*Artigo
de José M. Castillo,
periodista digital
Tradução : Gilmar Pereira
Se
levarmos em conta esses dois conceitos, entende-se o porquê daqueles que
propõem, para renovar a Igreja e atualizá-la, a supressão do clericalismo.
Porque,
se a intervenção do clero na vida da Igreja, é ‘excessiva’, o mais lógico seria controlar o excesso clerical, de
modo que os leigos não sejam reduzidos a mera submissão e observância dos
clérigos que governam. Com isso, os leigos, que são a grande maioria dos
cristãos, acabam permanecendo na Igreja com a única missão de se submeterem ao
que o clero pensa, decide e impõe (cf. F. Vidal, em Vida Nueva digital.com : ‘Decálogo para suprimir o clericalismo’).
A
razão para esta proposta é clara : se as coisas continuam como estão na Igreja,
os crentes (não ‘ordenados’ como
sacerdotes) serão reduzidos à mera condição de ‘clientela do clero’. Ou seja, os cristãos estarão sempre à mercê da
vontade dos bispos, sacerdotes e ‘clérigos’
em geral, a partir de suas ideias e interesses que, como sabemos, podem estar,
em muitos casos e em questões importantes, talvez muito longe do que os mortais
comuns pensam, sentem e vivem.
Além
disso, essa questão é complicada se acrescentarmos a isso a teologia, a
liturgia, as cerimônias, as normas, o que pode e deve ser feito para determinar
as questões da vida, e tudo o mais. Isso parece estar mais de acordo com o que
se pensava, era dito e feito na Antiguidade e na Idade Média, que com o que
pensamos, estamos interessados e temos que resolver no século XXI.
Não
temos mais que ir à missa, celebrada em certas igrejas, confessar-nos com tal
ou qual sacerdote ou comparecer a casamentos e batismos em que as pessoas têm
que ouvir coisas que deixam a mais de um nervoso. Lá, a linguagem, as roupas,
as cerimônias, as questões que surgem e as soluções propostas são coisas que
não são compreendidas. E se chegam a se entender, poucos participantes estarão
interessados.
Costuma-se
dizer que a raiz desses problemas está no ‘clericalismo’.
Daí a necessidade de superá-lo. O que é verdade. Mas não é toda a verdade.
Porque, se esse assunto for analisado mais a fundo, logo fica claro que o
problema não está no ‘clericalismo’,
mas no ‘clero’.
De
fato, o termo grego ‘klêros’ é usado,
no Novo Testamento, quando se fala de Matias para substituir Judas (Atos 1,
17-26). Para designar os sacerdotes, foi generalizado no século III o título e
categoria de ‘clérigos’, distintos e
superiores aos ‘leigos’. Assim, a
Igreja estava dividida entre : o ‘clero’
que monopolizava a capacidade de tomar decisões, o poder de administrar os
rituais sagrados e a dignidade de ser ‘consagrados’.
Com o inevitável perigo de que não poucos ‘homens
da Igreja’ começassem a ver, no ministério eclesiástico, uma maneira de se
estabelecer na vida e até alcançar uma categoria senhorial (Y. Congar).
Entende-se
isso, mesmo antes de Constantino, o tratado ‘De singularitate clericorum’ que lutou contra os abusos de grandeza
e vaidade de não poucos ministros da Igreja (J. Quasten). E, infelizmente, essa
tendência (ao longo dos séculos) estava aumentando. Até transformar o ‘seguimento de Jesus’ em uma ‘carreira de dignidade’, situando-se
(talvez sem pensar) nos níveis mais altos da sociedade.
Assim,
a comunidade dos crentes em Jesus ficou fraturada e dividida. O ‘clero’ (que é uma minoria) impõe suas
ideias e possui os poderes sagrados. Os ‘leigos’
(a grande maioria) são forçados a se submeterem aos ‘consagrados’.
Se
a isto somarmos os templos, monumentos sagrados, palácios episcopais, mosteiros,
propriedades e a quantidade de dinheiro que estes lugares movimentam e
precisam, a questão que se coloca é inevitável : isso tem que ver, em algum
grau, com o que Jesus fez e disse? É mais ainda : pode-se razoavelmente pensar
que todo este artificio solene evoluirá para se assemelhar à simplicidade,
pobreza e condição humilde em que Jesus viveu, conforme o apresentado no
Evangelho?
A
contradição entre ‘o que é vivido’ e ‘o que é dito’ é clara. Então, pode ter ‘credibilidade’ quem vive em tal
contradição?
Dói-me
ter que dizer essas coisas. Porque tudo o que sou e tudo o que sei é à Igreja a
quem devo isso. E é por esse motivo que, por quanto amo a Igreja, não posso
calar a boca contra essas contradições que magoam tanto.’
Fonte
:
* Artigo na íntegra http://domtotal.com/noticia/1331272/2019/02/clero-e-clericalismo-essa-enorme-trama-tem-algo-a-ver-com-o-que-jesus-fez-e-disse/
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