Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
Missa pelos consagrados com o papa Francisco em 2 de fevereiro de 2020
*Artigo do Padre Carlos Cesar, SJ
‘Às
vésperas do 25º Dia Mundial da Vida Religiosa e Consagrada a ser celebrado no
dia 2 de fevereiro, coincidentemente ou não, numa conversa amistosa fui
questionado sobre o sentido da vida religiosa e o que levava ainda um ou uma
jovem nos dias de hoje a se consagrar através dos votos de pobreza, castidade e
obediência.
Na
visão desse meu interlocutor, ‘não fazia mais tanto sentido não se casar,
(castidade), não desfrutar dos bens (pobreza) e nem fazer o que se quer
(obediência)’. Certamente, essa é uma visão limitada e reduzida do que
significa cada um desses conselhos evangélicos. Em todo caso, nada melhor do
que uma boa conversa para procurar explicar, contextualizar e testemunhar
aquilo que cada um acredita e vive. A honestidade com o chamado de Deus tem que
se dar em todos os contextos e ela passa por ser capaz de se questionar e de
permitir ser questionado.
É
comum encontrar pessoas que nos etiquetam por não entenderem a nossa
consagração ou até pessoas que desconfiam e desqualificam a nossa opção de vida
enxergando os votos mais como uma condenação do que como um valor. Muitos não
fazem por mal. No contexto de nossa cultura atual a crise das instituições traz
à tona mecanismos de desconfianças e suspeitas que são transferidos a quem faz
parte de uma instituição como a Igreja, mais especificamente parte de uma ordem
religiosa. Essa constatação é apenas um alerta de que temos que encontrar novas
linguagens e novos modos de ser e estar e de comunicar a nossa fé e os nossos
carismas. Se não fizermos isso correremos o risco de ficarmos presos a um
saudosismo de outras épocas em que tudo isso estava dado por suposto, mas que
já não nos corresponde mais. O grande desafio é continuar buscando um
caminho onde nós religiosos e religiosas possamos seguir tendo uma missão
credível, uma palavra oportuna e profética a ser dita e um lugar a ocupar sem
constrangimentos, não obstante as nossas muitas limitações e pecados. O fato é
que continuaremos a caminhar na linha sempre tênue dos novos caminhos e da
fidelidade inspiradora dos nossos institutos religiosos. O segredo é não ter
medo e nem calar o Espírito.
Quanto
à pergunta feita se a vida religiosa ainda tem sentido, um vigoroso sim precisa
ser dado, amparado, sobretudo, a partir do testemunho de muitos homens e
mulheres que seguem fazendo de suas vidas uma verdadeira oferenda a Deus e ao
próximo. Doam a vida porque têm fé, porque se sentem chamados, porque acreditam
e porque creem que o 'nós' tem mais força que o 'eu'.
Felizmente ainda há muita gente que acredita, espera, necessita, acolhe,
incentiva e sustenta, dos mais diversos modos, a nossa consagração.
Pessoalmente,
ao longo de minha caminhada vocacional tenho podido compartilhar com muitos
amigos de dentro da ordem a qual eu faço parte, mas também com os de fora dela,
as incertezas e preocupações que sempre aparecem. De igual modo, sinto-me livre
em partilhar também o perene entusiasmo, a renovada paixão e a humilde
consciência de que a vida religiosa tem sentido e tem muito a oferecer à Igreja
e à sociedade e que, por isso, o meu futuro e a minha vida estão empenhados aí,
pois para além dos desejos e esforços meramente pessoais, existe o amparo de
Deus que chama, confirma e sustenta.
Há
quem diga também que a vida religiosa e as vocações de um modo geral vivem um estado
de crise. Isso é verdade e não é nenhuma novidade. Etimologicamente, a palavra
crise não tem em si um significado negativo. Em sua origem grega ela indica um
momento decisivo, difícil, de mudança súbita e remete à ação de distinguir,
separar, eleger, julgar. A crise é, nesse sentido, uma oportunidade de
discernimento, de escolha e decisão. Portanto, é compreensível e em certa
medida até desejável, que a vida religiosa e as vocações em geral estejam em
crise, pois a partir daí se abre uma grande oportunidade de mudança e de
acolhida às novidades de Deus. Mais cedo ou mais tarde, através do Espirito e
dos profetas de hoje, a vida religiosa será lançada a caminhar sem medo e
sempre em frente pelos caminhos complicados do mundo de hoje, discernindo e escolhendo
o melhor diante de Deus e dos filhos e filhas por ele amados.
Mas
e sobre os motivos que levam um jovem a considerar a vida religiosa como uma
opção plausível para seu futuro? As respostas podem ser muitas, a partir da
experiência de cada um que opta por esse caminho. Mas o fato é que consagrar-se
a Deus supõe uma escolha radical, já que é a vida de cada um que está em jogo
e, consequentemente, há renúncias sérias e conscientes a serem feitas; é uma
escolha possível, já que Deus não nos pede aquilo que não somos capazes de dar
ou fazer, e, sobretudo, é uma escolha definitiva, que prova a cada um e ao
mundo de que o para sempre segue sendo possível, mesmo num mundo de liquidez,
instabilidade e de projetos fugazes.
Mas
e os votos? Bom, ao mesmo tempo em que eles, se mal compreendidos, podem
assustar ou afastar, são também esses mesmos votos que continuam sendo um
importante diferencial para que alguém considere a vida religiosa como um
caminho possível entre tantos outros caminhos, também bons. Seja como for, para
os religiosos ou para quem se dispuser a vivê-los, os conselhos evangélicos
são, antes de tudo, sinais de liberdade num mundo cada vez mais carente de
raízes e de empatia. Sinal de liberdade diante das coisas (pobreza), diante das
relações (castidade) e diante do próprio ego (obediência).
A
vida religiosa e consagrada merece ser celebrada por tudo aquilo que ela
representa na Igreja e no mundo. Ela ainda tem sentido? Sim. E continuará
tendo! Ser fiel à vocação é atrever-se a ser feliz.’
Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1496273/2021/02/vida-religiosa-e-consagrada-dom-para-a-igreja-e-para-o-mundo/
Nenhum comentário:
Postar um comentário