Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo de Fabrício Veliq,
teólogo protestante
‘A qual Jesus seguimos? Essa pergunta
pode parecer um tanto quanto sem sentido. Afinal, qualquer pessoa que se diz
cristã tende a afirmar que segue ao Jesus que foi considerado Cristo no Novo
Testamento, o Filho de Deus, crucificado e ressuscitado pelo Pai no terceiro
dia.
Dogmaticamente, a resposta está
corretíssima. Mas, será que o seguimento que se faz é desse Jesus que foi
crucificado e ressuscitado, que andou por toda parte fazendo o bem e libertando
os que eram oprimidos pelo diabo, como afirma Pedro no livro de Atos, ou de um
Jesus que foi transformado num senhor que está acima de todos e, portanto,
condena aos que não o obedecem? Ou ainda, alguma outra modalidade de Jesus que
se adequa melhor aos anseios de cada um?
Ao longo da história do cristianismo,
diversas imagens de Jesus foram criadas. Com o passar do tempo, quanto mais
afastado do contato real com a personagem histórica Jesus de Nazaré, ou até
mesmo com os apóstolos que viveram com Jesus, mais essa imagem foi sendo
distorcida, chegando a um ponto, principalmente no século 18, de se desconfiar
do que era falado de Jesus pela Igreja, uma vez que tal discurso não se
coadunava com os Evangelhos. As buscas do Jesus histórico começam de maneira
mais sistemática com os trabalhos de Reimarus a partir dessa inquietação.
Ainda em nossos dias é possível
perceber que são diversas as imagens de Jesus. Há um leque de possibilidades
para que cada pessoa escolha qual Jesus deseja seguir. Bem na linha de um
capitalismo feroz, também o seguimento de Jesus entrou em oferta. Há um Jesus
próprio para cada pessoa, que se adequa perfeitamente ao tipo de vida que tal
pessoa deseja ter.
Se determinada pessoa acredita que não
há nenhum problema em acumular diversas riquezas na terra, não se importando
com seu próximo, ou até mesmo, sonegando imposto, desobedecendo as leis, a fim
de lucrar mais, há diversos discursos que se dizem cristãos que adequam Jesus a
esse tipo de pessoa. Basta olhar os teólogos e teólogas da prosperidade, que
justificam os resultados financeiros desses tipos de conduta como sendo a
benção de Deus que alcança os que devolvem o dízimo.
Ainda, se determinada pessoa deseja um
Jesus miliciano, que toma em armas, incentiva que elas sejam usadas para ‘promover
segurança’, destrua terreiros e lugares de cultos de religiões de matrizes
africanas por considerar ‘lugares satânicos’, também essa pessoa
encontrará uma teologia que atenda a isso. Basta olhar a modalidade dos
traficantes evangélicos, ou dos milicianos que se batizam no Jordão, ou de
pastores que chamam jovens para ‘fazer a obra do Senhor’ contra os
terreiros, ou ainda, aqueles e aquelas que pegam o texto que Jesus fala para
pegar uma espada e usa isso como justificativa para armar a população.
Esses pequenos exemplos mostram que é
possível falar que se segue a Jesus de Nazaré sendo que, na verdade, somente o
adequa ao modo de vida que se deseja ter. No entanto, se voltarmos aos
Evangelhos, em sua mensagem central (porque, nesse caso, mesmo apresentando
perspectivas diferentes, todos são unânimes no ponto central da mensagem de
Jesus) percebermos que não é Jesus que se adequava ao modo de vida dos que
vinham a ele, mas era demandado do que desejava segui-lo que se adequasse ao
modo de vida de Jesus.
Que modo de vida era esse? Do amor ao
próximo, da busca do bem, da não violência, da abertura ao diferente, da não
perseguição aos que criam de outra maneira, da não hipocrisia etc. Em outras
palavras, o modo de vida de Jesus era o amor sem medida que leva,
necessariamente, à denúncia das estruturas de morte que persistem na sociedade,
e não raras as vezes, à morte daqueles e daquelas que lutam pela justiça. A
crucificação de Jesus, portanto, é resultado de sua vida de amor e luta contra
um Império opressor. Como consequência, morreu como bandido aos olhos desse
Império. Deus, porém, o ressuscitou dentre os mortos, confirmando que a morte
não tem a última palavra, ao mesmo tempo, confirmando que a vida de Jesus é a
vida desejada por Deus para nós.
Diante disso, a pergunta : ‘a qual
Jesus seguimos?’ deve ser respondida diariamente. Se simplesmente adequamos
Jesus ao nosso modo de vida, então não somos nós que o seguimos, mas ele que
nos segue.
Seguir a Jesus não é o pertencimento a
um clube, mas um compromisso de vida de denunciar e lutar contra as estruturas
de morte que persistem em nosso mundo. Sem isso, Jesus se tornou somente mais
um produto, dentre tantos que consumimos atualmente.’
Fonte : *Artigo na íntegra https://domtotal.com/noticia/1507659/2021/03/um-jesus-para-chamar-de-seu/
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