‘Por
estes dias estive a rever o filme À procura de Nemo. Uma história
apaixonante de um peixe que perde a sua amada juntamente com as dezenas dos
seus filhos. No meio de tanta perda, ele descobre um bebê que sobreviveu :
Nemo! Esta história desenvolve-se apresentando os medos do pai em perder o seu
único filho, e o desejo do filho de partir para longe ‘das amarras’ do
pai. Ao desejo jovem de se arriscar em novos caminhos, contrapõe-se a
preocupação do pai que não consegue circunscrever a vida do filho aos lugares ‘seguros’
que estão sob a sua proteção. Nemo ousa partir para longe apesar de todos os
intentos do pai em impedi-lo de o fazer. Nemo tem de encontrar o seu caminho –
a sua vocação – mesmo que o pai não entenda ou se recuse a aceitar que a vida,
para ser vivida, implica sempre arriscar. Nemo vai para longe, perde-se,
encontra dificuldades. A sua procura por um caminho de realização pessoal
leva-o a viver perigos imensos. Por seu lado, também o pai, apesar da idade,
empreende um caminho de descoberta vocacional. Ao fim de tanto tempo,
finalmente, o pai de Nemo vai percorrendo um caminho de realização pessoal
enquanto pai! No final da história, pai e filho reencontram-se. A felicidade é
imensa, não porque um se submete ao modo de vida do outro, mas porque o amor
vence sempre e ambos percebem que cada um, para ser feliz, tem de viver o seu
caminho. Desta vez, sem ruptura de relação, o Nemo e o pai percorrem um caminho
juntos, um caminho de regresso, mas cheio de descoberta e de novidade. Nada
será como antes, não porque um deles assim decidiu, mas porque ambos assim o
desejam para uma vida realizada, plena e feliz.
Quando
revejo esta história, penso nas dificuldades dos primeiros passos para a
descoberta do caminho vocacional. Tudo parece tão difícil! Tudo parece tão
impossível! E, como Nemo, na ânsia de fazer valer os nossos desejos e sonhos,
cometemos tantos erros! Contudo, todo este percurso já faz parte da nossa
procura interior pelo ‘caminho certo’ da nossa vocação.
À procura!
A
procura que empreendemos, fruto do nosso desejo de viver a plenitude da vocação,
implica sempre (pelo menos para evitar as asneiras de Nemo) um tempo de
discernimento. Este discernimento, ao contrário do que muitas vezes
desejaríamos, não pode ser feito sozinho. Não é por acaso que a nossa vida se
pauta por uma pluralidade de relações. Não existem super-heróis quando se fala
de ‘vida real’! A humildade de perceber que não se é
auto-suficiente é o primeiro sinal de maturidade e o primeiro passo para um
discernimento que se quer que seja revelador do ‘mais’ que queremos viver, para
a nossa plena realização pessoal.
O
primeiro discernimento é o de perceber quem poderá melhor acompanhar-nos. Sobre
esta procura e sobre o discernimento vocacional, alerta o Papa Francisco que «nesta
busca, deve-se privilegiar a linguagem da proximidade, a linguagem do amor
desinteressado, relacional e existencial que toca o coração, atinge a vida,
desperta esperança e anseios. É necessário aproximar-se da gramática do amor»
(exortação apostólica Cristo Vive, n.º 211). Convém que seja alguém
que conheça e ame o caminho que pensamos ser o nosso e que, simultaneamente,
seja capaz de caminhar conosco para ver se o que desejamos não faz parte apenas
de caprichos ou ilusões que criamos (por vezes inconscientemente). Se assim
for, permanecer neste caminho trará apenas o vazio à nossa vida, nunca a
plenitude. O discernimento vocacional, porque é um caminho acompanhado,
permite-nos ter a confiança de que quem nos ajuda estará à altura de nos fazer
ver outros caminhos que devemos conhecer e discernir para que a nossa vida seja
verdadeira vida e não um mar de ilusões ocas e sem sentido.
