Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)
*Artigo
de Fabrício Veliq,
teólogo
protestante
‘Todas as culturas têm uma maneira própria
de lidar com as questões divinas. Pensar que todas elas pensam o divino assim
como a sociedade ocidental pensa seria muita inocência ou presunção. Até mesmo
dentro da própria América Latina é possível perceber modos de vida religiosa
totalmente diversa da que se está acostumada nos países ocidentais, bastando
para isso olhar para as religiões andinas e indígenas para perceber que elas
possuem seu modo próprio e rico de se relacionar com a divindade.
Essa
característica plurirreligiosa, no entanto, ainda é vista por muitos/as
cristãos/ãs como algo maléfico. São diversos os movimentos que querem ‘evangelizar’ os povos originários do
continente, transformando-os em cristãos/ãs na versão ocidental, por
acreditarem que esta é a única forma possível da salvação de Deus se fazer
presente para eles. Nesse tipo de postura, Deus não diverge de nada de um
soberano que tem sua ordem pré-definida e que deve ser, então obedecida
cabalmente. A evangelização é somente uma desculpa para mostrar quem é o Todo
Poderoso e quem é que manda, realmente, no mundo todo.
A
perspectiva que Jesus tem de Deus, no entanto, como narrada nos Evangelhos,
segue por um caminho totalmente oposto. Deus, para Jesus, é o seu Pai e está
disposto a se relacionar pessoalmente com seus filhos e filhas. Assim, sai de
cena uma visão meramente do ‘Senhor de
toda terra’, tão presente na religião judaica, e entra a figura subversiva
de um Deus que se mostra como Pai/Mãe de seus filhos e filhas. Esse Deus,
então, não deve ser considerado um ‘Deus
acima de todos’, mas um ‘Deus conosco’
(Emanuel, como narra Lucas), que decide caminhar com aqueles e aquelas que se
mostram dispostas a seguir seus caminhos, estendendo sua graça sobre todos e
todas, sem distinção, e promovendo sua salvação da morte a todos e todas,
independentemente de cultura ou nacionalidade.
Paulo,
falando aos Gálatas, ressalta esse caráter não discriminatório da graça de
Deus, que não faz separação de raça, cor, etnia, ou qualquer outra coisa. Faz
isso em resposta a grupos de judeus convertidos que queriam que os gentios
seguissem os rituais judaicos para serem considerados como salvos em Cristo.
Seguindo
nessa linha é possível perceber que o Cristianismo, após ser decretada religião
do Império Romano, seguiu na mesma via, tendo ainda hoje esse tipo de atitude
como algo comum. São diversos os grupos, sejam evangélicos, sejam católicos,
que continuam a seguir os mesmos passos dos primeiros judeus convertidos,
pregando que as pessoas que desejam ser alcançadas pela salvação que vem pela
graça, necessariamente, precisam cumprir os rituais do Cristianismo, como
batismo, ceia, ‘aceitar Jesus’,
dentre tantos outros.
Ao
fazer isso, não raramente, esses/as que se dizem cristãos/ãs consideram-se
melhores, mais iluminados, e, alguns, até mesmo, mais dignos da salvação do que
as pessoas que não são convertidas ao Cristianismo. O seguimento de Jesus,
nesse sentido, transformou-se em máquina proselitista e, com isso, ao invés de
se tornar instrumento de graça e salvação para as nações, em muitos lugares tem
se tornado instrumento de morte de culturas, povos, e saberes.
Nesse
ponto, faz-se importante perceber a subversividade trazida por Jesus em seu
tempo. Diante de um povo que se considerava escolhido por Deus e guardião dos
rituais desejados por ele para ser considerado santo, Jesus apresenta um Deus
totalmente diferente, que não ligava para os rituais de pureza, que não estava
nem aí a respeito de qual o dia da semana em que se colhiam espigas, que não
tinha nenhuma preferência por ações morais ritualísticas, mas que prezava,
antes de tudo, pelo mostrar da compaixão e misericórdia.
Jesus mostra que o que Deus procura é um
coração contrito e disposto a segui-lo em seu amor aos outros, em sua
misericórdia e apreço pelos marginalizados e excluídos na sociedade injusta. O
próprio Jesus não se importava se algo era feito por alguém que não o seguia,
antes, simplesmente disse em uma situação : ‘não o impeçais’.
Diante
de tudo isso, uma teologia que se diz cristã necessita olhar com atenção para
as matrizes religiosas não ocidentalizadas para reconhecer nelas também
aspectos do mesmo Deus que, como cremos, é único.
Dessa
forma, podemos dizer que um cristão que acha que tem um melhor conhecimento de
Deus do que um indígena, ou do que qualquer outra pessoa que pertença a
qualquer outra religião simplesmente porque pertence ao Cristianismo,
provavelmente não compreendeu as Escrituras e a ação do Espírito que sopra onde
quer.’
Fonte
:
* Artigo na íntegra http://domtotal.com/noticia/1303681/2018/10/voce-nao-e-melhor-do-que-quem-nao-e-cristao/
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