segunda-feira, 29 de setembro de 2025

A Torre de Babel de fato existiu?

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre José Inácio de Medeiros, CSsR

 

‘A Bíblia continua sendo ainda hoje o livro mais traduzido em todo o mundo. Segundo um relatório mais recente da Sociedade Bíblica Internacional, cerca de 3.610 idiomas contam hoje com a tradução de pelo menos um livro da Bíblia. A tradução completa de todos os livros das Sagradas Escrituras, por sua vez, está disponível atualmente em 733 línguas. Ainda assim, muitas perguntas a respeito da bíblia continuam circulando pelo mundo e uma das mais recorrentes é : A Torre de Babel de fato existiu?

Começando a responder, é importante que a gente saiba que não é apenas a língua comum ou um território habitado por um mesmo povo que criam a cultura de uma civilização. Em quase todas as civilizações antigas certas histórias e mitos são fatores que ajudam a entender a forma como um determinado povo conta a sua origem e baseia os seus costumes.

Uma história intrigante : realidade ou mito?

A narrativa da Torre de Babel pode ser encontrada no capítulo 11, versículos de 1 a 9 do Livro de Genesis.

Naquele tempo toda a humanidade falava uma só língua. Deslocando-se e espalhando-se em direção ao oriente, os homens descobriram uma planície na terra de Sinar e depressa a povoaram. E começaram a falar em construir uma grande cidade, para o que fizeram tijolos de terra bem cozida, para servir de pedra de construção e usaram alcatrão em vez de argamassa. Depois eles disseram : ‘Vamos construir uma cidade com uma torre altíssima, que chegue até aos céus; dessa forma, o nosso nome será honrado por todos e jamais seremos dispersos pela face da Terra!’

O Senhor desceu para ver a cidade e a torre que estavam levantando. Vejamos se isto é o que eles já são capazes de fazer; sendo um só povo, com uma só língua, não haverá limites para tudo o que ousarem fazer. Vamos descer e fazer com que a língua deles comece a diferenciar-se, de forma que uns não entendam os outros.

E foi dessa forma que o Senhor os espalhou sobre toda a face da Terra, tendo cessado a construção daquela cidade. Por isso, ficou a chamar-se Babel, porque foi ali que o Senhor confundiu a língua dos homens e espalhou-os por toda a Terra.

A narrativa da Torre de Babel já existia antes que os primeiros textos das Sagradas Escrituras começassem a ser escritos pelos judeus, se caracterizando como um dos mitos mais intrigantes da história humana, ao falar de um povo que começa a construir uma torre para chegar até os céus a fim de alcançar a Deus, porém, o Senhor não gosta da soberba que envolvia o projeto, derrubando a torre antes mesmo dela ficar pronta.

Essa história era comum a vários povos da região da Mesopotâmia. Como a maioria dos povos era politeísta falavam em alcançar os deuses, no plural. Mais tarde, os hebreus usam da narrativa para falar da multiplicação dos povos sobre a face da terra, cada um com seus costumes, línguas e tradições, porque o povo antes de se estabelecer na Terra de Canaã ou Palestina, circulava no meio destas civilizações, bem mais fortes e poderosas.

Explicações da arqueologia

Se é que existe, ainda não foi encontrada uma explicação que comprove a existência da Torre de Babel e até hoje a arqueologia nunca comprovou a existência desta construção, que, segundo a narrativa bíblica deveria se localizar entre os rios Tigre e Eufrates, onde hoje existe o moderno Iraque.

A explicação mais aceita sobre a Torre de Babel é que a narrativa tenha sido inspirada na construção dos templos da antiga Babilônia, localizados no sul da Mesopotâmia, em homenagem ao deus Marduk.

Estas construções chamadas de Zigurates, que se destacavam nas imensas planícies da Mesopotâmia eram templos onde os deuses podiam entrar em contato com os homens. A origem desta essa crença começou provavelmente com os sumérios.

Outra hipótese para a origem da Torre de Babel está no início da construção de um templo que um rei da cidade de Ur, localizada no sul da Caldéia, região onde viveram os antepassados dos judeus, tenha iniciado, mas nunca concluído. É possível que esta história tenha passado de geração em geração sendo aumentada continuamente, ganhando coloridos diferenciados.

Porta de Deus

A palavra Babel, em hebraico, significa ‘porta de Deus’, mas era também o nome que se dava à capital do Império Babilônico que em seu apogeu se transformou numa rica e poderosa civilização, chegando a se constituir num dos maiores centros culturais e econômicos do mundo antigo, para onde os judeus foram levados em cativeiro.

Existem diversas fontes extra-canônicas, como o chamado Livro dos Jubileus e o Terceiro Apocalipse de Baruch que chegam a falar das medidas desta torre, possivelmente localizada na Babilônia. A altura da Torre de Babel, segundo um desses livros seria de 5.433 cúbitos e 2 palmos, o equivalente a 2.484 metros de altura, muito mais alta que as mais altas construções do mundo de hoje.

O valor e as medidas são realmente impressionantes, porém, o que se quer demonstrar é sim o seu significado que é utilizado para explicar a dispersão dos grupos humanos pela terra, a grande variedade linguística existente e, sobretudo, a temeridade que é desafiar a Deus, como fez a Babilônia impenitente, que na concepção judaica era a simbolização do pecado e do mal.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2025-06/curiosidades-biblia-torre-babel.html

sábado, 27 de setembro de 2025

As hóstias que trazem histórias de redenção ao redor do mundo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo de Pietro Piga


‘O projeto ‘O Sentido do Pão’ (Il Senso del Pane, no original em italiano) nasceu de uma pergunta. Ela foi feita a Jesus dez anos atrás, por Arnoldo Mosca Mondadori, cofundador – junto com Marisa Baldoni – e presidente da Fundação Casa do Espírito e das Artes (Casa dello Spirito e delle Arti). ‘Como posso comunicar ao mundo a tua infinita doçura e o teu amor, que nos traz ao coração a bem-aventurança do Céu?’, ele indagou de joelhos, diante de um tabernáculo.