Crescer para dar fruto
Hoje,
podemos perguntar-nos de que é que estamos à procura e quais os passos que
estamos a dar para um discernimento vocacional sério, capaz de vencer os
desafios do ‘mar de dificuldades’ que temos diante de nós e nos fazer
viver, em plenitude, uma vida realizada e feliz. Se, a este questionamento, nos
deparamos com um vazio de respostas, então, a nossa vida está estagnada, às
voltas numa rotunda imparável da qual nos recusamos (temos medo!) a sair.
Engana-se quem atribuiu o estado de estagnação a outros. Pensemos no pequeno
Nemo : não podia viver mais vigiado pelo pai, não podia estar mais acorrentado
às vontades de outros. Porém, ele não desiste e procura o seu caminho. Da nossa
parte, temos uma cabeça maior do que a do Nemo e sabemos que a radicalidade
desesperante do pequeno peixe em nada o ajuda. O crescimento na vida e
discernimento vocacional implica libertar-se das amarras, mas também, fazê-lo
com maturidade e com a segurança de não se lançar no ‘mar’ sozinho.
Crescer implica, portanto, algo mais do que ‘ter altura’ ou ‘ter a
maioridade’. Crescer significa viver um desabrochar capaz de frutificar. Um
crescimento que não venha a dar fruto, isto é, que não atinja uma realização
capaz de ser dom para todos, é um crescimento estéril. É uma vida de zombies em
que não se vive verdadeiramente, antes vagueia-se sem destino, sem
possibilidade de ser vida para os outros, sem a possibilidade de percorrer um
caminho maduro e feliz com aqueles que mais amamos. Para aqueles que nos amam,
a nossa felicidade é tudo e esta só pode ser abraçada vencendo as barreiras do
medo e lançando-se nos desafios da vocação.
Para
trilhar um caminho vocacional autêntico, há que «crescer na fraternidade,
viver como irmãos, auxiliar-se mutuamente, criar comunidade, servir os outros,
aproximar-se dos pobres» (exortação apostólica Cristo Vive, n.º
215). Não é fácil este crescimento vocacional. Na sociedade cada um puxa-nos
para um determinado lado, na família a mesma coisa. Vemo-nos arrastados, ora
para a direita ora para a esquerda, e ficamos perdidos, tontos e incapazes de
ver/escolher/decidir um caminho a percorrer. O crescimento vocacional implica
procurar um determinado ambiente em que seja possível crescer e fazer a nossa
procura vocacional frutificar.
Procura e crescimento
rumo a um caminho
Se
permanecemos à deriva no mar, à mercê das redes sociais ou das vozes ‘lá de
casa’ ou dos amigos que não o são verdadeiramente, que caminho poderemos
trilhar? Que frutos poderemos produzir? Que realização pessoal poderemos
alcançar?
Como
uma planta que precisa de determinado ambiente para crescer e dar fruto, também
nós precisamos de procurar os ambientes que nos ajudem a este crescimento
pessoal. Não haverá dano maior se nos enganarmos. De fato, se formos por
ambientes que nos atrofiem, certamente teremos noção disso e, claro está,
teremos ajuda para partir rumo a paragens que nos tornem possível um
crescimento sólido, responsável e maduro.
Crescer
é sempre um desafio. Nunca é fácil! A procura de um caminho implica ousar
enfrentar as dores do crescimento e vencer as barreiras de proteção que, de um
ou de outro modo, são colocadas à nossa volta. Discernir, com responsabilidade,
os caminhos da vocação é ousar optar por um crescimento saudável, duradouro e
feliz. Sem esta ousadia, a vida sem rumo torna-se sem sentido, sem sabor e sem
esperança de futuro.’
Fonte
:
* Artigo na íntegra https://www.combonianos.pt/alem-mar/artigos/8/160/procura-e-crescimento-rumo-a-um-caminho/
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