israelitas a pensar no problema do mal. A solução proposta por ele é que Deus, no final, salvará o justo.

Ageu é mencionado no livro de Esdras (5,1 e 6,4). Exerceu o ministério em Jerusalém, por volta do ano 520, quando o templo era reconstruído.

Zacarias é contemporâneo de Ageu e prega uma reforma moral e ao mesmo tempo exorta o povo a reconstruir o templo.

Malaquias fala do amor de Deus por seu povo e explica que o comportamento humano impede que o Criador seja mais generoso em bênçãos, denunciando as negligências no ministério sacerdotal, a falta de respeito à santidade matrimonial e a falta de comprometimento no pagamento do dízimo.


Fonte :

Mês da Bíblia: os Livros Sapienciais

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 Biblia otwarta na drewnianym stole
*Artigo de Mário Scandiuzzi, 
jornalista


‘Vamos falar agora do conjunto de sete livros da Bíblia chamados de Sapienciais. São eles : Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cânticos, Sabedoria e Eclesiástico.

O Livro de Jó tem como tema central o personagem de Jó, que era para os antigos israelitas uma figura do típico justo sofredor. O autor é desconhecido, e acredita-se que foi escrito no século 5 antes de Cristo. Jó se encontra privado de todos os seus bens, de seus próprios filhos e de sua saúde. Os amigos de Jó representam a ideia de que o sofrimento é um castigo; todo homem é pecador. Deus entra em cena e, enviando provações ao homem, mostra que é justiça e bondade. Ao homem cabe humilhar-se com paciência e esperança, sem querer desvendar os planos do Criador.

O livro dos Salmos era usado para as orações dos antigos judeus. A palavra Salmo (Psalmus) é tradução do termo hebraico que quer dizer Louvores. Mas no livro também se encontram lamentações, cânticos de penitência e de reconhecimento, poemas didáticos e súplicas. Nos salmos encontramos ensinamentos religiosos, tais como : respeito à majestade divina, gratidão pela misericórdia infinita e pelo perdão de Deus, confiança na Providência, penitência e contrição diante dos próprios pecados, tristeza e temor pelos perigos que nos cercam, paz, consolo, coragem, obediência, alegria e esperança.

O Livro dos Provérbios tem autoria atribuída a Salomão. Nele encontramos um conceito puríssimo de Deus, de um Deus justo, benevolente, misericordioso e criador. O autor divide a humanidade em duas categorias, do ponto de vista moral : os sábios e insipientes. Os sábios são inteligentes, virtuoso e íntegro. Entre os insipientes estão os maus, os mentirosos e os malfeitores. Os textos reforçam as virtudes da caridade, da justiça, da prudência, da moderação e da discrição. De outro lado, combate os vícios da embriaguez, da gula, da luxúria e da preguiça. De modo especial o livro destaca a piedade filial e a educação das crianças.

O Eclesiastes apresenta uma série de meditações sobre a instabilidade da vida humana. O autor é desconhecido, mas pela época (século III a. C.) acreditava-se que todos os homens iam para o mesmo lugar depois da morte, uma região onde não há consolação. Disso surge um certo pessimismo nos textos. Se a perspectiva do céu é tão duvidosa, a solução é usufruir dos bens que Deus nos dá nesta vida e agradecer por tudo. Apesar disso, o autor expressa uma profunda religiosidade. Tudo que há de bom nessa vida é dom de Deus e um dia o homem terá que prestar contas de todos os seus atos. No final do livro, fica um resumo : ‘Como conclusão geral, teme a Deus e observa os seus preceitos; eis aí o homem todo’.

O Cântico dos Cânticos (expressão que significa o mais belo dos cânticos) é uma coleção de poemas que originalmente teriam sido usados em solenidades nupciais. O amor que une homem e mulher foi querido por Deus no plano da criação. O Cântico prega a fidelidade.

A Igreja Cristã, baseada no simbolismo do texto, sempre viu neste livro uma figura do amor de Cristo por sua Igreja, considerada sua esposa.

O Livro da Sabedoria tem como tema central o louvor à Sabedoria divina. Na primeira parte mostra a Sabedoria na vida de cada homem, sendo recompensada pela vida eterna. Na segunda, expõe o papel que a Sabedoria representou na vida do rei Salomão. E numa terceira parte, mostra a Sabedoria em ação : na criação, na história da humanidade e em particular na história do povo de Deus. Não se sabe ao certo quem é o autor deste livro, mas ele é dirigido aos judeus que moravam no Egito e faz um alerta do perigo de serem desencaminhados pela filosofia grega e serem tentados a abandonar o culto de um Deus único. O texto contém ainda as primeiras revelações sobre a imortalidade da alma e do seu destino eterno.

O Eclesiástico, ou Livro da Igreja, recebeu esse nome na igreja latina porque era utilizado com frequência para instrução dos fiéis. O autor se apresenta com o nome de Jesus, filho de Eleazar, filho de Sirac, e deve ter sido escrito por volta do ano 200 a. C. Neste livro o autor trata de todos os aspectos da vida humana : exortações aos maridos, às mulheres, aos pais, aos filhos,  aos senhoras, aos homens da lei, aos anciãos. Também traz temas como a riqueza a pobreza, o comércio e a educação. O texto mostra um conceito que tem como base os mandamentos de Deus na lei mosaica e aplicado na vida cotidiana.


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