O presidente da ONG sediada em Milão, na Itália, e ativa desde 2012 no campo das artes, da cultura e da promoção social, encontrou a resposta em sua alma : deveria ir às prisões, reunir os detentos que haviam cometido homicídios, mas que se arrependeram, envolvendo-os na produção e distribuição das hóstias. Esse diálogo interior se concretizou em 2016, na Casa de Reclusão de Milano Opera, em Milão, onde foi aberto o laboratório eucarístico que produziu as primeiras hóstias. Ao Vatican News, Mondadori recorda os primeiros passos do projeto : ‘Fui à Milano Opera, onde encontrei um diretor muito sensível, Giacinto Siciliano, que nos deu uma sala dentro da prisão para as atividades. Ali três detentos trabalharam com um contrato formal, sendo que depois escreveram uma carta ao Papa Francisco, que consagrou pessoalmente essas hóstias’.

Além das prisões e fora da Itália

A poucos meses do décimo aniversário da iniciativa, graças ao apoio da Fundação Ennio Doris ETS, da Fundação Santo Versace, da Fundação Carlo Acutis e da Confcommercio, os laboratórios eucarísticos chegaram a 27 e os participantes já são mais de 15 mil. As hóstias são destinadas a dioceses italianas e estrangeiras, congregações religiosas, paróquias e mosteiros. O Sentido do Pão se expandiu em várias regiões da Itália : além de Milão – onde as atividades também acontecem nos presídios de San Vittore e Bollate – a produção e distribuição das hóstias de pão ocorrem nas cidades de Catânia, Fabriano, Nápoles, Pollone, Veneza, Vico Equense e Volpiano. Mas o projeto ultrapassou as fronteiras do país, chegando a nações distantes, algumas atingidas por conflitos e crises humanitárias, como a Palestina (Faixa de Gaza, Belém), Moçambique (Maputo), Sudão do Sul, Zâmbia, Sri Lanka, Argentina (Buenos Aires) e Brasil (Frutal, Governador Valadares, Itaúna, Ituiutaba).

Além disso, os laboratórios eucarísticos já não são destinados apenas aos presos : neles trabalham pessoas pobres, pessoas com deficiências físicas ou psíquicas, refugiados, ex-dependentes químicos, viúvas e mães solteiras. ‘Aos padres que nos pedem as hóstias’ – conta Mondadori – ‘nós as doamos e pedimos que informem os fiéis, durante a missa, que foram produzidas por detentos ou por pessoas que vivem em extrema pobreza.

‘Queremos testemunhar a união indissolúvel entre Cristo e os menos favorecidos’

Dentro das Apac brasileiras

Há três anos, O Sentido do Pão chegou ao Brasil, por meio da Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (Apac). Nessas associações destinadas à reabilitação de presos e à justiça reparativa, os laboratórios eucarísticos são quatro, todos em Minas Gerais, iniciados entre 2022 (Itaúna, Frutal) e 2025 (Governador Valadares, Ituiutaba). Cada um deles produz cerca de 300 mil hóstias.

Nesses locais, Simonetta D’Italia Wiener atua como voluntária e responsável pela ONG. Ela também é diretora e produtora de vídeos, além de professora no St. Francis College, em Nova Iorque. Ao Vatican News ela afirma que participa do projeto porque ‘as Apac e O Sentido do Pão têm em comum a centralidade da vida como experiência de misericórdia e perdão’. Todos os dias, das manhãs às tardes, ela acompanha grupos de seis a sete reeducandos, que recebem um salário mensal, com o objetivo de ajudá-los no caminho de reabilitação, conscientização e reconciliação com o próprio passado, e de reinseri-los na sociedade.

Histórias de redenção

No Brasil, aumentam os pedidos de hóstias, principalmente pelas dioceses de Divinópolis e Uberaba, o que D’Italia Wiener considera ‘um sinal concreto daquilo que a tradição cristã chama de ‘partir o pão’ : o milagre da multiplicação da Eucaristia que continua a se renovar’. Mas, prossegue, a essência de O Sentido do Pão é ‘a esperança fruto das mãos que um dia conheceram o mal, mas que hoje, renascidas, tornam-se sinal vivo e tangível de uma profunda transformação’.

Prova disso é a experiência de Paulo José, que há sete meses trabalha na produção das hóstias. Simonetta lê trechos de uma carta de Paulo : ‘Tiraram-me as algemas e pediram para levantar a cabeça. Fui convidado a trabalhar na fábrica e me sinto útil, sabendo que as hóstias são doadas gratuitamente a muitas igrejas pobres de Minas Gerais. Assim, as pessoas podem compreender o desejo de mudar de vida’.

Outro testemunho é o de Lucas, que cuida da manutenção das máquinas, orienta os novos participantes dos laboratórios eucarísticos e escreveu estas palavras : ‘No passado fiz coisas terríveis. Hoje, ao contrário, levo Deus às pessoas, e aqueles que não acreditavam na minha recuperação podem ver que estou realizando algo de bom. Quero agradecer à Fundação Casa do Espírito e das Artes porque me permite pedir perdão e transformar meu presente em algo belo’.

