Nos últimos anos
aumentou a perseguição religiosa e surgiu um novo fenômeno de violência com
motivação religiosa, o hiperextremismo islâmico. Os cristãos perseguidos são
334 milhões.
‘No prefácio do
relatório da Liberdade Religiosa no Mundo da Ajuda à Igreja que Sofre, o padre
Jacques Mourad, sacerdote sírio-católico que foi detido pelo autoproclamado
Estado Islâmico (EI), mas fugiu cinco meses depois, conta a sua experiência. «No dia 21 de Maio de 2015, fui raptado na
Síria pelo grupo EI e fui encarcerado em Raqqa. Durante oitenta e três dias, a
minha vida esteve presa por um fio. Temi que cada dia fosse o último. No oitavo
dia, o wali (governador) de Raqqa veio à minha cela e convidou-me a considerar
o meu cativeiro como uma espécie de retiro espiritual. Estas palavras tiveram
um grande impacto em mim. Fiquei espantado por ver que Deus conseguia até usar
o coração de um alto responsável do EI para me enviar uma mensagem espiritual.
Este encontro marcou uma mudança na minha vida interior e ajudou-me durante o
tempo em que estive preso. Mais tarde, fui transferido de volta para a minha
cidade, Qaryatain, e a partir daí consegui alcançar a liberdade, graças à ajuda
de um amigo muçulmano da região. Teria sido muito fácil ceder à raiva e ao ódio
pelo que me aconteceu. Mas Deus mostrou-me outro caminho. Em toda a minha vida
como monge na Síria procurei encontrar ligações com os muçulmanos e que
aprendêssemos uns com os outros.»
O recente
relatório da Liberdade Religiosa no Mundo analisa o período de dois anos –
Junho de 2014 a Junho de 2016 –, centrando-se no Estado e nos atores não
estatais (militantes ou organizações fundamentalistas), que restringem ou
recusam a expressão religiosa. No total, 196 países foram analisados, com um
foco especial em cada caso em relação à liberdade religiosa nos documentos
constitucionais e em outros documentos estatutários, em incidentes de
referência e finalmente na projeção de tendências prováveis. Foram levados em
consideração os grupos religiosos reconhecidos, independentemente da sua
dimensão numérica ou influência percebida em qualquer país. Cada relato foi
depois avaliado, no sentido de criar uma tabela de países onde há violações
significativas da liberdade religiosa.
Os países onde as
violações graves ocorrem foram colocados em duas categorias : ‘Discriminação’ e ‘Perseguição’. Na essência, a ‘Discriminação’
envolve habitualmente uma institucionalização da intolerância, levada
normalmente a cabo pelo Estado ou pelos seus representantes de diferentes
níveis, com regulamentos legais e outros que enraízam os maus tratos a grupos
de indivíduos, incluindo as comunidades de fé. Enquanto a categoria ‘Discriminação’ identifica habitualmente
o Estado como o opressor, a categoria ‘Perseguição’
também inclui grupos terroristas ou atores não estatais, pois o foco aqui está
nas campanhas ativas de violência e subjugação, incluindo assassínio, detenção
falsa e exílio forçado, bem como danos a bens e expropriação de bens.
Situação mundial
Dos 196 países
apresentados, trinta e oito revelaram provas inequívocas de violações
significativas da liberdade religiosa. Dentro deste grupo, vinte e três foram
colocados no nível máximo da categoria de ‘Perseguição’
e os quinze restantes foram colocados na categoria de ‘Discriminação’.
Desde o último
Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo – há dois anos –, a situação relativa
à liberdade religiosa piorou claramente no caso de catorze países (37 %), com
vinte e um (55 %) sem sinais de mudança óbvia. Apenas em três países (8 %) a
situação melhorou claramente : Butão, Egito e Catar. Em relação aos países
classificados com nível de ‘Perseguição’,
onze – pouco menos de metade – foram avaliados como situações onde o acesso à
liberdade religiosa está em declínio acentuado. Entre os países classificados
com ‘Perseguição’ que não revelam quaisquer
sinais visíveis de melhoria, sete caracterizam-se por cenários extremos
(Afeganistão, Iraque, Nigéria (Norte), Coreia do Norte, Arábia Saudita, Somália
e Síria), onde a situação já é tão má que dificilmente pode piorar. Isto
significa que há um espaço crescente entre um grupo maior de países com níveis
extremos de abuso da liberdade religiosa e aqueles países onde os problemas são
menos evidentes, como, por exemplo, Argélia, Azerbaijão e Vietnam.
Em países como a
Índia, Paquistão e Mianmar, onde uma religião específica é identificada com o
Estado-nação, foram dados passos para defender os direitos dessa religião, por
oposição aos direitos dos fiéis individuais. Isto resultou em restrições mais
rigorosas à liberdade religiosa de minorias religiosas, aumentando os
obstáculos à conversão e impondo maiores sanções para a blasfémia.
Nos países com as
piores violações, incluindo a Coreia do Norte e a Eritreia, a contínua
penalização da expressão religiosa representa a negação total dos direitos e
liberdades, por exemplo, através do encarceramento de longa duração sem
julgamento justo, da violação e do assassínio.
Houve uma
repressão renovada dos grupos religiosos que se recusam a seguir a linha do
partido nos regimes autoritários, como a China e o Turquemenistão. Por exemplo,
mais de 2000 igrejas viram as suas cruzes demolidas em Zhejiang e nas
províncias vizinhas.
O período em análise viu surgir um novo fenômeno de violência com
motivação religiosa, que pode ser descrita como híperextremismo islamita, um processo
de radicalização intensificada, sem precedentes na sua expressão violenta. As suas
características são : crença extremista e um sistema radical de lei e governo;
tentativas sistemáticas de aniquilar ou afastar todos os grupos que não
concordem com a sua perspectiva, incluindo correligionários : moderados e
aqueles com diferentes tradições; tratamento cruel das vítimas; uso das redes
sociais mais recentes, principalmente para recrutar seguidores e intimidar os
opositores através da exibição de violência extrema; impacto global, tornado
possível através de grupos extremistas filiados e de redes de apoio com bons
recursos.
A ameaça do
Islamismo militante pode ser sentida numa proporção significativa dos 196
países analisados : pouco mais de 20 % dos países – pelo menos um em cinco –
viveram um ou mais incidentes de atividade violenta, inspirados pela ideologia
islâmica extremista, incluindo pelo menos cinco países na Europa Ocidental e
dezessete países africanos.
Ao definir um novo
fenômeno de hiperextremismo islamita, o relatório corrobora as alegações
generalizadas de que, ao atacar cristãos, yazidis, mandeanos e outras minorias,
o grupo EI e outros grupos fundamentalistas estão a infringir a Convenção das
Nações Unidas para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio.’
Fonte :
* Artigo na íntegra http://www.alem-mar.org/cgi-bin/quickregister/scripts/redirect.cgi?redirect=EulEpFlAVVUCgngsPf
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