Por Eliana Maria
(Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo de Svyatoslav +
Pai e Primaz da Igreja Greco-Católica Ucraniana
‘‘Transcorre a 93ª
semana da grande guerra que o ocupante russo trouxe à nossa pacífica terra
ucraniana. Ao longo de toda a linha da frente, a tensão nos combates persiste
sem tréguas. O inimigo bombardeia constantemente cidades e aldeias ao longo das
fronteiras das nossas regiões de Chernihiv, Sumy e Kharkiv. Onde quer que possa
estender a sua mão assassina, o inimigo continua a atacar as pacíficas cidades
e aldeias da Ucrânia.
No Dia da Memória do
Holodomor, quando a Ucrânia recorda o 90º aniversário da grande fome e do
genocídio, a nossa cidade, Kiev, a nossa capital, foi palco do mais massivo
ataque de drones na história da guerra. Esta luta atual, este confronto com o
mal que a Ucrânia trava hoje, tem todos os sinais de uma batalha espiritual.
Sabemos que na guerra
espiritual, quando uma pessoa que crê enfrenta as forças do mal, essas forças
podem ser extremamente poderosas e o seu ataque pode ser intensamente forte. No
entanto, a vitória contra o mal é definida como resiliência. Vence quem não se
rende. Vence quem não abaixa as mãos. Vence quem resiste neste confronto.
Não podemos destruir
os espíritos do mal nos espaços celestiais, mas podemos opor-nos ao seu ataque,
que nunca é eterno, nem sempre forte, mas temporário. Observamos hoje uma
situação semelhante na Ucrânia. O inimigo quer desgastar o nosso povo, quer nos
fazer perder a fé, nos desanimar e deseja a nossa rendição. No entanto, a
Igreja ucraniana, as nossas Igrejas e organizações religiosas permanecem como
portadoras de esperança. Levamos conosco Cristo, que é a fonte da resiliência
do nosso povo. É por esta razão que resistiremos como nação, como Estado, como
povo de Deus. Hoje, queremos dizer a nós mesmos e ao mundo inteiro : a Ucrânia
resiste, a Ucrânia luta, a Ucrânia reza!
Noventa anos desde a
grande carestia e genocídio na Ucrânia. Esta última é uma data triste e
dolorosa. O regime de Stalin matou mais de sete milhões de ucranianos pela fome
artificial. Esta carestia era artificial porque, embora as terras ucranianas
tivessem produzido colheitas abundantes naquele ano, as autoridades soviéticas
confiscaram tudo.
Esta carestia foi um
verdadeiro genocídio, uma vez que o Estado tinha a intenção deliberada de matar
os ucranianos como nação, como povo, como cultura. A Grande Fome teve como
objetivo não apenas matar o corpo, mas também semear um medo paralisante em
relação ao desejo de liberdade.
A Grande Fome tinha
por objetivo matar permanentemente o desejo dos ucranianos de serem eles
mesmos, o desejo de serem pessoas livres.
E, infelizmente, esse
trauma, que é um trauma espiritual, assim como um trauma psicológico, tem a
propriedade inerente de ser transmitido de geração em geração. E, infelizmente,
constitui uma parte da nossa situação atual, da nossa identidade, a de uma
nação pós-genocídio. É por isso que hoje é tão importante lembrar e homenagear
aqueles que foram inocentemente mortos pela fome na Ucrânia.
Mas este ato de
recordação e comemoração tem um efeito terapêutico e curativo. A recordação nos
liberta. A memória nos faz compreender que ser nós mesmos não só é possível,
mas também necessário. Não somente é legítimo desejar a liberdade, mas o Senhor
Deus nos dá esta liberdade como seu dom. O dom da dignidade, o dom da liberdade.
É por isso que os ucranianos estão profundamente gratos a todos aqueles que
hoje, juntamente connosco, prestam homenagem às vítimas desta grande
catástrofe, que tocou os próprios alicerces da humanidade.
Este trauma superou
em muito as fronteiras do povo ucraniano. Estamos gratos a todos os países que
reconhecem o Holodomor como um genocídio. Mais de trinta nações em todo o mundo
já comemoram esta ferida e a dor da Ucrânia.
Podemos observar que
a atual guerra que a Rússia está travando contra a Ucrânia tem todos os
indicadores de um genocídio. A Rússia pretende subjugar mais uma vez a Ucrânia
como a sua antiga colônia e extinguir o próprio desejo de liberdade do povo
ucraniano. Pretende suprimir esta capacidade de liberdade nos ucranianos.
Contudo, vemos que a Ucrânia não foi aniquilada há 90 anos e a Ucrânia não se
rende. Continuará a resistir também hoje.
Apelo a todas as
pessoas de boa vontade em todo o mundo. Dirijo-me a todos aqueles que
atualmente têm o que comer e que, durante este inverno, vivem em condições
confortáveis e quentes. Convido-vos a pensar nos sete milhões
de ucranianos que necessitarão de assistência
imediata para se alimentarem e manterem aquecidos neste Inverno. O Holodomor de
90 anos atrás e a guerra em curso na Ucrânia hoje são ambos causados pelo mesmo mal : o
insaciável imperialismo russo.
Vamos unir forças e
juntos deter o mal. Permaneçamos unidos na luta contra as forças do mal,
naquela que é uma batalha espiritual. Porque a batalha da Ucrânia hoje é uma
luta pela liberdade humana em todos os países, em todas as culturas e entre
todos os povos.
Deus, proteja a
Ucrânia. Deus, cure a ferida do nosso povo. Esta ferida, que hoje completa 90
anos, mas também este trauma, infligido ao nosso povo por esta cruel guerra de
longa duração. Deus, abençoe as crianças da Ucrânia. Dê-nos forças para não nos
cansarmos. Dá-nos forças para resistir, porque sabemos que o mal pode ser
derrotado não pelo poder humano, mas apenas pelo poder de Deus. Portanto, Deus,
abençoe a Ucrânia com a tua justa paz celestial.’’
Fonte : *Artigo na íntegra