O futuro do projeto

Em 2026, O Sentido do Pão continuará a se expandir : os laboratórios eucarísticos deverão se tornar 35, mas podem ser ainda mais porque, explica Mondadori, ‘todos os dias recebemos pedidos de novas implantações. Para a ampliação, porém, é necessária a oração, e sem a adoração eucarística o projeto não avança’. No próximo ano, nas Apac brasileiras poderão ser instaladas outras seis fábricas de produção de hóstias.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/mundo/news/2025-09/hostias-sentido-do-pao.html

quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Vivendo o Mês da Bíblia

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo da redação da revista Ave Maria


‘Setembro é conhecido como o Mês da Bíblia. Desde 1971, a Igreja no Brasil dedica esse período à valorização da Palavra de Deus, incentivando os fiéis à leitura, ao estudo e à prática cotidiana das Sagradas Escrituras. É um tempo especial para aprofundar a fé, nutrir a vida espiritual e fortalecer a missão de anunciar o Evangelho. Mais do que um convite à leitura, o Mês da Bíblia é um chamado à transformação de vida a partir da escuta atenta da voz de Deus.

Para aproveitar ao máximo esse período, algumas iniciativas podem orientar o caminho.


  • Estabeleça um plano de leitura : reserve diariamente um momento para a Palavra de Deus. Escolha um livro ou tema bíblico específico, alternando textos mais curtos e longos para manter o ritmo. Utilize subsídios e comentários que ajudam na compreensão e contextualização.
  • Pratique a leitura orante (lectio divina) : leia atentamente o texto, medite sobre sua mensagem, aplique-o à própria vida e finalize com uma oração, pedindo luz ao Espírito Santo, assim, a Palavra passa da mente ao coração e se traduz em atitudes.
  • Participe de atividades comunitárias : integre-se a grupos de estudo, encontros de partilha ou celebrações em sua paróquia. Com crianças e jovens, crie dinâmicas e jogos bíblicos, tornando a vivência mais atrativa e participativa.
  • Relacione a Bíblia com a vida cotidiana : deixe que a Palavra ilumine suas decisões, inspire suas atitudes e seja partilhada em gestos de fé e esperança. Use-a como espelho de conversão pessoal e guia para os desafios diários.
  • Aproveite os recursos disponíveis : explore aplicativos, plataformas digitais, vídeos e formações on-line que auxiliam na leitura bíblica. Utilize também os materiais preparados pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para o Mês da Bíblia que trazem roteiros, reflexões e subsídios pastorais.

Dica extra : Monte um pequeno ‘cantinho da oração’ em sua casa, reservado à leitura e à meditação da Palavra. Esse espaço pode ser um refúgio espiritual, ajudando a cultivar constância e intimidade com Deus.

Celebrar o Mês da Bíblia é redescobrir que a Sagrada Escritura é viva e atual, fonte de sabedoria, consolo e discernimento. Quem se aproxima dela com fé descobre que Deus continua falando, iluminando o caminho e fortalecendo a missão de ser testemunha do Evangelho no mundo.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/vivendo-o-mes-da-biblia.html

Tiago Maior, o peregrino da vida

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

*Artigo do Padre Nilton Cesar Boni, cmf


‘Tiago, cuja origem do nome é Iákobos (Jacó), era irmão de João, filho de Zebedeu e pertencia ao grupo dos três discípulos privilegiados na comunidade apostólica que sempre estavam com o Senhor nos momentos mais inéditos, como, por exemplo, na cena da transfiguração no monte Tabor e na hora da agonia no Getsêmani.

Na convivência com o Mestre foi experimentando as alegrias e as contradições do Reino de Deus, vendo com os próprios olhos as humilhações que Jesus passava em obediência ao Pai. Teve a oportunidade de amadurecer na fé e entender que o Messias esperado não seria um rei aos moldes do povo, mas um crucificado cuja glória se daria na participação de nossas dores.

Certamente, o momento decisivo para Tiago foi no dia de Pentecostes, quando ele entendeu seu chamado e missão diante dos apelos do Evangelho. É nessa diáspora que o cristianismo começa a se espalhar e provocar as nações, os governantes e suscitar um novo olhar redentor para as comunidades que antes estavam sem um pastor e guia.

Por volta dos anos 40 da nossa era, o rei Herodes Agripa, neto de Herodes, o Grande, começou sua perseguição aos membros da Igreja (cf. At 12,1-2), mandando matar Tiago; no entanto, sabemos que esse apóstolo se dedicou a evangelizar a Espanha, embora alguns historiadores digam que somente o corpo de Tiago tenha ido para as terras ibéricas, chegando a Compostela.

O fato é que Tiago foi o primeiro a beber o cálice de Jesus, a ser cruelmente martirizado pelo testemunho de amor a Cristo. Papa Bento XVI escrevia que ‘Podemos aprender muitas coisas de São Tiago : a presteza em aceitar o chamado do Senhor, entusiasmo em segui-lo nos caminhos que Ele nos indica, a disponibilidade para testemunhá-lo com coragem até o sacrifício supremo da vida’.

Tiago é o apóstolo generoso que escutou a voz do Cristo e caminhou ao lado da verdade sem negar a identidade do Mestre, sendo fiel arauto do Evangelho e propagador de um caminho ascendente de transformação na vida das pessoas. Isso é perceptível na jornada de Compostela, que atrai milhares de peregrinos em busca de equilíbrio e encontro com o sagrado independente de crenças.

O apóstolo se deixou ser transfigurado desde a experiência do Tabor até a agonia de Cristo. Viu as lágrimas e o sangue de Jesus e acolheu com sabedoria as incertezas, transformando-as em sólida confiança.

