Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo
de Fabrício Veliq,
protestante,
é mestre e doutorando em
teologia
pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE),
doutorando
em teologia na Katholieke Universiteit Leuven - Bélgica,
formado
em matemática e graduando em filosofia pela UFMG
‘...No texto
da semana passada falamos a respeito de um Cristianismo que precisa reaprender
a ouvir, recuperando assim uma característica primordial da experiência do povo
de Israel para com seu Deus. Que isso seja uma tarefa difícil, ninguém o poderá
negar. Afinal, a disposição para ouvir vem quando se considera que o outro que
está diante de nós seja digno de respeito e de ser ouvido. Sem esse princípio
básico, a fala desse outro se torna somente um amontoado de sons emitidos e
palavras jogadas ao ar sem a menor relevância.
Durante muito tempo o Cristianismo se mostrou como uma religião
que não estava disposta a ouvir por não considerar as outras vozes dignas de
serem ouvidas. Ainda hoje, esse tipo de postura se faz presente entre cristãos
e cristãs espalhadas pelo mundo, sendo um exemplo bem vívido disso a questão do
diálogo inter-religioso.
A grande ironia é que uma boa parcela de cristãos e cristãs da
atualidade dizem que se deve estar disposto a dialogar com as outras religiões
e ouvir os seus discursos, bem como pregam que deve haver tolerância e respeito
pelos pensamentos divergentes, desde que no final desse suposto diálogo se
chegue à conclusão de que o Cristianismo seja a melhor religião que existe, a
que compreendeu melhor a pessoa de Deus e o melhor caminho para se alcançar a
salvação. Por incrível que pareça, são várias as pessoas que não vêm a
dissonância entre a proposta de diálogo defendida e a conclusão proposta para
esse diálogo.
Diante desse cenário não tão difícil de ser encontrado, é
possível dizer que um dos motivos pelos quais isso ocorre é porque o
Cristianismo atual ainda mantém certa ideia exclusivista a respeito do
relacionamento com Deus e, dessa forma, tudo que vai contra a conclusão de que ‘o Cristianismo é a melhor religião que existe’
ainda é visto, por muitos, como afronta e obra do inimigo, devendo, por isso,
ser totalmente desconsiderado. Em outras palavras, ouvir alguém de uma religião
não cristã (em alguns casos, até mesmo cristãos e cristãs com doutrinas
diferentes) se torna algo perigoso e que deve ser evitado para que não se caia
nos enganos e ciladas do inimigo que visam corromper a fé.
Quando isso acontece, a proposta de diálogo se torna um grande
jogo de xadrez, onde o discurso de ouvir o outro é somente uma tática de jogo para
tentar encontrar algum erro argumentativo, a fim de começar a ação proselitista
mascarada de diálogo inter-religioso. Mas, se é essa a postura com a qual um
cristão ou uma cristã segue para o diálogo, as palavras do outro não fazem
diferença para o questionamento a respeito da própria fé e a disposição honesta
de ouvir já se foi há muito tempo, restando somente o antigo complexo de
superioridade que afeta o Cristianismo desde longa data.
O verdadeiro ouvir exige humildade. Exige enxergar o outro como
igual em dignidade e, por isso mesmo, como tendo algo a contribuir para
tornar-nos melhores cristãos e cristãs. Se isso é verdade para qualquer
diálogo, para o diálogo inter-religioso isso se mostra como imprescindível, uma
vez que somente uma religião humilde é capaz de um diálogo honesto e verdadeiro
com outra. Recuperando o texto
de semana passada, é possível dizer que sem humildade não há audição e sem
audição não há diálogo.
Assim, somente um Cristianismo que imita àquele que é
manso e humilde de coração será um Cristianismo disposto a se reeducar para
ouvir tanto a sociedade em suas questões quanto às outras religiões em suas
contribuições.’
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