Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
Negacionistas antivacina durante protesto, em Roma, em 2020 | Vincenzo Pinto/AFP
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das
poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa
da Santa Sé
‘O Papa não é incriticável, embora paire sobre ele
aquela visão (bem equivocada) da infalibilidade. Isso porque ele só é
infalível, segundo a crença do catolicismo, quando atua em ex cathedra, ou
seja, quando proclama um dogma de fé ou um artigo moral. O último pontífice a
usar dessa prerrogativa foi Pio XII, em 1950, ao promulgar o dogma da Assunção
de Maria.
Pois
bem, dito isso, agora vamos diferenciar crítica de postura antipapal pública.
Muitos católicos têm criticado ou renegado um pontífice legítimo? Trocando em
miúdos, uma coisa é fazer análises técnicas e pontuais sobre o governo de um
pontífice; outra é tentar destroná-lo do posto em que ele foi colocado
licitamente e sobre o qual ele tem a liberdade - como qualquer Papa - de eleger
um programa de prioridades. Francisco, no caso, escolheu encabeçar uma reforma
da Cúria Romana e focar na pastoral. E que mal tem nisso?
Um
crítico, em tempos de Lutero, era aquele que chamava seu oponente ao debate
público para que ambos pudessem confrontar seus argumentos. O teólogo alemão,
ao fixar suas 95 teses na porta da catedral de Wittemberg, estava chamando a
comunidade acadêmica e o príncipe da Saxônia para um debate sobre as
indulgências (com cópia para o Papa Leão X e o bispo local). Mais que um
documento de protesto, era a expressão de uma práxis comum na época. Depois
disso, com o desenrolar da situação, o seu antipapismo foi se efetivando até a
formalização do cisma.
Mas
Lutero, na qualidade de professor de teologia, em 1517, sabia, certamente,
montar um discurso. Era alguém que dominava a arte da retórica. Hoje em dia, o
que vemos é o Zé do youtube querendo bancar o Sêneca. Ganham visibilidade pelo
grito : uma explosão de várias teorias paralelas que transitam, em espiral,
dentro da cabeça oca.
Os
protestantes-católicos de hoje - podemos chamá-los assim -, tentam salvar a
Igreja do próprio Papa. Tal postura é fomentada pela ideia romântica de uma ‘idade
de ouro do catolicismo’ que precisa ser resgatada. Como se a instituição
tivesse escapado ilesa do mundanismo que corrompeu a sociedade em várias eras.
A história de qualquer instituição humana é feita de luzes e sombras. E com a
Igreja não é diferente.
A
questão é que, à diferença de Lutero, esses indivíduos são rasos - extremamente
rasos. Sem contar que há um abismo que separa Francisco do papado corrompido
com o qual o pai da Reforma Protestante se deparou. O pontífice romano, nos
idos do século XVI, estava mais preocupado em expandir as terras do Estado
Pontifício que em ser pastor do seu rebanho.
No
Brasil - e digo sem medo de errar - não há críticos do Papa atual; há
opositores da pior qualidade, que sabem usar muito bem máquina de fake news em
benefício próprio. E fazem isso sem nenhum peso na consciência, pois militam em
nome dessa caricatura de catolicismo que é bastante lucrativa para eles.
Eles
têm um ódio [político] a Francisco e estão dispostos a tudo para triturar a sua
reputação.
A
resistência, na maioria dos casos, não está relacionada ao catolicismo nem à
defesa de valores. Até porque o Papa, para quem professa a ‘fé de Roma’, não é
um padre qualquer. Sendo assim, minar a credibilidade do próprio líder,
mentindo, significa considerá-lo insignificante. E considerá-lo insignificante,
para quem professa a fé apostólica, é apostasia. Simples assim.’
Fonte : *Artigo na íntegra
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