A vocação desse grande seguidor de Cristo nos faz refletir sobre nossa ação pastoral como batizados e tomar consciência de que beber do cálice de Cristo é atitude de graça e salvação. Que nosso caminho de descobertas seja amparado pela maior glória do Ressuscitado e sustentado pela espera na consolação e na misericórdia. Dedicados como São Tiago às coisas do alto sejamos promotores da dignidade e da liberdade tendo Cristo como Mestre e Senhor.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/tiago-maior-o-peregrino-da-vida.html

terça-feira, 23 de setembro de 2025

A história do Êxodo

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo do Padre José Inácio de Medeiros, CSsR

 

‘O Livro do êxodo e um dos mais conhecidos do Antigo ou Primeiro Testamento e a história da caminhada do Povo de Deus pelo deserto é um dos eventos centrais da narrativa bíblica porque marcou não apenas a libertação dos hebreus da escravidão no Egito, liderados por Moisés, mas passou a ter um simbolismo muito grande na vida do povo e na história de cada pessoa, por que a nossa vida nesse mundo é  identificada como o nosso êxodo particular em busca da eternidade.

De tão importante o Êxodo se transformou em temas de filmes, novelas e séries da TV, e mesmo na atualidade continua inquietando as pessoas que, muitas vezes, não sabem interpretar o seu real significado.

De acordo com o seu relato os israelitas, após terem vivido e se multiplicado por várias gerações no Egito, passaram a ser oprimidos e escravizados pelos faraós que, temendo o crescimento populacional dos hebreus, impôs a eles trabalhos forçados e buscou controlar o seu aumento, chegando a ordenar a morte dos recém-nascidos do sexo masculino.

O êxodo se transformou no ‘mito fundador dos israelitas’, que também existe em outras nações, a exemplo de Roma, que tem a versão histórica e a versão lendária de sua fundação. Para os escritores sagrados não importante se e como aconteceu, mas o evento simboliza não apenas a passagem da escravidão para a liberdade, mas funciona como uma escola de pedagogia necessária para a construção da nação sob a orientação divina. Êxodo se confunde também com a história do próprio povo.

São estes, pois, os nomes dos filhos de Israel que entraram com Jacó no Egito, cada um com a sua respectiva família : Rúben, Simeão, Levi e Judá; Issacar, Zebulom e Benjamim; Dã, Naftali, Gade e Aser. Ao todo, os descendentes de Jacó eram setenta; José, porém, já se encontrava no Egito.

Ora, morreram José, todos os seus irmãos e toda aquela geração. Os israelitas, porém, eram férteis, proliferaram, tornaram-se numerosos e fortaleceram-se muito, tanto que encheram o país. Então subiu ao trono do Egito um novo rei, que nada sabia sobre José. Disse ele ao seu povo : ‘Vejam! O povo israelita é agora numeroso e mais forte que nós. Temos de agir com astúcia, para que não se tornem ainda mais numerosos e, no caso de guerra, aliem-se aos nossos inimigos, lutem contra nós e fujam do país’.

Estabeleceram, pois, sobre eles chefes de trabalhos forçados, para os oprimir com tarefas pesadas. E assim os israelitas construíram para o faraó as cidades-celeiros de Pitom e Ramessés. Todavia, quanto mais eram oprimidos, mais numerosos se tornavam e mais se espalhavam. Por isso os egípcios passaram a temer os israelitas, e os sujeitaram a cruel escravidão.  (Êx 1,1-13).

Moisés e a libertação do povo

Segundo as narrativas históricas os hebreus foram ao Egito em busca de terras férteis, fugindo da fome e da escassez de alimentos, que atingiram a região de Canaã por volta de 1750 a.C, porque o Egito, conhecido na antiguidade como ‘celeiro do Oriente’, por causa das terras férteis banhadas pela água abundante das cheias do Nilo, era o local ideal para uma população que dependia da agricultura e pecuária viver.

É possível que a chegada dos hebreus ao Egito tenha ocorrido durante a invasão dos Hicsos, povo de origem semita, conhecido como ‘Povo do Mar’ que dominou o Egito numa época de desorganização. Com a expulsão dos invasores os hebreus foram transformados em escravos por cerca de 400 anos.

No contexto de opressão nasce Moisés, salvo da morte pela filha do faraó e criado na corte egípcia que, ao conhecer a real situação dos hebreus, se transformaria no libertador de seu povo.

Disse Deus ainda a Moisés : ‘Eu sou o Senhor. Apareci a Abraão, a Isaque e a Jacó como o Deus Todo-poderoso, mas pelo meu nome, o Senhor, não me revelei a eles. Depois estabeleci com eles a minha aliança para dar-lhes a terra de Canaã, terra onde viveram como estrangeiros. E agora ouvi o lamento dos israelitas, a quem os egípcios mantêm escravos, e lembrei-me da minha aliança.

Por isso, diga aos israelitas : Eu sou o Senhor. Eu os livrarei do trabalho imposto pelos egípcios. Eu os libertarei da escravidão e os resgatarei com braço forte e com poderosos atos de juízo. Eu os farei meu povo e serei o Deus de vocês. Então vocês saberão que eu sou o Senhor, o Deus de vocês, que os livra do trabalho imposto pelos egípcios. E os farei entrar na terra que, com mão levantada, jurei que daria a Abraão, a Isaque e a Jacó. Eu a darei a vocês como propriedade. Eu sou o Senhor’. (Êx 6,2-8)

Porque o deserto?

O êxodo começa com a partida dos israelitas em direção à Terra Prometida, liderados por Moisés e seus continuadores, numa longa jornada pelo deserto que duraria 40 anos.

A distância do Egito até a Terra de Canaã era apenas 200 km, existindo um caminho conhecido como ‘Estrada Real’ que ligava as duas regiões com segurança. Até hoje as pesquisas arqueológicas não encontraram nenhum vestígio da caminhada do povo pelo deserto. As estimativas mais exageradas chegam a falar de 600 mil pessoas e durante a caminhada os israelitas enfrentam dificuldades e provações.

