*Artigo
do Frei Sinivaldo S. Tavares, OFM,
doutor
em Teologia Sistemática
pela
Pontificia Università Antonianum, Roma.
‘Domingo passado,
em comunhão com as comunidades eclesiais de todo o mundo, iniciamos o tempo
litúrgico do Advento. Ad-vento, como exprime a própria palavra, significa
espera, expectativa. Quem espera, espera sempre por alguém ou por alguma
alvissareira notícia, ou por ambos, como é o nosso caso. Aguardamos a vinda do
Cristo, Sol nascente que nos vem visitar. Esse é o sentido pleno do mistério
que celebramos no Natal, cuja preparação se dá ao longo destas quatro semanas
que constituem o tempo litúrgico do Advento.
Há quem insista em
interpretar a esperança como sendo uma atitude passiva e, na melhor das
hipóteses, resignada face à vida e seus inerentes processos. Assim entendida,
ela se restringiria a uma espécie de expectativa cega, ilusória e ingênua. A
esperança cristã não se propõe como uma espera monótona ou entediante nem
tampouco como uma expectativa que provoque ansiedade ou angústia. A esperança
cristã, para todos os efeitos, não consiste apenas em uma atitude ativa, mas
criativa. Ela se encontra enredada em torno aos nós constitutivos da variegada
e rica teia que é a experiência de fé bíblica.
A inteira trama da história da salvação,
narrada na Bíblia, é tecida mediante os nós recíprocos e complementares que
constituem a tessitura da aliança de Javé com o povo de Israel :
promessa/(não)cumprimento. O próprio nome que o Senhor revela a Moisés, depois
de muita insistência, IAHVEH, consiste em uma forma verbal, no tempo futuro.
Trata-se, afinal, de uma promessa. Dessa maneira, o próprio nome através do
qual o Senhor se revela a Moisés significa uma promessa que Ele faz de
permanecer sempre junto a seu povo eleito todos os dias. Estamos diante de uma
promessa que instaura uma autêntica história de aliança entre Deus e seu povo.
Aquele que se antecipa e propõe a aliança promete fidelidade para sempre, custe
o que custar, e espera que o povo, caminhando por entre luzes e sombras,
corresponda à mesma, ainda que em meio a fidelidades e infidelidades. E, a
partir daí, inicia-se o longo e sinuoso percurso da história da salvação,
narrada de formas diferentes e mediante distintos gêneros literários.
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alvissareiros, segundo o testemunho dos textos da Bíblia, remetem-nos à visita
de Deus. Visita esperada e acalentada desde tempos imemoráveis que promete vir
ao encontro dos mais profundos desejos do coração humano e satisfazer suas mais
remotas necessidades. O Senhor vem, de fato, e vem para nos salvar. Nesse
sentido, Deus irrompe em meio à nossa vida, atraindo-nos para o futuro. Sua
presença subverte nossas ordens estabelecidas e nossa maneira usual de pensar e
raciocinar. Ele jamais se deixa circunscrever ou aprisionar dentro de nossas
estreitas categorias, espaços e formas de pensar e de agir. Por essa razão,
necessitamos estar sempre vigilantes para não cristalizarmos imagens de Deus
nem para engessá-lo dentro de nossos critérios. É preciso deixar Deus ser Deus,
renunciando a toda e qualquer tentativa de querer reduzi-lo a um ídolo que,
estando aí à nossa inteira disposição, obedeceria fielmente aos nossos interesses
e propósitos.
E, se antes, ele
havia nos visitado através de patriarcas e profetas, agora, na plenitude dos
tempos, ele se aproxima e se acerca de nós, pessoalmente, em seu próprio Filho.
Os sinais de sua visita são desconcertantes e até escandalosos : um
recém-nascido, coberto com panos rudes, deitado em uma simples manjedoura,
aquecido pela respiração e transpiração dos animais, na atmosfera lúgubre de um
estábulo. Seria possível imaginar fragilidade maior do que essa?
Não raramente,
associamos Deus a grandes manifestações, a fatos e a situações extraordinários.
Comportamo-nos como os Magos dos evangelhos que, preferem se informar junto a
Herodes e sua corte, do que continuar seguindo a estrela que os levaria à cena
em que se faziam presentes todos aqueles sinais prometidos. Observar as
estrelas era o que faziam os Magos quotidianamente. Como imaginar que Deus se
serviria de uma atividade monótona e repetitiva, do dia-a-dia, para sinalizar
algo ou para comunicar-lhes uma alvissareira notícia? Melhor se prevenir e
buscar outras formas mais adequadas à dignidade e majestade divinas. Não é
assim que também nós pensamos?
Em sua singular e
inusitada maneira de se fazer presente entre nós, mediante sinais, o Deus de
Jesus Cristo potencializa as mediações humanas, históricas e também cósmicas
como possíveis vias de sua presença e interpelação. Entre tantas mediações
escolhidas pelo Deus bíblico, uma merece ser destacada. Trata-se da mediação do
pobre, concebido como sacramento primordial do Deus comunhão, revelado por
Jesus Cristo. Ao se revelar preferencialmente no pobre, no excluído e no
marginalizado, Deus revela um de seus segredos mais recônditos. E o segredo é
este : que Deus ama tudo o que é desprezível, insignificante, simples. Deus ama
a todos e se serve de toda e qualquer situação para se fazer presente e
comunicar-nos os desígnios de sua vontade. No entanto, manifesta um carinho
especial para com os pequenos, desprezados e últimos deste mundo, e ama
particularmente aquelas situações mais desprezíveis e insignificantes. Numa
palavra, Deus ama o abandonado e faz dele seu sacramento por excelência.
Francisco de
Assis, o Poverello, e Teresa de Calcutá, entre outros, intuíram este segredo de
Deus. Foi assim que, descobrindo o valor recôndito das situações insignificantes,
realizaram a experiência singular do encontro com o Deus de Jesus Cristo e, em
comunhão com os pobres, aprenderam a cultivar e a apreçar a beleza desta
intimidade. Assim vivendo, portanto, ensinam que o caminho que conduz o ser
humano a Deus passa inevitavelmente pelo irmão ou pela irmã e, de modo
especial, por aquele que se encontra caído à margem, vale dizer, excluído de
toda e qualquer convivência social.
Quais seriam,
então, hoje esses novos sinais de Deus que somos interpelados a perscrutar? O
empenho em perceber em toda e qualquer situação a presença do Deus de Jesus
Cristo e em acolher generosamente suas interpelações torna-se imprescindível.
Não existem, para o cristão, situações que constituam um total empecilho à
presença e à interpelação do Deus de Jesus Cristo. Não raras vezes, Ele se faz
presente justamente naquelas situações nas quais resulta difícil perceber, de
antemão, sua presença e conseqüente interpelação.
Que no decurso
destas quatro semanas do Advento, de modo especial, exercitemo-nos em uma maior
sensibilidade para com nosso dia-a-dia a fim de percebermos os sinais da
presença interpeladora de Deus. E, uma vez percebida, que nos disponhamos a
corresponder aos apelos de Deus com generosidade.’
Fonte :
* Artigo na http://www.domtotal.com/noticia/1103114/2016/11/tu-vens-senhor-eu-ja-perscruto-teus-sinais/
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