Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo
de Mirticeli Dias de Medeiros,
jornalista e mestre em História da Igreja, uma das
poucas brasileiras
credenciadas como vaticanista junto à Sala de Imprensa
da Santa Sé
‘O
papa Francisco, em março do ano passado, rezou pelo fim da pandemia, evocando
uma antiga devoção da diocese de Roma : o crucifixo milagroso da Igreja de São
Marcelo. O objeto sacro, que já sobreviveu a um incêndio que destruiu
completamente o templo que o abrigava, foi responsável, de acordo com a
tradição católica, pelo fim da peste do século 16 que devastou a capital. Essa
imagem também protagonizou o ‘Dia do Perdão’, quando João Paulo II, no
jubileu dos anos 2000, se retratou, em nome da Igreja, por todos os crimes e
omissões cometidos pela instituição ao longo dos séculos.
Enquanto
os católicos se digladiam em busca de uma resposta ‘teológica’ para a
crise, o papa dá a receita mais simples de todas : é hora retirar da gaveta as
práticas de devoção popular e praticar a solidariedade. Era justamente o que os
cristãos de outras épocas faziam.
Quando
Francisco convoca o ‘ano de São José’, pensa não só na pandemia, mas
nesse retorno à essência da espiritualidade, propondo uma devoção acessível e
simples. Foi também no século 16 que orações e rosários em honra ao pai adotivo
de Jesus começaram a aparecer com mais frequência. Lembrando que, nesse
período, a Europa vivia uma série de convulsões sociais.
E no tempo dos
primeiros cristãos...
A
gravidade da peste do século 3 chegou ao conhecimento dos historiadores graças
a um texto do bispo Cipriano. Ainda não se sabe, exatamente, que tipo de doença
era essa, mas é possível explorar, através dessas poucas fontes disponíveis,
como os cristãos se comportaram perante essa situação dramática.
Dionísio
de Alexandria diz que os pagãos, nessa época, abandonavam seus parentes à
própria sorte, para evitar o contágio. Já os cristãos acabaram morrendo em
decorrência da doença, porque trabalhavam, dia e noite, na assistência daqueles
que tinham sido abandonados por essas famílias.
Nunca
o mundo antigo havia visto uma rede de solidariedade tão significativa, o que
teria, na opinião de alguns historiadores, atraído a atenção de algumas pessoas
para a religião nascente.
Por
mais que os textos sejam dotados de recursos propagandísticos – ou apologéticos
– é certo que a caridade e a fé a toda prova eram as características que mais
distinguiam os cristãos dos demais cidadãos do império.
Olhando
hoje, para a nossa realidade, parece que estamos longe de assumir esse tipo de
postura. Os livros de novena seguem empoeirados, enquanto muitas línguas estão
afiadas para perseguir quem tem feito algo pelo próximo. Cobram a abertura das
igrejas enquanto o coração se fecha, ainda mais, para quem mais precisa. O luto
pelos mortos tem dado lugar às justificativas estratosféricas perante
ideologias assassinas.
Algumas
pessoas, de fora da Igreja, odeiam alguns cristãos não mais por causa da
doutrina que defendem, mas por causa da distorção e instrumentalização da fé
que praticam. Muitos membros da Igreja perderam, nesta pandemia, a oportunidade
única de atrair as pessoas para um cristianismo professado e vivido, cujo amor
é a palavra de ordem, não as agendas políticas de líderes pseudocristãos.
E é
justamente essa chamada de atenção que Francisco nos faz. O papa atual está
muito preocupado em resgatar a essência do cristianismo, enquanto muitos
trabalham para negligenciá-lo através de um falso zelo religioso.
Como
o cristianismo sairá dessa pandemia? – pergunto. Se depender de Francisco, mais
fortalecido. Se depender de outros, será uma religião que não tem credibilidade
nem para falar de Jesus Cristo mais.’
Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1496463/2021/01/os-cristaos-e-a-peste/
Nenhum comentário:
Postar um comentário