O percurso mais curto e direto para a Terra Prometida foi evitado por Deus, e o povo, debilitado pelo cativeiro e sem experiência em guerra, sentiu medo e desejo de voltar ao Egito. Deus optou por um caminho mais longo para preparar o povo para os desafios futuros.

A leitura do Êxodo mostra que não se trata apenas da libertação física da escravidão, mas do momento da consumação da aliança entre Deus e o povo. Durante a caminhada pelo deserto, os israelitas aprenderiam a confiar em Deus, recebendo as instruções para viver como um povo consagrado a Ele

O Êxodo se torna o evento fundante do povo de Israel, marcando o início de sua história como nação sob a orientação direta de Deus. A história do Êxodo também influenciou inúmeras outras tradições religiosas e tem sido uma fonte de inspiração para movimentos de libertação ao longo da história.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2025-09/curiosidades-biblia-historia-exodo.html

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Uma sede insaciável no coração humano

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Dom Aparecido Donizeti,

Bispo auxiliar de Porto Alegre, RS

 

‘Inquestionável que há um grito, uma inquietação no coração humano que perpassa todos os povos, tempos e lugares. A sensação de ausência de algo está sempre presente. É uma sede, um desejo que, quase sempre, não se compreende a razão. Em outras palavras, há uma sede de sentido mais profundo da própria vida, sede de plenitude, de paz, de alegria, que, a partir de um olhar marcado pela fé, é, na verdade, uma profunda sede de Deus. Já afirmava Santo Agostinho : ‘Inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em ti’.

O ser humano precisa reconhecer e aceitar que essa sensação de incompletude é algo constitutivo do próprio ser. Tal compreensão o leva a perceber que o homem não é o senhor da verdade e nem tem resposta para muitas questões da existência humana. Eis a razão pela qual precisa ter consciência de ser criatura imperfeita, limitada e frágil e como tal deve-se reconhecer. Em outras palavras, reconhecer-se sedento de infinito, de plenitude, de algo que o completa totalmente. Esse sentido verdadeiro da vida, sem dúvida, não será encontrado em coisas materiais ou em outras criaturas humanas. Assim sendo, essa consciência de uma sede de infinito favorecerá abertura maior ao transcendente que, na nossa visão de fé, é o próprio Deus criador e redentor da humanidade.

Já dizia o salmista : ‘Ó Deus, tu és o meu Deus, desde a aurora eu te busco. Minha alma tem sede de ti; por ti deseja a minha carne, numa terra deserta, seca, sem água’ (Sl 63). Quando a pessoa não busca em Deus a resposta para essa sede presente no coração, certamente buscará em outras fontes, contudo, essas outras fontes, na verdade, são puras ilusões que vão aos poucos gerando um vazio existencial e levando a pessoa à perda do sentido da própria vida. É o que acontece com muitos que são apegados aos bens materiais, ao poder e também aos prazeres passageiros, acreditando que isso, sim, é viver. Sem contar que, vivendo assim, geram sofrimentos para si e, consequentemente, para tantos outros. Exemplo disso é a ganância que, muitas vezes, cega o ser humano e leva à destruição de tantos semelhantes e também do meio ambiente. Os mais pobres e já fragilizados da sociedade são sempre os que mais sofrem com isso.

Que cada ser humano compreenda melhor o que verdadeiramente é importante e essencial na vida e não se deixe levar pelas falsas promessas de felicidade que o mundo apresenta. Compreender o verdadeiro sentido da vida supõe aceitá-la como um dom precioso de Deus e, por isso, vivê-la com responsabilidade e zelo.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/uma-sede-insaciavel-no-coracao-humano.html

sábado, 20 de setembro de 2025

A fé oculta de Dubai: como prospera a comunidade católica nos Emirados Árabes

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo de Solène Tadié

 

‘A cidade mais emblemática do Golfo Pérsico, famosa por seus arranha-céus, opulência ostentosa e mesquitas, também abriga uma das paróquias católicas mais movimentadas do mundo : a Igreja de Santa Maria em Oud Metha. Todos os fins de semana, dezenas de milhares de fiéis se reúnem lá para a missa, com liturgias que se estendem pelos pátios e salas. Dentro do complexo, encontra-se uma réplica da Gruta de Lourdes, um local de oração afastado da rua, simbólico de uma fé vivida com fervor, mas com discrição, na cidade.

Dubai faz parte dos Emirados Árabes Unidos (EAU), uma federação de sete emirados governados por monarquias hereditárias. Outrora um modesto porto no Golfo, em poucas décadas tornou-se um centro global de comércio e turismo. Essa transformação rápida moldou tanto as oportunidades quanto as limitações das comunidades cristãs, que permanecem em grande parte confinadas a complexos designados a elas. Segundo as últimas estimativas disponíveis, aproximadamente 850 mil católicos viviam nos EAU em 2020 — cerca de 9% da população total — embora fontes locais sugiram que o número tenha aumentado rapidamente desde então, especialmente em Dubai.

Consagrada em 1989, a paróquia de Santa Maria é uma das duas principais paróquias da cidade, juntamente com a de São Francisco de Assis, em Jebel Ali, inaugurada em 2001. Juntas, elas atendem a uma população onde estrangeiros constituem a grande maioria dos residentes. As duas igrejas ilustram como a vida católica em Dubai combina multidões extraordinárias, liberdades cuidadosamente administradas e devoção profundamente pessoal em uma das cidades mais cosmopolitas — e rigorosamente regulamentadas — do Oriente Médio.

Uma paróquia abarrotada

A magnitude da prática católica em Dubai é impulsionada principalmente pela demografia. Nos Emirados Árabes Unidos, migrantes e seus filhos representam quase 90% da população.

