*Artigo de Dom Alberto Taveira Corrêa,
Arcebispo
Metropolitano de Belém, PA
‘Há um convite
provocante que percorre os séculos, onde quer que chegue a proclamação da Boa
Nova de Jesus Cristo, o chamado à conversão. E este faz parte dos chamados ‘mistérios da alegria’, quando a Igreja
reza o Rosário, contemplando, com os olhos de Maria, os acontecimentos de nossa
salvação. Sempre é possível acolher de novo e de modo mais decisivo o chamado à
mudança de vida, e só estaremos prontos no final de nossa caminhada terrena. E
as mudanças decorrentes da conversão interferem, pouco a pouco, a sociedade e o
relacionamento entre as pessoas. É hora de abrir os olhos, acolhendo com
alegria a linguagem poética que a Igreja oferece neste tempo do Advento.
‘Alegrem-se o deserto e a terra seca, dance o
chão duro, florido como a palma. Que se cubra de flores, dance e comemore, pois
Deus lhe deu o esplendor do Líbano, a beleza do Carmelo e do Saron. Eles hão de
ver a glória do Senhor, a majestade do nosso Deus. Fortalecei esses braços
cansados, firmai os joelhos vacilantes. Dizei aos aflitos : ‘Coragem! Nada de
medo! Aí está o vosso Deus, é a vingança que chega, é o pagamento de Deus, ele
vem para vos salvar!’ Então, os olhos dos cegos vão se abrir e abrem-se também
os ouvidos dos surdos. Então os aleijados vão pular como cabritos e a língua
dos mudos entoará um cântico, porque águas vão correr no deserto, rios na terra
seca. O chão duro vai se mudar em pântano e o seco vai se encher de minas d’água,
o lugar onde dormiam os chacais será lavoura de juncos e papiros. Haverá aí uma
estrada, um caminho, que será chamado de caminho santo. Nenhum impuro passará
por ele. Será para eles um caminho reto : nele nem os tolos se perderão. Aí não
haverá leão, nem qualquer animal selvagem poderá alcançar esse caminho, ou nele
será encontrado. Por ele só andarão os que foram libertados. Os que foram
resgatados pelo Senhor voltarão e chegarão a Sião cantando louvores, cobertos
de alegria sem fim. Alcançaram a felicidade e o prazer, a dor e a tristeza
foram-se embora’ (Is 35, 1-10).
O sonho é alto
demais, parece irrealizável! No entanto, a Igreja o proclama de novo no tempo
do Advento. É a estação espiritual da esperança, dos projetos de um mundo
possível, com a graça de Deus!
Ouvimos dizer : ‘Alegrem-se o deserto e a terra seca. O chão
duro vai se mudar em pântano e o seco vai se encher de minas d’água!’
Recolhemos os desejos de porções imensas da humanidade que experimentam a
secura dos desertos, sinais do valor da água para a natureza e para a
humanidade. A terra seca fez o povo da Bíblia compará-la com o desejo de Deus!
Sabemos também o quanto o povo da Aliança transformou deserto em estrada de
esperança, pensando na terra desejada, onde deveria manar leite e mel, fruto de
plantações irrigadas até com um rio nascido do lado direito do templo! O feliz
jogo de palavras chegou até à Cruz, quando nasceram o sangue e a água do lado
de Cristo. E foi o mesmo Senhor que prometeu rios de água viva a nascerem
daqueles que acreditassem.
Sem medo de
sonhar, ouvimos que ‘os braços cansados
são fortalecidos e os joelhos vacilantes se firmam’. Que bela oportunidade
para ir ao encontro de um mundo de gente, em torno a nós, pessoas esmorecidas,
sem força para caminhar. De fato, a experiência da fé vivida com decisão muda o
coração das pessoas e infunde nelas novas energias. E precisamos disso
urgentemente!
As imagens das
limitações físicas se tornam as mais eloquentes para propor a todos uma nova
vida : ‘Os olhos dos cegos vão se abrir e
abrem-se também os ouvidos dos surdos. Os aleijados vão pular como cabritos e a
língua dos mudos entoará um cântico’. Já ouvi pessoas amigas que não
enxergam expressarem todos os seus desejos num só lampejo possível de luz, nem
que fosse por um momento. E Deus concede a luz vinda de dentro, quando se
acolhe a novidade do Evangelho!
‘Coragem! Nada de medo!’ Num tempo de
crises proclamadas por toda parte, ressoe esta voz, que só pode vir de Deus. A
fonte da coragem não está em nossos parcos recursos humanos, mas será resultado
da confiança, a aposta da vida nas promessas de Deus. É do Senhor Jesus que
ouvimos : ‘Tende coragem! Eu venci o
mundo’ (Jo 16, 33). Se olharmos a vida a partir do seu ângulo, muda tudo,
mas o risco é nosso, pois será necessário escapar das aparentes razões, que
julgamos mais lógicas do que a lógica de Deus!
‘Haverá aí uma estrada, um caminho, que será
chamado de caminho santo Por ele só andarão os que foram libertados. Os que
foram resgatados pelo Senhor voltarão e chegarão a Sião cantando louvores’.
Ah! O sonho de Deus, que se faz humano na Encarnação do Verbo, cujo mistério
celebramos neste tempo, é uma estrada nova, e esta é santa. Não dá para
negociar ou pedir descontos! Deus é realista, concreto. Seu Filho amado,
Caminho, Verdade e Vida, há de ser acolhido e seguido. Pode parecer distante do
que pensam os grandes do mundo, mas, até agora, sabemos os resultados das
escolhas que distanciam de Jesus Cristo. Só nele existe a verdadeira e única
esperança!
João Batista (Cf.
Mt 3, 1-12), voz daquele que grita para preparar nos desertos da vida o caminho
do Senhor e endireitar suas veredas, mesmo para seu tempo andava contra a
correnteza, pelos seus hábitos e palavras. No entanto, seus apelos são
plenamente atuais, e passam por alguns gestos irrenunciáveis. As pessoas, ao
ouvirem sua pregação, confessavam seus pecados, reconheciam ser ‘raça de cobras venenosas’. Que ousadia
em suas palavras! Pedia frutos capazes de provar a conversão, vida nova e
diferente!
Sabia João Batista
ser apenas capaz de preparar o caminho. Aquele que o supera em força traz o
Batismo com o Espírito Santo e com o fogo. E nós, geração da crise de hoje,
cujos perigos rondam de modo permanente, somos chamados a transformá-la em
grande oportunidade.
Peçamos confiantes
: ‘Ó Deus todo-poderoso e cheio de
misericórdia, nós vos pedimos que nenhuma atividade terrena nos impeça de
correr ao encontro do vosso Filho, mas, instruídos pela vossa sabedoria,
participemos da plenitude de sua vida. Amém!’’
Fonte :
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