terça-feira, 18 de julho de 2017

Religiosas socorrem migrantes em sua tragédia

Por Eliana Maria (Ir. Gabriela, Obl. OSB)



‘Os jovens italianos lideram uma missa dominical bem animada na Igreja Católica São Pio X, em Caltanisetta, cidade siciliana do sul, com a ajuda de um migrante africano que segue o ritmo brincalhão de um tambor.

Integrar os migrantes em uma vida normal é um dos objetivos do Projeto Migrante/Sicília, projeto da União Internacional dos Superiores Gerais. As freiras de diferentes congregações em todo o mundo atenderam o apelo urgente do Papa Francisco em 2015 para ajudar os migrantes a fugir dos conflitos e da pobreza.

Chamamo-nos de migrantes entre migrantes’, disse a irmã Janet Cashman, membro das Irmãs da Caridade de Leavenworth, no Kansas. Ela serviu como assistente de saúde nos EUA, no Peru e no Sudão do Sul antes de assumir esse último chamado com o Projeto Migrante/Sicília.

Religiosas estão dando ajuda prática e apoio emocional a dezenas de migrantes que chegam às margens da Sicília. A Organização Internacional das Migrações das Nações Unidas disse que, desde o dia 3 de julho, mais de 85 mil migrantes – dos mais de 100 mil que atravessavam o Mediterrâneo – desembarcaram na Itália este ano.

Quando você olha para o mar, você vê sua beleza, mas o que eu sei é que muitas pessoas estão perdidas lá’, disse a Irmã do Sagrado Coração, Maria Gaczol, ao Serviço Católico de Notícias (CNS). A ONU estima que mais de 2.200 pessoas morreram no mar nos primeiros seis meses deste ano. ‘É também um cemitério, um deserto’.

Antes dos africanos chegarem à Líbia na travessia para a Europa, muitos devem atravessar o deserto do Saara.

Não é um ou dois, mas quase todos falam sobre o inferno que passaram para vir aqui’, conta ao CNS a irmã congolesa Vicky Victoria, das Irmãs Missionárias de Nossa Senhora da África, sobre a perigosa jornada. ‘A maioria deles são traficados, tendo recebido promessas de um bom trabalho na Líbia ou ainda melhor na Europa’.

Mas o primeiro grande desafio é atravessar o Saara vivos. Muitos imigrantes disseram a Victoria que os motoristas que os levam na travessia do Níger só tiram proveito da situação. Muitas vezes dizem aos migrantes que sua caminhonete quebrou no meio do deserto.

Eles dizem : ‘Eu vou repará-lo e vou voltar para levá-los’. ‘Mas eles nunca voltam’, disse ela.

Se os imigrantes abandonados tiverem sorte, algum motorista de caminhão amável retornará para recolhê-los depois de deixar seus passageiros. Contudo, muitas vezes, os migrantes são ‘deixados para andar sem comida nem água’. ‘Eles simplesmente cavam na areia com as mãos e colocam os corpos mortos abaixo’, disse Victoria.

Muitos contam que o que mostra o caminho quando estão perdidos são os ossos, os esqueletos daqueles que morreram ao longo da travessia no deserto’, disse ela.

A tragédia continua : para as mulheres, alcançar a Líbia pode significar ser colocada à força na prostituição, enquanto outras são vendidas como escravas, alguns para trabalhar em fazendas sem nenhum tipo de experiência.

‘Algumas pessoas são muito qualificadas, como médicos, economistas, enfermeiras, professores. Eles são espancados como bestas. Suas costas são apenas cicatrizes’, disse Victoria. ‘Assim é a escravidão hoje, e ninguém fala sobre isso’.

Outros são sequestrados e forçados a telefonar para suas famílias, com seus captores exigindo resgate pelas suas vidas.

Tudo isso, antes de fazer a viagem mortal no Mediterrâneo, muitas vezes em navios não aptos para a navegação. Uma viagem que pode custar até 5.700 dólares.

Muitos já viram seus colegas afundarem em diferentes barcos. Alguns deles estão dentro do barco. Outros ficam sentados na beirada do barco e são engolidos pelo mar’, disse Victoria. ‘Alguns chegam, totalmente fora de si por causa do trauma que viveram’.

A Irmã indiana Veera Bara disse ao CNS : ‘Além de orar com eles, integramos cada um em nossas orações. Suas histórias de vida também resultam difíceis para nós quando as escutamos’.

Um migrante me telefonou dizendo : ‘Irmã, eu não consigo dormir mesmo que me dê um remédio forte. Todos os dias vejo minha família que foi morta vindo a mim como um trauma’, disse ela.

As religiosas oferecem apoio emocional, ensinam italiano e traduzem para os migrantes os processos legais com funcionários italianos e em hospitais. Elas também fornecem refeições e roupas quentes para aqueles que precisam, bem como conduzem aulas de catecismo e mantêm os grupos infantis.

Um dos migrantes ajudados pelas religiosas, Godfrey Wadelwasee, de 35 anos, compartilhou sua própria história da travessia.

O barco estava superlotado, com algumas pessoas desmaiando dentro. Muitas ondas fortes batiam. Eu via calças e bonés daqueles que morreram na superfície das águas. Nosso barco começou a afundar. Nós oramos. Logo, os socorristas vieram e nos apanharam’, disse o nigeriano.

Eu acreditava em Deus, sabia que não morreria. Quando chegamos à Sicília, eles escreveram nossos nomes. Eu encontrei-me em Caltanisetta’, disse Wadelwasee, que está alojado em um acampamento de centenas. Ele, como outros migrantes, espera obter papéis para a residência e o trabalho. Mas as freiras disseram que talvez apenas 10% dos migrantes serão aceitos. Itália ameaçou fechar suas portas, já que só este ano entraram no país 83 mil migrantes, e a Itália está recebendo pouca ajuda de outros países europeus. Mais de 2.000 migrantes já morreram este ano tentando atravessar o Mediterrâneo. ‘É uma tragédia e o mundo deve agir, se tivermos ainda um pouco de humanidade’, disse Victoria. ‘Pelo contrário, as leis foram apertadas e até mesmo os menores que deveriam ser protegidos, não estão sendo mais amparados’.

Enquanto isso, o migrante paquistanês Gishon Payan, de 23 anos, diz que não tem escolha senão tentar trabalhar na Europa para apoiar sua mãe viúva e oito irmãos. Ele tomou um empréstimo de mais de 10.000 dólares para fazer a viagem de dois meses de ônibus e caminhada para a Itália e, se ele não pagar o dinheiro, a vida de sua família está em perigo. ‘A vida está cheia de tensão. Sinto a pressão para obter meus papéis e reembolsar o empréstimo’, disse Payan ao CNS. ‘Não consigo dormir nem comer’.’


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