A paróquia de Santa Maria, portanto, se parece menos a uma paróquia de vila e mais com um centro de trânsito : múltiplas filas, gerenciamento constante de multidões e uma programação intensa pensada para atender as pessoas de acordo com seu idioma, situação familiar e horários de trabalho. As equipes da paróquia coordenam regularmente com a polícia e as autoridades municipais todos os fins de semana para organizar o trânsito e a segurança, uma expressão prática da combinação de tolerância e ordem da cidade.

‘Mais de 200 mil hóstias são distribuídas nos fins de semana, e as missas são celebradas em todas as línguas, do concani ao tagalo, malaiala, urdu, inglês, árabe, francês e coreano’, disse o padre Tanios Geagea, um padre libanês que lidera as comunidades de língua árabe e francesa em Santa Maria desde 2010. As missas ocorrem a cada hora ou meia hora durante todo o fim de semana, com multidões adicionais frequentemente lotando as salas próximas. Os padres batizam centenas de crianças todos os meses e celebram grandes casamentos comunitários. A igreja pode não estar entre os edifícios mais altos ou imponentes de Dubai, mas segundo a maioria dos relatos, é uma das maiores paróquias católicas do mundo.

A população católica em Dubai é notavelmente diversa, refletindo o mosaico da cidade como um todo. Indianos e filipinos formam os maiores grupos, acompanhados por importantes comunidades árabes, africanas e europeias. Essa diversidade cultural é tanto um desafio pastoral quanto um sinal vivo da catolicidade da Igreja no sentido mais literal.

Fé sob limites

O clima de tolerância em Dubai é real, mas comedido. Os católicos podem praticar em suas dependências, administrar escolas e aulas de catecismo, organizar retiros, peregrinações ou feiras paroquiais. Mas a visibilidade pública é estritamente limitada.

Permissões, vigilância e supervisão marcam a vida pastoral diária. Não pode haver cruzes no topo das igrejas, nem se podem tocar sinos. Às vezes, isso é perceptível até mesmo durante o culto : para quem ouve a missa do pátio, devido à falta de espaço dentro da igreja, a leitura do Evangelho pode ser completamente abafada pelo adhān, a convocação à oração dos muçulmanos, da imponente mesquita que fica em frente.

‘Conhecemos as regras do jogo; temos que aceitá-las : é um país muçulmano que já nos concedeu duas igrejas’, disse Armelle Demont-Lebert, membro do conselho paroquial francófono. Ela reconhece que os espaços existentes estão longe de ser suficientes para a crescente população católica. ‘Os vistos para padres são difíceis de obter. Em nossa comunidade, tentamos trazê-los regularmente, mesmo que seja por curtos períodos. Nem sempre é fácil’. Segundo o seu depoimento, há cerca de 15 padres permanentes em Santa Maria e cerca de dez em São Francisco, um número modesto considerando a vasta população que atendem.

 Lembrando que a presença da Igreja nos Emirados é relativamente recente — cerca de seis décadas em Dubai e Abu Dhabi, e menos em outros emirados —, o padre Geagea explicou que ‘a principal prioridade da diocese sempre foi acolher as pessoas para que todos tenham pelo menos espaço suficiente para rezar e crescer na fé. Não tentamos construir igrejas no estilo ocidental, nem pedimos que os monumentos arquitetônicos pareçam igrejas. Esse não tem sido nosso objetivo principal’.

O relatório World Watch List de 2025 da Open Doors confirma esse equilíbrio delicado : cristãos expatriados podem praticar em ambientes fechados, mas são proibidos de evangelizar ou rezar em público. Os convertidos locais do islamismo enfrentam a pressão mais forte, muitas vezes vinda de suas próprias famílias e comunidades : podem perder heranças, empregos e até mesmo o direito à guarda dos filhos. Muitos, portanto, mantêm sua fé oculta ou emigram.

Apesar de tudo, os católicos em Dubai desfrutam de um nível de segurança raro na região. ‘Aqui, ninguém se sente ameaçado em sua vida, em seus relacionamentos ou em suas crenças. Todos são livres para ser quem são, desde que não haja proselitismo’, disse o padre Geagea.

A visita do papa Francisco a Abu Dhabi, um dos emirados, em 2019 — quando assinou o documento sobre a Fraternidade Humana com o grão-imã de Al-Azhar — marcou um ponto de virada para a visibilidade católica e as relações inter-religiosas no Golfo. Seguiu-se a inauguração da Casa da Família Abraâmica em 2023 e outras iniciativas inter-religiosas.

A infraestrutura, no entanto, está crescendo mais lentamente. O padre Geagea confirmou que há discussões com as autoridades para a construção de novas igrejas.

‘Nossa comunidade francófona, por exemplo, era pequena no início, mas cresceu rapidamente, especialmente a partir de 2019’, disse Demont-Lebert, morador de Dubai há mais de cinco anos. Ele estimou um aumento de 25% no número de paroquianos francófonos, com cerca de 2 mil fiéis regulares e mais de 550 crianças nas aulas de catecismo. ‘As famílias aqui tendem a ter de três a cinco filhos, e estar longe de casa parece aprofundar a fé’.

Conciliar uma cultura acelerada e consumista com tempo para a família e a vida paroquial é, no entanto, um desafio constante ao qual o clero local precisa se adaptar. As grandes distâncias dentro da cidade também dificultam a participação. E para muitos migrantes que fugiram de zonas de conflito ou de situações de pobreza, as feridas espirituais frequentemente vêm à tona em Dubai. Alguns fiéis descrevem suas chegadas profundamente desorientados pela perda. A resposta da paróquia tem sido aumentar o número de pequenos grupos de diferentes faixas etárias — alguns com 150 a 200 participantes — para que todos possam encontrar uma comunidade que os faça sentir-se em casa.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://www.acidigital.com/noticia/64563/a-fe-oculta-de-dubai-como-prospera-a-comunidade-catolica-nos-emirados-arabes

sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Santo André Kim Taegon, sacerdotes e mártires coreanos

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)

 
*Artigo da redação da revista Ave Maria

 

‘Também a Igreja coreana, em seu nascimento, recebeu o batismo de sangue com o testemunho, dizem os coreanos, de cerca de 10 mil mártires, dos quais 103 canonizados por João Paulo II em Seul, em 6 de maio de 1984, na ocorrência do bicentenário da evangelização da Coréia.

