*Artigo
de Paulo Aido,
Jornalista
Em redor dos bairros luxuosos de
Luanda, ilhas perfumadas no meio do lixo dos musseques, vivem milhões de
pessoas. O afundamento do preço do petróleo veio tornar ainda mais difícil a
vida desta multidão de pobres, de excluídos. Entre estes filhos da má sorte, há
milhares de crianças que vivem na rua.
‘Há cicatrizes que
não se apagam da memória. Ainda hoje, Angola parece não conseguir libertar-se
dos tempos atrozes da guerra civil. Esses 27 anos de sofrimento parecem ter
reaparecido agora com a recente crise do petróleo que fez soar todos os gritos
de alarme. A economia do país, dependente do chamado ouro negro, entrou em
colapso, com um aumento galopante do número dos muito pobres que rivalizam com
a riqueza quase obscena de uns quantos, privilegiados.
Os bispos
denunciaram este estado de coisas na sua mais recente nota pastoral. Nesse
documento, os prelados afirmam que esta crise não pode ser explicada apenas
pela queda do preço do petróleo, sendo necessário apontar o dedo à ‘falta de ética, má gestão do erário público
e corrupção generalizada’ no país. O fim da guerra e a euforia do dinheiro
fácil do petróleo transformaram a capital angolana numa terra desejada.
Hoje, Luanda é das
cidades mais caras do mundo, o que é difícil de entender nos becos dos
musseques onde vivem milhões na mais abjeta pobreza. É um contraste criminoso.
Casas luxuosas e barracas imundas, quase lado a lado. As palavras dos bispos
são a verbalização de um sentimento coletivo. Dizem os bispos que ‘a falta de critérios no uso dos fundos
públicos, gastos exorbitantes e importação de coisas supérfluas’ explicam,
em parte, a situação a que se chegou.
Meninos da rua
Entre a nova
geração de excluídos há os que, tendo nascido já depois do fim da guerra, nunca
souberam o que significa viver em paz : são os meninos da rua. Em Luanda há
bairros onde é fácil encontrar crianças e jovens que perderam a família, que
desconhecem a palavra ‘carinho’, que
não sabem o que é a escola, cama, comida na mesa. É nesses emaranhados de
barracas, nessas ruas estreitas e perigosas, com esgotos a céu aberto, que
vivem dezenas, centenas de crianças. Em Luanda há dois centros de acolhimento
para crianças de rua : a Casa Magone e a Casa Mamã Margarida. São dois projetos
da Igreja em que se procura dar resposta a esta chaga social. As crianças que
chegam a estas casas vêm com os olhos carregados de medo e trazem consigo
histórias terríveis de exploração sexual, de violência, de doença. Muitos
cheiram gasolina, que é a droga das periferias. Ninguém sabe ao certo quantos
meninos de rua haverá em Luanda. Serão, por certo, mais de cinco mil. Estes
filhos da má sorte andam pelas ruas como se fossem invisíveis, mas graças aos
responsáveis da Casa Magone e da Casa Mamã Margarida vão conseguindo fintar o
futuro negro que lhes estava reservado.’
Fonte :
* Artigo na íntegra
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