Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo do Padre Michael Rennier,
sacerdote católico ordenado através da Provisão Pastoral para ex-clérigos episcopais que foi criado pelo Papa São João Paulo II
‘A dor chega até nós nos momentos mais
estranhos. Em um dia como a Páscoa, o mundo transborda de vida nova. No
hemisfério norte, de onde escrevo, os dias estão ficando mais longos e o ar
mais quente. No nosso quintal, a magnólia está em plena floração e os jacintos
perfumam o jardim. As meninas correm freneticamente com seus vestidos amarelos,
procurando ovos enfiados nas árvores. Na missa, o Aleluia volta a ser cantado e
a homilia é sobre a Ressurreição.
Mesmo em meio a toda essa alegria,
pode surgir um pensamento, uma dor, porque esta Páscoa não é como as Páscoas
que passaram, e a próxima também será diferente. A vida muda e com essa mudança
vem a perda. Talvez haja um assento vazio em sua mesa de jantar hoje que não
estava vazio no ano passado.
A dor de Maria
Eu me pergunto que tristeza permaneceu
no coração de Maria, mesmo quando ela se alegrou com o milagre da Páscoa? Seu
filho estava vivo, sim, mas ela ainda havia testemunhado sua morte horrível
apenas três dias antes. Não consigo imaginar que ela tenha processado o choque
e estivesse imediatamente pronta para esquecê-lo. Ela, claro, foi capaz de
vê-lo novamente, mas os entes queridos que você e eu perdemos ainda estão longe
de nossos olhos. Temos fé de que os veremos um dia no céu, mas esse dia não é
hoje. E assim a celebração se confunde com o luto.
Logo após um funeral, sempre há uma
enorme demonstração de apoio. Chegam cartões e flores, telefonemas consoladores
e companhia. É bem entendido que, se alguém perdeu um ente querido, precisa de
um pouco de folga do trabalho e não estará no seu eu normal e feliz. Depois de
cerca de uma ou duas semanas, porém, há uma expectativa de que é hora de
começar a vida. Um limite de tempo foi atingido e qualquer tentativa de falar
sobre a dor ou mesmo continuar processando-a emocionalmente em silêncio é
considerada estranha ou um sinal de que algo está errado. As mensagens de apoio
desaparecem à medida que todos voltam aos negócios normalmente.
Vivendo o luto
O luto é único e não pode haver uma
expectativa definida de como uma pessoa deve enfrentá-lo. Somos todos
diferentes e, à medida que uma perda persiste, ela afeta a todos nós de
maneiras diferentes. O que significa carregar essa dor pelo resto da vida, sentir
realmente a ausência de uma pessoa que foi para o túmulo? Não é saudável
guardar essas memórias, permitir-se sentir a dor disso? É mórbido reconhecer
isso? Parece-me que não é nada mórbido e todos nós precisamos continuar, pelo
menos de alguma forma, a lamentar nossos mortos.
A intensidade da dor pode diminuir com
o tempo, mas não vai embora totalmente e não devemos esperar que ela
desapareça. Na verdade, a dor está conectada ao amor. Continuar a sentir a
ferida da perda é sinal de que o vínculo de amor ainda está intacto, de que a
morte não o superou. Simplesmente não convém ignorar a dor e não deve haver a
obrigação de encobri-la ou fingir que não existe. Além disso, realmente não
existem regras sobre como lamentar adequadamente. Você lida com isso do seu
jeito e no seu próprio ritmo.
Direi, porém, que em minha experiência
como padre, passando tempo com famílias enlutadas, há três pontos importantes a
serem enfatizados :
Você não tem que seguir em frente
Não existe um cronograma segundo o
qual você precise parar de sofrer. A dor pode diminuir. Pode levar algum tempo
ou muito tempo. É verdade que a vida não pode parar totalmente quando alguém
morre, e precisamos continuar buscando felicidade e alegria. Entretanto, é
possível fazer isso no contexto do sofrimento que continua. Você pode nunca
seguir em frente inteiramente.
Você não tem que viver em negação
Muitas vezes, não sabemos como
enfrentar nossa tristeza e acabamos em negação ou proferindo clichês. Esta é
uma solução rápida que, na verdade, não corrige nada. Ao sofrer, é importante
se expressar honestamente e não entorpecer a dor.
Você não precisa dizer ‘pelo menos …’
Não vale a pena dizer : ‘Pelo menos
ele está em um lugar melhor agora’ ou ‘Pelo menos ele viveu uma vida
plena.’ Pode parecer melhor agarrar o lado bom, mas na verdade isso não é
nada mais do que um instinto protetor para entorpecer a dor, para se afastar de
seu impacto. Isso é compreensível, mas para sofrer de maneira saudável, devemos
reconhecer a perda e não pular para uma falsa racionalização.
Enfim, na Páscoa de todos os dias, a
morte e a vida estão abraçadas na totalidade da experiência humana. Não podemos
ter um sem o outro. Se quisermos celebrar a vida, também reconheceremos a
realidade da morte. O luto sempre estará conosco, mas lembre-se, é um sinal de
amor. Talvez por isso chegue até nós nos momentos mais estranhos, porque o amor
é sempre uma surpresa.’
Fonte : *Artigo na íntegra https://pt.aleteia.org/2021/04/05/abrindo-espaco-para-a-dor-no-tempo-da-pascoa/
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