Uma igreja nascida dos leigos

A fé cristã chegou a esse país nos albores do século XVIII, por iniciativa dos leigos do lugar. A cada ano uma delegação coreana visitava Pequim, na China, para um intercâmbio cultural com essa nação que era então muito estimada em todo o Extremo Oriente. Aí os coreanos entraram em contato com a fé cristã e levaram para sua pátria o livro do Padre Mateus Ricci, A verdadeira doutrina de Deus. Lee Byeok, um leigo, inspirando-se no livro do famoso missionário jesuíta, fundou uma primeira comunidade cristã muito viva.

Ele pediu a um amigo seu, Lee-sunghoon, membro da costumeira comissão em visita à China, para se fazer batizar e levar livros e escritos religiosos para aprofundar a nova fé. O amigo voltou com o nome de Pedro na primavera de 1784 e a comunidade cristã teve um novo impulso. Não conhecendo bem a natureza da Igreja, a comunidade se organizou com uma hierarquia própria e começou a celebrar não apenas o Sacramento do Batismo, mas também o da Crisma e o da Eucaristia.

Quando souberam do bispo de Pequim que para ter uma hierarquia válida era necessária a sucessão apostólica, suplicaram-lhe que lhes enviasse sacerdotes o mais rapidamente possível. O bispo os satisfez enviando um padre, Chu-mun-mo, e em poucos anos a comunidade coreana cresceu para diversos milhares de fiéis.

Infelizmente, a perseguição, já posta em ação desde 1785, tornou-se cada vez mais cruel e em 1801 matou também o único sacerdote residente na Coreia. A comunidade, porém, não se entregou; ao contrário, continuou a crescer. Em 1802, o rei emanou um edito que se tornou lei do Estado, no qual se ordenava, sem mais, o extermínio dos cristãos : ‘Não encontrando meio algum para fazer que os cristãos mudem de ideia é preciso absolutamente fazê-los morrer para destruir o germe da sua loucura’.

Tendo ficado sem sacerdote, os cristãos enviaram apelos contínuos e aflitos ao bispo de Pequim e, por seu intermédio, ao Papa, mas somente em 1837 um bispo e dois sacerdotes das Missões Estrangeiras de Paris conseguiram penetrar às escondidas no país para serem martirizados dois anos depois.

Uma segunda tentativa, com êxito mais feliz, foi feita em 1845, por obra de André Kim, que conseguiu fazer entrar no país um bispo e um sacerdote. A partir desse momento, a Santa Sé não deixaria faltar à comunidade cristã a presença de um vigário apostólico. 

Em 1866, teve-se a perseguição mais encarniçada, mas finalmente em 1882 foi proclamada pelo governo a liberdade religiosa.

Os principais mártires coreanos

Os mártires coreanos canonizados até agora pela Igreja são 103; destes, apenas dez são estrangeiros, três bispos e sete sacerdotes. Não podendo falar de todos, damos informações de alguns deles.

André Kim Taegon nasceu em 1821, de uma nobre família cristã. Para escapar da perseguição, o pai deixou sua aldeia e transferiu-se para uma localidade escondida entre os montes com a mulher, os filhos, a mãe e os irmãos, todos cristãos. Ali se dedicou à agricultura. Sua casa tornou-se uma verdadeira ‘Igreja doméstica’, para onde convergiam em grande número não só os cristãos, mas também aqueles que desejavam ser instruídos por ele na nova fé, para depois receber o Batismo. Tinha apenas 44 anos quando foi descoberto pelas autoridades governamentais, que lhe impuseram em vão renegar a fé. Ele preferiu o martírio. Esse era o ambiente em que André havia crescido.

No entanto, em 1836, chegavam da França os primeiros missionários e André, crescido na escola do heroísmo em família, entrou em contato com Padre Maubant, que o mandou a Macau, na esperança de prepará-lo para o sacerdócio. Tinha 15 anos. Voltou à pátria em 1844 como diácono, para preparar secretamente a entrada do novo vigário apostólico, Monsenhor Ferréol. Ele armou uma embarcação, com marinheiros todos cristãos, e dirigiu-se ao porto de Xangai para receber o bispo. Lá foi ordenado sacerdote e com uma viagem muito arriscada conseguiu com muita astúcia introduzir o bispo na Coreia, onde trabalharam juntos, sempre em clima de perseguição, recolhendo muitos frutos.

Ele era particularmente estimado pelos cristãos não só porque era coreano e compreendia muito bem a mentalidade do lugar, mas também porque era nobre no trato, exemplar na prática do Evangelho e ótimo pregador. Com efeito, sabia transmitir a fé com uma linguagem simples e profunda.

Na primavera de 1846, o bispo encarregou-o de fazer chegar cartas à Europa por intermédio do bispo de Pequim. Foi nessa missão que foi descoberto casualmente, enquanto se encontrava com as barcas chinesas nos rios da província de Hwanghai-do, e foi encarcerado.

Conduzido perante o mandarim, este lhe perguntou : ‘És cristão?’. André respondeu : ‘Sim, eu o sou’. ‘Por que segue essa religião contra a ordem do rei?’, perguntou o mandarim. ‘Porque é verdadeira, ensina-me a honrar a Deus e me conduz à felicidade eterna’, respondeu André. ‘Se não a renegares, farei que morras sob os golpes’, informou o nobre, ao que André respondeu : ‘Como quiseres, mas eu não abandonarei nunca o meu Deus’.

