quarta-feira, 26 de setembro de 2018

A liturgia dentro da história da salvação

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

Celebração da Santa Missa em Kaunas, na Lituânia 
Celebração da Santa Missa em Kaunas, na Lituânia

*Artigo dJackson Erpen,
jornalista


No nosso Espaço Memória Histórica – 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos falar no programa de hoje sobre o tema ‘A liturgia dentro da História da salvação’.

A palavra liturgia tem sua origem no grego leitourgos, para denominar alguém que fazia serviço público ou liderava uma cerimônia sagrada. Mesmo já sendo usada na antiguidade, somente depois dos séculos VIII e IX passou a ser usada no contexto da Eucaristia na Igreja grega.

Por meio da liturgia, ‘exerce-se a obra da nossa redenção’ (Concílio Vaticano II, Sacrosanctum Concilium, 2). Assim como foi enviado pelo Pai, Cristo enviou os apóstolos para anunciarem a redenção e ‘realizarem a obra de salvação que proclamavam, mediante o sacrifício e os sacramentos, em torno dos quais toda a vida litúrgica gira’ (ibidem, 6).

A Igreja pode celebrar e adorar o mistério de Cristo presente na eucaristia precisamente porque o próprio Cristo se entregou antes a ela no sacrifício da cruz’ (Sacramentum Caritatis, 14). ‘A Igreja vive desta presença e tem a difusão desta presença no mundo inteiro como a sua razão de ser e de existir’ (Bento XVI, Discurso de 15 de abril de 2010 aos Bispos do Brasil, Regional Norte-2).

Esta é a maravilha da liturgia, que, como o catecismo recorda, é culto divino, anúncio do evangelho e caridade em ato (cf. CIC, 1070). É Deus mesmo quem age, e nós nos sentimos atraídos por esta sua ação, a fim de sermos, deste modo, transformados nele.

Inicialmente a liturgia era da responsabilidade dos apóstolos e bispos, mas é sabido que algumas Igrejas criaram a sua própria liturgia, como a Igreja da Alexandria no Egito e de Antioquia na Síria. Existem várias manifestações de liturgia, como a liturgia ambrosiana, liturgia de S. João Crisóstomo, liturgias orientais.

Até a metade do século XVI não havia uma regra geral e obrigatória para a liturgia. O Concílio Vaticano II representou uma renovação da liturgia, dando maior ênfase à Sagrada Escritura na liturgia da palavra, e permitindo o uso de línguas em vez do latim, de forma que o fiel pudessem melhor compreender e participar de forma mais ativa da celebração.

Na edição de hoje deste nosso espaço, padre Gerson Schmidt, que tem nos acompanhado neste percurso de exposição dos documentos conciliares, nos fala sobre a liturgia dentro da história da salvação :

A Constituição Sacrosantum Concilium não foi proclamada no Concílio sem ter em conta a caminhada percorrida pelos teólogos, liturgistas e papas, antes do Concilio Vaticano II, num verdadeiro movimento sério de Reforma da Liturgia. Os teólogos Odo Casel e Romano Guardini tiveram sua importância fundamental aqui nos conceitos do Mistério Pascal e do Corpo Místico. Também contribuiram Salvatore Marsili, Dom Lambert Beauduin, Maurice Festugière, Cipriano Vagaggini. O caminho percorrido pelos papas Pio X, Pio XI e Pio XII também deram mais um passo à frente. 

O teólogo pioneiro na reflexão da teologia litúrgica sem dúvida é Odo Casel. Casel explorando a doutrina dos mistérios, construiu a base sólida da teologia litúrgica, a partir da tradição e do argumento teológico. Para ele, ‘o mistério de Cristo é um conjunto orgânico e vivo que não pode ser fracionado; é o grande mistério da redenção, portanto, onde está presente o mistério central, como é o mistério da cruz, todos os demais mistérios da vida de Cristo estão presentes¹’.

Isso o leva a afirmar a presença sacramental do ato da morte e ressurreição de Cristo no ato litúrgico atual. Por isso, Casel ocupa uma posição hegemônica na teologia moderna. Salvatore Marsili, outro expoente, seguiu os passos de Odo Casel e continuou o seu pensamento, embora com as devidas diferenças. Ao redefinir teologia como teologia do mistério de Cristo e da história da salvação, naturalmente incluiu a liturgia como um eixo da teologia, pois a ‘liturgia é aquela realidade na qual a revelação divina se torna acontecimento de salvação em ato e se coloca como momento síntese de toda a história da salvação²’.

A Constituição Sacrosantum Concilium insere a liturgia no seu lugar legítimo que é dentro da história da salvação. ‘Dentro da história da salvação existe uma economia eclesial e litúrgica. Aqui, torna-se evidente que a liturgia é o elo que liga o tempo de Cristo e o tempo da Igreja. A ação litúrgica aparece claramente como um momento da revelação³’ .

A história da salvação é atualizada nos ritos e sinais sagrados. Se a história da salvação não fosse ritualmente celebrada se transformaria em mero fato do passado, seria apenas um ‘rito mitológico, alienante e incapaz de despertar em nós a esperança escatológica’.’

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[1] J.J. Flores, Introdução à teologia litúrgica, Paulinas, 2006, p.197-198.

[2] Idem, p.247.

[3] Apontamento de Dom Geovane Luiz da Silva, bispo auxiliar de Belo Horizonte, enquanto ainda padre da Arquidiocese de Mariana. Subsídio entregue na Assembleia Regional do Clero, Região Episcopal da Conceição – Arquidiocese de Belo Horizonte, p. 07.


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