Permaneceu cinco dias nessa primeira prisão, aonde acorriam em quantidade generosíssima os curiosos que desejavam ver esse homem extraordinário e nobre, disposto a morrer por uma nova religião. André aproveitou a oportunidade, respondendo às suas perguntas, para catequizá-los. Transferido para o cárcere de Kaitsu, capital da província, o seu caso foi apresentado ao governador, que quis interrogá-lo na presença de toda a corte. André expôs com sua costumeira limpidez as principais verdades da fé. O governador declarou-lhe : ‘O que dizes é bom e razoável, mas o rei não permite que sejam cristãos’. Em se tratando de um nobre, foi dada uma informação ao rei, que o quis no cárcere de Seul. Aí fizeram de tudo para levá-lo a apostatar, mas, não o conseguindo, muito embora se utilizassem das mais atrozes torturas, foi decapitado aos 16 de setembro de 1846.

Do cárcere, havia escrito aos cristãos uma carta que tem o sabor dos escritos apostólicos.

Paulo Chong Hasang : outro mártir ilustre da terra coreana é o leigo Paulo. Havia nascido em Mahyan em 1795. Seu pai Agostinho e seu irmão Carlos foram martirizados em 1801. Naquela ocasião, ele, a mãe Cecília e a irmã Isabel foram antes aprisionados e depois provados de todos os seus à pobreza, a mãe foi morar com um parente seu. No novo ambiente, sentiram-se muito incomodados, não só por causa da pobreza, mas principalmente porque ficaram sem contato com a comunidade cristã.

Tão logo lhe foi possível, Paulo tomou consigo a mãe e a irmã e transferiu-se para Seul, onde, já com 20 anos, pôde dedicar-se à comunidade cristã, sobretudo ao serviço dos mais pobres. Foi a Pequim pelo menos quinze vezes, enfrentando a pé uma viagem dificílima, para receber os sacramentos e para implorar pelo envio de sacerdotes. O bispo de Pequim, em primeiro lugar, mandou o Padre Sim, o qual, todavia, morreu em viagem; depois, sugeriu a Paulo e a seus companheiros que escrevessem ao Papa pedindo um bispo. 

A partir desse momento, Paulo dedicou todo o restante de sua vida a garantir a presença de um bispo e de sacerdotes na Coreia. Foi por seu mérito que veio da China o sacerdote Yan e depois foram introduzidos os sacerdotes franceses, Padre Pedro Maubant, Padre Tiago Chastan e o Bispo Lourenço Imbert.

O Bispo Imbert tomou-o em sua casa juntamente com a mãe e a irmã para prepará-lo ao sacerdócio, porém, a perseguição reacendeu-se violenta e o bispo e os missionários foram forçados a esconder-se. Paulo, a velha mãe e a irmã – esta última, juntamente com o irmão, havia se consagrado a Deus na virgindade – permaneceram na casa do bispo e continuaram a manter a comunidade unida, mas, um apóstata os traiu e foram acabar na prisão.

Assim se desenvolveu o interrogatório diante do juiz : ‘É verdade que abandonaste as tradições da Coreia para praticar uma doutrina estrangeira e que arrastas para ela também outros?’. Paulo respondeu : ‘Se nós aceitamos do exterior objetos úteis para nosso uso, por que deveria eu rejeitar a religião cristã, que é a verdadeira, pelo único fato que vem de fora?’. E o juiz : ‘Se tu exaltas uma religião estrangeira, pretendes que o rei e os mandarins estejam em culpa porque a proíbem!’. E Paulo : ‘A estas palavras, nada tenho a objetar. Devo somente morrer’. 

Depois de havê-lo submetido a torturas insuportáveis sem obter a abjuração, os guardas o decapitaram em 22 de setembro de 1839, juntamente com seu caríssimo amigo Agostin o Nyon, que com ele havia subscrito a petição ao Papa para que enviasse um bispo para a Coreia.

Passados alguns meses, a mãe Cecília, de 79 anos, foi encarcerada e morreu devido às privações, enquanto a irmã Isabel, de 43 anos, foi decapitada. 

Os missionários mártires : não podemos omitir um rápido aceno ao heroísmo e ao martírio do Bispo Imbert e dos dois padres, Maubant e Chastan, todos os três franceses. Para atenuar as violências e os vexames exercidos sobre os cristãos para que revelassem o esconderijo dos missionários, o bispo apresentou-se espontaneamente às autoridades e sugeriu a seus dois sacerdotes que fizessem o mesmo. Nessa ocasião, o Padre Chastan escreveu uma belíssima carta, da qual transcrevemos apenas um trecho : ‘O nosso bispo, em sua sabedoria, considera oportuno, nas circunstâncias atuais, que é dever do bom pastor dar a vida pelas suas ovelhas. E disso deu o exemplo, apresentando-se ele próprio espontaneamente. A ordem de ficarmos escondidos nos havia mantido no segredo; a ordem de nos apresentarmos agradou-nos tanto quanto a primeira’.

Os dois sacerdotes, tomados sob custódia pelos guardas, foram conduzidos a Seul, tendo-se encontrado com seu bispo na prisão e, depois das costumeiras torturas, todos os três foram decapitados às margens do rio Han-kang, a cinco quilômetros da cidade.

Outros dois bispos e cinco missionários tiveram o sangue derramado junto à fileira dos mártires coreanos para estabelecer as bases dessa Igreja sempre fiel ao Evangelho e hoje particularmente florescente.’

 

Fonte : *Artigo na íntegra

https://revistaavemaria.com.br/santo-andre-kim-taegon-sacerdotes-e-martires-coreanos.html